☪ . ☆ FIFTY ☆ . ☪
Minha cabeça estava doendo como o inferno. A primeira coisa que fiz, antes mesmo de abrir os olhos, foi soltar um gemido de dor. O que tinha acontecido? Eu não me lembrava exatamente, mas tudo estava girando e girando e eu sentia vontade de vomitar. E estava frio; frio para caralho, um frio de me fazer tremer ao ponto de bater os dentes. Foi difícil abrir os olhos, ainda mais difícil me situar do que estava acontecendo.
Ah, sim. Ah, sim, eu tinha sido sequestrada pela desgraçada da Shiori. Depois dela ameaçar matar minha mãe e minha filha. Porra. Porra do caralho, ela ia me matar, eu tinha bastante certeza disso, e quando meus olhos percorreram o lugar onde eu estava, tive ainda mais certeza que eu provavelmente não ia conseguir escapar com vida desse inferno.
Estava mais para um cela do que para um quarto. Era uma sala vazia, com uma porta que levava para um banheiro, ou pelo menos algo parecido com a porra de um banheiro, e dois colchões no chão, tão finos que eles e nada daria no mesmo. E tinha apenas uma saída, fechada com uma grade de ferro, assim como a única janela daquela sala.
-Então, você acordou.- uma voz atrás de mim quase me fez dar um grito, mas eu não tinha forças nem para isso. Meu coração foi parar na garganta e, lentamente, eu me virei. Apenas para encarar os olhos azuis de Kazume. Ele estava literalmente acabado; o cabelo loiro estava completamente bagunçado e embaixo de seus olhos tinham marcas roxas que entregavam o quão mal ele estava dormindo.
-Que lugar é esse?- eu disse observando as paredes cinzas ao nosso redor. Kazume deu risada, uma risada que entregava o quão na merda nós estávamos agora.
-Se eu ao menos soubesse.- ele suspirou, enfiando as mãos nos cabelos e os bagunçando ainda mais. Por um tempo, fiquei quieta.
-Porque você tá aqui se você é casado com ela?- eu disse num sussurro. Kazume me olhou por um tempo, e dava para ver as lágrimas nos olhos dele.
-Porque ela me odeia, porra.- ele disse. Eu arqueei uma sobrancelha.
-Bem, é isso que você ganha batendo nela, né.- Kazume me olhou com tanta indignação que me fez piscar os olhos.
-Bater nela? O caralho, Asuka! Eu amava ela, caramba. Mesmo quando ela ficou completamente maluca e obcecada por você, continuei amando ela mais do que amava a mim mesmo, então não pode dizer isso. - ele disse baixinho, olhando para baixo. Eu apenas suspirei.
-Não vai conseguir fazer com que eu me sinta mal por você, você tentou me atropelar.- eu resmunguei e Kazume riu, sem nenhum humor.
-Achei que se Shiori achasse que eu ainda te odiava, ia perceber que eu não tava nem aí pra você. Mas pelo jeito a porra da inveja que ela sente de você foi maior que o amor que ela sentia pela nossa família. Legal pra caralho, né?- ele disse me encarando. Caralho, não é possivel que agora estou sentindo pena de Kazume, porra! Mas tinha tanta mágoa e sinceridade em suas palavras que era difícil de não acreditar nele. E, bem... Ele estava aqui também, não é?
-Vocês tem um filho. O que ela fez com ele?- eu perguntei, mesmo sabendo que era a pergunta errada. Bem errada mesmo, porque isso só fez Kazume ficar ainda mais nervoso.
-Não sei.- ele disse bagunçando de novo o cabelo e o puxando com força. -Só me resta acreditar que ela não seria capaz de machucar ele. Mas Shiori ficou louca pra porra.
-Eu não entendo.- eu resmunguei. -Eu não fiz nada pra ela, cacete!
-Caralho, Asuka. Você nunca entendeu, não é? Você sempre teve tudo o que ela queria e não tinha. Como coragem de enfrentar seus pais ou até mesmo pessoas que dariam a vida por você. Ela nunca teve nada disso. E você viveu a vida que sempre quis, não aquela que te mandaram. É por isso que ela te odeia tanto, porque ela tem inveja de você. Você quer um desenho pra entender, caralho?
-Vai se foder.- eu disse num sussurro.
Sentia como se tivessem dado um soco no meu estômago, e estava tudo revirando dentro de mim. Eu queria vomitar; queria desaparecer. Porra, é sério que ela vai me manter presa porque eu tive coragem e ela escolheu viver como uma puta de uma covarde do caralho?
-E eu tô aqui porque ela acha que eu ainda gosto de você, quando eu apenas não sinto nada pela sua pessoa. Nem ódio, nem raiva, só... Porra, eu só queria viver minha vida. - Kazume disse, parecendo bem perto de surtar para um caralho. -Ela me prendeu aqui quando eu descobri que foi ela que tentou te matar. Quando eu disse que ia contar para a porra da polícia.
Caralho, caralho.
O que Shiori tinha se tornado, porra? E a troco do que? Porque me matar não ia fazer ela se sentir melhor consigo mesma! Caralho, ela precisava, urgentemente, de um terapeuta!
-Seu irmão ajudou ela, sabia disso?- Kazume disse e eu o encarei. Ele deu uma risada sem nenhum humor. -Ele não ajudou ela na hora, mas foi ele que ensinou Shiori o que ela tinha que fazer pra te matar. Seu irmão te quer morta, mas ele quer que os outros façam o trabalho dele pra ele. Não ficaria nada surpreso se Shiori ter ficado maluca pra porra for culpa do arrombado do seu irmão do caralho.
A cada palavra que saía da boca de Kazume eu sentia mais e mais vontade de vomitar. Não, essa porra não pode tá acontecendo comigo. Logo agora, logo agora que tudo tinha parecido magicamente se acertar nessa vida de merda que eu tenho. Agora... O que aconteceria comigo, afinal?
-Você é tão fofoqueiro, Kazume.- a voz de Shiori soou, fria e cruel. Nós dois nos viramos para olhar a mulher que estava abrindo a cela, a arma nas mãos. Ela olhou para mim e deu um sorriso maldoso. -Vamos, Asuka. Vou te mostrar o como é uma merda ter alguém te machucando e você não poder fazer nada para impedir. Como seus amiguinhos fizeram comigo uma vez.
E eu sabia que o que viria a seguir ia quebrar algo dentro de mim que muito provavelmente eu jamais fosse conseguir colocar de volta no lugar.
Não sabia quanto tempo tinha se passado. Dias? Semanas? E isso importava, afinal? Claro que não; porque eu ia morrer ali, era apenas uma questão de tempo. Quantos dias mais levariam até que Shiori cansasse de brincar comigo, de me machucar?
Ela não me queria morta ainda, apenas queria que eu desejasse morrer, e eu certamente já estava desejando isso, porque a dor... Ah, sim, a dor era algo que eu não sabia ao certo se conseguiria aguentar por muito mais tempo.
Se você gritar, vai ser pior;
Se falar, eu corto sua língua;
Se tentar algo, morre;
Não tinha como escapar desse inferno.
Senti meus olhos queimarem com as lágrimas de dor enquanto Kazume amarrava com força um pano na minha coxa, tentando parar o sangramento. Nem importava, sinceramente, se eu sangrasse até morrer; não conseguia nem me mover mais, que parte do meu corpo não tinha sido perfurada com a faca de Shiori, afinal?
A primeira coisa que ela fez foi marcar meu rosto, um corte na minha bochecha esquerda, uma marca que jamais sairia, mas de que importância isso tinha se eu ia morrer ali?
Depois, ela quebrou minha perna com um martelo. Segundo ela, assim eu jamais poderia fugir. No fim das contas, ela estava certa, afinal. Eu sequer conseguia me mexer.
E depois, ela fez cortes pelo meu corpo, apenas para me escutar gritar e implorar. O que eu fiz, porque eu não tinha forças para lutar contra isso. E estava bem perto de implorar para morrer.
O que ela queria, me machucar ou acabar com meu psicológico? Porque ela tinha conseguido ambos, aliás. Eu nem conseguia mais falar; e eu apenas não fiquei completamente louca por causa de Kazume. De Kazume!
-A gente precisa dar um jeito de sair daqui.- ele murmurou. Eu apenas o encarei; na verdade, essa era a única coisa que eu fazia, já que nem sabia mais o que era falar, porque eu não conseguia mais falar nada.
Shiori esteve certa, no final. Ela realmente conseguiu acabar comigo ao ponto que a única coisa que eu conseguia pensar era apenas em morrer logo. Não tinha como sair daqui, ninguém jamais me acharia.
Só conseguia pensar nisso; morrer, morrer, morrer.
-Conheço esse olhar, Asuka.- Kazume disse me encarando. -Você tem uma filha, cacete.
Como se eu não soubesse disso. Como se eu não rezasse todos os dias para que Violeta estivesse bem, para que ficasse bem. Como se eu não sofresse todos os malditos dias pensando nela, caralho.
Olhei para a aliança na minha mão e respirei fundo, fechando os olhos por um instante.
Não importa se eu vou viver ou morrer. Eu apenas espero que minha família esteja bem. Sei que vai ser uma merda, mas também sei que uma hora eles vão acabar superando isso. Violeta vai me esquecer com o tempo, e, tudo bem. Vai ficar tudo bem, porque ela tem Rindou, e tem Aya, e tem Ran, e tem Koji. Então, tá tudo bem se eu só... Fechar os olhos por um instante e não os abrir mais, certo?
Deus, como eu queria não abrir mais os olhos.
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