Chapter 1 - May, 1th
Apertei minhas mãos dentro do bolso do meu sobretudo, incomodada pelo frio intenso que atingia aquela área do Japão. Meus dedos estavam congelando apesar de estarem envoltos em uma luva quentinha de veludo.
Por que diabos o dia tinha que começar tão frio? E por que diabos eu estava na rua, para início de conversa?
Suspirei sozinha e continuei caminhando pela calçada, calmamente, em uma tentativa de me esquecer um pouco dos dias passados e relaxar um pouco a minha alma.
Eu estava me sentindo tão sobrecarregada.
Havia passado o dia anterior em casa, trancada e chorando — provavelmente deveria ter feito o mesmo hoje, entretanto eu precisava cumprir com minha agenda e se ficasse em casa, certamente não o faria —, sendo corroída pela saudade e pela culpa, juntamente com o medo pelo que eu estava prestes a fazer.
Quão ruim eu me sentia para acreditar que minha solução era única e somente a morte? A que ponto eu estava perdida?
Entretida em meus questionamentos, não percebi que eu havia parado na frente de uma confeitaria. Quando despertei, meus olhos pousaram sobre um bolo de chocolate e um manju tradicional que estavam expostos na vitrine. No mesmo instante eu percebi que olhar aquilo não me dava um pingo de fome, mesmo que eu não comesse há quase dois dias.
Outro suspiro escapou por meus lábios, mais parecendo um grunhido insatisfeito. Elevei meu olhar até dentro do estabelecimento, observando as diversas pessoas que se encontravam ali dentro. Crianças, advogados, empresários, estudantes, mães e pais. Alguns sorridentes, outros sérios e parecendo preocupados com o horário. Tão entretidos em seu próprio mundo que me fascinou a ideia de que eles pudessem notar o quanto eu estava mal. Será que eles poderiam perceber isso?
É claro que não. Eu ri com esse pensamento e em seguida me virei ao escutar meu nome ser chamado. Demorei algum milésimo de segundo para reconhecer a figura ao meu lado, que sorria complacente em minha direção.
— Jungkook-san! — Eu o cumprimentei, curvando suavemente o corpo em sua direção.
Apesar de Jungkook ser apenas alguns meses mais velho que eu, o honorífico “san” era utilizado por mim pelo fato dele ser uns centímetros mais alto e parecer bem mais maduro que a sua idade tão jovem. E também porque eu gostava de usar esse honorífico com ele. Nos primeiros meses que eu o chamei assim, ele pareceu claramente incomodado, mas com o tempo aceitou ele como um “apelido carinhoso”.
— Ayumi-chan. — Ele retribuiu, fazendo um careta. — Está muito frio, você devia estar em casa. — O mais velho avisou.
— Ah, eu precisava relaxar um pouco. — Forcei meu melhor sorriso a ele e encolhi os ombros.
Jungkook ficou calado, com seu olhar queimando sobre mim por algum tempo, e eu desviei o olhar para a vitrine, incomodada. Após, ele também olhou para as sobremesas a nossa frente, quieto, quando alguém saiu de dentro da confeitaria e se aproximou dele, trazendo dois sacos de papel marrom nas mãos, estendendo em sua direção um deles.
— Jungkook, eu trouxe manju¹ e shukurimu² pra você, ande logo, nós estamos atrasados pro colégio. — O garoto olhou em minha direção assim que notou a minha presença, parecendo um pouco surpreso antes de sorrir. — Olá, Ayumi-chan.
— Olá, Jimin-san. — Eu o cumprimentei, e seu sorriso era tão maravilhosamente cativante que foi impossível eu não retribuí-lo.
— Toma. — Jimin entregou o saco para Jungkook e se despediu de mim com um aceno antes de se dirigir ao SUV preto estacionado próximo ao local, alertando mais uma vez a ele que estavam atrasados.
Tirei as minhas mãos do bolso do meu sobretudo e levei-as aos meus lábios, soprando-as em uma tentativa de amenizar o frio avassalador que eu estava sentindo. Acho que eu estava com febre.
Jungkook então pareceu despertar e hesitou antes de dar um passo e estender o saco marrom na minha direção. Eu franzi as sobrancelhas com o seu ato, balançando levemente a cabeça para negar quando percebi o que ele estava fazendo.
— Por favor, Ayumi. — E antes que eu respondesse negativamente mais uma vez, ele pegou meu pulso e me fez segurar o saquinho. — Eu sei que você gosta de shukurimu, pode ficar, eu não estou com fome. — Então ele sorriu de canto e se inclinou brevemente, despedindo-se e seguindo até o carro que Jimin havia entrado. No entanto, antes de entrar no veículo, ele se dirigiu novamente a mim, com o pequeno sorriso ainda presente em seus lábios: — E quando chegar em sua casa, se aqueça bem. Nessa época do ano é fácil ficar doente, então, por favor, se cuide.
O máximo que consegui fazer em resposta foi balançar a cabeça devagar em afirmação. O carro foi embora segundos depois e foi somente aí que eu olhei para o saco em minhas mãos, deixando uma careta tomar meu rosto ao lembrar a mim mesma que eu não estava com fome e que Jungkook tinha ficado sem café da manhã à toa. Droga.
Soltei uma lufada de ar e movi meus calcanhares de volta para casa, segurando o saco com uma das mãos. E foi então que eu percebi que não tinha dito a Jungkook que não iria para o colégio hoje. “Você devia estar em casa”. Ah, Jungkook, sempre tão esperto e bom em ler as pessoas. Tirei meu telefone do bolso e parei de caminhar para digitar uma mensagem a ele, agradecendo pela comida e dizendo que sim, eu ficaria bem, retomando meu caminho logo depois.
Quando finalmente pude ver minha casa, me surpreendi ao encontrar minha tia na porta, apertando a campainha de maneira insistente e irritada.
— Mas que droga, será que ela está dormindo? — Ouvi seu murmúrio antes que finalmente me notasse, sorrindo aliviada logo depois. — Ayumi! Onde você estava? Eu estou tocando essa campainha há séculos, vamos, abra logo essa porta, eu estou congelando.
Ri com a maneira desesperada que ela me empurrou em direção à porta, puxando o saco de papel das minhas mãos e quase me jogando para dentro de casa quando finalmente destranquei o objeto de madeira.
— Argh, o que está acontecendo com essas estações do ano? Eu não lembro de ter ficado tão frio assim no inverno passado. Graças aos céus a primavera está bem pertinho. — Minha tia tagarelou, tirando seus sapatos e correndo para ligar o aquecedor mais próximo dela.
— O que a senhora está fazendo aqui? — Perguntei, colocando minhas luvas na mesa da cozinha e soltando um gemido satisfeito quando um ar quentinho do aquecedor bateu contra meu rosto.
— Obrigada pela parte que me toca, querida sobrinha. — Minha tia dramatizou, me fazendo rir baixo. — Eu vim conversar com você, Ayu-chan. Nós precisamos decidir algumas coisas agora que sua mãe se foi. — Ela caminhou até a cozinha e soltou um suspiro pesado enquanto olhava para o chão, pensativa. Permaneceu calada por uns segundos, antes de finalmente murmurar: — É tão estranho fazer isso, sabe? Vir aqui conversar com você porque minha irmã morreu.
Então ela tossiu, tentando disfarçar a garganta embargada e sorriu, pegando o saco de papel para ver o que tinha dentro.
— Você comprou isso aqui? — Ela perguntou enquanto pegava um doce e enfiava na boca sem ao menos pedir permissão.
— Não, um amigo me deu. — Respondi, dando de ombros e tirando meu sobretudo.
— Um amigo? — Questionou, confusa. — Hum, ele deve ser muito legal. — Ela fez uma pequena careta sarcástica na minha direção antes de terminar o seu manju.
Revirei os olhos com sua ação e fui até a sala, pendurando meu sobretudo no cabideiro ao lado da porta. Era cômico como minha família sempre disfarçava a dor interior na frente dos outros, como há pouco foi percebido em minha tia. Era óbvio que ela estava tão triste quanto eu, mas se abrir comigo seria uma das últimas coisas que ela faria, acredito. Um cômico trágico demais, na verdade, porque esse tipo de coisa machuca e faz mal, não? “A necessidade do ser humano de se comunicar com os outros quando se sente para baixo não é uma fraqueza, como muitos pensam, é uma válvula de escape que pode salvar sua vida”. É, segundo o livro de auto ajuda que eu comprei, aquele tipo de comportamento não era apropriado para alguém. Mas quem liga, huh?
— Ayu-chan, você vai comer esse shukurimu aqui? — Minha tia perguntou da cozinha, balançando o doce na frente do rosto.
— Não, pode comer. — Fiz uma pequena careta. Ela pareceu perceber minha atitude estranha, porque veio até mim segundos depois.
— Ayu, quando foi a última vez que você comeu?
Mordi os lábios, relutando em contar a verdade.
— Eu comi alguns desses doces enquanto voltava pra casa, tia.
— Ayumi… — Minha resposta não soou tão convincente quanto eu imaginava, e bufei por não saber mentir bem.
— Tá, faz um tempinho.
— Quanto tempo?
— Tia, por fa…
— Quanto tempo, Ayumi?
— Dois dias! — Respondi, irritada por sua intromissão, ignorando o seu rosto espantado e retornando à cozinha para beber água. — Mas eu estou bem, garanto. — A tranquilizei, mais calma, antes de tomar um gole de água. — Então, nós vamos conversar sobre o que exatamente? — Busquei mudar de assunto e sorri pequeno na direção dela, me sentando na mesa da cozinha.
Em seguida, ela suspirou e também se sentou, começando a realmente conversar comigo. Perguntou como eu queria que as coisas fossem daqui para frente, se eu queria vender a casa e ir morar com ela, porque se não o fizesse, teria que arranjar um emprego por meio período, e é claro que eu escolhi continuar com a casa, visto que dali a uns dias eu não estaria mais lá dentro. As outras perguntas foram pequenas conversas de ajuda que não foram tão produtivas por eu me sentir estranha falando sobre isso com ela — assim como ela se sentiu comigo. Não que eu não gostasse dela, já que era a minha melhor tia de longe, mas compartilhar sentimentos tão profundos — e confusos — não me pareceu confortável ou correto.
Depois de terminarmos, ela me avisou que sempre iria me visitar, e também me perguntou se eu não queria passar algum tempo com ela, em seu apartamento. Eu neguei educadamente, agradecida por sua preocupação. Assim que ela foi embora, eu quase me arrependi de não ter aceitado a sua proposta quando cada canto daquele lugar me lembrou minha mãe e o quanto eu queria estar perto dela.
Paciência, eu precisava ser paciente.
Mesmo que eu não admitisse a mim mesma, eu acreditava que alguém ou alguma coisa me salvaria. Aliás, por que eu daria um prazo a mim mesma a respeito da morte se eu poderia simplesmente ter me matado, rápido e silenciosamente?
Eu acreditava que poderia mudar o rumo das coisas dentro de mim. Mesmo que tudo estivesse uma completa bagunça, eu tinha esperanças que tudo mudasse. Todo mundo que se suicida deve pensar assim, não é mesmo? Que alguém vai finalmente perceber o quanto ela está acabada e procurar ajudá-la, porque sozinha ela não consegue seguir adiante. Que alguém vai finalmente ajudar ela a vencer a luta contra si própria, e que a dor que ela sente não precisará ser anestesiada com a morte. Eu não sei se todas as pessoas suicidas têm esperança, mas eu, mesmo inconscientemente, possuía alguma faísca dentro de mim. Entretanto, não admitiria, porque não acreditava ser digna de ajuda.
Eu não era digna de ajuda, por ser a responsável dos meus próprios problemas. E era tão patética ao ponto de nem ter coragem de me matar na primeira oportunidade.
Meu telefone tocou no bolso do meu sobretudo, anunciando a chegada de uma nova mensagem e eu o peguei, curiosa, lendo o nome do remetente.
Jungkook-san:
Não foi nada, Ayumi, se cuide. Qualquer coisa que precisar eu estou aqui, de verdade.
Me:
Tudo bem, obrigada.
Passei a língua pelos lábios e joguei meu telefone no sofá, me preparando para subir as escadas quando percebi o saco marrom em cima da mesa, parecendo possuir ainda alguma coisa dentro de si. Relutei um pouco antes de ir até ele e pegá-lo, para somente então subir as escadas até o meu quarto e ir tomar um banho enquanto saboreava alguns daqueles doces.
-•-
¹ doce tradicional japonês feito de mochi (arroz glutinoso cozido no vapor) e recheado com anko (pasta doce de azuki, um tipo de feijão).
² doce feito com uma massa açucarada recheada com creme ou chocolate.
Aí, se vocês tão acostumadas com um Jungkook sério e quieto, aqui vocês vão encontrar uma tentativa de apresentar o Jungkook em sua versão real (preocupado com os outros, carinhoso e amoroso). Se não gostarem, sinto muito, mas Jeon Jungkook merece ser enaltecido com a preocupação fofa que ele tem com as suas Armys e seus hyungs, obrigada de nada <3
Ps: Eu sabia que tinha esquecido de avisar uma coisa nas notas, então vou avisar aqui, né: Essa fanfic não terá NENHUMA interação homossexual, entre membros do BTS ou qualquer outro personagem da história. A história é focada na luta interna da Ayumi, e todos os membros aparecerão (como o Jimin, nesse primeiro capítulo), no entanto, não terá nenhum shipp entre os meninos, apenas interações. Se você não gosta de fanfic hétero (totalmente hétero), eu peço que não leia e se ler, por favor, não comente coisas relacionadas aos shipps, porque já foi avisado aqui que NÃO HAVERÁ QUALQUER tipo de relacionamento homossexual. E não, eu não sou homofóbica, só estou avisando pra depois não me perguntarem ou ficarem decepcionadas por não ter esse tipo de interação aqui. Obrigada, anjas <3
Ps2: Jungkook foi substituído por um robô, que tá ativo nas redes sociais no lugar dele. Eu estou muito bem alimentada esse mês de dezembro, confesso que adoro.
Ps3: As atualizações acontecerão duas vezes por mês (na segunda semana e na quarta semana).
Xoxo,
~Ally
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