O que se passava com a Vitória podia muito bem ser uma questão de expansividade. Ela berrava aos quatro cantos, e isso era quase literal. E se apaixonar irremediavelmente e com tanta certeza, como sentia, era motivo de fazer valer seu nome. Exatamente estas coisas que desembocaram numas intrigas com a Bia, as duas que eram amigas. E a Vitória resolveu cantar a real, chamou a Klars para uma decisão dizendo que encontrara nela seu próprio membro freudiano e que pela primeira vez sentia verdadeiro amor no incêndio, deu no pé para a Europa e disse vem. Vem que vamos ser felizes longe desse povo brasileiro. A Klars disse não. Não iria deixar a Bia, nem a Gim que não se desgrudava mais do Artur — ou era ele que se tornara um apreciador das transparências e das misturas proibidas para os reles humanos, enfim se sentindo vingado das brochadas do passado —, e que até ela mesma gostava de conviver com o Artur apesar de os dois não se relacionarem sexualmente e ele fazer questão de expor uma longa autocomiseração pseudofilosófica sobre avançar em temas de ponta. Era isso, para explicar certas coisas apenas um podcast seria a plataforma suportável para a transformação da falsidade num aparato de humor.

O que as duas falavam então naquela tarde, depois que saíram da loja de carros futurísticos, testemunhadas pelo sol poente imenso e próximo de um lado e pelo casal Bombay & Sapphire abraçados do outro, era sobre esse assunto, a Klars estava decidindo também partir por um tempo para o sul. E no fundo estava com muita raiva de que a Bia não cedesse em conversar com a Vitória, e embora dissesse o contrário, não se movimentava em nada que resolvesse pela própria Klars a decisão de ficar.

No entendimento da Klars, a Bia não deveria perder tão facilmente a Vitória, ninguém devia facilmente abrir mão de Vitória alguma. E o que sobrava desta atitude, era que se fosse realmente gostada, uma Vitória que a queria de forma estrondosa não seria um incômodo.

A Klars e a Vitória tinham, para início de conversa, sido encontradas não apenas na paixão que esta cantava, mas também nos projetos políticos. Houve uma complementação quase sinérgica numa ferramenta de denúncias e rastreamento, onde a Klars recebeu da Vitória que era advogada internacional, as ideias fundamentais. Se travava de algo importante para a Klars, rastreamento digital dos financiamentos de entidades civis por grupos bilionários e únicos para a veiculação de dados falsos sobre aquecimentos global, superpopulação, eficiência de vacinas, e outros golpes profundos contra a humanidade. Porém com a partida da Vitória, tudo desandou e ela teve que desistir.

Então foi embora andando dali mesmo do meio da tarde e do sol, deixando todos com a preocupação de como ela se viraria, porque não retornou nem para o apartamento onde viviam para pegar suas coisas.