Jennie deveria nos encontrar no cinema. Ela tinha arrumado um emprego de meio período em uma lanchonete e iria pra casa primeiro, tomar banho. Rosé, Bohyun e eu compramos o ingresso dela antes que acabassem todos.

- Rosé, você tem certeza que seu encontro vai aparecer? - Bohyun ri.

- Ela vai estar aqui. - Rosé me olha incerta.

Na verdade eu não tenho nenhuma pista se ela está planejando aparecer e rezei para que ela não viesse. Quando Rosé mandou uma mensagem pra ela dizendo que nós iríamos entrar na sala para guardar os lugares, ela não respondeu.

Enquanto esperávamos na fila de entrada, Bohyun colocou o braço sobre os meus ombros, me fazendo endurecer. Isso foi um pouco avançado demais desde que nós estamos apenas nos conhecendo. Ele cheirava bem e estava muito bonito em jeans e camisa de botão preta. Seu curto cabelo castanho claro estava espetado com gel.

Eu me lembro que costumava achar Bohyun uma graça. Hoje em dia, todo cara parece sem graça se comparado a Jennie, em se tratando do quesito atracão. Eu queria esmagar esse quesito com uma marreta. Rosé estava sob estritas instruções de não dizer a Bohyun que Jennie era minha meia-irmã.

Como Jennie nunca falava comigo na escola, a maioria das pessoas não tinha ideia que nós vivíamos na mesma casa.

Eu preferia desse jeito.

Alívio me tomou quando a sala escureceu e os trailers começaram a passar. Eu coloquei meu telefone pra vibrar. Talvez ela não apareça no fim das contas.

Meu corpo começou a relaxar enquanto Rosé verificava seu telefone a cada dois segundos e procurava em volta por ela.

Os créditos de abertura começaram. Eu me afundei na minha cadeira e coloquei meus pés pra cima no assento vazio à minha frente. Bohyun me ofereceu um pouco da sua pipoca. Eu estava mastigando a pipoca por um tempo e na verdade estava gostando do filme até que quase engasguei com uma lufada de cigarro de cravo misturada com colônia.

Então lá estava ela.

Meus joelhos tremeram quando ela passou por mim na escuridão para o assento vago do outro, ao lado de Rosé. Eu queria estapear a cara de satisfação da minha amiga.

Quando Jennie se inclinou e beijou a bochecha dela, meu apetite pela pipoca se transformou em náusea. Eu entreguei o saco para Bohyun e fingi estar interessada no filme. Honestamente eu estava encarando a tela, mas era como se Drew Barrymore estivesse falando mandarim. Tudo que eu estava realmente fazendo era ruminar e respirar o cheiro de Jennie. A presença dela tinha me deixado mais irritada do que eu achei que ficaria.

Em certo ponto Bohyun pegou minha mão e eu congelei.

Rosé tinha tomado uma Coca Diet gigante antes da chegada de Jennie e cochichou no meu ouvido que iria ao banheiro. Meu coração começou a bater depressa assim que ela saiu porque não tinha mais nada bloqueando minha visão de Jennie, eu podia ver pelo canto do olho que ela estava olhando pra mim. Apesar dos risos das pessoas a minha volta, o peso do olhar dela parecia afogar tudo isso. Eu não olharia pra ela nem me mexeria.

Apenas continue a olhar pra tela, Jisoo.

Meu telefone vibrou na minha perna.

[Jennie] Você está praticando pra ser um manequim de loja?

Eu não podia responder o texto porque Bohyun iria ver. Entretanto eu olhei pra ela e me arrependi. Seu cabelo magnificamente Escuro, normalmente rebelde estava alinhado, ela estava mais bem arrumada do que o normal também, com jeans escuros, coturnos e jaqueta de couro.

Sua boca estava espalhada em um raro e genuíno sorriso que me fez sentir um aperto no coração. Então ela dá uma risadinha, me fazendo rir de mim mesma também.

Ela estava certa. Eu tinha estado sentanda lá dura como uma tábua. Eu estava sendo ridícula.

Rosé interrompeu meu momento com Jennie quando ela passou por mim para se sentar, outra vez obstruindo minha visão. Ela encostou-se em Jennie e essa foi minha deixa para voltar a olhar para a tela.

Eu queria ser quem está com ela. Isso não fazia sentido, mas eu era a prova de que desejo e lógica eram duas coisas separadas.

E se Rosé tentar beijar ela essa noite? E se ela responder?

Eu já não podia lidar com o ciúme e nada tinha acontecido ainda. As garotas que ela ficava da escola tinham se tornado algo que eu me forcei a aceitar. Quer dizer, ela é minha meia-irmã, supostamente não gosta de mim e voltaria para o Japão depois da formatura. A realidade era que nada nunca poderia acontecer entre nós. Apesar disso, ela ficar com minha melhor amiga não estava ok pra mim. Rosé vai me contar todos os detalhes e eu não vou me segurar.

Em algum momento no meio dos meus pensamentos o filme acabou. Drew Barrymore estava sorrindo, então eu acho que teve um final feliz.

A mão de Bohyun descansava na parte baixa das minhas costas enquanto nós saíamos da sala de cinema. Na brilhante luz florescente do abarrotado saguão, Jennie parecia ainda mais deslumbrante.

Rosé agarrou o braço dela possessivamente. Eu queria odiá-la por isso, mas ela não tinha ideia dos meus sentimentos por Jennie.

A situação estava me sobrecarregando, eu precisava ficar sozinha por alguns minutos.

- Pessoal, eu só vou me refrescar. Vocês deveriam decidir onde nós vamos comer. - Entrando na segurança do banheiro, eu exalo um profundo suspiro.

Depois de fazer xixi e lavar as mãos, eu estava relutante em voltar para fora, então eu fiquei e encarei meu reflexo no espelho. Quanto mais eu pensava nesse encontro furado mais a raiva e a frustração me enchiam.

Eu peguei meu telefone e mandei uma mensagem para Jennie.

[Você] Por que você está aqui na realidade? Você pelo menos gosta da Rosé?

Imediatamente me arrependo dessa ação impulsiva.

Meu telefone vibra.

[Jennie] E se eu gostar?

Eu gostaria de nunca ter dito nada, eu não tinha resposta e só continuei olhando para o telefone. Ela mandou outra mensagem.

[Jennie] Eu não gosto.

Eu não tinha percebido que estava segurando a respiração até que um grande suspiro de alívio escapou de mim.

[Você] Então por que você está aqui?

[Jennie] Pra te provocar.

[Você] Por quê?

[Jennie] Por que eu tenho prazer nisso.

[Você] Por quê?

[Jennie] Eu não posso responder a essa pergunta assim como você também não pode me dizer por que você me olha do jeito que olha mesmo quando eu te trato como merda.

Oh. Deus.

Até agora eu não tinha percebido como meus sentimentos eram óbvios, como eu devo ter parecido estúpida e desesperada por ela todo esse tempo.

[Jennie] Tenha algum respeito próprio.

Que. Porra. É. Essa.

Agora ela me irritou seriamente.

Nossa.

[Você] Não se preocupe. Eu não vou mais olhar pra você.

Eu simplesmente não podia acreditar que ela disse isso pra mim. Meus olhos começaram a marejar, mas eu estava determinada a não deixar que ela me visse chateada. Levou alguns minutos pra me recompor antes de voltar para o saguão. Tão difícil como era, eu me recusei a olhar pra ela.

- Por que você demorou tanto? - Bohyun perguntou.

- Eu tive um pequeno contratempo. Mas agora já passou.

Rosé colocou a mão no meu ombro.

- Está tudo bem?

- Está. Vamos lá.

Rosé e Jennie andaram a nossa frente. Minha amiga ainda estava pendurada no braço dela enquanto suas duas mãos estavam nos bolsos. Nós quatro nos esprememos no Prius de Bohyun e fomos para uma lanchonete 24 horas.

Evitar minha irmã de criação se tornou um grande desafio no pequeno espaço da cabine onde ela estava sentada bem na minha frente. Ainda assim eu mantive minha palavra. Eu me foquei nas tatuagens do seu braço ou no saleiro, mas nunca olhei pra cima.

Eu fingi aproveitar e estar imersa na conversa com Bohyun, que estava sentado à minha esquerda. Nós pedimos nossa comida e até então eu fui bem sucedida em não olhar para Jennie.

- Então Jisoo, vai ter uma festa na próxima sexta na casa de Choi Yeonjun. Eu quero que você vá comigo. - Bohyun disse.

- Claro. Parece divertido.

- Bom. - Ele se inclinou e beijou de leve meu rosto.

Jennie estava brincando distraidamente com alguns pacotes de açúcar. Se eu fosse Rosé, eu acharia peculiar que meu "par" não estivesse nem falando comigo.

Mas o que eu sei?

Ela tentou puxar papo.

- Jennie, quais são seus planos pra depois da formatura?

- Me mandar de Boston.

E isso foi tudo que ela conseguiu. Alguns minutos depois, Jennie parecia estar mandando mensagens por debaixo da mesa.

Então meu telefone vibrou.

[Jennie] Aposto que faço você olhar pra mim.

Eu ignorei e não respondi.

Alguns segundos depois nossa comida chegou e todos nos ocupamos. Eu estava bem feliz com minhas panquecas quando ouvi Jennie dizer pra Rosé: - Você tem um pouco de milk-shake bem ali.

- Onde?

- Aqui. - Ela disse antes de puxá-la pra si e dar um beijo de língua em Rosé, bem na minha frente.

Eu observei horrorizada enquanto ela fazia com a boca de Rosé a mesma coisa que ela fez com a minha, no café. Meu rosto queimava de raiva enquanto Jennie, lenta e sensualmente movia sua boca sobre a dela.

- Droga, vocês duas arrumem um quarto. - Bohyun disse.

Quando Jennie finalmente se afastou, Rosé cobriu a boca e disse: - Nossa... E eu aqui pensando que você não estava interessada. - Ela riu.

Meu olhar queimava no de Jennie e ela disse em silencio: - Eu disse.

- Com licença. - Eu disse pra Bohyun enquanto saía da cabine e prontamente perguntei pra garçonete onde poderia encontrar o banheiro. Antes que eu pudesse entrar, Rosé veio atrás de mim.

- O que foi aquilo? - Ela perguntou.

Eu me inclinei contra a pia.

- Aquilo o quê?

- Aquela coisa toda... Jennie me beija daquele jeito, então você sai correndo. Chateou você que ela me beijou?

Eu desviei a questão.

- Ela pode fazer o que ela quiser. É só que ela me enche.

- Você não respondeu minha pergunta.

Claro, porque eu simplesmente não admito que eu seja obcecada pela minha meia-irmã, tanto que me excitou um pouco olhar ela beijar você, porque tudo o que ela faz parece fazer meu corpo reagir.

- Você sabe que as coisas entre nós duas são meio turbulentas, Rosie. Eu também não quero ver você se machucar.

- Não se preocupe. Eu sou crescidinha. Eu só estou me divertindo um pouco. Eu sei que ela está indo embora.

Isso é exatamente o que eu temia.

- Não se importe comigo, ok? Jennie me dá nos nervos. Não é grande coisa. Eu só preciso de uma folga.

- Ok, se você está dizendo. - Ela cruzou os braços. - Você está se sentindo bem com relação à Bohyun apesar disso?

- Vamos ver. Ele é... Legal. Eu acho que vou dar uma chance pra ele.

- Bom.

Quando Rosé me abraçou eu pude sentir o cheiro de Jennie nela, isso me deixou louca. Foi a minha reação àquela lufada de almíscar de fumaça que me lembrou de que ela estava me levando à insanidade e isso precisava terminar.

Eu jurei naquele momento fazer o que quer que fosse pra me livrar dessa coisa que eu tinha por ela.

- Você está pronta pra voltar lá pra fora? - Ela pergunta.

- Estou. - Eu assenti e tomei um fôlego. - É, eu estou pronta.

Os eventos que ocorreram depois parecem ter passado em rápida sucessão. Enquanto nós caminhávamos de volta pra cabine, eu escutei talheres voando e depois um alto som de impacto. Um amontoado de pessoas se assustou antes que eu visse Bohyun no chão e Jennie chutando ele sem parar. O rosto de Bohyun estava todo ensanguentado e a boca de Jennie também estava sangrando.

- Jennie, o que você está fazendo?! - Eu gritei.

Ela continuou chutando Bohyun com toda sua vontade. O gerente do restaurante correu até nós junto com um garçom que o ajudou a puxar Jennie de Bohyun que estava tombado no chão pela dor.

Eu me abaixei.

- Bohyun, o que aconteceu?

- Aquela lunática me bateu sem razão nenhuma, então eu bati de volta. Daí ela simplesmente começou a me dar uma surra. Eu tropecei e ela começou a me chutar enquanto eu estava caído.

- Você está bem?

- Eu vou ficar ótimo.

- Você não parece ótimo.

Eu o ajudei a se levantar, e ele se apoiou em mim. Os dois homens ainda estavam segurando Jennie no chão enquanto a sirene da polícia se ouvia à distância.

O que estava acontecendo?

Rosé foi até Jennie.

- O que diabos está acontecendo? - Ela cuspiu sangue no chão.

- Não a deixe sair com ele.

Eu olhei pra Bohyun.

- O que começou isso? Eu não entendo.

- Nada. Aquela doida simplesmente me atacou.

- Mentiroso do caralho! - Jennie cuspiu se atirando pra frente pra chegar a Bohyun de novo, mas os homens a seguraram.

Dois policiais entraram e começaram a questionar cada um dos envolvidos em cantos diferentes. Rosé e eu apenas ficamos de lado, atordoadas e confusas com relação ao que poderia ter acontecido no pequeno período em que estávamos no banheiro pra causar isso. Eu queria ter podido escutar o que eles estavam dizendo para os policiais, mas eles estavam muito distantes. Depois que eles foram liberados, Jennie passou direto por Rosé e veio até a mim.

- Vamos. Você não vai entrar no carro dele.

- Quem você pensa que é tentando levar meu encontro pra casa? - Bohyun atirou.

- Eu estou na casa dela, idiota.