Capítulo 7 - Borboletas Sempre Voltam
Eu sei que você está aí achando que a mensagem que chegou veio do João. Mas antes que você crie expectativas eu já vou dizendo que não teve nada a ver com ele.
Como todos saímos em horários diferentes da escola, somente Patrícia, Stella e eu voltamos para casa juntas. Minha mãe deve ter buscado as crianças, e os rapazes do terceiro ano só voltariam pra casa à tarde, por causa das aulas pré-vestibular. Eu passei o resto da manhã, desde a mensagem, querendo que o tempo corresse logo e, agora, eu me perguntava como é que as gêmeas conseguiam andar tão devagar.
Eu e Patrícia estávamos nos dando bem. Ela perguntava todo o tipo de coisa sobre mim, mas eu não tinha tempo de fazer perguntas também além de responder. Ela gostava mais de falar do que pareceu naquele primeiro jantar na minha casa, o que foi uma surpresa. Eu também não esperava que ela fosse me acolher entre seus amigos e que fosse, bem, ser uma garota legal. Nós poderíamos muito bem ter feito amizade se tivéssemos nos conhecido em outras circunstâncias.
Stella, por outro lado, permanecia um enigma.
Enquanto eu e Patrícia conversávamos no caminho para casa, a outra gêmea teclava em seu celular. Ela era a única dentre os novos irmãos que não havia se dirigido diretamente a mim e eu não posso negar que fiquei curiosa depois dos comentários nada amigáveis dos amigos da Patrícia. Eu não sabia se podia perguntar a Patrícia qual era a da sua irmã, porque nós não éramos íntimas.
Mas se você parar pra pensar que estamos dividindo o banheiro e a dignidade, eu tenho todo o direito de saber se a cota de vacas narcisistas será aumentada por metro quadrado lá em casa.
Hipólita era o meu limite até agora.
Eu sabia que o aniversário delas estava chegando e usei-o como desculpa para começar uma conversa que envolvesse nós três.
― Minha mãe falou que vocês vão ter uma festança no fim do mês.
O nariz de Stella finalmente se levantou do celular e ela olhou pra mim. Eu havia acertado seu ponto fraco em cheio.
― Ah, sim - Patrícia, entretanto, não parecia tão animada. Ela deu de ombros. - Sempre temos, na verdade. Não que eu tenha alguma escolha - ela lançou um olhar provocativo pra irmã, que apenas abriu um sorrisinho e voltou a digitar.
― Você deveria me agradecer por trazer movimento à sua vida social - Stella disse. E não foi de um jeito malvado como eu estava esperando. Ela simplesmente falou como uma irmã implica com outra irmã.
E Patrícia fez uma careta.
― A festa é mais sua do que minha de qualquer maneira.
― Porque você não se importa e eu me importo - Stella não parecia abalada. - Parece justo pra mim.
Eu tinha que concordar, parecia justo.
― Aliás, os convites estão para chegar essa semana. É bom que você me ajude a distribuir.
― Vocês vão convidar muita gente?
Stella olhou pra mim como se tivesse alguma coisa errada com o meu cabelo. Eu quase me senti amedrontada.
― Mas é claro. Senão não seria a maior festa de aniversário dessa cidade.
Ok. Certo.
Eu deixei escapar um riso e ela levantou uma das sobrancelhas bem feitas. Patrícia parecia piscar em código vermelho, prestes a me dar um beliscão pra eu parar de falar. Aparentemente Stella levava a coisa toda da festa muito a sério. Eu olhei para Patrícia pedindo ajuda.
Havia duas opções possíveis. Ou essa menina tinha complexo de grandeza e viajava na maionese. Ou eu me tele transportei sem saber para dentro de um filme adolescente americano e ela é a abelha rainha das meninas mais populares da escola.
Ou talvez a festa seja mesmo muito famosa por causa do Marido Número 3 e eu não faça ideia da dimensão do poder do nome dele nessa cidadezinha. Quer dizer, ok, o cara é influente e um bom samaritano que constrói cinemas e Skate Parques. Mas se essa influencia se estende às suas filhas adolescentes é porque o buraco é mais embaixo.
Quem, afinal, é Marido Número 3?
De repente comecei a entender o que Jo... Guto dissera sobre precisar "ter mais interesse sobre as coisas da família". Eu mesma não tive o mínimo interesse em ir procurar saber a fundo quem eram essas novas pessoas na minha vida. Talvez por eu estar em negação sobre ter que me mudar ou por não conseguir aceitar esses estranhos como parte da minha família.
Eu ainda não conseguia. Era muita informação ao mesmo tempo para se adaptar tão rápido. Mas a minha raiva por ele, infelizmente, estava perdendo a sua força. Porque não havia sentido.
Por sorte eu não tive muito tempo para ficar pensando nisso, já que estávamos chegando a casa. Eu corri os últimos metros da rua até o portão com o coração fazendo um verdadeiro ensaio de Escola de Samba, e subi as escadas da varanda já gritando pela pessoa que me mandou a mensagem - minha mãe. Estava uma barulheira na sala, onde os pequenos brincavam de Twister, e eu procurei minha mãe em todos os cômodos até encontra-la na cozinha.
― Onde está? - perguntei eufórica.
Ela levantou os olhos do livro que estava lendo, encostada na bancada da pia, e indicou a mesa da cozinha com o queixo.
Lá estava.
Soltei um gritinho que negaria até a morte e avancei para o pacote como uma leoa caçando a sua presa. Rasguei o embrulho e abri a caixa de papelão, tirando lá de dentro alguma coisa dura embrulhada em plástico-bolha. Quando desembrulhei e encontrei uma miniatura de balão de ar quente super colorida do tamanho do meu antebraço, eu me derreti por dentro.
Minha mãe já havia se aproximado e estava bisbilhotando por cima do meu ombro.
― Alguém acertou em cheio no presente - ela disse, com sua voz de quem diz "ta namorando!".
E eu não conseguia eliminar o sorriso do meu rosto, pra piorar a situação.
― Só estou curiosa, como foi que seu admirador descobriu nosso endereço? Nós nos mudamos ontem.
― A Helô deve ter dado pra ele - era a única opção lógica. - Lembra? Eu fiz você pegar o endereço com o Marid... com o Otávio assim que ele comprou a casa porque a Helô estava histérica.
― Olha, tem um cartão! - ela exclamou, tão feliz como se fosse ela a presenteada. Minha mãe às vezes parecia ter quinze anos e estava prestes a bater palminhas.
Eu deixei meu novo amor em cima da mesa e peguei o cartão lilás dentro da caixa. Abri e quase caí na gargalhada com a mensagem.
Borboletas sempre voltam e o seu jardim sou eu.
Uma mensagem espertinha com a frase de uma música de sertanejo universitário. Não era nem preciso assinatura.
Minha mãe franziu o cenho, um pouco confusa, enquanto eu me afogava no mar da paixão e pressionava o cartão contra o meu peito. Onde é que estava o meu celular?
― Dona Clara, a senhora quer que eu lave a roupa branca agora ou depois?
Olhei para a mulher entrando na cozinha pela porta que vinha do quintal de trás.
― Olha Inês, minha filha chegou - mamãe me deu um abraço apertado. - Cali, essa é a Inês, nossa ajudante.
Certo, nós tínhamos uma ajudante agora. E toda a política da minha mãe sobre não ter ajudantes? Sobre dividir as tarefas entre os filhos? Tenho até a desconfiança de que ela gerou tantas crianças justamente com o intuito de nos escravizar. Então entendam minha confusão quando a Inês se apresentou pra mim e me perguntou se eu tinha alguma roupa branca pra lavar.
Olhei pra minha mãe buscando explicações quando a Inês voltou para o quintal.
― Ela está com o Otávio há quase vinte anos. Você não queria que eu fosse a responsável pelo desemprego dessa senhora, queria? - mamãe parecia magoada por eu pensar que ela seria capaz de um ato tão cruel. - Além do mais, logo eu volto a trabalhar e agora a casa está mais cheia do que o habitual.
Pois é, isso eu já havia percebido. Mas espere um minuto...
― Onde você vai trabalhar?
Os olhos da minha mãe se iluminaram e aquilo foi o suficiente para minha espinha gelar de medo.
― Parece que um professor de história está para sair da escola e o Otávio falou sobre mim com a diretora. Amanhã vou me encontrar com ela. O plano era começar no ano que vem, até porque estamos em agosto. Mas uma porta se abriu e eu não sou do tipo que vira as costas para o destino!
Ela tinha que ser sempre tão dramática. Mas espere um minuto...
― Em que escola você vai trabalhar?
O sorriso dela quase me fez querer sair correndo da cozinha.
― Na sua, bobinha. É a melhor escola de Assunção.
Era só o que me faltava. Eu estava absolutamente sem palavras. Eu precisava de Apolo e Hélio pra poder lidar com essa situação.
― Aliás, por falar em História, o Eduardo vem pra casa nessa quinta-feira. Você quer que ele traga alguma coisa do Rio que tenha esquecido? Seu avô pode pegar.
Eduardo, o filho mais velho do Marido Número 3. Estudante de História na Universidade Federal do Rio de Janeiro e ex-aluno da minha mãe, antes de ela largar tudo e vir morar com o pai dele. A culpa era toda dele por tê-los apresentado.
Bom, talvez ele pudesse trazer de volta a minha paz.
Eu não precisava de mais nada então peguei meu balão e meu cartão e subi até o meu quarto, ainda atordoada com as últimas notícias. Balancei a cabeça para afastar isso e me concentrar no que realmente importava no momento. E meu peito se preencheu de um sentimento de puro deleite. Eu puxei meu celular do bolso da calça e comecei a digitar.
Cali: Victor e Leo - Borboletas.
Deitei na cama, abraçada ao meu mais novo - e preferido - balão de ar quente enquanto fazia o maior esforço para não roer as unhas. Esperar era uma tortura. Principalmente quando você se sente tão cheia de felicidade que precisa colocar isso pra fora.
Um minuto depois o meu celular vibrou e eu abri a mensagem nova tão rápido que quase deixei o aparelho cair.
Maurício: Finalmente haha já estava achando que tinha sido extraviado
Cali: Quando foi que você mandou? Eu ainda to meio chocada.
Maurício: Segredo. O importante é que chegou... E você gostou?
Cali: Estou apaixonada.
Maurício: É pra pensar em mim quando olhar pra ele ;)
Deixei escapar uma risadinha e comecei a me debater na cama, não conseguindo controlar a euforia. Respirei fundo e mordi o lábio sorridente, com medo de que eu fosse explodir a qualquer momento.
Maurício: Você ta fazendo falta
Cali: Eu queria poder voltar ): Mas me conta, como foi o primeiro dia sem a minha maravilhosa pessoa?
E essa foi uma conversa que durou pelo menos uma hora. Até o Maurício precisar sair para o seu treino de natação. E eu jamais me senti tão injustiçada por ter tido que me mudar quanto agora.
Olha quem está de volta!
Falei no capítulo anterior que SOMT tava fazendo um mês e que eu possivelmente postaria o capítulo 7 antes... Alguém aí se lembra? Alguém esperou ansiosamente? hahaha
Pois bem, aqui está ele, surpresa! Escolhi hoje, dia 23/05, porque faz EXATAMENTE um mês da postagem do capítulo 1. É uma data simbólica e, tanto a Cali quanto eu, adoramos símbolos.
Aproveitem a leitura e continuem comentando e votando porque a opinião de vocês é o combustível dessa história. Quero saber o que vocês estão achando e o que vocês esperam ler nos próximos capítulos... Vai que eu acabo escrevendo mesmo? #suspense
A música de hoje é Borboletas - Victor e Leo POR MOTIVOS hahahaha um hino desse.
Beijos e queijos, câmbio desligo.
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