5: Doze minutos restantes
A maioria dos delinquentes estava desconfortável por ter que se prender a alguém que não faziam a mínima ideia de quem era. Seria uma vantagem ter alguém perigoso como sua dupla? Não havia como não pré-julgar o outro na situação em que estavam.
Os jovens se observaram, provavelmente refletindo sobre a pessoa que compartilharia da mesma algema. Ninguém se atreveu a iniciar uma conversa, permaneceram todos calados, conforme os pares foram se achando, até que alguns começaram a expressar suas reações.
- Ah, não – Lotus se manifestou. Por mais que tivesse reconhecido o nome de seu companheiro, ao ouvi-lo, não havia conseguido se lembrar a quem pertencia. Até que o avistou. – VOCÊ!? Só pode ser brincadeira, alguém deve tá zoando com a minha cara.
- Ou com a minha, né? – Cabrón falou, ao se aproximar de Lotus. – Afinal, fui eu quem xingou o nomeador. O velho deve ter mandado juntar a gente. Por causa do nosso histórico de desentendimentos, saca.
- Não. Saco nada. Não acredito que vão me colocar logo contigo.
- Ei, relaxa aí – Cabrón tentou tranquilizar Lotus, novamente, com as mesmas palavras que pareciam estressá-la mais ainda. – Você foi amaldiçoada com a melhor pessoa que poderia fazer dupla.
- Melhor pessoa? Se eu me lembro bem é você quem já teve não sei quantos ataques de pânico desde que chegamos aqui.
- Como eu já disse, eu tenho ansiedade. É diferente de um ataque de pânico.
- Dane-se. Ninguém se importa. Se você não conseguiu ficar normal na porra de uma sala de espera, imagina como vai ficar quando a fase começar – Lotus disse, ao virar sua cabeça e se dirigir para o carrinho, como uma forma de parar de ouvir Cabrón, que a seguiu. – É o seguinte, vamo pegar nossa algema logo, mas só colocamos quando tiver para começar, tá bom? A voz disse que ainda temos doze minutos para se preparar, então quanto menos tempo passarmos juntos melhor. Para os dois. Ou acabamos nos matando antes mesmo do negócio começar.
- Você – Cabrón destacou. - acaba me matando, né? Eu sou inofensivo – completou, corrigindo Lotus, com seu tom brincalhão, e um sorriso torto no rosto, por não saber bem qual poderia usar para tentar agradá-la.
Lotus pegou uma algema do carrinho, posicionado logo depois do portão na parede de pedras, e olhou para Cabrón, após ele concluir sua fala, com um olhar fechado, repreendendo a tentativa dele de fazê-la rir, ou algo perto disso. Se afastou dele, e de todo o resto, indo se isolar em um dos bancos do pátio, perto de onde os gêmeos ainda permaneciam.
- Ei – Primo chamou Caz, mas ele permaneceu fitando o chão, com sua postura jogada para a frente, e os braços apoiados no joelho. – Alô? Terra chamando o raspa de tacho.
- Ah, oi. O quê? – Caz conduziu sua atenção para seu irmão, porém, de alguma forma, ainda parecia estar pensando no que estava em sua cabeça, anteriormente.
- Quem é sua dupla? – Primo questionou, notando que Caz não parecia estar dando importância para o que falara. – Não consegui prestar atenção no nome de mais ninguém sem ser no meu e no da minha dupla.
- É aquele Ares ali – Caz indicou, com sua cabeça, o delinquente de cabelo castanho-claro, penteado em forma de topete, diretamente, o que fez Primo estranhar, novamente, já que não o tinha visto daquela forma desde a morte de seus pais. Estava quieto. Distante. Pensativo.
- Aí, qual foi? Que que deu na pessoa mais boca frouxa que eu conheço?
- Eu... é que... – Caz sentia vontade de falar, já que sempre pôde contar com seu irmão para tudo. Constantemente compartilhavam todo e qualquer tipo de problema que os perturbava, pois o outro sempre estava disposto a ajudar, mas, daquela vez, não queria dividir a sua paranoia.
- Fala sério, Caz, sou eu. Pode falar qualquer merda comigo. Vamos, o que foi? – Primo insistiu, e, após um pequeno momento calado, Caz se manifestou.
- Aqueles três. Aquilo que falaram... sobre a gente – Caz iniciou sua fala, mas Primo, ao saber do que se tratava, o interrompeu de imediato.
- O trio de imbecis que se danem. Nós não somos errados, tá bom? Essa sociedade de merda que é. Aqueles delinquentes que são. Não temos nenhuma culpa por termos nascido. Muito menos nossa mãe, ou nosso pai. O erro deles foi nos amar demais, nada além disso.
- Mas, e se tiverem mais pessoas que pensam como eles? E se marcarem para matar a gente primeiro por causa disso?
- Eles não vão nos machucar, entendeu? Eu estou aqui para te proteger, assim como você irá me proteger. A gente se cuida. Não fizemos dupla com nenhum do trio de patetas, o que já é algo promissor, agora precisamos focar em passar a primeira fase, certo?
Caz se sentiu confortado, como de costume. Por mais que fossem gêmeos, Primo havia pego o cargo de irmão cuidador, enquanto Caz permanecia sendo o mais inocente e cândido.
- E você? Quem é sua dupla?
- É um tal de Seis. Não vi ele ali na muvuca. Talvez ainda tenha mais pessoas para chegar.
- Na verdade, eu acho que não. Tem um garoto isolado naquele canto do pátio que pode ser ele – Caz apontou, direcionando Primo, para a área que não conseguiam enxergar, devido a grande árvore central. – Ele estava com o nosso grupo durante a nomeação, mas sempre com uma cara de choro, e assim que chegamos foi correndo se afastar de todo mundo.
- Ótimo, então vou ter que bancar o irmão mais velho com ele também.
Caz riu, e Primo se levantou, indo na direção da árvore, até que conseguiu enxergar um delinquente, em um canto do pátio, abraçado com suas pernas, e a cabeça enfiada no joelho. Era notável que chorava, e o irmão gêmeo, ao se aproximar, diminuiu a velocidade, tentando fazê-lo o perceber, antes que chegasse, o que não aconteceu.
- Ãn... oi... – Primo abordou o garoto, que se assustou com sua presença, e se jogou para trás, batendo as costas na parede de pedras. – Calma, eu vim aqui porque sou sua dupla – disse, ao observar o apelido dele em seu uniforme, confirmando que falava com a pessoa certa.
- Eu... dupla? Do que você tá falando? – Seis questionou, ainda mantendo seu olhar assustado, e observando uma rota de fuga caso precisasse.
- Você não ouviu? A Absolvição disse que haverá duplas nessa primeira fase, seja lá o motivo, e que os delinquentes precisavam se algemar com seus pares.
- Algemar? Eu e você?
- É, amigo – Primo explicou, notando, ao encará-lo, os seus olhos vermelhos, encharcados, e sua calça molhada, tendo certeza de que não se tratava apenas das lágrimas. Era uma pessoa paciente... com seu irmão. Ter que lidar com alguém como Seis, que aparentava ter 14 anos, naquela situação, não o agradava, mas de certa forma, por conseguir ver Caz nele, adquiriu forças para motivá-lo, e se abaixou, o olhando seriamente. – Olha, eu sei que tudo isso aqui é assustador. Não sei pelo o que você está passando, internamente, mas saiba que pode contar comigo. Não te conheço, mas se tem algo que eu necessito muito aqui, é proteger meu irmão, e isso não vai acontecer com você morto, então farei o possível para te manter vivo, tanto quanto ele.
Seis se manteve calado. Não soube processar se o que ouviu foi algo positivo ou negativo. Então apenas balançou a cabeça, concordando com Primo, que se levantou e se afastou, indo para a entrada do pátio, pegar sua algema do carrinho, onde Ino, Cabrón, Roma, Lobo, Kant e Libra ainda estavam reunidos.
- Ei – Lobo chamou Primo, ao perceber sua aproximação. – Primo, não é? Então, chega aqui e pensa com a gente.
- Pensar o quê? – Primo questionou, se esgueirando pelo meio do grupo, e alcançando sua algema, pronto para ir embora, assim que fosse possível.
- Aquela ruiva, a Faith, sabe de algumas coisas sobre como a Absolvição funciona. Você não deve ter ouvido na hora pois tinha saído daqui depois da briga com o carequinha.
- Não, eu ouvi. Vocês todos falam muito alto.
- Massa, então, concluindo, ela sabe de algumas coisas, e por uma coincidência, que talvez não seja coincidência, acabou formando dupla com a amiga. Fala sério, acha mesmo que isso pode ter sido por acaso? Somos vinte e dois, e ela ficou junto logo com quem conhece e confia.
- É, mas ela não sabia da formação de duplas.
- Será mesmo? Talvez ela tenha se fingido de besta pra não atrair mais a atenção da gente.
- O que você tá sugerindo?
- Eu tô pensando que talvez o tal pai dela, na verdade, faça parte da Absolvição. Isso explicaria como que ela sabe de algumas coisas e ficou junto da amiga.
- Olha, eu acho que isso tudo é uma paranoia bem grande. Deveriam cuidar da própria vida e deixar ela para trás. Se quiser tanto saber das outras informações que ela possa ter, tenho certeza que se daria bem com o trio de otários – Primo expressou, jogando seu olhar para onde Kraken, Eco e Orion estavam reunidos.
- Uou, calma aí. Foi só uma teoria que passou pela minha cabeça, não vou me juntar com o bando dos preconceituosos.
- Ótimo, então, acho que já expus bem a minha opinião – Primo se afastou dos seis delinquentes, tornando ao seu irmão, que permanecia sentado no banco, porém, agora, acompanhado de Ares, que segurava as algemas em sua mão.
- Oi, prazer, sou o Primo – o gêmeo se dirigiu à dupla de seu irmão, estendendo sua mão para que ele apertasse, o que o delinquente fez, ao recebê-lo.
- É, dá pra ver pela sua etiqueta, assim como dá pra ver a minha, então não precisa nenhuma introdução, não é? – Ares falou, pelo o que parecia ser a primeira vez, desde que entrara no pátio, e se mostrou com um tom de voz grosso.
- É, mas creio que seja costume fazer isso. Por educação, sabe.
- Que seja.
- Pelo menos o apelido que você escolheu é um maneiro – Caz se intrometeu, numa tentativa de melhorar o clima entre seu irmão e sua dupla. – Se eu fosse você sairia expondo ele para todo mundo. Que nem a gente fez.
- Que nem você fez, não é, Caz? – Primo corrigiu seu irmão, lhe dando um olhar de reprovação.
- Foi a primeira coisa que pensei – Ares começou a falar, cabisbaixo, como se não fosse alguém de muitas conversas. – Quando era criança, minha mãe lia histórias sobre mitologia grega para eu dormir. Sempre fui apaixonado. Era uma criança estranha.
Os irmãos se olharam, enquanto Ares falava, e conseguiram se comunicar apenas com essa ação. Ares vestia vermelho, o que simbolizava que estava na lista dos mais perigosos, diferente deles, que vestiam verde, a cor representante do crime mais baixo que podia colocar alguém na Absolvição, então sabiam que a melhor forma de tratar alguém com aquele tipo de uniforme seria através da simpatia, principalmente pelo fato de que ele era tão grande quanto Roma, o que o tornava praticamente impossível de ser derrubado.
Distante desses três jovens, no lado contrário do pátio, também em um banco, Kraken, Eco e Orion se localizavam.
- É óbvio que seria eu quem pegaria a merda da criança – Eco se expressou, irritada, olhando para Dama, que estava sentada, sozinha, em um banco afastado. – Ela vai acabar resultando na minha morte.
- Pelo menos não pegou o pretinho, que nem eu – Kraken comentou, revelando que sua implicância não se aplicava apenas aos gêmeos. – Tipo, metade das pessoas aqui são brancas e EU que fico com o chocolate? Tá de zoação. Até preferia ter pego a mina do Orion do que esse tal de Kant.
- Aí, mané, só porque a gente concordou contigo sobre os japinhas não quer dizer que somos uma máquina de preconceito que nem tu, beleza? – Orion falou, fitando Kraken, que deu uma risada rápida.
- E me poupa de ficar com papo machista perto de mim. Já avançamos demais desde que isso era algo comum – Eco reclamou, mantendo sua expressão rude.
- Não é machismo, é fato. Acha que uma mulher tem as chances iguais de passar isso aqui tanto quanto um homem? – Kraken questionou, olhando para Eco.
- O único fato aqui é que você é um imbecil – Eco afirmou, se levantando e indo na direção de Dama.
- Ela não disse que eu estava errado – Kraken disse, rindo, e olhando para Orion, esperando uma gargalhada dele.
- Eu vou conversar com minha dupla, até mais – Orion se levantou, após falar, abandonando Kraken, e se dirigiu até Júpiter, que também se encontrava sentada em um banco, sozinha, passando por onde o trio de amigas estava conversando.
- Calma, amiga, vai ficar tudo bem – Wish tentou tranquilizar Hope, que estampava um olhar de desespero, acompanhado de ambos seus olhos segurando uma grande quantidade de lágrimas. – Nós vamos nos encontrar no final da primeira fase, tá bom? Eu e Faith vamos ficar te esperando, caso a gente chegue primeiro, e você faz o mesmo, que tal?
- Como que eu vou ficar esperando vocês se a minha dupla é aquele ali? – Hope apontou para V, sentado, novamente, debaixo da árvore, com um olhar observador.
- Hope, - Faith chamou a atenção de sua colega. – ele é quem defendeu o menininho quando a gente chegou, então talvez não seja de todo o ruim. Ele me assusta? Pra caramba! Mas você assusta muito mais. Logo, se alguém deve ter medo, deveria ser ele de você.
Hope passou a manga de sua jaqueta em seus olhos, os enxugando, e sua boca se curvou, com um leve sorriso, então deu um forte abraço em Wish, que a abraçou de volta e sorriu para Faith, feliz por terem conseguido animá-la novamente.
- Obrigada, você sempre faz eu me sentir melhor – Hope agradeceu, olhando para Wish, ao passar sua mão pelos longos cabelos loiros de sua amiga, os alisando.
- ATENÇÃO! – a voz fez sua quarta aparição. – A... primeira fase da... sétima Absolvição do ano de... 2035 terá início em... 3 minutos. Todos se algemem às suas duplas, imediatamente, e se posicionem, em uma fila, ante ao portão de onde vieram.
Os delinquentes sentados se levantaram, e foram todos para onde o carrinho com algemas estava. Lobo o empurrou para o lado, liberando a passagem, e os jovens que ainda não haviam se prendido ao seu par, o fizeram.
"Bom, é isso. Finalmente começará a primeira fase. Minha dupla foi bem gentil comigo, pelo pouco tempo que nos falamos, e acho que a breve conversa que tive com Roma foi o suficiente para ele criar alguma afeição por mim. Agora é torcer para que isso seja o suficiente para que eu sobreviva" – Ino pensou, com seu pulso fino algemado ao de Lobo, e os dois se colocaram como sendo a primeira dupla da fila.
- Eai, como você tá? Tranquilo? – Lobo perguntou para Ino, o olhando, com um olhar preocupado.
- Sim, estou sim. Sem estresse.
- Olha, vou apertar mais nossa algema, tá bom? Vai que a Absolvição pensa que deixar ela frouxa assim é alguma forma de roubar.
- Tudo bem.
Lobo pressionou as argolas da algema, até elas travarem por completo em seu pulso, e no de Ino, o que com certeza deixaria marcas em ambos.
- Que a gente não morra – torceu Cabrón, se dirigindo a Lotus, que não reagiu, porém, dessa vez, por estar preocupada demais pensando o que iria ocorrer em seguida, e não por apenas ignorá-lo.
- Até o outro lado – Roma falou para Libra.
- Até o outro lado – Libra repetiu.
- É bom tu não me ferrar, entendeu? – Kraken advertiu Kant, que apenas o olhou com medo.
- Seja o que Deus quiser – Alma murmurou, para si mesma, e sua dupla, Neve, pegou em sua mão, a apertando, e lhe dirigindo um sorriso, que a acalmou.
- Tu faz o que eu mandar, tá? – Eco comunicou Dama. – Não tenta improvisar nada, ou nós duas acabamos mortas.
- Boa sorte – Júpiter falou, fitando sua dupla.
- Para nós – Orion completou.
- Eu amo vocês – Wish anunciou, para Faith, algemada ao seu lado, e Hope, acompanhada de V, logo atrás.
- Wish - Hope a chamou.
- Sim?
- Promete para mim que nós vamos nos ver. Promete.
Wish se manteve calada, mas então virou para Hope, a encarando profundamente, e falou:
- Eu prometo. Nós três vamos sobreviver, tá bom?
Hope sorriu, enquanto V revirou os olhos, por ser obrigado a escutar todo aquele drama.
- Boa sorte, maninho – Primo se referiu a Caz, ao olhar para trás, e fitar ele e Ares, que eram a última dupla da fila.
- Eu não preciso de sorte, sempre fui o mais sortudo – Caz respondeu, e Primo riu, virando seu rosto para frente. Caz olhou seu irmão, por trás, e medo nublou toda sua expressão. – Boa sorte, idoso – disse, escondendo seu rosto coberto de tensão, ao ser encarado novamente por Primo. Imaginou, pela primeira vez, o cenário em que seu irmão morreria, e ele sobreviveria. Como iria prosseguir? Mas, rapidamente, fez esse questionamento sumir, para focar em passar a primeira fase, assim como sabia que ele também faria.
- E aí, pronto? – Primo questionou o estado de Seis, que permaneceu com seu olhar assustado.
- Acho que não... mas não importa, não é mesmo?
- Nós vamos passar, certo? Fique com isso na cabeça durante toda a fase.
- ATENÇÃO! – a voz da Absolvição tornou, pela quinta vez para alguns, e pela última vez para outros. – Todas as duplas devem passar pelo portal, separadamente das outras, aos poucos, com um intervalo de 5 segundos entre cada travessia – ao falar a regra para dar início à primeira fase, o portão na parede de pedras brilhou, mais uma vez, e sua forte luz branca acertou todos os jovens. – O número máximo de delinquentes que será permitido passar para a segunda fase é... – uma pausa ocorreu. – dezesseis.
O coração de todos acelerou. A respiração de alguns ficou mais pesada. Vinte e dois entrariam na primeira fase, e apenas dezesseis poderiam conclui-la. Seis. Seis era número mínimo de mortes que deveria ocorrer. Esse fato passou pela cabeça de todos, e deixou até os mais tranquilos, inquietos. Quem iria morrer?
- Agora, com tudo esclarecido... ADENTREM O LABIRINTO!
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