Enfim, Mark
"Os animais são todos iguais, mas uns são mais que os outros"
George Orwell
- Marcos, vamos! É sempre bom chegar mais cedo no primeiro dia de trabalho. - A mãe de Mark estava ao pé da escada, aguardando por algum grito, mensagem ou sinal de vida. E nada. O jovem de penas dezoito anos estava dormindo, em posição fetal e com um ronco estridente. - Vamos! - foi quando decidiu solenemente subir as escada e bater na porta do quarto. A voz calma e gentil, agora era tomada de profunda irritação. Vamos Mark!
- Agora, sim. - disse o rapaz do outro lado da porta. Que abriu a porta com um sorriso generoso, mas abalou pela expressão do semblante de sua mãe que não estava nada contente.
- Vamos, foi um favor o senhor Moura lhe dar essa oportunidade. - levantou a mão direita em um sinal de "vamos, rapazinho ou essa mão vai longe". E ele pegou a sua mochila e correu para o banheiro. Pegou a camisa que estava na frente do banheiro e juntou com a toalha e colocou em cima de um pequeno cesto que ficava dentro do banheiro. Entrou no box e já começou a cantoria. Um inglês profundamente genérico, flertando com um idioma desconhecido. Ouça a canção dos anjos! Ele sempre dizia que o inglês genuíno era o que fluía em sua mente e o que saía de seus lábios era mera tolice.
- Vamos, rapaz. Não tenho todo tempo do mundo para lhe dar uma carona! - era o sinal que o rapaz precisava para sair. Com a roupa toda torta se endireitou e seguiu descendo as escadas e indo direto para a cozinha.
- Os teus bolinhos são os melhores, dona Luzia! - e abriu a boca devorando como por uma necessidade. Pegou a mochila e saiu de encontro com a porta e olhou para sua mãe. - Agora eu que vou ter que fala hein mocinha!
- Me chama de mocinha de novo que faço você engolir outro bolinho! - e seguiu o rapaz fechando a porta.
No caminho para o trabalho os olhos de Mark percorriam por toda quadra, a assimilação das cores e o cheiro de café quentinho lhe entorpecia. A cidade era pequena, com poucos habitantes. "Menos é mais". Era por aí. Ele deu um suspiro.
- Espero que gostem de mim, mãe.
- Por que não gostariam? - ela trocou a música que estava tocando, lenta demais para uma segunda-feira.
- Talvez eu não seja tão legal quanto a senhora acha? Dizem que as mães tendem a ver o melhor de seus filhos.
- Eu te conheço desde que você nasceu, e entenda. Você é bem legal e esperto.
- Obrigado, mãe. Será que tem muita gente da minha idade lá?
- É uma loja que vende livros, pode se dizer que há essa possibilidade, viu. - falou dando uma breve batida no ombro do filho.
- E eu já li todos os livros desse mundo! - abriu a mochila e tirou um bendito exemplar de Duna. - pelo menos os bons!
- Esse é o caminho. - observando o tráfego, pegou uma sacola e entregou para o garoto.
- Não esqueça de almoçar. - e entregou o almoço do garoto. Que nem ao menos percebeu que estavam na frente a loja. A loja Moura Books. Futuro ambiente de trabalho de Marcos Guedes, agora Mark. Ao sair do carro esboçou um tchau e deu um breve sorriso para mãe que lhe enviou beijos e um "bom trabalho". O rapaz passeou seus olhos por toda a frente da loja e ficou observando por alguns minutos.
- Olá, posso te ajudar? - uma moça que aparentava ter a mesma idade que ele, se aproximou. - Você é o Marcos?
- Sim, e você é?
- Sou Desireé. Muito prazer! - a jovem estendeu a mão para um aperto que logo foi correspondido.
- Prazer é todo meu. - e realmente era. Mark e Desireé entraram dentro da loja. E logo o rapaz foi apresentado aos outros dois funcionários que trabalhavam ali. Henrique e Thales. Um era um pouco mais velho, na casa de uns vinte anos, esguio e com os olhos semelhantes a jabuticabas e outro tinha mais ou menos a mesma altura de Mark, seus valorosos um metro e setenta e era um pouco mais forte. Respectivamente.
- Você gosta de ler, Marcos? - perguntou Thales.
- Eu gosto de ler sim, e podem me chamar de Mark. - deu um sorriso, esperando um "beleza" e o "beleza" veio. - e vocês, gostam?
- Ah, não me sinto o senhor leitor do ano, mas me esforço em ler os quadrinhos. - disse Henrique levantando a capa de uma edição do homem aranha.
- Eu também me esforço para ler, mas também não sou nenhum especialista do assunto. - disse Thales se esforçando para encontrar as chaves da porta dos fundos.
- Não precisa se sentir inseguro, seu primeiro emprego? - perguntou a moça que estava apenas observando as conversas.
- Sim, minha mãe disse que já estava na hora de eu ter um rumo para a minha vida. - passou a mão direita na cabeça e bagunçou o cabelo que não estava com gel nem nada, porém estava "organizado". E assim foi o dia de Mark, entre o período do expediente e seu almoço, alguns clientes se aproximavam, pedindo conselhos e procurando por autores, um grupo seleto desejava Stephen King e outros vieram em busca de Collen Hoover. Se sentia muitíssimo bem por conhecer aqueles escritores. Culpou seus amigos por conhecer Stephen King e acusou Leticia de lhe apresentar os "romances tensos" da autora.
- Hey, Mark. Tem alguém te procurando aqui! - disse Thales apontando para o começo da loja.
- Luís e Arthur. O que devo a presença dos senhores? - falou sorrindo, demonstrando orgulho por estar ali.
- Queríamos saber como está sendo o seu dia? Muitas novidades. - e olharam em direção de Desireé que atendia um casal.
- Parem de besteira, tem nada desse tipo de novidade. - falou e ao contornar a conversa percebeu que o dedo de Luís estava sangrando.
- O que houve? - e apontou para a mão do rapaz, com exímio interesse.
- Bati a mão em algum lugar, certeza. Mas me diz, onde tem água aqui?
- Tay'taHbe' 'IwbIQ je. - disse Mark, que embora tivesse um péssimo inglês, tinha um klingon invejável
- Água e sangue não se misturam? - disse Desireé que se aproximou dos rapazes.
- Meu Deus, você gosta de Star Trek? - disse aumentando o tom de voz, não era bem o recomendável em uma livraria, mas Arthur realmente se impressionou.
- E quem não gosta? - disse ensaiando um breve riso. - vou ali no fundo ver se tem um exemplar para aquele casal.
- Entendido. - disse, ainda impressionado com a colega de trabalho.
- Onde que tem água, Mark? - perguntou novamente Luís, que ainda estava sangrando.
- Segue para a parte esquerda, ali. Ao lado da escada.
- Valeu, mano. - e saiu em busca de água, só não havia explicado para que. Mark deduziu que era para limpar o machucado, Luís pensou em beber mesmo. Quando se deu conta estava no banheiro.
- Ela deve amar Star Trek, Mark. Você tem uma ótima colega de trabalho. - disse Arthur que ficou observando ao redor com receio de alguém ouvir.
- Ah, eu não vou me animar não, ela deve ter namorado. Olha bem para ela. Prefiro ficar na minha fora que meu avo sempre diz. Onde se ganha o pão não se come a carne.
- Seu avô era machistinha, hein. - deu um tapa nas costas do amigo e completou. - Eu te vejo sábado no cinema?
- Vou me esforçar. - e nesse momento o terceiro amigo retorna.
- Agora vamos nessa, Luís. Já lavou o machucado. - disse Arthur.
- E aproveitei para beber água também, estava com muita sede. - respondeu Luís.
- Te vemos no sábado, Mark. Boa semana e dê um tchau para a sua amiga. - fazendo caretas e dando gargalhadas os jovens saem e seguem o rumo. Deixando o rapaz olhando para a rua sem muita expectativa para sábado, tudo estava uma bagunça. Sua mente flutuando entre responsabilidades.
- Você está bem? - questionou Desireé, que já havia voltado de seu atendimento. - Eles estavam confusos e eu os ajudei.
- Os meus amigos lhe mandaram um "tchauzinho". - disse sem muito polimento.
- Ah! Eu não sei bem o que responder. - falou observando a expressão de "pensamentos distantes". - Como está sendo seu primeiro dia?
- Muito bom. Vocês são legais e me ajudam em diversas coisas. O gerente tem seus momentos e os clientes têm um bom humor. Tudo nos conformes.
- Qualquer coisa eu estou por aqui. - disse e ao mesmo tempo em que caminhou de encontro para o outro cliente.
O dia passou mais rápido do que Mark esperava e às 20 horas lá estava sua mãe, na porta da loja. Sorrindo, ansiosa para saber sobre as novidades que o filho tinha para lhe contar. O cenho enfeitado por um lindo sorriso e um riso sincero ao ver o filho cruzando a porta da loja.
- Como foi na loja? Eles te trataram bem? Muita gente chata? - inúmeras perguntas e uma voz ansiosa por respostas. Em um tom animado e estimulante.
- Sim, mãe. Todos foram legais comigo. - disse com o tom mais utilizado pelos filhos quando começam a conversação com seus pais.
- E aquela moça ruiva ali, ela trabalha com você né? Ela é linda. - disse com os olhos brilhando. Se enchendo de orgulho por ver os passos do seu filho.
- Ela é bem legal também. - se animou em responder à pergunta retorica da mãe.
- Agora vamos que a fome está batendo a parede do meu estomago. - disse e ligando o carro saíram em direção ao lar, doce lar.
O relógio agora marcava mais de 22 horas e Mark estava lendo o livro que havia levado para o trabalho e por um segundo seus olhos foram para o retrato de quando ainda era muito novo. As memorias gritavam em sua mente, e por um relance lembrou das vezes que não queria estar naquela casa, no agora lar doce lar. as memorias atacaram com mais força o transportando para o dia que apanhou do pai bêbado. Mark odiava as lembranças. O odor do cigarro em um misto de bebida e o sentimento forte que invadia dos pedidos que fazia ainda muito novo para que seu pai morresse. Ele poderia ter morrido de cirrose. Mas agora estava preso por agressão. Teve um momento que todo mundo percebeu que a mãe caía muito e que ele já deveria entender que andar de bicicleta não era tão complicado. Inúmeras quedas que tinham a marca de Marcos. Seu pai.
E como por reação largou o livro em cima da pequena estante que ficava ao lado de sua cama e deu de encontro com a revista do Invencível.
- Temos pais de merda né Mark.
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