Idiota. Eu acertei seu olho com força e o impacto fez meus ossos tremerem. Será mesmo que eu era a única criatura inteligente em todo esse mundo? Eros é um idiota. O maior de todos eles. Nesse exato momento ele está parado com um sorriso torto embaixo de mim como se toda a solução desse problema fosse seu mérito. Mas ele não pensa, a sua cabeça certamente está toda entupida de algodão ou seja lá o que tem lá dentro. Como você pôde se deixar levar por uma sombra? Uma cópia ruim de você mesmo te irritou tanto assim? Você não aguentou encontrar alguém tão pedante e cabeça dura quanto você e logo se tornou agressivo. Eu realmente não posso confiar em ninguém além de mim mesma. Haan é esperto, ele sabe que nós iriamos resolver isso facilmente, é óbvio que ainda existe algum outro obstáculo, e julgando o jeito com que as duas cópias estavam se levantando irritadas, eu acho que a agressividade talvez seja nossa única resposta.

Movi meu braço com força mais uma vez e acertei o chão, eu conseguia sentir o ódio correndo dentro de mim, inchando minhas veias como tinta e dilatando todo o meu corpo em um estado inconsciente. Era como se eu estivesse leve, flutuando numa onda vermelha que me levava diretamente ao estado de espírito que eu precisava estar. Segurei o braço de Eros e o apertei brevemente, depois um aperto longo e dois curtos; dois curtos, um longo, mais um longo e um curto e um logo. Código Morse, eu espero que você ainda se lembre de alguma coisa da academia. Luta, eu soletrei apertando seu braço, e sua expressão vazia e pacífica me indicou que ele havia entendido. As cópias eram iguais o suficiente para entender nossa língua e agir como nós, mas dificilmente saberiam um sistema de códigos complicado e específico. Eu precisava apostar minhas fichas nisso.

— Certo, você é a minha Nyx então. — Ele sorriu com todos os dentes. — Agora vocês podem nos deixar ir embora.

— Vocês acham que isso acabou aqui? — O outro Eros disse.

— O que vocês vão fazer? — Eros riu. — Vocês não podem nos matar.

— Isso é o que vocês pensam. — Sua voz saiu alterada. — Ninguém aqui terá pena de vocês.

Me levantei devagar e Eros se sentou no chão com o pescoço para cima, ele estava tentando provocar a cópia e eu não fazia ideia se isso iria funcionar. Fisicamente eles eram iguais a nós, mas Haan foi capaz de se jogar do topo de um prédio sem nem ao menos se arranhar, e ao mesmo tempo foi atropelado e ficou inconsciente e ferido. Em teoria, eles não eram invulneráveis, poderiam ser subjugados se forem surpreendidos. Eu precisava encontrar o momento certo, uma leve hesitação da parte deles seria o suficiente. Mas como fazer isso com alguém que conseguia medir cada um de seus movimentos? Eu senti a raiva se apossar de mim mais uma vez, eu tentava gritar mas o som contraía minha garganta em ruídos surdos, o ar quente saía sem vibrar uma única corda.

Eu estava enfurecida, minha pele se esquentava e queimava ao toque, Eros me encarou brevemente e voltou a chamar atenção para si mesmo com provocações e ameaças que mal batiam nos meus ouvidos. Rapidamente eu comecei a sufocar, a falta de ar fez meus pulmões arderem, eu conseguia sentir meu tronco se contraindo e me dobrando para frente, comecei a suar enquanto queimava em uma febre doentia, meus dentes fechados apertavam a mandíbula e minhas mãos fechadas em punhos pesavam como rochas. Eu corri ainda sem respirar para cima do outro Eros, seu rosto em branco me recebeu de braços abertos, levantei a perna direita e tentei acertar um chute nas costelas que imediatamente foi bloqueado. Ele segurava minha perna com força apertando os dedos na carne, peguei minha mão e tentei um soco em seu rosto que também foi desviado, e nesse momento em que ele me pensava completamente presa, um grito saiu do fundo da minha alma, labaredas de fogo rubro saíram por entre os meus dentes e queimaram seu rosto.

O gosto de fuligem atingiu minha língua como cinzas amargas, a cópia se contorceu no chão e escondeu entre os braços o rosto queimado. A outra Nyx hesitou por um momento antes de se aproximar, as chamas já haviam assumido meu cabelo e e desciam pelos meus braços como uma capa, contornando minha testa como uma coroa. Abri e fechei o punho, a forma aérea e física das chamas assumia cada dedo, cada encontro, repousando na pele como se fosse tão inofensiva quanto água. Eu havia perdido o elemento da surpresa, mas claramente havia confundido as cópias. Quando ela segurou minha mão com as suas, vi o desconforto em seu rosto ao tentar segurar um golpe feito de brasa quente, e cada vez mais ela parecia se defender e procurar saídas.

Eros não demorou em sumir de vista, correndo pelo lugar em busca de saídas, jogando as camas para cima e batendo com força no chão. A outra Nyx tentou me pegar de surpresa, cada vez tentando dar um golpe mais imprevisível, costelas, rosto, pés, tudo que ela fazia não era rápido o suficiente e o desespero a tornou ainda mais lenta e fácil. Um golpe rápido no seu pescoço a derrubou no chão, enquanto ela se arrastava sem ar eu vi o que eles queriam que fosse eu, essa pessoa com o mesmo rosto, o mesmo cabelo e o mesmo corpo. Ver uma versão de mim mesma implorando por misericórdia não seria o suficiente para amolecer meu coração, eu não era apaixonada como Eros ou sensível como Mica. Eu era forte, muito mais forte, e eu precisava salvar todos eles com a minha força. Respirei fundo e soltei um grito que estremeceu as paredes do lugar, chamas corriam pelos lençóis da cama e as duas cópias estavam no chão estremecidas e fracas.

— Eu não sou só a humana que vocês pensam que eu sou. — Eu falei. — Eu sou uma fênix.