⌯ ˓ 𝓢𝓱𝓼 ⨾ the tortured poets department.
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CHAPTER TWO. ✦
straight from the
tortured
poets department.
SEMPRE FUI CONSIDERADA como a filha rebelde, meus pais me veem como um problema que eles não sabem lidar, e desde que eu me entendo por gente foi assim. Talvez seja porque eu não sou sua primogênita e suas atenções estão mais voltadas para meu irmão mais velho, e já que toda responsabilidade e preocupação com um futuro grandioso é colocada nele, para mim apenas resta a escolha de obedecer qualquer ordem que meus adoráveis pais colocam sobre minha pessoa. Felizmente o sacrifício de Taeyong me deu mais liberdade, por mais mínima que ela seja.
Se eu tirasse notas boas na escola e não desse problema para eles, então eu poderia seguir a carreira que eu quisesse e fazer minha faculdade amada, é por isso que sempre procurei ter a maior nota na escola e não me colocar em problemas que atrapalhem meu futuro. Todos acham que uma vida de luxo é confortável, que o dinheiro é capaz de comprar qualquer coisa no mundo. Sim, é claro que muita gente procura pelo conforto de uma vida segura e um futuro reservado com as melhores opções possíveis. Mas uma vida segura comprada pelo dinheiro e um futuro reservado graças ao sobrenome de uma família não é o mesmo se não existir o mais necessário, amor.
Do que adianta ter milhões na conta se nunca soube o que é receber um eu te amo vindo dos meus pais? Eles acham que sapatos, bolsas e roupas luxuosas compram o que eles não foram capazes de me dar durante minha infância e adolescência, mas não compra. Eu sempre observei os pais com suas filhas e filhos e lá no fundo sentia inveja por eles serem tão amados, por receberem carinho e atenção. Minha vida foi rodeada de fartura, isso é bom, não nego. Mas eu sempre senti falta daquilo que eu nunca tive, e isso hoje me tornou a pessoa que eu sou.
—— Mais um minuto que você levasse para se aprontar seria mais um minuto de atraso adicionado no nosso relógio, e adivinhe só, não temos tempo para perder! —— A primeira coisa que eu ouvi quando terminei de descer as escadas foi a voz de meu irmão.
—— Sabia que esse seu jeito de ser pontual em tudo é extremamente irritante? —— Perguntei ironicamente arrumando a bolsa jogada sobre os ombros de forma desajeitada.
—— Você é extremamente irritante, mas nem por isso eu reclamo.
Pode parecer que a gente se odeia, mas não é isso. Qualquer relação entre irmãos é parecida com a nossa, tudo bem, talvez sem os xingamentos, puxões de cabelos e insultos, mas pelo menos eu acho que é uma coisa que todos irmãos fazem. Taeyong sempre foi mais presente em minha vida do que nossos pais, enquanto eles estavam ocupado demais com viagens a negócios ou confraternizações entre amigos importantes da classe alta, era meu irmão quem cuidava de mim.
Isso até a minha fase adolescente começar e ele ir para a faculdade. Nossa relação esfriou de certo modo depois disso, talvez seja porque eu não sou mais aquela garotinha que vivia nas sombras de meu irmão. Eu cresci o suficiente para entender que estou sozinha nessa e que não posso mais me esconder de meus medos ou dos meus pais atrás de Taeyong.
—— Mãe, pai, a gente já tá indo!
Taeyong acabou me puxando até a entrada da sala de jantar, aonde nossos pais desfrutavam de um café da manhã extremamente farto. E após sua fala, não demorou muito para que os dois se levantassem da mesa e viessem até nós, ou até Taeyong. Se fosse eu no lugar do meu irmão eles apenas concordaria com a cabeça e voltariam a refeição, não é como se eles prestassem muita atenção em mim, por isso depois de tanto tempo recebendo seu tratamento de frieza, eu parei de me importar e nunca mais me despedi ou comuniquei que iria sair. A melhor coisa que podemos fazer quando somos tratados com ignorância é revidar na mesma moeda.
—— Mas já? —— Meu pai, Hyun-Woo, perguntou olhando para o relógio em seu pulso. —— Ainda é cedo para ir.
—— Tenho que passar pegar o Yuta no caminho e levar a Hyeri com o amigo dela pra escola que fica do lado oposto da faculdade, por isso preciso sair mais cedo.
Reparei bem a cara de desgosto que meu pai fez com a menção dos irmãos Nishimura, e pela expressão de Taeyong, ele também reparou. Tive que controlar minha língua dentro da boca para evitar dar uma resposta bem adequada para ele. Seu desgosto pelos amigos de Taeyong é completamente perceptível, principalmente Yuta e seu irmão mais novo. Se fosse qualquer um que tivesse um sobrenome da alta sociedade e vários zeros na conta, meus pais ao menos se importaria com quem estamos andando. Entretanto, como esse não é o caso, sua aprovação com nossas amizades não é de se chegar aos olhos. Taeyong mantém Yuta longe deles e eu mantenho Ni-ki. O veneno de cobra que sai de suas línguas peçonhentas não pode afetar aqueles que nos importamos.
—— Esses garotos não tem pais, não? Não é possível que eles não sejam capazes de levar seus próprios filhos pra escola.
—— Eles...
Taeyong me deu uma cutucada forte no quadril, isso foi o suficiente para que eu olhasse feio para ele e começasse a resmungar baixo.
—— Os pais deles saem cedo para trabalhar, pai. —— Eu admiro a paciência de meu irmão para lidar com esses dois. —— E eles podem ir de ônibus, mas, como eu já estou indo para a faculdade e tenho que levar a Hyeri pra escola, não vejo problema em oferecer uma carona para os dois.
—— Sua irmã tem o próprio carro e motorista para levá-la até a escola. Do que adianta mantê-lo no emprego se Hyeri vai sempre com você pra qualquer canto?
Revirei os olhos com a chegada da nossa matriarca, Lee Sun-mi. Não é nem preciso mencionar seu olhar analisador e cheio de repugnância para cima de mim, certo? Se meu pai ao menos me olha e fala comigo, minha mãe consegue ser pior, com seu olhar julgador que sempre parece estar procurando qualquer defeito em mim. Tudo o que eu faço nunca é bom o bastante para ela, eu sempre fui insuficiente, nunca a filha perfeita, sempre a rebelde que foi um erro em sua vida.
Não que seja a culpa de Taeyong, mas sempre senti uma pontada de ciúmes e inveja quando meus pais o tratavam com carinho e amor em minha frente. Meu irmão não teve culpa se nasceu primeiro. Aprendi que os pais nunca irão amar outro filho como amam o seu primogênito, por mais que tentem negar isso. E acredite em mim, meus pais ao menos escondem que sou a menos favorita.
—— Eu não pedi para ter um motorista em primeiro lugar, vocês que decidiram por mim. Aliás, vocês sempre fizeram as decisões por mim.
—— Hye...
—— E qual é o problema de eu estar sempre com ele? Não é isso que os irmãos devem fazer?
—— Taeyong tem mais coisas com o que se preocupar.
Claro que tem, ser um fantoche para vocês.
—— Quando vai parar de pintar seu cabelo com essas cores horríveis? Você sabe que eu desaprovo completamente esse estilo horrível que você usa, Lee Hyeri. —— Ela segurou em uma mecha do meu cabelo por alguns segundos, franzindo o rosto com algo que se assemelhava a nojo. —— Você é uma garota da alta sociedade, deveria se portar e se vestir como tal. Não ser uma completa... selvagem, sem senso de moda.
—— E quando você vai parar de se intrometer na minha vida? Como eu me visto ou me porto somente interessa a mim, você não pode decidir até a cor do meu cabelo. —— Cruzei os braços, não deixaria que ela falasse mal de mim em minha frente novamente. —— Tínhamos um trato, não sei se você recorda, mamãe.
—— O trato era você pintar o cabelo, mas com cores de uma moça da sua idade. Não como se fosse uma...
—— Uma o quê?
—— Uma daquelas garotas de programa que você encontra nas boates da cidade.
—— Mãe!
—— Querida!
É impressão minha ou minha mãe acabou de me comparar com uma prostituta?
—— Belo jeito de dizer que sua filha se parece com uma prostituta, belo jeito. —— É claro que eu tinha que tirar sarro da situação.
—— Sua mãe não quis dizer isso, Hyeri. Seu estilo é um pouco... —— Ele olhou pra mim de cima para baixo e logo franziu o cenho. —— Diferente e exagerado demais, mas isso é uma característica única sua.
Uau, um elogio seguido de várias palavras em apenas uma frase, acho que essa foi a primeira vez que meu pai falou verdadeiramente comigo, foi mais do que um simples “se comporte.” Que milagre, as coisas realmente mudam.
—— Podemos ir agora? —— Taeyong me perguntou de lado, apenas acenei. —— Nós vamos indo nessa, não queremos nos atrasar. Tchau, mãe, pai.
—— Tchau, querido. —— Fiz uma careta de desgosto quando ela beijou sua testa. —— Você comeu?
—— Sim, estava delicioso.
—— Tudo bem, tenha boas aulas. —— Analisou sua bochecha carinhosamente e se afastou, por último, ela se virou para mim. —— Faça como sempre, Hyeri.
—— Não se preocupe, eu não causei problemas até agora, não será no meu último ano que irei estragar a imagem dessa família perfeita. —— Comentei revirando os olhos de forma sutil, é notório que a última parte foi completamente debochada, mas eles não perceberam isso. Apenas Taeyong.
—— Eu acho bom. E por favor, passe no salão e pinte esse cabelo, irei deixar agendado para depois da escola. —— Minha mãe deu as costas. —— Com uma cor aceitável dessa vez de preferência.
—— Claro, mãe.
Vou pintar nada, o cabelo é meu, não tem porque ela dar palpite em algo que nem está no corpo dela. Decidi concordar porque não quero ficar o dia todo aqui batendo boca com ela, e se dependesse de nós duas seria isso que aconteceria, meu pai tentaria acalmá-la e Taeyong a mim, não que funcionasse, já que no final nós duas parávamos as brigas depois de algumas horas e íamos cada um para um canto. Tentamos fazer terapia de mãe e filha a um ano atrás, o que foi orientado pelo meu pai, mas claramente não deu certo, por parte dela, é claro.
Dei o meu melhor e tentei me esforçar para tornar nossa convivência dentro da casa em algo melhor, mas ela não cooperou e continuou do mesmo jeito. No final do diagnóstico que a terapeuta nos deu, ela falou que a pessoa que é o problema nessa relação é minha mãe, não eu, seus problemas do passado interferem na nossa relação e enquanto ela não se resolver consigo mesma não será capaz de lidar comigo, que é uma cópia exata dela. É difícil conviver com uma mãe narcisista e controladora, mas o que posso fazer? Ela é minha mãe no final das contas.
—— Filha. —— Parei de andar assim que o ouvi me chamando, olhei por cima do ombro e meu pai ainda continuava de pé, mas minha mãe havia voltado a se sentar e ao menos fazia questão de se despedir. —— Você comeu?
—— Não.
—— Deveria comer, não queremos que você passe mal na escola por falta de alimento.
—— Deixe ela, assim quem sabe ela consegue emagrecer mais. Quando eu estava na sua idade fazia dietas para ficar no peso adequado, Hyeri deveria seguir o meu exemplo e parar de comer como um moleque.
—— É bom que ela não siga seu exemplo, não quero que minha filha viva no hospital por causa de problemas com o corpo causados pelas suas dietas rigorosas.
Minha mãe não lhe respondeu, apenas o enviou um olhar cortante que dizia tudo: vamos conversar sobre isso mais tarde. Bem, pelo menos eles não discutiam na minha frente. Não quando era sobre mim, e acredite, é sempre sobre mim.
—— Eu como na escola de qualquer forma e já estou atrasada. —— Me aproximei da mesa e juntei algumas iguarias para levar pra comer no carro. —— Vou comer no carro.
—— Hyeri...
—— Tchau! —— Gritei já saindo correndo segurando as comidas nas duas mãos.
—— Tenha uma boa aula, filha.
Nem preciso dizer que essa despedida foi vinda de meu pai, pelo menos ele me tratava como filha quando lhe dava na telha, por mais que a maioria do tempo fosse rigoroso e frio demais. Escutei Taeyong se despedindo do nosso pai e não fiz questão de esperar por ele, apenas corri porta afora onde o carro de meu irmão estava estacionado. Ainda bem que ele já tirou da garagem, eu odeio entrar naquele lugar e ver o tanto de carro que tínhamos para usar enquanto outros ao menos tem meios para transporte além de um ônibus super apertado e cheio de gente. Já andei várias vezes junto com Ni-ki para poder ir até sua casa, e não foi nem um pouco prazerosa essa experiência.
Fiquei esperando Taeyong impaciente do lado de fora, meus pés batiam no chão enquanto eu olhava para o céu, tentando manter a paciência que não tenho. Minha atenção se voltou para o carro dele, era um cinza, estilo esportivo, diferente dos outros que estavam na nossa garagem. Eu e Taeyong não somos alguém que gosta de esbanjar luxo, e eu agradeço ao meu irmão por ter escolhido esse carro ao invés de um conversível como nossos pais queriam lhe dar de presente. Confesso que o motivo de não aceitar o motorista que meu pai contratou para mim me leve pra escola, é porque não quero chamar a atenção.
Prefiro passar imperceptível por todas aquelas pessoas, e certamente ter um carro de marca luxuosa e com um motorista abrindo e fechando a porta para mim, não seria nada imperceptível e chamaria atenção que eu não quero. Passar como se fosse invisível pelos corredores daquela escola é o meu objetivo, não tem nada que eu mais odeie do que pessoas me olhando, cochichando sobre mim, o que eu nunca sei se é bom ou mau. E também não suporto pessoas tentando fazer amizade por interesse. Por isso sou a invisível da escola.
—— Pensei que ia viver lá dentro. —— Ironizei.
—— Não via a hora de sair daquela casa e você nem pra me ajudar, que boa irmã você é.
Taeyong abriu a porta do lado do motorista para mim, esperando que eu fosse primeiro, e eu logo entrei enquanto ele fechava a porta logo em seguida, a primeira coisa que fiz foi jogar a mochila para o banco de trás e começar a comer o pão e as frutas que peguei. Meu irmão deu a volta do carro para ir para seu lugar e eu coloquei o cinto com dificuldade, sabendo que se ele entrasse e não me visse com ele, surtaria. Um defeito de Taeyong é ser comportado demais, ele segue as regras como se fosse um livro sagrado onde qualquer desobediência vindo da sua parte faria ele sofrer grandes consequências.
Ele segue cada regra de trânsito, respeita cada faixa de pedestre, cada placa de pare e até mesmo os semáforos. Andar com Taeyong é uma chatice porque ele é certinho demais e sempre tá usando a velocidade que a lei permite, por isso temos que sair antes, para não nos atrasarmos. Assim que ele entrou no carro, colocou o cinto e virou a chave para dar partida, liguei o rádio do carro e conectei no Bluetooth do meu celular, acessando minha playlist e dando play. Sorri assim que o instrumental de Fearless começou a tocar. É uma das minhas músicas favoritas da Taylor, a nostalgia que me bate quando escuto as músicas dos álbuns antigos não pode ser descrito.
—— Ah, não. Não, não e não! —— Taeyong reclamou do meu lado. —— Taylor Swift de novo não.
—— Taylor Swift de novo sim!
—— Não no meu carro. —— Os cantos de meus lábios se contraíram assim que ele tirou minha música.
—— Ei! Você não pode fazer isso.
—— Meu carro, meu rádio, minha playlist. —— Eu bufei assim que ele disse isso e Taeyong sorriu vencedor. —— Enquanto eu estiver dirigindo esse carro, eu quem controla o som.
O platinado tirou o carro do estacionamento em frente a nossa casa, o som de sua música irritante fritando minha cabeça, eu queria destruir o rádio quando ouvi o primeiro verso. Ele chama isso de música? Cruzei os braços rente ao peito e me encostei ainda mais no banco, olhando para o lado com um bico enorme nos lábios. Meu irmão cantarolava as letras da música do meu lado, batucando os dedos no volante e parecendo animado demais pro meu gosto. Para tentar me animar, ele abriu a janela do carro e eu me mantive ocupada olhando para a paisagem.
Queria xingar meu irmão por tirar minha música sagrada, essa que eu sempre gostei de escutar no caminho até a escola, e também tive que me conter para não bater sua cabeça no volante com força quando ele aumentou o volume. E evitando me estressar ainda mais com o ser humano sentado do meu lado, comecei a pensar na fanfic que li ontem a noite. Era uma de Chanbaek, muito boa, recomendo muito para quem quer chorar e sofrer que nem uma condenada. Foi o caminho todo assim, eu não aguentava mais a felicidade de Taeyong ao escutar sua música esquisita e principalmente ouvi-lo cantando. Por isso, assim que chegamos na frente da casa dos Nishimura eu nem perdi tempo antes de tirar o cinto, abrir a porta e saltar do carro.
—— Hye!
Escutei um grito me chamando por meu apelido, e só tinha uma pessoa no mundo que me chamava assim fora Taeyong. Olhei para frente e vi Ni-ki saindo de dentro de sua casa correndo, quase tropeçando em seus próprios pés, e assim que meu melhor amigo entrou no meu campo de visão eu abri um grande sorriso enquanto meus olhos brilhavam.
—— Ni-ki! —— Gritei de volta e sai correndo em disparada em sua direção.
Foi como uma típica cena de filme, o mundo parou ao nosso redor e foi como se estivéssemos correndo em câmera lenta até um ao outro. Até diria que parecemos um casal de romance, se Ni-ki não fosse somente meu melhor amigo e como um irmão mais novo pra mim, e claro, se ele não fosse gay e me visse apenas como sua melhor amiga e irmã mais velha. Mas pensar no garoto como um par romântico é de embrulhar o estômago, por isso logo fiz questão de tirar esse pensamento tosco e sem sentido da minha cabeça.
Quando estávamos próximos o suficiente, ele abriu os braços e eu fiz o mesmo, me jogando em cima dele e cruzando minhas pernas ao redor da sua cintura, enquanto Ni-ki me rodava no ar. Entrelacei meus braços ao redor do seu pescoço para me manter firme e soltei uma risada junto com ele, quem nos olhasse até pensaria que não nos víamos a meses e esse era nosso reencontro. O que não é verdade. Contudo, nossa amizade sempre foi muito forte, assim como a nossa ligação. Eu podia sentir falta do meu irmãozinho.
—— Eu senti tanta a sua falta! —— Falei.
Ni-ki parou de me girar e com muito cuidado me tirou de cima dele, assim que meus pés pisaram no chão novamente, encarei ele ainda com um sorriso gigantesco. Tive que olhar para cima para poder encará-lo, já que o garoto é mais alto que eu, apesar de ser mais novo. O Nishimura e eu estudamos na mesma escola, apenas em classes diferentes, não que nossa diferença de idade fosse muita, ele é só um ano mais novo que eu, por mais que pareça mais velho para quem olhar de longe.
Ni-ki é um adolescente gigante, se eu com minha altura fico como uma anã perto dele, imagine as pessoas que são mais baixas. Quando as pessoas nos veem juntos pensam que somos como unha e carne, sapato e cadarço, cachorro e carrapato. E de fato nós somos muito próximos, isso é por causa de nossos anos de amizade. Eu não o conheci na escola, definitivamente seria impossível para que eu e ele ao menos conversamos, sempre fui bastante reservada e isolada, se converso por lá é apenas porque não tenho outra opção. Por isso que nem tenho amigos, tá, eu tenho dois, mas mesmo assim é uma quantia bem pequena para alguém da minha idade.
Adolescentes sempre são rodeados de pessoas e amigos, e uma prova disso é meu irmão Taeyong. Seu grupo de amigos e gigante e quando eles vão para casa e fazem sua reunião cotidiana, me pergunto como alguém pode ter tantos amigos e se dar bem com todos. Acho que é um dom, um dom que eu obviamente não tive a sorte de ter. Meu irmão e eu sempre fomos muito diferentes um do outro, isso é um fato. Mas eu tenho que agradecer a ele por ter tantos amigo, foi graças a ele e sua amizade com Yuta que eu conheci Ni-ki. E isso certamente sempre será um dos maiores motivos por eu ser grata pelo meu irmão.
—— Eu também senti a sua falta, Hye! —— Ele bagunçou os fios de meu cabelo ainda platinado. —— Mas a gente não se viu praticamente ontem?
—— Como se mudasse alguma coisa. —— Revirei os olhos, Ni-ki apenas riu e passou os braços pelos meus ombros enquanto andávamos em direção aonde Taeyong e Yuta estavam. —— E aí, Yuta-chan.
—— Quando vai parar de me chamar assim? —— O mais velho me perguntou com a sobrancelha arqueada.
—— Deixe-me ver... —— Coloquei a mão sob o queixo de forma pensativa. —— Nunca!
—— Quando você não andava com meu irmão você era mais legal, Hyeri. Vejo que a má influência te levou a agir como ele.
—— Ei!
—— O que posso fazer? Seu irmão é descolado. —— Yuta bufou, mas eu vi um sorriso contido.
—— Então, vamos indo? —— Taeyong perguntou. —— Temos vinte minutos pra chegar na escola antes que o sinal toque.
—— Se depender da sua habilidade no volante, vamos demorar uma eternidade. —— Puxei Ni-ki para irmos para nossos lugares no banco de trás, o que renderia o caminho todo de fofoca e risadas. Levantei minha mão e girei a chave entre meus dedos. —— É por isso que você não vai dirigindo, irmão. Fica esperto, Yuta-chan!
Com uma delicadeza nem um pouco sutil, joguei a chave para o irmão de meu melhor amigo que o pegou no ar com facilidade. Isso devia ser graças ao seu tempo jogando beisebol com meu irmão, no final das contas ele realmente conseguiu aprender algo. Já eu... bem, pelo menos eu sei fazer um bom arremesso, isso foi a única coisa que consegui aprender das aulas que meu irmão nos deu a um tempo atrás.
—— Ei, o que você pensa que está fazendo?
—— Passando as chaves para alguém que realmente sabe dirigir. —— Cantarolei, mas antes de entrar no carro olhei para o japonês de cabelo vermelho. —— Não se preocupe com as multas, muito menos com as regras de semáforo, e eu nem preciso dizer sobre a habilitação, certo? Apenas foque em nos levar o mais rápido para escola, o resto o Taeyong vai cuidar.
Meu irmão iria reclamar, sim, ele iria. Mas não iria ficar aqui e ouvi-lo, apenas lhe enviei um sorriso debochado seguido de uma piscadela em direção à Yuta, o japonês riu e contornou o carro para entrar no banco do motorista com os gritos excessivos de Taeyong em nossos ouvidos. Ni-ki e eu começamos a rir descontroladamente com a discussão entre nossos irmãos, e quando Taeyong se deu por vencido, indo do lado do motorista. Abri a porta de trás e entrei primeiro, Ni-ki me seguindo e fechando a porta. Optei por ficar na janela de novo e o japonês foi no meio, nos dois afivelamos o cinto com a ordem de Taeyong, ele estava rabugento na frente enquanto me encarava pelo retrovisor com ódio.
—— Yuta-chan. —— Chamei por ele quando deu a partida. —— Posso conectar meu celular no Bluetooth, por favorzinho?
—— Não!
—— É claro que pode, Hyeri. —— O mesmo ligou o rádio do carro e eu soltei um gritinho feliz enquanto ligava meu celular para por minha playlist.
—— Ei, o carro é meu. Você não vai colocar suas músicas horríveis! —— Revirei os olhos com a exclamação de meu irmão.
—— Taeyong, querido... —— Arrastei minha voz para ela ficar melosa. —— Você mesmo disse que enquanto você estiver no volante eu não posso colocar as músicas, mas agora Yuta-chan quem está no volante, não você.
—— Ah, sua...
—— Sem brigas! —— O Nishimura pediu dando uma cotovelada em Taeyong e piscando para mim. —— Deixe ela colocar a música, parece um idiota implicando com sua irmã assim.
—— É porque você não ouviu as músicas que ela põe ainda.
Yuta não deu bola para ele, bufando baixinho, mas não pediu para que eu não colocasse minha música e isso foi o suficiente para que eu conectasse no Bluetooth de uma vez. Entrei no aplicativo de música cantarolando feliz e já fui logo colocando minha playlist, é claro que no primeiro segundo de música meu irmão gemeu descontente e começou a reclamar em um tom muito alto pra minha infelicidade. Mas nada que eu não pudesse impedir, pedi para que Yuta aumentasse o volume e assim ele fez, deixando Taeyong mais irritado do que antes.
O japonês ria com a cara que seu melhor amigo fazia, pelo menos ele não é insuportável como meu irmão e deixa que a gente aproveite nossas músicas sem implicância. Felizes, eu e Ni-ki embarcamos em começar uma cantarolia seguindo a letra da música, uma coisa boa entre nossa amizade é que temos gostos muito parecidos, principalmente para música, e isso rende momentos como esse entre a gente. Segundos depois Yuta também começou a cantar conosco, e continuamos assim durante todo o trajeto até a escola. É claro, Taeyong permaneceu carrancudo o caminho todo.
Não podia acreditar que meus amigos poderiam ser tão traidores, a forma que eles agiram pelas minhas costas dizia tudo que eu precisava saber sobre esses dois. Que eles são detestáveis, e que eu deveria cortar meus laços de amizades. É repugnante que eles tenham feito algo assim comigo, logo eu que sempre lhes ajudei em tudo que precisaram. Agora estou sendo apunhalada pelas costas? É inacreditável que algo assim veio a ocorrer, eu certamente não poderia perdoá-los por tamanha traição.
—— Como vocês poderam fazer isso comigo? —— Perguntei alterada enquanto os dois mantinham a cabeça baixa. —— É a maior traição que poderiam ter feito!
—— Me desculpe... —— Jungwon pediu. —— Mas foi necessário! Você não iria concordar com isso se a gente pedisse.
—— E então os dois bonitos resolveram colocar meu nome em uma audição de banda sem ao menos me consultar?
—— Sim. —— Como se fossem dois prisioneiros culpados pelo seus crimes, Jungwon e Ni-ki mantinham a cabeça baixa e as mãos juntas enquanto me dirigiam a palavra.
—— Eu não sei o que eu faço, sinceramente. Estou pensando em dar na cara dos dois ou chutar suas canelas.
—— Sentimos muito. —— Cerrei os olhos quando Ni-ki se desculpou em japonês, ele normalmente faz isso quando está tenso. —— Mas você vai na audição, certo?
—— É claro que não, eu não mandei vocês colocarem meu nome lá.
Jungwon e Ni-ki se entreolharam por alguns segundos, acenando com a cabeça em um movimento muito suspeito, depois viraram para mim novamente e tive que xingá-los na minha mente por estarem me olhando com o famoso olhinhos de gato de botas. Minha vontade agora é de socar a cara para que parem, quem sabe assim eu não seja convencida a fazer algo que não quero. Esses dois sabem que não sou capaz de resistir a essa maneira fofa, ainda mais Jungwon com o jeito de gato laranja dele.
—— Por favor, você não pode fazer isso. É uma ótima oportunidade!
—— É só um festival, Ni-ki. Vai ser como qualquer outro.
—— Não é qualquer festival, Hye! É o último festival da escola que você vai poder participar, desde que entramos no primeiro ano você nunca aceitou participar quando pedimos, agora você está no último ano e é a melhor oportunidade pra conseguir o que você quer. Essa é a última chance de tocar e ganhar, qual é, vai me dizer que nunca quis?
—— Essa não é a questão aqui, Ni-ki. Vocês sabem muito bem porque não posso fazer isso, se meus pais descobrirem, eles acabam com a minha vida.
Esse é o acordo, não participar de nada que envolva microfone, dança e palco até terminar a escola. É estupido que eles tenham feito isso, afinal, o que tem eu cantar? Que mal irá causar neles? Apesar de saber que não foi inicialmente uma ideia vinda de meu pai e sim de minha mãe, mas ao invés dele discordar de sua ideia maluca de privar sua filha de seu sonho, ele apenas concordou, não há nada que minha mãe faça que meu pai não aprove, é por isso que eles estão juntos.
E o medo da minha mãe de perder sua prodígio é gigante, ela quer que eu continue seu sonho, quer que eu me transforme em uma modelo e tenha a passarela como meu único caminho. É claro que não quero isso, mas minha mãe não lida muito bem com um não sendo falado na sua cara. Mães narcisistas e suas incansáveis tentativas de transformar seus filhos no que elas falharam em ser um dia.
—— Dane-se os seus pais. —— Ergui uma sobrancelha com o seu linguajar impróprio. Jungwon está com uma boca muito suja ultimamente. —— Até quando vai se proibir de fazer as coisas por causa deles? Você não é uma marionete, Hyeri. Eles não podem controlar sua vida como se fossem deles, são seus pais, não seus donos. Não precisa dizer a eles que vai participar, pode manter em segredo, fazer escondido.
—— Eu tô com ele nessa. —— É claro que vai estar. —— Afinal de contas se você contasse eu tenho a certeza de que eles apoiariam, o festival é importante pra escola, é hora dos alunos mostrarem seus talentos pros olheiros de fora. Os boatos é que irá ter um produtor no júri, ele está procurando por novos talentos para uma empresa e essa é a oportunidade perfeita para conseguir se tornar uma idol, Hye. Você sempre quis ir atrás de seus sonhos sem depender de seus pais, se não participar, vai perder a única chance.
—— Eu não sei... —— Murmurei olhando para baixo. —— Não quero ter que enfurecer minha mãe e acabar com meu futuro longe de suas garras.
—— Isso não vai acontecer, eu prometo. —— Ni-ki segurava em minha mão com carinho, ele é o único que sabe me acalmar em momentos assim. —— Além disso vai valer pontos pra quem se escrever e quem vencer vai ganhar um prêmio. É uma viagem com tudo pago! É a chance de você fugir daquela casa por alguns dias.
—— Você sabe que eu não preciso dessas notas e que posso pagar essa viagem pra todos nós somente com minha mesada, certo?
—— Largue mão de ser metida! —— Ele me deu um empurrão e eu acabei rindo. —— Mas e aí, vai topar?
—— Vocês não me deram muita escolha. —— Levantei os ombros em rendição. —— Então sim, eu topo essa ideia maluca.
—— Isso!
Os dois comemoraram com um high-five, sorrindo aproveitando sua vitória. Eu revirei os olhos e cruzei os braços, não que eu pudesse fazer muita coisa, no final eu sabia que acabaria sendo convencida pelos dois de qualquer maneira. Depois de uns segundos de comemoração, Ni-ki se virou para mim com um sorriso gigantesco que quase era do tamanho do seu rosto.
—— Agora vamos, está quase na hora da sua vez!
—— Espera, a audição é hoje? —— Perguntei nervosa. —— Vocês não me disseram isso!
—— Pois é né, meros detalhes. —— Ele coçou sua cabeça. —— Não podemos perder mais tempo, então...
Sua mão agarrou a minha antes que eu pudesse ir contra alguma coisa e ele começou a me puxar a uma direção desconhecida por mim, eu gritava enquanto pedia para me soltar, mas Ni-ki parecia não me ouvir, ou somente estava me ignorando mesmo. É nesses momentos que quero poder ter força o suficiente para me livrar de seu aperto e correr pro mais longe possível, só que apesar de não parecer, o japonês tem uma força imaginável e eu não conseguia fazer nada contra isso enquanto ele apenas me conduzia pelos corredores. Jungwon que estava do nosso lado, mantinha a mão na boca enquanto tentava falhamente conter uma risada. Segundos depois eu desisti, me dando por vencida e apenas deixando ser levada.
Um longo caminho depois, parecemos finalmente chegar no nosso destino. Ni-ki com uma mão livre empurrou a porta na nossa frente, dando espaço para que a gente entrasse dentro no lugar que eu reconheci como o ginásio da escola. Mas era uma das entradas que levavam para a parte do lado, onde normalmente acontecia os bastidores. Havia apenas uma garota ali, esperando pela sua vez. E como eu sabia disso? Deve ser pelo fato do som dos acordes desafinados e de uma voz totalmente horrível soando por todo local, estava quase tampando meus ouvidos quando a música parou e o garoto surgiu logo depois xingando e insultando seja lá quem. Ni-ki finalmente me soltou e eu comecei a massagear meu pulso quase que imediatamente, não demorou muito para a garota ser chamada e sair da nossa frente.
—— Eu aposto dez wones que ela vai ser péssima.
—— Eu aposto quinze.
Me via incrédula pela aposta sem fundamento dos meus dois amigos, eles não podem estar falando sério. Estão realmente se beneficiando através das custas da desgraça dos outros? Acho que nem preciso de respostas para isso, conhecendo esses dois como a palma da minha mão, sei que seriam capazes de fazer algo ainda pior. Ni-ki e Jungwon juntaram as mãos, dando início a sua aposta. Mas se ela seria péssima ou não, a gente não saberia, pois a garota surgiu um minuto depois sem ao menos cantar ou tocar. Fiquei surpresa ao vê-la parada na minha frente, seu estado era deplorável. Haviam lágrimas contidas nos cantos de seus olhos e seu rosto estava vermelho, pensei que era queria espaço para passar e estava quase indo para o lado, mas ela veio até mim e ficou muito perto pro meu gosto.
—— Você é Lee Hyeri? —— Concordei e isso fez com que ela tirasse o baixo e jogasse em mim, arregalei os olhos. —— O idiota mesquinho está te chamando, boa sorte.
E ela saiu em disparada para fora, seu ombro batendo em mim com força, mas não me virei para insulta-la por isso, pelos seus soluços isso era o que ela menos estava precisando no momento. Fiquei parada em choque por alguns segundos, piscando repetidamente para ver se entendia alguma coisa do que havia acabado de acontecer. Sem demorar muito eu arrumei o baixo, respirando fundo duas vezes. Não queria ter que sair daqui que nem a garota de agora, por isso estava pensando seriamente em fugir. O arrependimento já me batia como avalanche, nem sei o que eu estou fazendo aqui.
—— Eu acho que não deveria fazer isso! —— Me virei para meus amigos um pouco apreensiva. —— Ainda tem tempo pra desistir, certo?
—— Não, você não tem.
E antes que eu pudesse de fato sair correndo dali, os dois me empurraram com tudo para o palco e eu tive que juntar toda a estabilidade que eu ao menos tenho para conseguir me manter de pé. Lancei alguns xingamentos para os dois assim que me recuperei da minha quase queda, e se eu tivesse caído na frente dos outros eu juro que mais tarde faria eles se arrependerem. Sentindo os olhares nem um pouco imperceptíveis queimando minhas costas, me virei com tudo na direção deles e me sentia envergonhado por ter quatro caras me olhando como se eu fosse um bicho de três cabeças. Não tive tempo para poder reparar neles, apenas vi de longe que se tratavam de quatro garotos, três deles com cabelos pretos, cada corte sendo único e apenas um com o cabelo vermelho escuro.
—— Vai ficar aí parada? —— Escutei uma voz familiar e quando reparei de quem se tratava, arregalei os olhos. —— O que foi? Sei que sou bonito.
—— Não achei nada demais. Você é apenas mais um garoto comum como qualquer outro.
Devem estar se perguntando porque lhe respondi com tanta aspereza, talvez seja porque a pessoa que está na minha frente nesse exato momento seja ninguém mais ninguém menos do que Park Jong-Seong, ou como ele prefere ser chamado, Jay Park. E como eu o conheço? Bem, talvez seja porque ele é meu vizinho desde que me entendo por gente. Meus pais e seus pais são muito próximos, não sei quem é o mais pior, se são seus pais ou os meus. Nós dois não temos uma boa experiência com família, para Jay pode ser ainda pior porque ele é filho único e tudo é colocado sobre suas costas. Mas apesar de sermos vizinhos e praticamente termos crescido juntos, não somos bem amigos, nossa relação é um pouco complicada para falar a verdade.
—— Vai cantar ou vai continuar com esse deboche?
—— A segunda opção... —— Não terminei antes que ele me interrompesse.
—— Vai logo, garota. Ninguém aqui é desocupado, temos mais coisas pra fazer. E se você errar uma vez sequer ou desafinar, está fora.
—— Babaca irritante. —— Murmurei em um tom baixo, certificando de que ninguém escutaria.
Sem outra escolha, me aproximei em passos cautelosos do microfone, minhas mãos ajustando o suporte porque o tamanho era pequeno demais para minha altura. Em um ataque de nervosismo eu mordi meus lábios com força extrema, segurando os lados do baixo com força desnecessária, se tivesse um arranhão depois eu provavelmente surtaria. É totalmente perceptível o quão nervosa estou, isso devido ao fato de fazer tantos anos que não toco ou canto para uma plateia, apesar de ser um pequeno grupo de quatro garotos. Os únicos que já tiveram a chance de me ouvir fazer isso são Jungwon, Ni-ki e também... Jay. O último era o mesmo que me encarava com seus olhos que não transmitiam nada e me deixava ainda mais nervosa.
—— Que música você vai cantar? —— Sua voz me tirou do transe.
—— Eleanor Rigby dos Beatles.
—— Não. —— Franzi a testa, ele amava essa música quando eu tocava. —— Cante outra.
—— Smells Like Teen Spirit, então.
—— Não tem outra coisa melhor, não? —— Minha vontade é de voar na sua cara agora. —— Tente Back In Black do AC/DC.
—— Eu não...
—— Ótimo, está decidido então, pode começar.
—— É você quem escolhe as músicas ou sou eu? Deveria ter colocado isso no cartaz também. —— Falei com minha voz mais aspera, fechando a cara.
—— Se não quiser é só sair fora.
—— Idiota. —— Não me controlei quando xinguei, só me esqueci de um problema. Que eu falei no microfone e que todos haviam escutado. —— Foi sem querer.
—— Cante, Lee Hyeri.
Seu tom deixava claro que ele queria acabar com isso logo, sua paciência deve ter acabado. Acabei suspirando enquanto dava uma última olhada em Jay antes de me aproximar mais do microfone, esperei até que estivesse pronta para começar e com os canto dos olhos, observei Ni-ki e Jungwon torcerem por mim escondidos. Isso me fez começar. Os primeiros acordes no baixo soou, parecia estranho para mim tocar depois de tanto tempo, mas mesmo assim percebi que não havia perdido a manha. Engoli em seco enquanto meus dedos trabalhavam nos acordes de maneira profissional, e quando a introdução da música começou, meus lábios se aproximaram do microfone e comecei a cantar com o coração batendo a mil.
Nunca achei que minhas voz poderia ser a melhor do mundo, mas eu sabia que ela era boa o suficiente para conseguir seguir com uma carreira de cantora futuramente. E devido à expressão dos garotos a minha frente, provavelmente estava sendo boa o bastante para conseguir deixá-los impressionados. Um dos garotos tirou algo do ouvido, o que parecia ser um tampão e Jay estava entretido na apresentação, sorrindo de lado. Devo confessar que isso é surpreendente, vê-lo sorrindo assim. Mas assim como Jay, os outros também pareciam sentir o mesmo efeito. É ótimo ver que minha música é capaz de deixar as pessoas assim, isso só me motivou a continuar a cantar.
—— Caramba...
—— Uau!
—— É possível se apaixonar pela voz de alguém?
—— Calem a boca idiotas!
Meus lábios se moviam em sincronia com o ritmo do baixo, a música quase chegando ao fim. Eu focava em cantar sem errar uma letra, também sem errar as notas do baixo, não queria correr o risco de passar vergonha. Meus olhos até se fechavam às vezes, meu coração se enchendo de paz enquanto a sincronia da harmonia me guiava para um lugar distante. Sempre que eu tocava ou cantava parecia algo mágico, onde meus problemas sumiam, restando apenas eu, minha voz e o som dos instrumentos que toco. Finalizei a música com um ótimo toque de baixo, abrindo os olhos para poder analisar os garotos em minha frente. Estava com expectativa de que tinha me saído bem, e pela reação de cada um deles, achei que sim. Um dos garotos se levantou e bateu palmas, os outros dois estavam de boca aberta e olhos arregalados. E Jay permanecia do mesmo jeito, sem nenhuma expressão.
—— E aí? —— Perguntei com a respiração descompensada e o peito apertado. —— Fui da sua expectativa?
—— Você tá brincando, né? Você foi... —— O garoto começou a falar, seus olhos brilhando como o de um cachorrinho.
—— Poderia ter sido melhor. —— Apertei o baixo quando Jay falou. Sei que nos odiamos, mas não era preciso isso. —— Você pode ir agora, a saída é bem do outro lado pelo qual você entrou.
—— Jay, você não pode estar falando sério! —— Ouvi o sussurro do de cabelos vermelhos.
—— Tá legal, obrigado por me escutarem.
Quis me dar um tapa quando minha voz soou mais baixa que o normal, me via presa em pensamentos nebulosos que continuava a me dizer que eu havia estragado tudo. Engoli a seco o gosto ruim que subiu pela minha garganta e não querendo ficar mais nenhum segundo em cima desse palco, sai apressadamente pro lado que o idiota do Jay me mandou. A primeira coisa que fiz foi deixar o baixo por ali mesmo, jogado em um canto qualquer. Então andei na direção de meus dois amigos, eles estavam com a boca entreaberta, por mais que suas reações me dissessem que estavam indignados com o que havia acabado de acontecer. Se deixasse eles até iriam tirar satisfação com Jay, por isso quis sair o mais rápido possível desse lugar.
—— Vamos embora.
Comecei a arrastar Ni-ki e Jungwon que ainda pareciam estarem petrificados, os dois pareciam chocados com o que havia acabado de acontecer e eu de certa forma também estava. Jay é definitivamente o maior babaca que já conheci nesse mundo, quando pensei que ele já havia alcançado o nível mais alto de babaquice, ele vai lá e se supera novamente, agindo como a pior pessoa. Se meus amigos pelo menos tivessem a decência de terem me avisado que a banda em questão se tratava da dele, eu nunca sequer teria cogitado colocar os meus pés nesse lugar. Mas como sempre, os mais novos conseguiram me colocar em mais uma emboscada que eu não saberia lidar. Lembro-me de Jay sempre me alertar sobre nunca ficar no seu caminho, olha agora eu fazendo o contrário. Tem duas opções do que ele pode fazer e as duas parecem ruins. Um: surtar. Dois: surtar ainda mais.
—— Aish, quem aquele idiota pensa que é? —— Jungwon empurrou a porta de saída enquanto reclamava, era engraçado vê-lo tão bravo assim. —— Você foi a melhor e mesmo assim ele te dispensou, não sei como me segurei para não sair de trás daquele palco e voar na cara dele, ai se eu pudesse voltar lá...
—— Relaxe, Jungwon. —— Pedi evitando uma risada. —— Sei que a vontade de todos é socar aquele idiota, mas até eu já sabia que no final não daria tão certo.
—— Bem, você ainda pode entrar no festival como solo e acabar com aquele idiota.
—— A ideia é bastante tentadora, mas eu passo. —— Os dois gemeram em descontentamento. —— A humilhação de hoje já apareceu demais para mim, eu nunca mais quero pisar em um palco.
—— Eles não sabem a joia rara que perderam. —— Ni-ki concordou com a cabeça com Jungwon. —— Acharam diamante onde era pra ter ouro e mesmo assim escolheram jogar fora.
—— Vamos esquecer isso, por favor. —— Pedi em um tom baixo. —— Não quero ter que me lembrar de nada que aconteceu hoje. Eu sabia que seria uma má ideia.
—— Não foi uma má ideia, aquele idiota que não soube aproveitar a chance que teve. —— Os resmungos de meu amigo continuaram e por conhecê-lo, sei que não pararia tão cedo. —— Espero também que não consigam achar nenhum vocalista, que seja atropelado por uma bicicleta, que a calça dele rasgue no meio da escola e passe vergonha, que seus filhos coloquem ele em um asilo no futuro.
—— Jungwon!
—— O que? Só estou desejando coisas boas!
—— Isso foi coisas boas? —— Ele concordou minimamente. —— Não quero nem saber o que são as coisas ruins então.
—— Engraçado que somente aquele nariz empinado metido a besta não gostou. A solução é fácil e prática, os outros dois poderiam apenas tirá-lo da banda aos ponta pés e substituir com você.
Os planos de Ni-ki as vezes me assusta, esse garoto escreve muita fanfic pro meu gosto.
—— Se eu encontrá-lo na escola vou colocar meu pé na frente para que caia no corredor e quebre um nariz, ou melhor, um dente!
—— É encantador como vocês me defendem, mas estou começando a temer um pouco pelo tanto que vocês estão desejando o mal.
—— Querida Hyeri. —— O castanho parou do meu lado, as duas mãos na cintura enquanto eu o encarava. —— Se isso é desejar o mal, você ficaria assustada com o quanto minha mente está xingando ele nesse momento.
Pobre Park Jong-Seong, sua orelha deve estar queimando neste momento por ter Yang Jungwon amaldiçoando até mesmo seus ancestrais agora. Se eu fosse ele, iria atrás da igreja mais perto e pediria para um padre jogar água benta, quem sabe isso repelhe as maldições que está sendo jogada contra ele. E falando no diabo, meu celular tocou em um aviso que havia chegado mensagens e eu desbloqueei a tela para ver quem era. Uma era da minha mãe, não era nada importante, apenas uma lembrança de que havia marcado o meu cabeleireiro e o que o motorista iria me esperar na frente da escola para poder me levar até la. Queria negar e dizer que não iria fazer isso, mas eu sei bem as consequências que teria depois e por isso apenas enviei um ok como resposta. A segunda mensagem se tratava de Jay, e depois do ocorrido de hoje, estou pensando seriamente em adicionar mais um xingamento para seu nome de contato.
jay babaca supremacy park:
Esteja amanhã no antigo teatro
da escola pra gente resolver as
questões do festival. Você tá
na banda agora.
eu:
Vai se fuder, Jay Park!
Para que serviu tudo
aquilo, afinal?
—— Quem é? —— Tomei um susto quando Ni-ki tentou espiar por cima dos meus ombros. Imediatamente desliguei a tela. —— Ei!
—— Não coloque o nariz onde não lhe convém, Nishimura.
—— Você é insuportável.
—— E você consegue ser pior. —— Mostrei a língua pra ele, alcançando o Yang e conectando nossos braços um no outro. —— Pelo menos o Jungwon não me trata mal.
—— Pare de ser sonsa, Hye. —— Ni-ki conectou seus braços nos meus também e começamos a andar pela escola em direção a saída. —— Você me trata ainda pior.
—— Tudo mentira, enganação. —— Nem precisei olhar para ele pra saber que seus olhos estavam se revirando. Decidi contar uma meia verdade para matar a curiosidade dele. —— Era minha mãe.
Se tem uma coisa que os dois concordam plenamente, é que minha mãe é uma bruxa. Bem, eu também não poderia discordar, sei o quão ruim ela é e às vezes relacioná-la com as bruxas de terror não parece uma má ideia, afinal as duas são ruins. Por isso que meus amigos insistem em odiá-la, eu entendo, é claro que sim! Se as mães de meus amigos fossem insuportáveis como a minha, eu também odiaria elas, mas parece que entre nosso trio eu sou a única que tem uma mãe ruim e tenho que conviver com isso. Apesar de ela ser a pior pessoa do mundo pra mim, eu não a odeio. Só fico decepcionada por não receber aquilo que ela devia dar para mim, amor e carinho. Mas o que posso fazer se nem todas as mães amam as filhas que dão à luz?
—— E o que a bruxa do oeste quer agora? —— Tive que conter o riso com o apelido do Nishimura, os dois se soltaram e pararam em minha frente.
—— Ainda insistindo em transformar você na marionete dela?
—— Como se um dia ela fosse parar. —— Soltei um bufo cruzando os braços. —— Hoje foi o dia de implicar com o meu cabelo, então ela quer que eu pinte ele, só que dessa vez com uma cor “normal”. É claro que não vou obedecer as suas vontades.
—— Sua mãe não manda em você, sabe disso, não é?
—— É claro que sei, Jungwon. —— Enrolei meu cabelo nos meus dedos. —— Mas eu já estava pensando em pintar antes, então dá na mesma.
—— E qual cor você vai fazer agora? —— Ni-ki me perguntou animado parando em minha frente, Jungwon fez o mesmo. Ambos os dois garotos me olhavam com seus olhos de gato de botas com expectativa.
—— Eu não sei... —— Abaixei a cabeça por alguns instantes e pensei, até que a cor do laço de cabelo em meu pulso me chamou a atenção. —— Rosa, vou pintá-lo de rosa.
O capítulo de hoje foi meio longo gente, peço desculpas por isso, no próximo vai ser menos palavras.
Já aviso antecipadamente que amo o Ni-ki, o Jungwon e a Hyeri juntos. Votem e comentem e até mais, XOXO.
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