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𖤍𖡼↷ Voz Do Terror

Ah-reum havia imaginado que, quando enfim fosse dormir tranquila em sua cama, fosse finalmente se sentir em paz. Afinal, enquanto ela estivesse dormindo, não sentiria a morte ao seu lado, certo? Não precisaria viver lembrando a cada segundo que seu pai era o deus da morte e que agora ela estava condenada a viver com ela ao seu lado. Isso sem contar as asas! Aquelas imensas asas escuras que haviam pesado em suas costas, fazendo Ah-reum se desesperar e desejar nunca ter descoberto a verdade. Aquele poder que vinha de seu pai era demais para ela conseguir aguentar; Ah-reum não era Nico e jamais seria capaz de suportar um terço do que ele suportava.

Mas a verdade é que nem em seus sonhos Ah-reum tinha conforto. Afinal, essa era a vida de um semideus: você estava constantemente presenciando momentos de angústia. Para Ah-reum, nunca fora diferente disso, mas agora parecia que ela estava agonizando lentamente antes da morte. Como se não conseguisse sair daquele looping incessante de desespero, dor e ansiedade. E agora que sentia a morte a cada passo que dava, sem conseguir ver através disso, Ah-reum de deu conta que havia aberto uma porta que não podia mais ser fechada. E em seus sonhos, também existiam seres ruins que não deixariam de a atormentar.

A semideusa não sabia onde estava, se fosse ser completamente sincera. O lugar estava escuro demais para que ela fosse capaz de ver além da terra estéril por onde pisava. Mesmo que estivesse absurdamente calor ali, Ah-reum sentia frio; mas não um frio qualquer, quase como se algo gelado estivesse passando através dela. Um sentimento ruim, amargo no fundo de sua garganta, e ela olhou de um lado para o outro em busca de respostas, mas não obteve nada. Com o cenho franzido, Ah-reum caminhou pelo local vazio e escuro, tentando se localizar. Mas tinha bastante certeza que jamais estivera ali antes.

Então você é a semideusa que Thanatos tanto queria esconder.

Aquela voz não era nada familiar para Ah-reum, mas terrível o suficiente para fazê-la estremecer com aquele som. Ainda mais depois da risada que pareceu ressoar por todos os ossos da semideusa, fazendo Ah-reum desesperadamente querer sair daquele lugar. Ah-reum tinha enfrentado o exército de Cronos e o exército de Gaia, mas nada antes a havia atormentado tanto quanto aquela voz tinha naquele momento.

Entendo o interesse dele em proteger você, Ah-reum Woo. Você vai me trazer feitos grandiosos.

Ah-reum queria rir e talvez tivesse rido se não tivesse se desesperado. Estava claro que, quem quer que fosse por trás daquela voz, era alguém com poder o suficiente para ser temido. E se Thanatos, um deus, pai de Ah-reum, estava tentando a esconder daquilo... Bom, talvez não fosse de fato uma coisa boa. Mas era só um sonho, certo? O que demais poderia a afetar ali, onde nada era palpável de verdade? Mas Ah-reum sabia o que ficava mais vulnerável ali: sua própria mente. Um lugar que não teria salvação caso fosse afetado.

Sinto em te desapontar, mas não trabalho para deuses. Ah-reum zombou, reunindo toda a força que a restava. Mas a risada cruel fez ela estremecer mais uma vez. Quem era aquela entidade? Por que era capaz de a abalar tanto com apenas algumas risadas e uma risada cruel?

Ah, mas você vai. E ainda vai me agradecer por isso no final.

E, sem que ela pudesse dizer mais nada, o chão se abriu e Ah-reum caiu em direção a mais profunda escuridão.

A semideusa acordou em um pulo, quase caindo de sua cama. Seu coração batia acelerado dentro do peito devido ao seu desespero, suor escorrendo pela sua testa. O que havia sido aquele sonho? Era um fato de que sonhos atormentavam semideuses e que Ah-reum já estava acostumada com aquilo, mas aquele sonho havia sido demais, até mesmo para ela. Era a incerteza, não saber o que diabos tudo o que havia sido tido significava, que fazia a filha de Thanatos sentir a angústia no fundo de sua garganta, um pesar grande se instalando no peito, a impedindo de voltar a dormir, mesmo que ela quisesse.

Com as pernas trêmulas, Ah-reum se levantou, pegando o relógio ao lado da cama para ver as horas. Duas e meia da manhã; o lado positivo é que a manhã seguinte era sábado, e estar aproveitando suas férias fazia Ah-reum não ter que se preocupar com faculdade e o trabalho. E estar longo do Acampamento também fazia com que ela pudesse, ou pelo menos tentasse, manter todos aqueles pensamentos negativos que haviam se instalado em sua mente o mais longe possível. Passando a mão pelos cabelos e decidindo não pensar muito naquele sonho, Ah-reum abriu a porta de seu quarto sem fazer muito barulho e se encaminhou para cozinha.

Por um instante, ela observou as diversas fotos que tinham sido colocadas no corredor há um tempo. Fotos de Ah-reum bebê, fotos dela e sua mãe brincando em um parquinho, fotos de Yuna com Sam quando decidiram ficar noivos. Ah-reum imaginava que quando sua mãe e ele se mudassem para a casa que estavam construindo juntos, passariam a ter mais fotos de Sam e sua família, mesmo que Ah-reum soubesse que era doloroso aquele tópico. Afinal, deveria ser uma merda não ter os pais e nem o irmão vivos para participarem de sua vida. Ah-reum tinha plena certeza que ficaria maluca sem sua mãe ao seu lado.

Ao passar pela sala, Ah-reum se deparou com Sam sentado no sofá, um copo de água em suas mãos enquanto ele observava o fogo da lareira crepitar. A sensação estranha que Ah-reum tinha tido ao estar perto dele mais cedo havia sumido, sendo substituída pela melancolia que ela podia ver vindo de Sam naquele momento. Por um instante, a semideusa se sentiu um tanto perdida. Mas ela tinha plena certeza que Sam sabia que ela estava ali. Ainda assim, Ah-reum fez um pequeno ruído para anunciar sua chegada, fazendo Sam se virar para a fitar e dar um leve sorriso para ela.

-Não consegue dormir? - Ah-reum perguntou, se sentando na ponta do sofá oposta a onde Sam estava, encolhendo suas pernas até o peito e as abraçando. Sam apenas deu de ombros, o que indicava que, sim, ele estava tão inquieto quanto ela. Ah-reum deu uma pequena risada, sem nenhum humor. -Acho que é meio difícil mesmo depois do climão que ficou no jantar. Desculpa por isso.

-Você não precisa me pedir desculpar, Ah-reum. Eu jamais vou me meter nos conflitos que você tem com sua mãe, acho que é algo que precisam resolver entre vocês. - ele disse a olhando por um instante, mas deu um meio sorriso para ela. -Mas vocês bem que podiam parar de serem tão cabeça dura uma com a outra, né? - isso fez a semideusa rir. Ela se lembrava perfeitamente que já tinha colocado Sam em cada torta de climão graças as encrencas que ela arrumava, principalmente com sua mãe. Era engraçado ver o quão perdido Sam ficava quando elas duas brigavam entre si.

-Meio difícil quando nossas personalidades entram em conflito. - ela riu. Por um tempo, apenas ficaram em silêncio. -Sam? - ele se virou, fitando Ah-reum com seus olhos bonitos. -Posso te perguntar uma coisa? - Sam a olhou por um instante antes de assentir. -Por que você está tão triste? E não tente mentir pra mim, não vai funcionar. - ela disse semicerrando os olhos e tentando aliviar o clima. Sam deu um sorriso triste a Ah-reum, fitando a água dentro de seu copo por alguns instantes, pensando no que exatamente deveria dizer para ela. E Ah-reum esperou até que ele quissesse falar sobre aquilo.

-Muita coisa aconteceu na minha vida. - ele disse e por algum motivo, Ah-reum sentia que não estava falando exatamente sobre coisas boas. -Não são situações que eu gosto muito de recordar, mas que vez ou outra ficam rondando na minha mente. Sabe, é muito difícil de se livrar de lembranças, Ah-reum, mas é ainda mais difícil tentar fingir ser algo que não é. Passei uma boa parte da vida tentando. E mesmo quando aceitei, perdi muita coisa importante pra mim. A vida é assim no final das costas. Selpre estamos ganhando de um lado, mas perdendo do outro. Difícil de evitar.

Ah-reum sentiu as palavras de Sam a atingirem como um soco no estômago. Por mais que ele estivesse falando sobre si mesmo, no fundo Ah-reum era exatamente aquilo: alguém que fingia e tentava se esconder, incapaz de aceitar quem era de verdade. Tinha vergonha de ser ela mesma, e muito antes de descobrir que seu pai era Thanatos, Ah-reum estava em constante fuga da verdade. Ela odiava o como sua vida tinha se desenrolado, mas no fundo sabia que Sam tinha razão: não dava para se esconder para o restante da vida.

-Por mais absurdo que possa soar, eu entendo perfeitamente o que quer dizer. - Ah-reum suspirou, se afundando mais no sofá. -Sam, eu definitivamente não sou uma pessoa normal. Você se surpreenderia. Talvez até fugisse. Tenho a tendência de causar esse efeito nas pessoas.

Por mais verdade que o que Ah-reum disse fosse verdade, Sam ainda assim deu risada, olhando com uma espécie de compreensão para ela que a pegou totalmente de surpresa.

-Acredito, Ah-re, eu não sou assim tão diferente do que você me diz ser. Definitivamente não tenho nada de normal. Se soubesse um terço das coisas que já vivi, você seria a primeira a sair correndo por aquela porta. - Sam disse e Ah-reum arqueou a sobrancelha, dando um sorriso desafiador para ele.

-Sam, você não faz ideia das coisas que eu já vi, que já fui obrigada a vivenciar. Eu não ia me assustar assim tão fácil. - ela garantiu, mas aquilo fez Sam rir.

-Não tenho tanta certeza assim. - ele provocou. Ah-reum olhou para epe com indignação.

-Quer apostar?

-O que vocês dois estão fazendo acordados? São quase três da manhã. - a voz de Yuna fez não só Ah-reum se assustar, mas como Sam também. Eles se viraram para fitar a mulher de cabelos escuros que tinha uma sobrancelha arqueada. -Pelo jeito a noite já está totalmente comprometida aqui. Vamos assistir The Walking Dead?

-Pela décima vez? - Sam disse com um suspiro. Yuna apenas o encarou e ele fez uma careta. -Claro, amor, tudo o que você quiser.

-Sabia que iria concordar! - ela disse, se sentando no espaço vago entre Sam e Ah-reum. -Vai assistir com a gente também, querida?

-A gente não pode assistir, sei lá, Vermelho, Branco e Sangue Azul? Já deu de coisas mortas e morte por um tempo. - Ah-reum resmungou. Sua mãe revirou os olhos e fez o mesmo, mas ainda assim colocou no filme que Ah-reum havia pedido. Com um meio sorriso, a semideusa colocou a almofada no colo de sua mãe e se deitou, sentindo o carinho suave da mais velha em seus cabelos.

E daquela vez, quando dormiu, Ah-reum não teve nenhum sonho ruim. Apenas o vazio e escuridão.

boa tarde povo bonito!
tudo bem com vocês?
espero que sim!

um momento em
família porque
daqui pra frente só
pra trás rs

votem e comentem,
isso me ajuda demais
a continuar!
é sempre bom receber
feedback de vocês

espero que estejam gostando!
nos vemos no próximo
capítulo!
~Ana

Data: 20/01/24

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