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Capítulo 18: Resistência.

Capítulo 18 - Resistência.

Caminhar ao lado de Jeovanna era como carregar um peso invisível. O céu da tarde estava limpo, o azul intenso quase pintado de propósito, mas nem a beleza da fazenda ajudava a melhorar meu humor. Mostrar tudo a ela parecia uma obrigação insuportável, uma missão imposta pelo meu pai.

Ela era bonita, isso eu não podia negar. Cabelos castanho-claros muito longos e bem presos em um rabo de cavalo impecável, um vestido florido que parecia escolhido a dedo para passar a imagem de boa moça, e um rosto que não escondia a vida de privilégios que tinha levado. Mas bastaram alguns minutos de conversa para que qualquer possibilidade de simpatia fosse jogada no vento.

— Então, você já morou aqui antes? — ela perguntou, a voz doce, mas com um tom de desinteresse.

— Não. Sempre fui mais de Goiânia. Só vim pra cá recentemente.

— Hm. E é... melhor do que parece? — Ela lançou um olhar ao redor, como se não soubesse como alguém podia viver tão longe da cidade.

Suspirei, já cansado.

— Dá pra se acostumar.

Ela sorriu, mas não era um sorriso genuíno. Parecia mais uma máscara polida.

Enquanto andávamos, ela começou a falar sobre coisas que eu já sabia que não tínhamos em comum. A maior parte da conversa girava em torno de como tantas coisas no mundo eram pecados.

— Meu pai sempre diz que lugares como esse são abençoados por Deus, sabe? Trabalhar no campo, cuidar dos animais... Mas aquelas festas que vi nas redes sociais, Gabriel, aquilo é... — Ela fez uma pausa dramática. — Bem errado.

Minha testa franziu antes que eu pudesse me controlar.

— Festas?

— Sim. — Ela parou de andar, cruzando os braços e me olhando como se fosse minha professora da escola. — Vi no seu perfil. Você postou fotos em festas, bebendo. Você parou, não é?

Eu respirei fundo, tentando me manter calmo. Que saudade de quando crente também que internet é coisa do diabo.

— Faz tempo que não saio pra festa, Jeovanna. Agora estou aqui, lembra?

— Mas você ainda pensa em fazer essas coisas? Porque, Gabriel, se vamos nos casar, isso tem que acabar. Beber é coisa de desviado, leva direto para o inferno. Eu nunca bebi uma gota de álcool, e você também não pode.

Ela falava com tanta certeza que, por um momento, achei que estava mesmo condenando minha alma ao inferno por uma cerveja.

— Olha, Jeovanna, eu nem...

— Não. — Ela me interrompeu, levantando a mão como se estivesse ditando uma sentença. — Quando nos casarmos, vamos à igreja juntos pedir perdão pelos seus pecados. Não podemos começar uma vida juntos com você ainda preso a esses erros.

Eu pisquei, sem saber se ria ou se ficava irritado.

— Você já tá falando como se estivéssemos casados.

— E não estamos noivos? — A pergunta veio carregada de convicção. — Não é isso que seu pai quer? Que nossas famílias se unam e vivam de acordo com os planos de Deus?

Minha paciência estava se esgotando rapidamente. Não bastava que eu tivesse que tolerar o desajuste óbvio entre nós dois, ela ainda queria controlar minha vida antes mesmo de qualquer aliança.

— Vamos só continuar o passeio, tá bom? — falei, tentando cortar a conversa.

— Claro, mas pense no que eu disse. É importante.

Andamos até a área dos peões, e finalmente meu humor deu sinais de melhora. O cheiro de comida vindo da cozinha enchia o ar, e os cachorrinhos que eu tinha resgatado estavam espalhados sob a sombra de uma árvore. A mãe deles estava mais perto da cozinha, sendo mimada por Clarisse com o que me parecia carne.

— Aqui é onde os peões descansam e fazem as refeições — expliquei, tentando me focar em algo mais leve.

Mas Jeovanna torceu o nariz, visivelmente desconfortável. Quando ela viu os cachorrinhos, o desconforto virou repulsa.

— Meu Deus, o que é isso?

— São os filhotes que resgatei junto com a mãe deles.

— Resgatou? Gabriel, esses bichos são sujos! Provavelmente invadiram a fazenda. Você devia mandar eles embora.

Minha cabeça girou para ela, a incredulidade estampada no meu rosto.

— Mandar embora? Eles estavam abandonados na estrada. São só filhotes.

— Sim, mas são vira-latas. Você sabe como é. Cachorro de rua traz doença. Pode ser perigoso deixar eles aqui.

A condescendência na voz dela era insuportável, como se ela estivesse explicando algo óbvio para uma criança. Eu olhei para os filhotes, tão pequenos e indefesos, e depois para ela.

— Olha, Jeovanna, eu tô... não tô me sentindo bem. Preciso ir. — Apertei a mão contra a barriga, forçando uma expressão desconfortável. — Acho que comi algo que me fez mal.

Ela ficou pálida, os olhos arregalados.

— O quê?

— Diarreia.

O choque no rosto dela quase fez tudo valer a pena.

— Meu Deus, Gabriel! Vai, vai! Não precisa ficar aqui desse jeito!

Me virei rapidamente, segurando o riso enquanto me afastava. Quando me distanciei o suficiente, soltei um suspiro longo. A verdade era inescapável: Jeovanna e eu éramos como óleo e água. Fiquei grato pela desculpa esfarrapada de estar passando mal me dar um tempo para pensar.

Eu esperei até ver Jeovanna desaparecer pela porta da casa grande antes de sair do meu esconderijo. O peso do dia ainda me pressionava os ombros, mas, pelo menos, eu tinha um lugar para onde correr: a cozinha.

Ao chegar, encontrei Clarisse com as mãos ocupadas, descascando batatas como se estivesse travando uma batalha silenciosa contra elas. A cozinha estava tomada pelo cheiro delicioso de alho refogado, cebola e ervas, e a visão de uma panela de barro no fogão prometia algo especial para o jantar.

— O que você tá aprontando aí, Clarisse? — perguntei, jogando meu chapéu em uma cadeira e me encostando na bancada.

Ela levantou os olhos rapidamente, o sorriso curto e sagaz de sempre surgindo ao me ver.

— Roberto mandou fazer um jantar "elaborado" pra impressionar a noivinha de hoje. Que tal? Já tá babando?

Revirei os olhos, puxando um banco para me sentar perto dela.

— Se esse jantar é pra Jeovanna, pode guardar pra ela. Eu tô sem fome.

Clarisse ergueu uma sobrancelha, sem perder o ritmo das mãos trabalhando.

— Ih, já não tá se dando com a patroinha? Tava achando que vocês iam sair daqui direto pro altar.

Suspirei, soltando um riso seco.

— Só se o altar for pro sacrifício. Ela é bonita, mas, meu Deus, Clarisse... eu não consigo.

— Por quê? — perguntou, genuinamente curiosa, enquanto jogava as batatas na água fervente. — O que tem de tão ruim?

A lembrança das conversas com Jeovanna me fez esfregar o rosto com as mãos.

— É o jeito dela. Tudo é pecado, tudo é sujo, tudo tem que mudar pra ela aprovar. Ela viu as fotos que postei nas redes e já quer me levar pra igreja pedir perdão.

Clarisse riu alto, quase derrubando a colher que tinha na mão.

— Igreja? Essa menina acha que é sua dona já, é?

— Parece. Hoje, quando mostrei os cachorrinhos, ela disse que devia mandar eles embora porque são sujos e podem trazer doenças. — Minha voz saiu mais amarga do que eu esperava.

Clarisse parou, encarando-me com os olhos estreitos, a expressão séria pela primeira vez.

— Ela falou isso? Dos filhotes?

Assenti, inclinando-me para pegar um pedaço de cenoura crua da bancada.

— Falou.

Ela balançou a cabeça, desaprovando.

— Ah, Gabriel... você não pode casar com alguém assim. Não mesmo.

Minha risada foi baixa e sem humor.

— Eu sei.

Antes que ela pudesse responder, a mãe dos filhotes se aproximou, abanando o rabo e olhando para mim com os olhos cheios de doçura. A cadela parecia outra desde que chegou ali. Tinha ganhado um pouco de peso, o pelo começava a brilhar mais, e o olhar cansado de antes dava lugar a algo mais vivo, mais esperançoso.

— Oi, menina — murmurei, abaixando-me para fazer carinho na cabeça dela. Ela se deitou de lado, exibindo a barriga como se confiasse em mim completamente.

Passei a mão pelo pelo dela, sentindo o calor do corpinho canino, e um sorriso escapou sem esforço. A cadela era um contraste gritante com Jeovanna. Tão simples, tão pura em seu jeito de mostrar afeto.

— Como alguém pode não gostar de você? — falei, mais para mim mesmo, mas Clarisse ouviu.

— É isso que eu tô falando, Gabriel. Você precisa de alguém que ame o que você ama. Que entenda o que importa pra você.

Fiquei quieto por um momento, apenas fazendo carinho na cadela, enquanto ela suspirava contente no chão. A cena era tão tranquila que me peguei pensando no absurdo de tudo aquilo. Como eu podia casar com alguém que desprezava uma criatura tão doce?

— Clarisse — chamei, ainda olhando para a cadela — Será que existe alguém assim? Que entenda?

Ela soltou um suspiro exagerado, colocando a colher de lado e cruzando os braços. O sorriso dela era malicioso, daqueles que já entregam que vem coisa pela frente.

— Claro que existe. Só talvez não seja quem seu pai escolheu, né?

Ri baixo, mas a ideia ficou pairando na minha cabeça. Jeovanna podia ser bonita, podia ter aprovação do meu pai, mas nunca seria doce. Nunca seria... bem, do jeito que eu precisava. A imagem de Joaquim veio à minha mente sem esforço.

Clarisse me observou por alguns segundos antes de se inclinar na bancada, diminuindo o tom da voz.

— E se esse "alguém" já estiver aqui, hein? Na fazenda?

Minha cabeça se virou automaticamente pra ela, e ela levantou as sobrancelhas com aquele ar travesso que só ela tinha.

— O que você tá insinuando?

— Ah, para, Gabriel, você sabe muito bem. — Ela deu um passo à frente, apertando os olhos como se quisesse arrancar um segredo de mim. — Como é que andam as coisas entre você e o Joaquim?

Meu rosto esquentou na hora, mas tentei disfarçar, voltando a fazer carinho na cadela.

— O que tem o Joaquim?

— Gabriel! — Ela bateu na bancada, apontando o dedo pra mim. — Não me enrola! Eu vejo o jeito que você olha pra ele. E ele também não tá disfarçando nada muito bem, viu?

Eu suspirei, sabendo que mentir era inútil. Clarisse era pior que investigador.

— Tá bom, tá bom. A gente... se beijou.

Os olhos dela se arregalaram, e um gritinho saiu da boca dela antes que pudesse se controlar.

— Eu sabia! — Ela praticamente pulou no lugar, rindo como uma criança que acabou de ganhar um presente. — Conta tudo, agora! Foi bom? Ele é bom nisso?

Eu ri da empolgação dela, balançando a cabeça.

— Foi bom, Clarisse. Muito bom, na verdade.

Ela bateu palmas baixinho, se aproximando como se estivéssemos conspirando contra o governo.

— E vocês já... sabe, foram além?

Minha risada saiu antes que eu pudesse segurar.

— Não, ainda não.

— Ainda? — Ela repetiu, arregalando os olhos de novo. — Então tá com vontade, né?

Suspirei, enfiando a mão nos cabelos e me encostando na bancada.

— Muita.

Clarisse riu de novo, mas dessa vez o tom era mais acolhedor.

— Relaxa, Gabriel. Se vocês se gostam de verdade, vai dar certo. O sexo, eu digo.

— E se não der? — perguntei, mais pra provocar do que por dúvida real.

Ela me lançou um olhar dramático.

— Ah, pelo amor de Deus. Você acha que o Joaquim, daquele tamanho, com aquele jeitão de peão, vai ser ruim de cama? Duvido muito.

Eu não consegui evitar de rir.

— Você é terrível, Clarisse.

— E você tá querendo morrer de tesão, né? — Ela jogou uma cenoura na minha direção, mas a expressão dela continuava divertida. — Olha, garoto, é melhor pensar direitinho. Porque quando você provar, não vai conseguir largar.

Soltei uma risada alta, mas a verdade era que, no fundo, ela não estava errada.

— Pelo menos com o Joaquim não vai ter essa de "é pecado" toda hora. — Clarisse fez uma imitação exagerada do tom de Jeovanna, e eu gargalhei, quase tropeçando no banco.

— Você tá me fazendo ficar ainda menos animado com o jantar.

Ela deu de ombros, sorrindo.

— E por acaso você já tava animado?

Neguei com a cabeça e me abaixei para dar mais atenção à cadela, que continuava ao meu lado, aproveitando o momento.

— Não. Eu só quero sobreviver à noite.

Clarisse terminou de mexer a panela e limpou as mãos no avental antes de se virar para mim.

— Vai lá, então. Sobrevive à noite. E tenta não pensar muito no Joaquim, porque senão... bom, aí você se ferra.

Levantei, rindo, e dei um abraço apertado nela.

— Obrigado, Clarisse. Você é a única coisa que me mantém são nessa casa.

— E você é o drama em pessoa. — Ela revirou os olhos, mas sorriu de volta.

Depois de mais alguns minutos de conversa, deixei a cozinha com um pouco mais de leveza no peito, mas ainda com aquela sensação estranha de estar preso entre dois mundos. Enquanto me arrumava para o jantar, uma coisa era clara: a última pessoa que eu queria impressionar naquela noite era Jeovanna.

XXX

A casa grande estava impecável, como sempre, mas algo na luz quente do salão parecia mais opressor do que acolhedor. Subi os degraus da varanda, ajeitando a camisa social que Clarisse insistira para eu usar. Ela dizia que eu precisava "fingir" um pouco, pelo menos. Mas a cada passo, sentia a gravata apertar mais, como se a formalidade da noite fosse me sufocar.

Abri a porta e entrei, sendo recebido pelo som abafado das conversas na sala de jantar ao fundo. No entanto, o salão de estar estava vazio... ou quase.

Joaquim estava lá.

Eu parei no mesmo instante. Ele estava de pé ao lado do aparador, vestindo uma camisa social cinza, com as mangas dobradas até os cotovelos, e uma calça jeans escura que parecia recém-passada. Apesar da simplicidade, ele estava... muito gato. A roupa acentuava os ombros largos e a postura firme que ele sempre tinha.

Quando ele percebeu minha presença, virou o rosto na minha direção, e o olhar dele demorou um pouco mais do que o necessário para subir e descer, me observando da cabeça aos pés.

— Boa noite, Gabriel. — A voz dele veio baixa, mas cheia daquele tom que sempre fazia meu coração bater um pouco mais rápido.

— Boa noite. — Eu respondi, me mexendo sem jeito. — Você... tá bem diferente.

Ele arqueou uma sobrancelha, mas havia um traço de um sorriso nos lábios dele.

— Diferente como?

— Sei lá. — Sorri de lado, coçando a nuca. — Acho que nunca te vi tão arrumado assim.

Ele deu de ombros, o olhar fugindo por um momento.

— Essa camisa é velha. Tava guardada lá no fundo do armário. Roberto me convidou, achei que devia fazer o esforço.

Eu assenti, tentando parecer casual, mas não conseguia desviar os olhos dele.

— Bom, ficou bem em você. Tá... muito bom.

Joaquim riu baixo, o tipo de riso que parecia sair de alguém que não está acostumado a receber elogios.

— E você? — Ele continuou, o tom meio hesitante. — Tá diferente também. Tá... bonito.

Meu rosto queimou na hora. Não consegui evitar o sorriso meio bobo que escapou.

— Brigado.

Por um momento, parecia que o tempo tinha parado ali. Ele me olhava, eu olhava para ele, e o resto do mundo parecia distante. Só que, como sempre, alguém tinha que quebrar o encanto.

— Gabriel!

A voz de Roberto ecoou pelo salão, e nós dois demos um leve sobressalto, nos afastando instintivamente. Meu pai entrou na sala com passos firmes, seguido de perto por Jeovanna, que parecia mais animada do que deveria estar.

— Joaquim, que bom que veio. — Roberto sorriu para ele, a expressão sincera. — Achei que um rosto conhecido seria bom pra quebrar o clima formal demais desse jantar.

— Obrigado pelo convite, seu Roberto. — Joaquim respondeu, sério, mas com respeito.

O olhar de Roberto passou de Joaquim para mim, estreitando por um segundo, mas antes que ele dissesse algo, Jeovanna se apressou em tomar o protagonismo.

— Gabriel! — Ela praticamente correu até mim, segurando meu braço como se já fosse dona dele. — Que bom que você tá aqui!

— Claro... — murmurei, desconfortável, lançando um olhar rápido para Joaquim, que desviou os olhos, a expressão voltando ao neutro habitual.

— Vamos, querido, seu pai quer que a gente fique juntos na mesa. — Jeovanna sorriu, apertando meu braço com força.

Tentei responder algo, mas senti um nó no estômago ao perceber que Joaquim não olhava mais para mim. Ele estava de volta à postura calma e reservada, mas eu sabia que, por trás da fachada, algo tinha mudado.

Enquanto Jeovanna me puxava para a sala de jantar, o perfume dela invadindo meu espaço pessoal, não consegui evitar uma última olhada por cima do ombro. Joaquim estava parado no mesmo lugar, os olhos fixos na lareira, como se já soubesse que esse jantar seria longo para nós dois.

A mesa estava posta de forma impecável, e o cheiro delicioso do jantar de Clarisse preenchia o ambiente. Todos se serviram com entusiasmo, e logo os elogios começaram.

— Clarisse se superou hoje. — Roberto comentou com um sorriso satisfeito. — Não tem comida assim nem nos melhores restaurantes de Goiânia.

— Isso é verdade. — Joaquim acrescentou, erguendo o garfo antes de levar um pedaço de carne à boca. — Temperou tudo no ponto certo.

Eu concordei com um leve aceno, aproveitando a oportunidade para encher o prato novamente. A comida de Clarisse sempre era motivo para esquecer qualquer problema, mas, claro, Jeovanna tinha que abrir a boca.

— Tá muito carregado no tempero. — Ela disse, torcendo o nariz enquanto empurrava o arroz no prato. — É bom, mas parece comida de festa de peão.

O comentário fez o sorriso de Roberto sumir. Olhei rapidamente para o canto da sala, onde Clarisse estava de pé, observando como sempre fazia. Vi o desconforto no rosto dela antes que ela se virasse rapidamente e desaparecesse pela porta de volta para a cozinha.

— Clarisse é uma cozinheira excelente. — Joaquim comentou, a voz baixa, mas firme. — Se alguém tem algo contra a comida, talvez devesse cozinhar o próprio jantar.

O clima ficou pesado, mas Roberto tentou mudar o foco.

— Bom, vamos falar de coisas boas.

Eu soube no instante em que ele abriu a boca que "coisa boa" não tinha o mesmo significado para mim.

— Gabriel, estava pensando na festa de noivado. Acho que seria bom irmos a Goiânia semana que vem para você escolher o anel. Algo bonito, digno da nossa família.

Jeovanna sorriu, colocando a mão no peito como se já estivesse imaginando o anel em seu dedo.

— Ah, eu sempre quis um anel com diamantes pequenos, nada exagerado, mas refinado. E a aliança de casamento também precisa combinar, sabe? Algo que mostre o nosso compromisso com Deus.

Minha paciência começou a se esvair. Eles falavam como se eu não estivesse ali, como se eu fosse um mero acessório no meio daquela decisão toda.

— Que tal uma aliança com um versículo? — Jeovanna sugeriu, a voz animada. — Algo que lembre o nosso propósito de vida juntos.

— Chega! — Minha voz soou mais alta do que eu esperava, e todos pararam de falar para me encarar.

Roberto franziu o cenho, e Jeovanna arregalou os olhos, surpresa com minha explosão.

— Eu não quero me casar com você, Jeovanna! — As palavras saíram antes que eu pudesse pensar em como dizer de forma mais controlada. — Eu não te suporto!

— Gabriel! — Roberto levantou a voz, mas eu não parei.

— Você é chata, controladora e maldosa. — Continuei, encarando Jeovanna diretamente. — Reclamar da comida da Clarisse? Isso foi desnecessário e mal-educado. E eu não sinto nada por você, mal nos conhecemos!

Jeovanna começou a chorar, cobrindo o rosto com as mãos enquanto saía da sala correndo. O barulho de seus passos ecoava pela casa, mas Roberto logo virou toda sua raiva contra mim.

— Gabriel, isso foi inaceitável! — Ele se levantou da cadeira, a voz firme e alta. — Você não tem ideia do que está falando.

— Inaceitável é você achar que pode decidir minha vida! — Retruquei, me levantando também. — Eu não sou sua marionete, pai!

A briga aumentou. Os dois gritando um com o outro, as vozes ecoando pela sala, até que senti o impacto do tapa de Roberto no meu rosto. A sala ficou em silêncio.

— Não tinha direito de fazer isso. — Joaquim disse, se levantando calmamente. Ele se posicionou entre nós dois, mas sem agressividade. — Seu Roberto, com todo respeito, isso não vai resolver nada.

Roberto parecia arrependido, esfregando a própria testa. Quando falou novamente, sua voz estava mais baixa.

— Eu só... queria o melhor pra ele. Eu não vou viver pra sempre!

Joaquim o olhou com calma, o tom humilde.

— Às vezes, o melhor é deixar os filhos voarem sozinhos.

Sem dizer mais nada, Joaquim saiu da sala, me seguindo.

Eu corri para fora, o rosto ainda quente da vergonha e da raiva. Não sabia para onde ir, mas acabei no pé de manga atrás do casarão. Me sentei no chão, cercado pelos filhotinhos que, como sempre, pareciam entender meu humor melhor do que qualquer pessoa.

Não demorou para Joaquim me encontrar ali. Ele se abaixou, sentando-se ao meu lado em silêncio por um momento antes de falar.

— Você tá bem?

— Não. — Respondi, sincero, a voz embargada.

Ele não disse mais nada, apenas estendeu a mão para acariciar um dos filhotes, que se aconchegou em seu colo. De repente, o mundo parecia menos pesado com ele ali.

Joaquim ficou ali, ao meu lado, em silêncio. O som dos filhotes brincando ao nosso redor preenchia o vazio que as palavras não conseguiam. Finalmente, ele falou, a voz baixa e tranquila.

— É muita pressão pra você, né?

Eu assenti, sem olhar para ele.

— Não é só a pressão. É a sensação de que minha vida inteira tá sendo decidida por todo mundo, menos por mim.

Ele ficou pensativo, os dedos ainda acariciando o filhote em seu colo.

— E você já pensou no que quer fazer? O que realmente quer?

Olhei para ele, os olhos cansados.

— Não quero me casar com Jeovanna, isso é certeza. Quero... — Hesitei, mas as palavras saíram antes que eu pudesse contê-las. — Quero algo que me faça sentir vivo, sabe? Algo que faça sentido.

Ele me olhou, e por um instante parecia estar escolhendo as palavras certas.

— Às vezes, a gente precisa fazer o que sente aqui. — Ele tocou levemente o peito, sobre o coração.

Eu me virei mais para ele, percebendo como seus olhos castanhos brilhavam à luz da lua que começava a surgir no horizonte.

— E você? O que sente aqui?

Houve um silêncio tenso, mas não desconfortável. Ele segurou meu olhar por alguns segundos antes de suspirar e desviar, como se estivesse tentando se proteger de algo.

— Acho que já deixei isso bem claro da última vez.

Foi o empurrão que eu precisava. Antes que pudesse pensar no que fazia, me inclinei e pressionei meus lábios nos dele. Não houve hesitação da parte dele; Joaquim respondeu ao beijo com a mesma intensidade, como se estivesse guardando aquele desejo há muito tempo. Sua mão segurou minha nuca, puxando-me para mais perto, enquanto a outra apoiava-se no chão.

Eu me senti como se o tempo tivesse parado, tudo girando em torno daquele momento. Nossas línguas se tocaram, lentas e exploratórias, e um arrepio percorreu meu corpo inteiro. Seu gosto era misturado ao cheiro da terra úmida e da noite, uma combinação que me deixou tonto.

Mas, antes que o beijo pudesse se aprofundar mais, ele afastou o rosto, respirando com dificuldade. Olhou ao redor, como se temesse que alguém pudesse estar nos observando.

— A gente não pode... aqui.

— Não tem ninguém. — Argumentei, mas ele balançou a cabeça, um sorriso quase tímido surgindo em seus lábios.

— Não agora. — Ele hesitou, mas havia algo em seu tom que me fez sentir esperança. — Quer... passar a noite lá em casa de novo?

Seu convite parecia carregado de algo mais, algo que ele não queria ou não sabia dizer em voz alta. O coração bateu mais forte no meu peito, e um calor subiu pelo meu rosto. Eu sabia o que ele estava sugerindo, mesmo que não dissesse diretamente.

Assenti, tentando controlar minha respiração.

— Quero.

Ele se levantou, estendeu a mão para me ajudar, e juntos caminhamos para a casa dele. O trajeto foi silencioso, mas havia uma tensão no ar, uma mistura de nervosismo e expectativa. Eu sentia meu corpo reagir a cada passo, o nervosismo misturado à certeza de que aquilo era exatamente o que eu queria.

Quando chegamos à porta da casa pequena e acolhedora de Joaquim, ele olhou para mim, ainda com aquele ar calmo, mas havia um brilho diferente em seus olhos. Ele abriu a porta e me deixou entrar primeiro. O ar dentro da casa era quente e tranquilo, e eu soube que aquela noite mudaria tudo, quando ele novamente uniu nossos lábios.

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