4: Destinados à algema
Sete novos delinquentes. Sete novos concorrentes. Sete novas pessoas que estariam no caminho para a sétima fase. O novo grupo acabara de escolher seus apelidos e vestir seus uniformes. Havia uma diversificação de quase todas as cores nas vestimentas dos novatos, menos roxo, a única cor que ainda ninguém foi visto com. Os jovens já presentes no pátio se aproximaram dos novos, com a exceção do menino isolado, que permaneceu em seu canto.
- Só pode ser brincadeira, mais SETE? – Kraken comentou, reclamando com os recém-chegados.
- Vão acabar lotando esse maldito lugar de gente – Eco falou, pela primeira vez, revelando uma voz sem emoção.
- Cacete... outra criança! – Caz expôs a presença da pequena menina, e foi mal olhado por V.
A garota, apelidada de "Dama", recebeu os olhares de todos, e uma cena acaba por se repetir.
- É, uma criança. E daí, amigo? – Lobo, um adolescente de cabelo comprido, na altura de seu queixo, com um olhar de reprovação, questionou Caz, ao mesmo tempo que posicionou sua mão no peito de Dama, a empurrando para trás, e ficando em sua frente.
- Bom, é algo inesperado, né? – Caz respondeu, olhando para seu irmão, que balançou a cabeça horizontalmente. – Mas já parece que virou algo normal, afinal, nós temos a nossa criança também.
- Ele não é a criança de ninguém, Caz – V afirmou, de braços cruzados, então direcionou seus olhos frios para o gêmeo, acompanhados de uma expressão fechada. – Você não aprendeu nada com o que eu falei antes?
- Foi mal, é só que é um negócio que eu não esperava ser tão casual aqui – Caz tentou se defender – Fala sério, na idade deles eu comia areia, e não saía cometendo crimes.
A fala de Caz atingiu Ino, porém, o garoto não precisou se pronunciar, pois, rapidamente, V rebateu, soltando seus braços, e encarando o gêmeo profundamente, mais do que antes.
- Não sei se você sabe, mas nem todo mundo aqui é culpado do que está sendo acusado. Acho que tem a mínima noção de como a Absolvição funciona, então não importa se tu seja culpado ou inocente, se é acusado de ter feito algo ilegal, vem parar aqui, e só tem o direito de ser julgado caso sobreviva até o final.
Caz se manteve calado, sem mais nenhum argumento, e Primo fez o mesmo. Sabia que seu irmão estava errado, e tentar defendê-lo seria insistir no erro.
- Para falar a verdade, o mais incomum aqui nem são as crianças – Lobo expressou. – Vocês dois que são – então apontou com seu dedo para Caz e Primo.
- É, somos irmãos gêmeos – Primo começou a explicar, apressadamente, como forma de pular aquele assunto. – Vivemos nossa vida inteira sem ninguém descobrir, mas fomos expostos, então acabamos aqui.
- Nossos apelidos, inclusive, são por causa disso – Caz tornou a falar. – O meu é Caz, como abreviação de "caçula", e Primo é para "primogênito", saca? Porque ele nasceu um pouco antes de mim – o gêmeo mais novo explicou como se fosse a coisa mais divertida que poderiam ouvir.
- A verdade é que ambos deveriam estar mortos – Kraken declarou sua opinião, e a maioria virou a cara, cansados de ouvir, novamente, seu discurso de ódio. – Estamos em um mundo sofrendo de superpopulação, e o fato de AMBOS terem uma chance de viver é falta de respeito. Sempre que é descoberto que uma mulher está grávida de gêmeos, o último a nascer é executado, e é isso que deveria ter acontecido. Mas a mãe dos japinhas decidiu ferrar mais ainda o planeta e esconder isso de todos.
- PORRA, CHEGA! – Primo cortou Kraken. – Nós não te fizemos nada, seu racistinha de merda. Nossa mãe era a mulher mais corajosa que eu já conheci. Foi uma verdadeira guerreira por ter conseguido esconder isso do governo. Éramos os filhos dela, como que poderia deixar que um de nós fosse morto? Ela pagou pelo o que fez. Nosso pai também. Ambos foram executados por terem tido a gente em segredo. Agora abandona esse teu falatório preconceituoso, que ninguém aqui quer ouvir.
- Ele está certo – uma voz masculina foi escutada, entre os novos delinquentes, e surpreendeu todos, que não esperavam que alguém poderia concordar com Kraken. – Vocês comeram em dobro, usaram em dobro, gastaram em dobro, enquanto grande parte da população sofre por não ter o que comer, ou um lugar para dormir, ou remédios para comprar. Os pais de vocês foram verdadeiros covardes, isso sim – O adolescente apelidado de "Orion" desabafou seu pensamento.
- Quer saber? – Eco iniciou sua confissão. – É, eles estão certos. Se alguém aqui merece viver menos que os outros, são vocês. Ou, pelo menos, o último a nascer, como é a lei. Logo, o tal de Caz ali deveria ser quem parte primeiro.
- Isso só pode ser piada, como é a LEI? – Primo voltou a falar, após pensar de que não precisaria mais. – Agora vocês querem seguir a lei? Deixem de ser um bando de hipócritas, e vão se ferrar. – Dirigiu seu xingamento ao trio que acabara de expressar a opinião, e se afastou dos delinquentes reunidos, sendo seguido por Caz, que foi embora com uma expressão pensativa no rosto.
- Oi, menininha – Júpiter se abaixou, levemente, para falar com Dama, que permanecia atrás de Lobo. – Você quer ficar longe de toda essa gritaria? – Sugeriu, com um tom amigável.
- Ela não é um bebê, sabia? Não precisa falar com essa voz infantil – Lobo interferiu, se aproximando de Júpiter.
- Eu sei, apenas estou tentando afastá-la de presenciar mais discussões. Caramba, é uma criança, não precisa ficar vendo um bando de gente gritando uns com os outros – Júpiter falou, ao ficar ereta, para fitar Lobo.
- Ela já é bem grandinha. Não precisa de ninguém para dizer o que deve ou não fazer.
- Até porque é uma criança de vermelho, né? – Cabrón murmurou para Roma, porém, em um breve momento de silêncio, o que o fez ser ouvido e receber a atenção de todos. – Ô merda...
- O que você quer dizer com isso? – Lobo questionou Cabrón, que deu um passo para trás, se mantendo calado. – Está se referindo aos detalhes da roupa, né? Eu fiquei curioso mesmo para saber do que isso se tratava. Agora, vai, conta.
Lobo pressionou Cabrón para falar sobre uma informação que ele não sabia por completo. Assim como Kraken e Eco, Lobo vestia laranja, que era a cor mais ausente nos uniformes daqueles jovens, sendo seguida por amarelo, empregada por Wish, Faith, Cabrón e duas recém-chegadas, Libra e Alma; verde, usada pelos gêmeos, Roma, Júpiter, o menino isolado, e uma recém-chegada, Neve; e vermelho, por último, como a cor mais presente, que Ino, V, Hope, Lotus, Ares, e três recém-chegados, Dama, Orion, e Kant, possuíam em suas vestimentas.
- É... então, na verdade eu não sei por completo a respeito disso não. Quem comentou sobre as cores foi a ruiva ali – Cabrón indicou Faith, que se contorceu internamente, já que torcera para não virar a protagonista daquele assunto.
"Será que com a pressão de todo mundo querer saber das informações que tem, ela vai contar algo?" – Ino voltou com seus pensamentos, depois de um longo momento apenas observando, discretamente, Dama, e se perguntando se ela poderia ser uma aliada ali. Afinal, os fatores que possuíam em comum poderiam facilitar para que uma conexão fosse criada entre os dois.
- Como é? – Kraken proferiu. – Conta direito o que vocês sabem, mexicano.
- Eu não sei nada, só comentei sobre a cor porque ela tinha dito algo sobre representar um crime ruim aqui – Cabrón explicou, querendo se livrar logo da atenção que recebera de Kraken, e arrependido pelo comentário que havia feito.
- Então bora, ruivinha, conta aí o que tu sabe.
- Eu... – Faith iniciou sua fala, mas foi cortada por Hope.
- Ela não precisa contar nada, falou? Vocês que se ferrem, porque não vamos expor o que sabemos.
- Ninguém falou contigo, garota – Eco se expressou, fazendo a testa de Hope vincar.
- Então vocês realmente sabem de informações... – Kraken disse, com um tom curioso.
- É injusto não compartilhar o que você sabe. Faith, certo? - Eco disse, ao olhar para o uniforme de Faith, e confirmar seu apelido, pela etiqueta. - Olha, se eu tivesse no teu lugar, diria tudo logo, ou isso pode acabar sendo uma complicação pro teu lado.
- A gente não quer nenhum problema. Por favor, apenas nos deixem em paz – Wish pediu, com seu tom amigável, para Eco e Kraken, mas pareceu ser completamente ignorada pela dupla, que continuou fitando Faith, no aguardo de uma resposta dela.
- ATENÇÃO! – Uma voz nunca ouvida antes, por nenhum dos delinquentes, se apresentou. – A... – Uma pequena pausa ocorreu. – Primeira fase da... – E novamente. – Sétima Absolvição do ano de... 2035 terá início em... 14 minutos.
Os delinquentes não sabiam dizer se se tratava de uma voz feminina ou masculina. Parecia ter um tom robótico, mas suave. Era difícil perceber ser uma transmissão programada. O comunicado já havia sido roteirizado e os únicos elementos que mudavam, de uma fala para outra, era o que deixava notável que não se tratava de uma pessoa falando.
- Caramba, realmente vai começar... – Cabrón falou, voltando a ficar inquieto. – Eu não acho que tô pronto.
O semblante dos jovens mudou completamente. A tristeza nublou as expressões de alguns, enquanto outros foram tomados pelo medo e a insegurança.
"Está prestes a começar. Nós temos chances? Por mais que uns aqui pareçam estar mais assustados do que eu, ainda me sinto o mais propício a morrer. Sou frágil, vulnerável, limitado, e completamente incapaz de me defender. O que vou fazer se alguém como o Roma tentar me matar? Já disse que ele parece ser gentil, e chegou a defender o Primo do Kraken, mas vai que ele enlouquece e tenta algo contra mim. Além que tem o tal do Ares, que estava aqui antes mesmo da gente chegar, e eu não vi ele falar sequer uma palavra. Um peteleco dele e eu me quebro inteiro. A Eco também estava caladona até os novos delinquentes chegarem, e eu preferia que tivesse ficado. Concordou com o pensamento do Kraken e do Orion, o que não me agrada nem um pouco. Podem formar o trio dos idiotas, e enquanto isso, eu permaneço sozinho" – Ino tornou a temer seu estado. Segundo o comunicado da Absolvição, a primeira fase se iniciaria em instantes, mas ninguém ainda sabia do que se tratava.
- Tá bom, deu. Conta logo o que tu sabe que vai rolar aqui – Kraken ordenou, ao se aproximar de Faith, a encarando nos olhos, e lhe transmitindo todo seu ódio e rancor que tem guardado dentro de si.
- Se afasta da gente. Agora – Wish confrontou Kraken, e ele riu, por esperar que ela apenas tentasse uma abordagem pacífica com ele.
- Ou o quê? Vai chamar os guardinhas pra defender vocês? NÃO! Não vai! E você sabe porquê. Todo mundo aqui sabe. Estamos sozinhos a partir de agora. Se eu quiser, posso quebrar a merda do teu pescoço na frente da tua amiga pra fazer ela falar, mas vamo ver se eu realmente preciso fazer isso, ou ela vai ser uma boa cadelinha e fazer o que eu... – Kraken foi interrompido por um soco que acertou sua nuca, vindo de trás, o jogando para a frente.
As três amigas abriram passagem, rapidamente, fazendo Kraken cair na grama, e ele se manteve no chão, com sua cabeça balançando, o deixando completamente tonto e desnorteado.
- É isso que tu ganha por ser um completo imbecil – Roma, o responsável por agredir Kraken, se pronunciou. – Agora, se alguém mais quiser um pouco disso, é só falar.
"Bom, eu não quero. Se ele me dá um soco desses, no mínimo, eu morro"
Eco e Orion, que anteriormente haviam concordado com Kraken, se mantiveram calados, evitando contato visual com Roma.
"Quem diria que o garoto que eu nem havia notado na sala de espera, por parecer ser uma estátua, fez isso. Se eu tenho alguma chance de chegar até a sétima fase, é ao lado dele. Notei que Cabrón tem ficado colado com Roma, talvez pense igual a mim, e só o esteja usando. Devem ter se aproximado por terem ficado no mesmo grupo de nomeação, e eu poderia usar essa desculpa para me enturmar com eles. Como meu irmão costumava dizer, quem não tenta... quem não arrisca... sei lá, tinha algum ditado assim"
- Seu covarde de merda. Bater por trás é fácil, né? – Kraken disse, indignado.
- Covarde é tu, parceiro – Roma respondeu. – Além de que por onde eu batesse em ti, você acabaria no chão. Fala sério, é mais fino que uma folha.
- Vocês todos... – Kraken começou a falar, se levantando, com a mão na cabeça, que parecia que iria explodir, de tanta dor, pelos dois socos que já havia levado. - ...irão se arrepender. Mais tarde, também vão querer saber tudo que as coleguinhas aqui sabem, e vão notar que deveriam ter ficado do meu lado. Podem tentar manter a máscara de bons samaritanos, fingir que só vão fazer o certo aqui, sonhar que irão se redimir, mas isso vai custar a vida de cada um. Pra chegar à sétima fase vai ser necessário que cruzem inúmeras linhas. Guardem minhas palavras. Os que chegarem ao final comigo verão o quanto eu estava certo.
Kraken se afastou, mais uma vez, da aglomeração. Era notável que andava lentamente para não cambalear e cair no chão. O encontro do punho de Roma com sua nuca havia deixado uma marca nele, que não seria esquecida tão cedo pelo delinquente.
- ATENÇÃO! – Um segundo comunicado da Absolvição se iniciou. – Formação de duplas para a primeira fase. Algemas serão enviadas para o pátio de preparação, e precisarão ser colocadas nos pulsos dos delinquentes que a irão compor. Qualquer tentativa de roubo ou de facilitar a prova, resultará na eliminação dos dois jovens que a compõe. Todos terão os 12 minutos restantes para se preparar.
- Duplas? – Eco questionou, irritada, em voz alta. - Tá de brincadeira, né? Você sabia dessa também? – Então encaminhou sua pergunta à Faith.
- Não, - Faith respondeu, com uma expressão de quem estava tão perdida quanto os outros. – meu pai nunca me contou sobre formação de duplas.
- Não dá pra usar completamente as informações que ela tem. É só pensar – Lobo comunicou. – Se foi o pai dela quem participou de uma Absolvição, e lhe contou as coisas, faz, no mínimo, mais de 15 anos que ele passou por onde nós estamos agora. O que significa que é muito tempo para que mudanças ocorram. Deve estar tudo praticamente novo.
"Faz sentido, as histórias do pai de Faith já devem estar com validade vencida. Eu chutaria que a Absolvição deve mudar de ano em ano, tendo cada um, uma maneira diferente de lidar com os delinquentes. Talvez ela não seja tão importante assim para eu me aproximar"
- ATENÇÃO! – E a voz retornou. – O anuncio das duplas ocorrerá imediatamente – Os delinquentes se surpreenderam por se tratar de um sorteio. Não poderiam escolher quem seria seu parceiro, e isso, para muitos, foi considerado como algo péssimo. Então, sem enrolação, se deu início – Alma e Neve, Ares e Caz, Cabrón e Lotus, Dama e Eco, Faith e Wish, Hope e V, Ino e Lobo, Júpiter e Orion, Kant e Kraken, Libra e Roma, Primo e Seis – O anuncio foi feito rapidamente, dando tempo apenas dos jovens escutarem seu apelido e o apelido de quem o acompanharia, na primeira fase, sem poderem raciocinar muito a respeito das outras duplas formadas.
Wish e Faith escutaram seus nomes juntos. Haviam tido a sorte de serem uma dupla, e se abraçaram, imediatamente, comemorando, enquanto Hope permaneceu imóvel, ao escutar que faria dupla com V.
Antes que outros pudessem reagir, o portão na parede de pedras brilhou. A luz acertou em cheio os olhos de quem estava de frente para ela, deixando-os temporariamente cegos, devido à forte luminosidade. Todos fecharam os olhos, e apenas ouviram algo se juntar a eles, no pátio, vindo do portão, que teve sua luz apagada, em seguida. Quando voltaram a enxergar, se aproximaram do carrinho de mão deixado no pátio, contendo 11 algemas, que sabiam bem para que seriam usadas.
"As algemas... ótimo. Estou sendo acusado de algo que não fiz, e além de me obrigarem a lutar pela minha vida aqui, também preciso ficar preso com outro delinquente. Pelo menos o meu pareceu ser gentil, já que foi quem defendeu Dama quando Caz voltou a perturbar. Talvez tenham feito essa fase dessa forma para mostrar que alguns aqui apenas estão destinados à algema. Mas eu não. Não vou me acostumar a usar esse negócio no meu braço. Provarei a todos que estou aqui por causa do sistema ser falho. Quero ver a cara do juiz quando me inocentar e pedir desculpas pelo engano. Eu não estou destinado à algema, estou destinado à liberdade"
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