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Capítulo 6: O Laço Do Patrãozinho.


Capítulo 6: O Laço Do Patrãozinho.

O céu amanheceu cinzento após a tempestade da noite anterior, e o estrago que ela causou era visível em cada canto da fazenda. As goteiras pela casa já tinham virado parte da rotina, mas a chuva dessa vez trouxe algo mais: uma árvore enorme havia tombado sobre o galpão de ferramentas, esmagando parte da estrutura e espalhando destroços por todo lado. Não dava para esperar - havia muito a fazer antes mesmo do dia realmente começar.

Passei a mão pelos cabelos úmidos, tomando um gole do café amargo e forte. Já estava acostumado a manhãs assim; sempre que uma tempestade passava, deixava um rastro de trabalho dobrado. Do lado de fora, Gabriel vinha na minha direção, com o rosto mais abatido que de costume. Ele tentava disfarçar o cansaço, mas era nítido no passo hesitante e nas olheiras sob os olhos.

Sem dizer muito, ele murmurou um cumprimento e pegou uma enxada para ajudar. Não estava acostumado a esse tipo de esforço físico, e cada tarefa parecia exigir mais dele do que ele queria admitir. Mesmo assim, Gabriel parecia determinado a me acompanhar, pelo menos no começo.

Peguei o machado e comecei a cortar os galhos menores que estavam emaranhados ao redor do galpão, enquanto Gabriel afastava pedaços de madeira e folhas. Logo percebi, no entanto, que ele estava se arrastando mais do que o habitual, e sua respiração era pesada, como se cada movimento fosse uma luta. A cada golpe que ele dava, precisava parar e respirar fundo.

-Tá tudo bem aí, Gabriel?- perguntei, levantando a voz para ser ouvido acima do barulho do machado batendo na madeira.

Ele levantou a cabeça, passando a manga da camisa na testa suada. -Tô bem... Só um pouco cansado por causa da noite.

Assenti, mas fiquei de olho. Gabriel estava estranho, sem as respostas provocativas que geralmente vinham logo atrás de qualquer pergunta minha. De tempos em tempos, ele levava a mão à testa e fazia careta, como se tentasse aliviar uma dor persistente.

Quando finalmente passamos para o tronco principal da árvore, ele tentou me ajudar, mas logo largou o machado, cambaleando. -Espera... só um segundo,- murmurou, pressionando a mão contra a cabeça. Mas, antes que pudesse fazer mais alguma coisa, ele cambaleou e caiu de joelhos, a pele visivelmente pálida e o olhar perdido.

-Ei, garoto, você tá bem?- perguntei, agora alarmado.

Sem uma palavra, ele desabou no chão com a respiraçã o irregular. Por um instante, fiquei sem saber o que fazer. A febre fazia a pele dele queimar, e era evidente que o garoto estava mais fraco do que aparentava. Suspirei, sentindo uma mistura de exasperação e preocupação, e me abaixei para conferir sua respiração. -Ora, garoto, não vai morrer aqui, vai?

Sem esperar resposta, levantei-o e o coloquei sobre meus ombros, levando-o de volta à casa velha. Deitei-o com cuidado na cama e corri até à cozinha para pegar um pano úmido. Ele murmurava coisas sem sentido, preso entre a febre e o sono, enquanto eu mantinha o pano frio em sua testa, tentando baixar a temperatura.

Em um momento, Gabriel abriu os olhos devagar, ainda meio perdido. -Você... tá cuidando de mim?- A voz saiu baixa, com uma vulnerabilidade que me pegou de surpresa.

-Já deu trabalho suficiente, não acha?- respondi, tentando soar mais severo do que me sentia. Mas Gabriel esboçou um leve sorriso, e aquilo, de alguma forma, fez com que eu me sentisse desconfortável.

Ele fechou os olhos novamente, mas continuou sorrindo. Troquei o pano mais uma vez, notando o quanto ele parecia tranquilo agora, diferente do garoto insolente que eu conhecia. Sentei na cadeira ao lado da cama, observando-o, tentando entender o que estava acontecendo ali. Provavelmente era algum resfriado devido a chuva, ou o esforço dos últimos dias, me senti em parte culpado por ele estar assim agora.

Passamos a tarde assim, entre trocas de panos frios e momentos de sono profundo. Quando a febre começou a ceder, ele abriu os olhos novamente, a expressão ainda abatida, mas com algo diferente em seu olhar.

-Acho que... Estou te amolecendo, Joaquim. - murmurou, tentando manter o tom leve, como se quisesse brincar.

-Não fode, pirralho - respondi. -Ainda tem que comer muito arroz com feijão pra isso.

Ele riu suavemente, o som quase imperceptível. Foi uma resposta simples, mas o jeito que ele olhou para mim foi diferente, com uma espécie de gratidão sincera que não combinava com o rapaz que cheguei a conhecer.

Na manhã seguinte, quando voltei ao quarto para ver como ele estava, Gabriel já estava acordado, ainda pálido, mas determinado. Ele me encarou, ainda hesitante, mas com um brilho novo no olhar.

-Não sabia que você era capaz de cuidar de alguém assim,- ele disse, tentando soar casual, mas era claro que ele estava mais agradecido do que queria admitir.

-Não é nada,- retruquei, tentando parecer indiferente. -Preciso de gente aqui que faça mais do que atrapalhar.

Ele balançou a cabeça, rindo de leve, e o vi relaxar um pouco mais. -Você diz isso, mas, ontem... eu estava literalmente nas suas costas.

Revirei os olhos, sem conter o sorriso. -Só fiz o que precisava ser feito. Agora descansa. Ou vou te largar no barro da próxima.

A resposta dele foi um sorriso leve, quase infantil. Mesmo quando saí do quarto e voltei ao trabalho, a imagem dele, doente e vulnerável, ficou em minha mente.

XXX.

Ao longo do dia, enquanto cuidava dos reparos pela fazenda, a imagem de Gabriel continuava em minha mente, insistente, como um peso que eu não sabia explicar. Ele estava melhor, ainda que fraco demais para retomar o trabalho. Mas eu continuava a vê-lo como uma presença constante, uma lembrança que ecoava enquanto eu lidava com as consequências da tempestade.

Os outros peões almoçavam no campo, trocando risadas sobre a falta de jeito do garoto.

-Ele não aguenta nem uma chuvinha,- um deles comentou, arrancando risadas dos outros. Outro, mais velho, completou: -Cidade grande nunca preparou ninguém pra vida de verdade.- Eu apenas dei de ombros, mas senti um incômodo. Embora eu mesmo tivesse criticado Gabriel tantas vezes, agora aquelas brincadeiras pareciam desnecessárias, talvez até injustas. Ele estava tentando, afinal.

Após o almoço, fui direto para a casa velha, querendo verificar como Gabriel estava. Quando entrei no quarto, o encontrei acordado, um pouco abatido, mas com aquele olhar de quem tentava disfarçar a própria fragilidade.

-Não tem trabalho a fazer? Desse jeito vou ter que sair daqui e ir te ajudar - ele brincou, o sorriso tímido em seus lábios ainda evidenciando o esforço.

-Duvido que consiga sequer andar sem tropeçar,- retruquei, mantendo o tom seco. Mas, ao mesmo tempo, era impossível ignorar a ponta de alívio que senti ao vê-lo bem. Gabriel esboçou um sorriso, e eu que me senti um pouco vulnerável, como se ele estivesse vendo além do que eu pretendia mostrar.

Ele tentou se ajeitar na cama, gemendo com o desconforto da dor. -Não queria dar trabalho,- ele murmurou, desviando o olhar. -Parece que só consigo causar problemas.

Suspirei, mantendo a voz firme. -Ninguém aqui tá esperando que você saiba tudo de uma vez. Mas, se quiser aprender, essa é sua chance.- Dei-lhe as costas, esperando que ele não percebesse o sorriso involuntário que escapou dos meus lábios. Talvez, contra minha vontade, eu estivesse começando a ver aquele garoto de outro jeito.

Enquanto saía, ouvi uma voz baixa atrás de mim: -Joaquim?

Virei-me, hesitante, e encontrei seu olhar. -Tô aqui,- respondi, tentando parecer indiferente.

Ele piscou, parecendo ainda confuso pelo sono e pela febre. -Obrigado...- ele murmurou, a voz embargada com uma sinceridade que ele raramente mostrava.

Não respondi, apenas assenti com a cabeça, deixando que as palavras ficassem no ar. Aquele momento, embora breve, parecia ter mudado algo entre nós. E quando finalmente deixei o quarto e voltei para o trabalho, a sensação persistia. Gabriel ainda era um fardo, mas, de alguma forma, um que eu estava começando a carregar com um pouco menos de resistência.

O sol começava a se pôr, e o céu, já mais claro, assumia tons alaranjados e rosados no horizonte. Peguei as ferramentas para arrumar os últimos estragos que a chuva deixara, mas, ao longo do trabalho, me peguei pensando nas palavras de Gabriel. Naquele agradecimento. Aquilo ficou na minha cabeça o dia inteiro, a um nível que já estava me irritando.

Mais tarde, o céu já começava a escurecer, e a quietude da fazenda era interrompida apenas pelos barulhos do campo. O trabalho intenso ao longo do dia já se refletia no cansaço em meus músculos, mas minha mente ainda se prendia ao garoto lá dentro da casa. Decidi que era mais fácil simplesmente ir ver como ele estava e acabar com isso.

Ao voltar para dentro, tudo estava em silêncio. Fui direto ao quarto de Gabriel, tentando checar se ele precisava de alguma coisa antes de encerrar o dia. Ele estava adormecido, o rosto relaxado de um jeito que contrastava com o Gabriel que eu conhecia, sempre com aquele ar de desafio e provocação. Ali, ele parecia... leve.

Por um momento, parei à porta, observando a respiração tranquila que subia e descia no peito dele. Parte de mim dizia que devia sair, que aquilo não era nada além de curiosidade passageira, mas o silêncio me prendeu ali. Sem pensar muito, dei mais um passo e me sentei na cadeira ao lado da cama.

-Muleque complicado,- murmurei, a voz baixa o suficiente para que ele não ouvisse. Estendi a mão e troquei o pano em sua testa, que começava a esquentar de novo. Ele franziu a testa levemente, talvez incomodado pelo toque frio, mas continuou dormindo.

Apenas uma semana atrás, nunca teria imaginado que estaria ali, cuidando dele daquela forma. Gabriel me irritava, e nossa convivência era como uma briga constante, mas agora... agora era diferente. Ele era o mesmo garoto da cidade grande, frágil e sem jeito para o trabalho, mas parecia estar tentando mudar. Algo nele me despertava um instinto de proteção maluco que eu nunca tive.

Ele se mexeu, o rosto se voltando ligeiramente em minha direção. A respiração dele estava mais tranquila, e o silêncio ao redor pareceu engolir tudo. Eu poderia me levantar e ir embora, mas minhas pernas não respondiam. E, contra tudo que eu estava acostumado a sentir, uma onda de afeto, de alguma forma, me fazia querer continuar ali.

Como se sentisse minha presença, Gabriel abriu os olhos, ainda sonolento, e piscou algumas vezes para se ajustar à pouca luz. Ele parecia confuso, mas não demonstrou surpresa.

-Você ainda tá aqui,- ele murmurou, a voz baixa e rouca, num tom quase de incredulidade.

-Preciso ter certeza que você não vai dar mais trabalho,- respondi, tentando manter o tom firme, mas sem conseguir esconder uma certa suavidade nas palavras. Gabriel me olhou de um jeito diferente, sem a usual ironia ou sarcasmo. Era um olhar profundo, quase agradecido.

-Joaquim...- ele murmurou, como se estivesse prestes a dizer algo mais, mas hesitou, deixando o silêncio preencher o espaço entre nós.

Aquele instante, por mais breve que fosse, parecia carregar um peso que eu não conseguia explicar. Ele estava sem as máscaras que sempre usava, e pela primeira vez percebi que, talvez, o garoto estivesse tentando provar algo, não só a mim, mas a ele mesmo.

Antes que ele pudesse dizer qualquer outra coisa, me levantei, interrompendo o momento. -Descansa,- ordenei, mantendo o tom seco. -Amanhã você tem que voltar pro serviço, sem moleza. Não tô afim de escutar bobeira do seu pai.

Ele sorriu, fraco, mas genuíno. -Vou tentar, não quero ser só mais uma dor de cabeça pra você.

Dei de ombros, tentando disfarçar qualquer reação. -Veremos se é capaz.

Saí do quarto, mas enquanto caminhava pelo corredor, aquela sensação estranha, um misto de alívio e algo mais, continuava a me acompanhar.

Naquela noite, enquanto eu me afastava do quarto de Gabriel, o peso do dia inteiro começou a me arrastar junto. Sentei-me na varanda por alguns minutos, observando o céu coberto de estrelas, tentando afastar aquela sensação que não conseguia nomear. Ele, frágil e abatido, mas sem dar o braço a torcer... não era algo que eu esperava encontrar em alguém que teve vida tão mansa.

No silêncio, lembranças começaram a se mesclar com a realidade. Era inevitável pensar nos anos que eu já tinha passado naquela fazenda, sozinho com minhas tarefas e minha rotina, sem precisar me preocupar com ninguém. Mas agora Gabriel estava ali, bagunçando tudo de um jeito sutil, quase imperceptível. A cada dia, o garoto estava deixando de ser só um desconhecido irritante para se tornar parte daquela paisagem.

XXX

Na manhã seguinte, o som do galo me despertou como sempre. O céu ainda estava cinzento, e o frio da madrugada impregnava o ar. Eu já estava acostumado a levantar antes do sol, mas naquele dia hesitei antes de sair da cama. Algo me dizia que deveria ver como Gabriel estava, mas ignorei o impulso, vestindo-me e indo direto para o desjejum.

Enquanto preparava os cavalos e revisava as cercas para os reparos, alguns dos peões comentaram sobre o estrago que a chuva tinha deixado. O galpão ainda precisava de uma boa reconstrução, e a árvore tombada era só o começo. Parecia que o trabalho nunca terminava, mas, para minha surpresa, minha mente se distraía mais do que o normal.

Quando voltei para a casa velha depois de um tempo, encontrei Gabriel de pé na cozinha, a mão apoiada na mesa, ainda com o rosto pálido e os ombros tensos, como se o simples ato de se manter em pé fosse um esforço.

-O que você pensa que está fazendo?- perguntei, cruzando os braços e o observando com um olhar severo.

Ele sorriu de lado, tentando disfarçar a fraqueza. -Achou que eu ia ficar na cama o dia inteiro? Eu quero trabalhar, já não fui ontem.

Soltei um suspiro e fui até ele, percebendo que ele ainda não estava nem perto de se recuperar. - Vai acabar desmaiando de novo se continuar forçando.

Ele me olhou por um instante, como se estivesse considerando minhas palavras, mas logo balançou a cabeça. -Você não me conhece tão bem assim, Joaquim. Não sou do tipo que desiste fácil.

Olhei para ele, dividindo a irritação com uma ponta de admiração. Era teimoso, disso eu sabia. E, no fundo, talvez fosse justamente essa teimosia que o fazia seguir em frente. Ele arrumou um chapéu de palha na cabeça, que arranjou não sei onde, e saiu da casa primeiro. Ele já estava indo na direção da roça quando o barrei.

-Varra a porta do estábulo se quer fazer algo,- disse, pegando uma vassoura encostada na parede e empurrando-a em sua direção, foi o serviço mais leve que consegui imaginar. -Mas, se desmaiar de novo, não espere que eu vá te carregar de volta dessa vez.

Ele riu levemente, aceitando a vassoura e indo comigo até o estábulo, havia palha solta pra todo lado. A princípio, Gabriel mantinha o ritmo, levantando poeira e juntando montes de palha, mas sua fraqueza e cansaço eram evidentes. Eu o observava de perto, nem dando muita atenção ao meu próprio trabalho, só esperava qualquer sinal de que ele estava ultrapassando seus limites novamente.

Ao final da manhã, enquanto o sol subia no céu, ele respirava com dificuldade, o rosto suado e os olhos semicerrados de exaustão. Mas, teimoso como sempre, continuava sem reclamar. Tentei conter uma ponta de preocupação.

-Por que você não desiste?- perguntei de repente, o tom mais sério do que eu esperava.

Ele parou e olhou para mim, o rosto iluminado pela luz do sol, os olhos escurecidos pela sombra do chapéu. -Porque... é a primeira vez que tenho algo que vale a pena lutar. Quero mostrar que sou capaz, que consigo fazer algo por mim mesmo.

Aquelas palavras ecoaram em mim de uma forma que eu não estava preparado para admitir. Gabriel, com todo seu jeito arrogante, estava revelando algo que talvez eu nunca tivesse considerado: ele só precisava de um lugar para pertencer, de uma chance para provar seu valor.

Fiquei em silêncio, apenas assentindo. A partir daquele momento, continuei ao seu lado, em um ritmo mais calmo, observando-o com um olhar diferente. Talvez, mesmo sem perceber, ele estivesse ensinando algo a mim também.

O sol já estava alto quando percebi que Gabriel começava a cambalear. Ele lutava para continuar varrendo, mas o cansaço evidente nos olhos e a respiração ofegante deixavam claro que, a qualquer momento, ele ia ceder.

Antes que pudesse protestar, ele soltou a vassoura e caiu de joelhos na terra, respirando com dificuldade, as mãos trêmulas buscando apoio no chão. Eu me aproximei, abaixando-me ao lado dele, a mão firme em seu ombro.

-Eu te avisei pra sossegar, garoto,- murmurei, minha voz saindo mais áspera do que eu pretendia. -Não adianta nada essa teimosia se não tiver fôlego pra aguentar.

Ele ergueu o rosto para me encarar, o olhar um misto de exaustão e desafio. -Não precisa... me tratar como um inútil.- A voz saiu entrecortada, mas mesmo assim ele sustentava o olhar, aquela expressão determinada que parecia desafiar o próprio cansaço.

Soltei um suspiro e, antes que ele pudesse protestar mais, passei um braço em volta da sua cintura, puxando-o para mim e colocando um dos seus braços sobre meus ombros. -Não adianta me olhar assim. Vai ser mais fácil se deixar ser ajudado.

Ele hesitou por um instante, mas logo cedeu, o corpo encostando no meu, ainda trêmulo. A proximidade me pegou de surpresa; eu podia sentir o calor da pele dele, o cheiro que misturava sabonete, suor e algo mais, um aroma quase familiar que eu não soube nomear. Estava mais perto dele do que eu nunca estive antes, o braço dele pousado sobre meus ombros, e sua respiração quente, próxima do meu pescoço.

Enquanto caminhávamos em direção à casa, o corpo dele se apoiava mais em mim, forçando-me a ajustar o ritmo para manter o equilíbrio. Ele escorregava levemente, e meus braços o seguravam firme, os dedos tocando a pele por baixo do tecido da camisa fina. Sentia cada músculo tenso e cansado sob o meu toque, o corpo dele era macio e muito mais delicado que o meu, uma tensão que parecia nos cercar com uma intensidade que eu não esperava.

Quando finalmente cruzamos a porta da casa, levei ele até o quarto, empurrando a porta com o ombro e me abaixando para que ele se deitasse na cama. Eu me inclinei sobre ele, nossas respirações se misturando por um instante. Ele me olhou, a respiração pesada, os olhos semicerrados, um olhar que parecia dizer algo mais, algo que eu quase consegui entender naquele instante.

-Descansa,- murmurei, minha voz baixa, enquanto ajeitava o travesseiro sob sua cabeça. Minha mão pousou em seu rosto por um momento, os dedos deslizando de leve pela pele quente e febril, mas tão suave. Ele fechou os olhos ao toque, a expressão relaxando, e por um instante, tudo pareceu suspenso entre nós, como se o tempo tivesse desacelerado. Aquele gesto - tão simples e ainda assim carregado de uma estranha intimidade - me deixou imóvel, e eu senti algo despertar, um impulso que eu não deveria sentir.

Antes que pudesse me permitir ir além, retirei a mão e me afastei, limpando a garganta. -Vou buscar água para baixar essa febre. Fica quieto aí, entendeu?- Ele abriu os olhos, parecendo meio frustrado, mas assentiu, o olhar ainda fixo no meu, como se quisesse entender o que eu estava pensando.

Saí do quarto rapidamente, o coração batendo mais forte do que eu esperava. Algo estava diferente, e, por mais que tentasse manter o controle, aquela proximidade com Gabriel mexia comigo de um jeito que não tinha como ignorar.

Depois de buscar um balde de água e uma toalha limpa, voltei ao quarto onde Gabriel estava deitado, os olhos semicerrados enquanto tentava resistir ao cansaço. Ao me ver entrar, ele esboçou um sorriso fraco.

-Obrigado pela ajuda,- murmurou, a voz rouca, quase um sussurro.

Coloquei o balde ao lado da cama e me sentei na cadeira próxima, observando-o enquanto encharcava o pano e o torcia para colocar sobre sua testa. Por alguns minutos, o silêncio era quebrado apenas pelo som de sua respiração pesada. O calor da febre ainda estava ali, e eu sabia que ele precisaria de descanso e muito líquido antes de conseguir se levantar. Voltei à cozinha e trouxe uma jarra d'água, lhe obrigando a beber um pouco mesmo que ele teimasse.

Porém, quase uma hora depois, Gabriel olhou para mim, o rosto corado não só pela febre, mas visivelmente constrangido. Ele virou o rosto, claramente sem jeito, e murmurou:

-Joaquim... eu... preciso ir ao banheiro.

Engoli em seco, o pedido me pegando desprevenido. Gabriel era teimoso demais para pedir ajuda tão facilmente, mas agora, com a febre e a fraqueza tomando conta, parecia ter se rendido. Soltei um suspiro, tentando manter a expressão neutra.

-Tudo bem, eu ajudo você a chegar lá,- respondi, minha voz firme, embora um pouco baixa. Sem dar tempo para ele protestar, passei meu braço em volta de seus ombros e o ajudei a se erguer. Gabriel vacilou, as pernas bambas, e ele se segurou em mim, os dedos apertando meu ombro. Estava mais fraco do que parecia, e foi preciso segurá-lo contra mim para que conseguisse se equilibrar.

Cada passo que dávamos era lento e cuidadoso, mas a proximidade era inevitável, e sentia a respiração de Gabriel se acelerar cada vez que o movimento o obrigava a se apoiar mais em mim. Ele parecia incerto, talvez desconfortável, mas ao mesmo tempo não havia outra alternativa.

-Concentre-se, Gabriel. Só mais alguns passos,- murmurei, tentando manter o tom prático, enquanto sentia o calor do corpo dele próximo ao meu.

Chegamos ao banheiro, e eu o ajudei a se apoiar no batente da porta, antes de me afastar um pouco, permitindo que ele tivesse algum espaço. Gabriel suspirou, aliviado, mas ao tentar se mover, desequilibrou-se, o corpo oscilando novamente em direção a mim. Antes que ele pudesse cair, alcancei-o de novo, segurando ele pela cintura.

Seus olhos encontraram os meus, um pouco surpresos, mas ele não disse nada. Ficamos assim por um instante, uma tensão silenciosa preenchendo o espaço entre nós. Ele abriu a boca como se fosse falar algo, mas hesitou, e, em vez disso, apenas assentiu levemente, indicando que estava pronto para continuar.

Quando finalmente se ajeitou, a febre parecia ter baixado um pouco, mas ele ainda estava fraco, os movimentos lentos. Aguardei do lado de fora, escorado na parede e mantendo a atenção em qualquer sinal de que ele precisasse de ajuda novamente. Momentos depois, quando terminou, o ajudei a voltar para a cama.

Ele se deitou e suspirou, parecendo aliviado. -Obrigado... outra vez.

-Não agradeça,- murmurei, tentando disfarçar o que aquela proximidade causava em mim. -Descanse agora, você vai precisar de forças.

Ele fechou os olhos, mas o leve sorriso em seu rosto mostrou que ele ainda estava consciente.

Depois que Gabriel se acomodou na cama, percebi que ele ainda precisava de mais cuidado. A febre estava baixando aos poucos, mas ele precisava se alimentar, recuperar as forças de verdade. Não estava certo de que ele conseguiria comer sozinho, então fui até a cozinha e preparei uma tigela de sopa quente, com pedaços de carne e legumes, algo que pudesse lhe dar sustento sem pesar muito no estômago.

Quando voltei para o quarto, Gabriel estava com os olhos nublados, meio grogue, mas despertou ao sentir o cheiro da comida. Sentou-se com dificuldade, e antes que ele pudesse fazer muito esforço, sentei-me ao lado da cama, com a tigela nas mãos.

-Não precisa... posso fazer isso,- ele disse, com a voz baixa e ainda cansada, mas teimosa como sempre.

-Ah, claro, mal consegue se sentar e quer segurar uma colher?- perguntei, num tom levemente provocador. -Fica quieto aí e deixa que eu cuido disso.

Ele pareceu hesitar, mas acabou se rendendo, talvez ainda sem forças para argumentar. Aproximei a colher e ele abriu a boca devagar, os olhos evitando os meus, como se estivesse desconfortável, mas ao mesmo tempo sem opções. A cada colherada, ele parecia ganhar um pouco mais de cor no rosto, e percebi que sua respiração estava voltando ao normal, sem o esforço de antes.

Por alguns instantes, fiquei focado em oferecer a ele a sopa, atento a qualquer reação de desconforto. Mas, conforme o tempo passava, Gabriel parecia relaxar um pouco. Em certo momento, ele levantou o olhar, e nossos olhos se encontraram. Por um segundo, uma sensação de proximidade tomou conta do quarto, como se o peso das nossas rotinas e dos nossos atritos fosse substituído por algo mais simples e silencioso.

-Tá melhor assim, não tá?- perguntei, tentando quebrar o momento com um tom casual.

Ele soltou um suspiro leve, quase como um riso abafado. -Nem acredito que tô aqui, sendo alimentado como criança... mas valeu.

-Tem uma primeira vez pra tudo,- brinquei, oferecendo outra colherada.

Quando ele terminou a sopa, deixei a tigela de lado e fiquei em silêncio por alguns instantes, sem saber exatamente como lidar com o que estava acontecendo. Eu costumava ver Gabriel apenas como um incômodo, alguém que precisava aprender as regras da fazenda. Mas ali, naquela quietude compartilhada, algo parecia diferente.

Assim que terminou de comer, Gabriel pareceu relaxar, finalmente cedendo ao peso do cansaço. Ele fechou os olhos, e aos poucos a respiração começou a se acalmar, tornando-se mais profunda e ritmada. Eu observei por alguns instantes, em silêncio, até ter certeza de que ele tinha adormecido.

A luz do final da tarde entrava por entre as frestas da janela, suavizando o quarto com um tom dourado que tornava o rosto de Gabriel ainda mais jovem, quase ingênuo. Ele parecia tão diferente dormindo, sem a teimosia e a atitude desaforada de sempre. E, naquele momento, por mais que eu tentasse evitar o pensamento, era difícil negar que o rapaz estava deixando alguma impressão em mim.

Levantei-me devagar, recolhi a tigela vazia e apaguei a lamparina sobre o criado-mudo. Antes de sair, ajustei o cobertor sobre ele, garantindo que estivesse bem coberto e aquecido. Gabriel se remexeu levemente, mas logo voltou a se aninhar sob as cobertas, imerso no sono.

Fechei a porta atrás de mim, deixando o quarto em completo silêncio. Caminhei até a cozinha para lavar e guardar a louça e, por alguns instantes, fiquei parado ali, refletindo sobre tudo o que tinha acontecido nos últimos dias. Não sabia exatamente o que aquele laço inesperado significava, mas, sem dúvida, era algo novo.

No fim, voltei para o trabalho que ainda me esperava na fazenda, com a mente inquieta. Sabia que, na manhã seguinte, Gabriel estaria melhor e provavelmente voltaria ao seu jeito obstinado de sempre, mas a imagem dele, vulnerável e tranquilo, parecia ter se fixado na minha memória.

O sol já estava começando a se pôr quando finalizei os últimos reparos do dia. Com uma sensação de cansaço que, curiosamente, trazia certo alívio, percebi que uma nova rotina talvez estivesse começando, e que Gabriel, de alguma forma, já fazia parte dela.

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