73
Dormir foi um desafio. Passei a noite inteira me remexendo na cama, em busca de alguma posição adequada, mas meu corpo estava inquieto demais para adormecer. Não me surpreendi quando o despertador tocou e eu só tinha conseguido tirar um cochilo. Meu corpo reclamou quando espreguicei, insatisfeito por ter que sair do conforto da cama e com um pouco de cansaço o abatendo.
Empurrei o cansaço para o lado. Levantei no meu antigo horário habitual, motivada a reestabelecer uma rotina mais saudável e responsável. Se eu fosse ser contratada naquele emprego não poderia perder o costume de acordar cedo.
Me arrastei para a cozinha, motivada a tomar o café mais forte o possível, preferencialmente sem açúcar. Liguei a cafeteira, coloquei a água e o pó, apertei o botão e deixei que a tecnologia fizesse o resto. Enquanto aguardava o café ficar pronto, colocava os pães na torradeira.
Mesmo não estando em um bom-humor pela exaustão em meu corpo, tive que sorrir ao ver Lilly surgindo. Minha amiga estava animada e me abraçou fortemente logo ao me ver. Nem parecia que tínhamos passado a noite toda conversando e trocando as novidades.
Ontem a escutei tagarelando sem parar sobre o encontro perfeito que teve com Luke Strawford. Ele tinha alugado um helicóptero somente para levá-la a um restaurante conceitual em outra cidade. Não interrompi Lilly durante sua narração. Ela parecia feliz demais com esse novo relacionamento. Tentei não expressar minha decepção ao saber que ela finalmente estava conseguindo superar Will, enquanto nosso amigo tinha tido a capacidade de admitir que continha sentimentos por ela, mas havia feito aquilo para a pessoa errada. Agora eu era responsável por guardar o segredo de ambos. Ok, já tinha dito a Will que Elizabeth gostava dele, mas como ela reagiria se eu a contasse aquilo? Preferia não saber. Gostava de ver o quão feliz e leve Elizabeth estava.
Não tocamos no assunto sobre Sebastian Johnson ou Louis Turner, mas adormeci pensando sobre eles e o que deveria ser feito. Estava tentada a dar uma oportunidade a eles, principalmente a Sebastian. Talvez já tivesse chegado no limite para torturá-lo com a minha falta de notícias. Claro que ele sabia tudo sobre mim através de Lilly, mas ele insistia com as ligações, em uma tentativa frustrada de se explicar. Mas qual seria sua explicação? Uma parte minha não desejava ouvi-lo, mas a outra estava repleta de um medo inseguro. Eu tinha medo de uma pessoa sem rosto, que desejava me machucar apenas para atingir Sebastian Johnson. O que essa pessoa ganharia fazendo isso?
Quando esses pensamentos incômodos surgiam, da ideia absurda de alguém querer me machucar, eu os empurrava para o fundo da minha mente e tentava pensar em qualquer coisa para me distrair. Era em momentos como aquele que adorava ouvir o que Lilly tinha a dizer.
— Ansiosa? — perguntou minha amiga enquanto se servia do café fumegante. Estendi minha caneca para ser servida.
— Só um pouco! — Lilly me conhecia muito bem para saber que eu raramente bebia café, somente em que as noites eram uma luta contra a minha ansiedade.
— Vai dar tudo certo, Meli! — motivou ela, mais confiante do que eu.
Assenti, fingindo acreditar nela. Porém, honestamente, como eu responderia os questionamentos do entrevistador? Meu currículo seria bom o suficiente para ser considerado? Eu complementaria em algo para a empresa? E... E se eles questionassem o motivo da minha demissão do restaurante? Tentei pensar em todas as respostas possíveis, mas nenhuma parecia adequada. E se descobrissem a verdade? Não, impossível! As únicas pessoas que sabiam do meu envolvimento com Tom Flanagam eram eu e ele. E eu confiava que ele jamais espalharia isso para alguém, somente para ser cruel.
Mesmo estando magoada com a atitude do chef de cozinha, ainda acreditava que seus sentimentos eram reais. Se fossem... Bem, ele certamente não iria querer tornar a situação pior entre nós, certo? E ele ainda havia dito sobre me esperar... Mas eu já tinha tomado minha decisão, pensei.
Tirei as torradas da torradeira e as coloquei em um prato, para logo em seguida espalhar geleia sobre elas. Encarei Lilly, estranhando-a por não estar comendo nada, apenas bebericando o café.
— Não vai comer nada? — questionei, já mordendo um pedaço da torrada e engolindo com café. Contive uma careta pelo gosto amargo da bebida, mas teria que suportar caso quisesse me manter acordada durante a entrevista de emprego.
Lilly colocou sua caneca na pia, não a lavando — o que me causou mais estranhamento — e mordiscou o lábio inferior nervosamente.
— Meli... — começou ela, como se tomasse coragem para dizer algo. Tombei a cabeça, aguardando pacientemente, mas receosa com o que poderia ser dito. — Eu vou tomar o café da manhã com Luke...
— Certo... — estimulei para que ela continuasse a falar, sem entender o motivo para a hesitação. Não via problema em tomar o café da manhã com Luke Strawford.
— E ele vai me levar para conhecer a empresa dele... Porque ele me ofereceu uma vaga de emprego por lá — confessou Lilly, soando sem jeito.
Engoli o café, sem me importar em estar um pouco quente. Tive a sorte de não engasgar, mas finalmente compreendi o motivo de sua hesitação.
— Você vai sair da Johnson Enterprise?! — Eu estava em choque. Lilly trabalhou arduamente para entrar na empresa de Sebastian e, agora que tinha um cargo melhor, simplesmente havia decidido em aceitar a oferta para entrar em outra.
Ok, eu não poderia julgá-la, isso só a chatearia, mas tinha uma noção básica do quão grandioso era para o currículo de alguém trabalhar em uma das maiores empresas dos Estados Unidos como a Johnson Enterprise. E o quanto esforço requeria para conseguir tal feito.
— Ainda não é uma certeza, mas estou considerando... — Tentei controlar minha expressão, em uma tentativa de não demonstrar desagrado. Lilly era uma adulta e plenamente consciente de tomar decisões grandiosas como aquela. — Não me julgue, Meli. Sei que você está se controlando para não dizer algo. Mas acho que você sabe o quanto trabalhar na Johnson Enterprise deixou de ser um sonho para um fardo. Depois de tudo que passei lá, não sei se quero permanecer em um ambiente onde fui poucas vezes valorizada.
— Mas Sebastian lhe deu um cargo novo, com um salário melhor... Pensei que estivesse satisfeita com isso — falei.
Lilly se aproximou e tocou meu ombro com leveza.
— Luke está me fornecendo o mesmo. E eu quero fazer como você... Ter um recomeço, em um ambiente novo... E eu também poderei ficar mais perto dele. — Finalmente tinha entendido porque Lilly estava ponderando mudar de emprego. Ela queria ficar mais próxima de seu novo amor.
— Você sabe que misturar romance e trabalho pode não dar muito certo, não é? — a provoquei. Ora, eu não estava mentindo, certo? Tinha passado pelo mesmo e o resultado não foi um dos melhores, porém, ela não sabia de toda verdade.
Minha amiga deu uma risadinha, o rosto ficando avermelhado. Antes dela inventar alguma desculpa para refutar minha provocação, seu celular tocou, demonstrando que uma nova mensagem havia chegado.
— É ele! — disse ela, expressando um sorriso de animação. — Me deseje sorte!
— Acho que você não precisa de sorte! — comentei, caçoando, enquanto Lilly me esmagava em um abraço antes de partir.
— Então, imagino que você também não! — brincou ela, pegando seu casaco e terminando de se ajeitar. — Como estou?
Lancei um olhar sério para Lilly, como se a estivesse avaliando. Lilly usava uma saia preta e uma camisa de seda azul. Ela parecia uma mulher de negócios. Eu gostava da aparência dela e como ficava bonita usando qualquer coisa. Hoje, diferente dos outros dias em que ia trabalhar, estava com o cabelo solto, caindo como uma cascata em seus ombros e costas.
— Perfeita! — Ela deu um aceno com a mão, constrangida pelo meu elogio direto. Aproveitei para completar, dizendo: — Mas acho que Luke não vai se preocupar muito com o que você está usando, já que ele irá arrancar todas as peças do seu corpo!
Lilly soltou um gritinho, mas envergonhada. Quando estava prestes a fechar a porta, decidiu dizer mais uma coisa, ignorando meu comentário ousado:
— Aliás, não se esqueça de... — Todavia, antes que ela completasse sua frase, meu celular instantaneamente começou a tocar. Nós duas encaramos o aparelho sobre a bancada da cozinha, e mesmo preferindo ignorar, sabíamos quem era o responsável por ligar naquele horário. — Atenda-o, por favor!
Ela fechou a porta, sem completar sua frase. Mas eu sabia o que Lilly queria dizer. Para eu não esquecer de pensar sobre resolver meus problemas com Sebastian... E Louis. E na noite passada eu realmente tinha considerado em seguir outro conselho, o do doutor Charles, sobre lidar com os meus problemas ao em vez de ignorá-los. E talvez — só talvez — eu já tivesse torturado bastante Sebastian Johnson ao ignorá-lo durante todos aqueles dias.
Estendi meu braço e peguei o celular, atendendo a ligação antes que caísse na caixa postal. Com certeza deixei a pessoa do outro lado surpresa por ter atendido a ligação, pois ele nada disse inicialmente.
— Melissa? — Escutei meu nome sendo dito por aquela voz com acentuado sotaque britânico. Quis desligar a ligação pelo efeito que meu corpo teve ao simplesmente ouvir sua voz. Odiava a forma como ainda reagia a ela. Ainda assim, decidi seguir o conselho de Lilly e dar uma oportunidade para ouvir Sebastian.
— Sou eu — respondi. Ele soltou um suspiro de alívio, como se tivesse aquele tempo todo prendendo a respiração. — O que você quer comigo, já que não para de me ligar?
— Eu gostaria de conversar com você — confessou ele, soando receoso. Era estranho ouvi-lo agindo daquela maneira, mesmo por ligação. Por um instante a imagem de homem inabalável desapareceu da minha mente e imaginei um Sebastian adolescente, que reagia ansioso e sem jeito toda vez que ia falar com alguém. Da mesma forma que tinha agido em seu discurso após receber o prêmio.
— Seja breve, então, pois estou um pouco ocupada — proferi, tentando agir como se não me importasse.
— Não por aqui. Gostaria de conversar com você pessoalmente. — Somente a ideia de encontrá-lo pessoalmente me causou mais aflição. Talvez eu não estivesse preparada para aquilo.
— Não acho que seja uma boa ideia... — Tentei negar, mas fui interrompida.
— Por favor, Melissa — suplicou Sebastian. Por favor? Sebastian Johnson nunca usava essa palavra. Aparentemente ter essa conversa pessoalmente era importante para ele.
Mesmo desejando torturá-lo, uma parte minha quis mostrar a ele o quão firme me encontrava — mesmo não sendo verdade.
— Está bem... Aonde? — aceitei, ainda relutante.
— Na minha empresa, por favor. — Fiquei aliviada. Seria um lugar mais fácil para encontrá-lo, já que ir ao seu apartamento só traria à tona as lembranças do que havia acontecido por lá.
— Só poderei encontrá-lo mais tarde, depois do meu compromisso – justifiquei, bancando a difícil.
— Não pode ser agora? É realmente urgente, Melissa. — Eu quis xingá-lo por sempre querer que tudo fosse no momento que ele quisesse. Ora, eu também tinha minha vida e outras preocupações! — Meu motorista está a aguardando do lado de fora do seu prédio. Prometo que tentarei ser breve em nossa conversa.
Respirei fundo, cogitando sobre o que faria. Eu ainda tinha algumas horas antes de ir para o lugar que aconteceria minha entrevista. Se Sebastian realmente cumprisse com sua promessa, talvez desse tempo de ir diretamente da sua empresa para a minha entrevista.
— Certo, até logo. — Não aguardei por sua despedida. Desliguei a ligação antes que cogitasse mudar de ideia.
Eu teria que ficar cara a cara com Sebastian Johnson novamente, mais cedo do que esperava. Queria poder continuar fugindo dele, mas precisava recordar que não era ele quem queria me machucar... Mesmo não querendo admitir, sabia que ele estava tentando me proteger. Me proteger das consequências que estar com ele causava.
Percebendo que não me restava muito tempo, engoli o café e as torradas, e parti rumo ao meu quarto, decidida a vestir uma roupa apropriada para a entrevista... E mostrar a Sebastian que eu estava muito bem, obrigada.
Desde a minha experiência desagradável na minha última entrevista de emprego, eu tinha adquirido algumas roupas mais apropriadas para eventos como aquele. Não que eu esperasse ser demitida, mas sabia que ir a entrevistas de emprego era algo praticamente habitual da minha vida. Mesmo tendo sido contratada para trabalhar no restaurante Flanagan Garden, sempre me mantive insegura sobre permanecer no emprego. E você sabe muito bem o motivo! Os atrasos, as louças caras quebradas, o ódio pelo meu chefe... Bem, esse último talvez não fosse total verdade, mas naquela época eu acreditava que o odiava o suficiente para chegar um momento em pedir demissão — que você também sabe que tentei inúmeras vezes.
Eu tinha comprado um blazer preto e finalmente havia encontrado ocasião para usá-lo. Combinei a peça com uma calça preta, blusa social branca e sapatilhas. Fiz uma maquiagem básica, mas o suficiente para encobrir minhas olheiras das noites mal dormidas. O meu cabelo estava um pouco ajeitado, mas acabei por prender um lado para não ficar caindo em meu rosto. Teria que ser o suficiente, pois não tinha tempo para deixá-lo mais arrumado do que aquilo. Busquei pela minha bolsa, onde estava todos os meus pertences, como carteira e documentos, e recordei de tê-la jogado no armário de casacos. A encontrei por lá, mas ao em vez de verificar meus pertences, apenas joguei meu celular em seu interior e segui para fora do apartamento, sabendo que meu tempo estava curto. Mesmo Sebastian tendo prometido que nossa conversa seria breve, não poderia confiar completamente nele.
Talvez não olhar o interior da minha bolsa foi o que fez diferença em minha vida. Ou talvez não me serviu de nada. Quando eu pensava nisso, será que eu teria feito algo diferente? Será que teria retirado aquilo do interior da minha bolsa, preocupada com a responsabilidade de carregar algo daquele valor?
Mal sabia eu o quanto aquele maldito objeto tinha quase custado minha vida e a vida de outras pessoas.
De fato, o motorista de Sebastian estava me aguardando, mas o homem não estava sozinho e sim acompanhado também de um segurança, o mesmo que me levou outro dia a empresa. Adentrei o carro, sendo bem recepcionada pelos dois homens. Ambos não falaram nada durante o caminho, me dando privacidade para me frustrar com meus pensamentos.
O que Sebastian tinha a explicar? Eu já compreendia toda a situação e ele sabia como me sentia. Para mim, ainda queria evitá-lo de todas as formas possíveis. Temia ficar em sua presença e mudar de ideia em relação a me manter distante e com os sentimentos suprimidos a seu respeito.
Estaria mentindo se dissesse que meus sentimentos por ele teriam desaparecido da noite pro dia. Gostaria que fosse simples fazer um sentimento como a paixão desaparecer. Se nós seres humanos fossemos capazes de fazer isso, as coisas seriam mais simples. Ou não. Imaginar o mundo sem a existência do amor era complicado. É algo complicado. O amor sempre foi o argumento utilizado para motivar as pessoas, mas também sempre foi o argumento utilizado para ferir outras pessoas.
Sebastian tinha admitido ter sentimentos por mim, mas agiu errado ao esconder a verdade sobre o acidente. Qual argumento ele utilizaria para justificar tal atitude? Amor?
E Louis? Uma parte minha ainda se sentia usada pelo escritor, mas quando mais pensava no que havia dito na noite passada, sobre desistir do livro por minha amizade... Minha amizade valia tanto a ponto de ele tomar aquela decisão? Lilly caçoou dizendo que ele não faria aquilo somente por medo de perder minha amizade, mas sim de me perder... O que também não fazia sentido, pois ainda recordava dele ter dito que eu não fazia seu tipo. Ou talvez Louis, assim como eu em relação à Sebastian, tinha percebido seus sentimentos tarde demais?
E mesmo que fosse real, que houvesse sentimentos além de amizade, não poderia vê-lo de outra forma. Minha concepção inteira tinha mudado ao seu respeito, mas quando eu pensava em dar um fim em nossa curta amizade, me sentia incomodada. Honestamente, gostava das sensações que Louis me proporcionava, como no nosso primeiro abraço, logo após nosso encontro no café. E mesmo querendo o odiar, sabia também do significado que seus livros causavam em minha vida, me estimulando a permanecer com o sonho de ser escritora. Porém, esse sonho era praticamente inexistente, pois haviam coisas mais importantes com o que me preocupar.
Sim, eu deveria dar uma chance de ouvir a explicação de Louis, assim como estava fazendo com Sebastian. Contudo, faria aquilo em outro momento, talvez depois de minha entrevista. Não queria me preocupar com outra coisa para acabar me distraindo. Precisaria estar focada durante a entrevista de emprego. Aquela era uma chance rara e talvez uma das poucas oportunidades que eu tinha de recomeço. Quem iria aceitar contratar uma garota com um currículo não tão interessante? A única coisa que me ajudava a ser contratada era minha motivação e otimismo, o que eu não tinha muito no momento.
Mais rápido do que eu esperava, o carro foi estacionado diante do prédio da Johnson Enterprise. Me questionei por um segundo se Elizabeth já teria chegado ao trabalho ou se preferira faltar para considerar a proposta de Luke Strawford. Ainda considerava insana sua ideia de mudar de empresa, mas não poderia ir contra ela. Prometi sempre a apoiar meus amigos, independentemente de suas escolhas, assim como eles faziam comigo. Talvez fosse uma boa decisão ela sair da empresa, pois assim me ajudaria a desfazer a relação com Sebastian.
Claro que ainda havia aquele maldito contrato, mas em nenhuma das cláusulas dizia sobre correr risco de vida ao namorar o CEO. Talvez aquela conversa seria a minha oportunidade de acabar com aquele relacionamento falso, pensei. A chance de tentar romper com os sentimentos que permaneciam insistentes em meu interior, e que não me ajudariam de nada.
Atravessei a entrada da empresa e segui até o elevador, ainda acompanhada do segurança. Tive a impressão que o homem estava mais atento, com os olhos fixos em mim, temendo que eu tentasse outra fuga. Mas mesmo que eu considerasse fugir, minhas pernas encontravam-se fracas demais para tal feito, principalmente quando as portas do elevador se abriram no andar do escritório do CEO.
Andei mais devagar, tendo plena noção que estava há poucos metros de Sebastian Johnson. A poucos segundos de revê-lo após dias turbulentos. Após tê-lo confortado, beijado, tocado e sentido o prazer de estar em seus braços. Após finalmente ter admitido meus sentimentos e o escutado fazer o mesmo. Eu quis fugir sim, mas temia tanto o que havia do lado de fora daquele prédio, distante da proteção que o segurança me fornecia, assim como as paredes do prédio.
O segurança abriu a porta, permitindo que eu entrasse. Ele não me acompanhou e pressupus que Sebastian tivesse ordenado para sermos deixados a sós.
Meus olhos foram imediatamente em sua direção, tomados por uma expectativa contida. O CEO estava diferente da última vez que o tinha visto. Suas belas feições estavam tomadas por uma expressão de cansaço e o vinco em suas sobrancelhas não parecia pertencer a aquele lugar. Preocupação, percebi. Porém, aquela expressão não era desconhecida por mim. Eu a tinha visto uma vez, quando acordei do coma após o acidente. Mas diferente daquela vez, ele não estava tentando esconder o quão afetado encontrava-se pela aflição que o tomava. Quis sentir pena dele, mas eu também passava pela mesma situação. Eu tinha medo todos os dias, de algo ou alguém, que simplesmente queria me machucar por ser querida demais para ele. Isso não era justo.
— Melissa — disse Sebastian, não controlando o alívio em sua voz logo ao me ver. Ele deu um passo adiante, como se desejasse vir em minha direção, mas ergui a mão em um movimento instintivo, não desejando que ele se aproximasse.
— Não se aproxime, por favor. Estou aqui, como você me pediu, mas meu tempo é curto, por isso peço que seja breve. — Minhas palavras, mesmo não sendo ofensivas, o atingiram como um soco no estômago, deixando-o com uma expressão de desconforto.
— Claro, Melissa. Serei breve, como prometi, mas peço que se sente, por favor. — Mantive meus braços cruzados, em uma tentativa de demonstrar que não iria obedecê-lo, mesmo pedindo por favor. — Estou lhe dizendo isso porque considero o melhor a ser feito. Tenho receio de como pode reagir as minhas palavras.
— Você não acha que eu seja forte? — retruquei, tentando bancar a inabalável.
— Pelo contrário, a considero extremamente forte, dado ao que você já passou... — Pisquei, sem entender ao que ele se referia. Ao acidente? Ou Sebastian sabia muito mais da minha vida do que eu imaginava? Preferi não discutir. Relembrei a mim que deveria agir com maturidade.
Sentei-me e cruzei as pernas, não largando a minha bolsa e a mantendo próximo. Sebastian a olhou por alguns segundos e depois voltou seus olhos verdes para mim.
— Pronto, estou sentada — proferi, não controlando o sarcasmo em minha voz.
Sebastian se encontrava atrás de sua mesa, ainda em pé. Diferente de mim, ele permaneceu daquela maneira.
— Eu sei que você deve me odiar, Melissa, e tem muitos motivos para se sentir dessa forma... Mas não posso começar a me explicar sem pedir por seu perdão — iniciou ele. Quis revirar os olhos para demonstrar o quanto seu discurso me irritava, mas não pude agir de tal maneira ao ouvir como sua voz soava embargada. Ele não estava gaguejando, mas imaginei o quanto tinha se preparado para ter aquela conversa. E também recordei da forma que ele agiu, gaguejando ao me encontrar parada do lado de fora do seu escritório, sem saber como argumentar sobre o que eu havia ouvido. — E vou compreender se você não quiser me perdoar, mas não posso deixar de pedir por isso. É injusto o que causei a você... E nada que eu diga ou faça irá mudar a forma que você se sente. Ou o que aconteceu.
— Bom que sabe disso — falei, amarguradamente.
— Ao menos pode considerar em me perdoar?
Quase soltei uma risada em deboche, mas a controlei. Maturidade, Melissa. Até porque minha risada não seria em divertimento. Honestamente, eu temia começar a chorar a qualquer momento.
— Desde quando Sebastian Johnson pede por perdão? — refutei, séria. Aquele questionamento o afetou, mas não da forma que eu esperava. Um pequeno sorriso surgiu em seus lábios, como se também não acreditasse que estivesse fazendo aquilo.
— Eu não sou o mesmo Sebastian de algumas semanas atrás — argumentou. Mesmo sabendo que aquele não era o assunto da nossa conversa, o provoquei:
— Ah, não? Então, você mudou, de repente?
Os olhos verdes não se desviaram de mim, como se refletisse bastante sobre o que havia acabado de ser questionado.
— Não... Mas acho que isso aconteceu mais rápido do que eu esperava... — Arqueei as sobrancelhas, ainda o observando sem entender sua resposta. No entanto, ele me surpreendeu, completando-a: — Você me mudou, Melissa.
Dessa vez não pude controlar o riso. Aquilo soava como uma grande piada. Eu o mudei? Nunca! Eu não poderia aceitar aquela resposta.
— Não, Sebastian, eu não o mudei. Na verdade, mulher nenhuma tem a obrigação de mudar um homem, e eu finalmente percebi isso. Se você tivesse realmente mudado, não teria mentido pra mim, não teria tentado controlar a minha vida, usando de argumento a minha segurança somente para me manter presa a você, para que não se sentisse tão culpado se algo ruim acontecesse comigo — soltei, não controlando mais minha mágoa.
— Não diga isso, Melissa, porque não é verdade...
— Você não conseguiria conviver com a culpa, caso eu morresse, certo? Por isso fez com que todos aqueles seguranças se mantivessem em minha porta, mantendo-se atentos a cada movimento que eu fizesse! — Quis tomar mais uma das minhas atitudes impulsivas e sair dali, daquele escritório. Segurei os braços da poltrona com firmeza e respirei fundo, em uma tentativa de talvez não pular em seu pescoço. Eu estava com tanta raiva, principalmente de mim, que queria encontrar alguém para culpar. E esse alguém era ele. Porém, aparentemente ele já estava fazendo aquilo consigo.
— Não, eu não teria conseguido conviver com a culpa. Por isso eu me preocupo tanto com você... Na verdade, me sinto muito culpado por saber que sou responsável pelo seu sofrimento, pelo acidente, pelo seu medo — confessou ele.
— Eu não estou com medo — neguei. Certo, eu estava mentindo, mas não queria parecer fraca.
— Mas eu estou... — Ouvi-lo dizendo aquilo me causou surpresa. Sebastian Johnson com medo? Ele não poderia sentir medo! Não quando tinha dezenas de seguranças a sua volta, um império a sua volta, toda a segurança que quisesse. —... De te perder, Melissa.
Finalmente entendi o motivo de seu medo. E era estranho pensar por ser minha causa.
— Eu nunca pertenci a você para poder me perder — contra ataquei.
— Ainda assim, mesmo sabendo que você nunca foi minha e talvez nunca venha a ser, eu estou com muito medo do que pode acontecer com você... Se eu não mantê-la próxima a mim — justificou o CEO.
Para mim aquilo soava mais como culpa do que medo. Ou preocupação.
— O seu medo é ter seu maravilhoso nome manchado... Aposto que não gostaria de ser considerado o culpado pela morte de sua namorada. Seria uma péssima imagem para os seus negócios — soei feroz, meus olhos fixos para observar a reação do CEO as minhas palavras.
— Pouco me importa a porcaria do meu nome ou os meus negócios! — disse ele, ficando alterado. — Mas sim, eu me importaria muito se você morresse, e por isso farei qualquer coisa para mantê-la viva, nem que tenha de aprisioná-la a mim!
— Você não pode fazer isso! — o acusei, sendo a minha vez de ficar alterada.
— Se você não aceitar meus termos, é o que farei!
— Novamente vai querer que eu assine um contrato? Que eu me lembre, não havia nenhuma cláusula no contrato que dizia algo sobre eu correr risco de vida ou sobre alguém tentar me assassinar! — retruquei, agora não omitindo minha fúria.
— Bom, pelo que eu saiba, nós também não seguimos nenhuma das cláusulas, fazendo o inverso do que estava escrito lá! — proferiu ele. Dessa vez não tive argumentos para contra atacá-lo, e nem podia, porque nós dois pensamos na mesma coisa. No que havia acontecido em seu apartamento, envolvendo declarações, beijos e... Bem, muita coisa.
Sebastian saiu de trás da sua mesa, e mesmo desejando ficar longe dele, veio para meu lado, ficando mais perto do que eu gostaria. E eu sabia que a proximidade entre nós dois não funcionava. Sempre algum de nós tomava uma decisão errada, e alguém inevitavelmente saía machucado — fisicamente ou emocionalmente.
— Não me arrependo do que aconteceu em meu apartamento, Melissa, e muito menos sobre ter quebrado aquelas malditas cláusulas. Sabemos muito bem que esse contrato não é mais válido, afinal, fomos incapazes de controlar nossos sentimentos... E se você quiser, eu o rasgo imediatamente, aqui, diante de você. — A proposta de Sebastian era tentadora. Aquele contrato era a única coisa que ainda me prendia a ele. Bem, eu sabia que estava mentindo ao pensar que era a única coisa que nos prendia um ao outro... Ele estava certo, fomos incapazes de controlar nossos sentimentos. E estávamos presos a eles também.
— Em que isso vai me servir, se para alguém nesse mundo sou considerada a coisa mais estimada por você? Minha vida irá continuar em perigo, certo? — Finalmente cheguei ao ponto que ele queria conversar.
O CEO se apoiou em sua mesa, decidido a permanecer próximo demais para o meu gosto.
— A única forma de resolver isso, a longo prazo, é fazer como eu disse. Não quero prendê-la a mim ou privá-la de liberdade, mas pelo menos por enquanto necessito que siga algumas regras... — Fiquei tentada a refutá-lo, mas não tinha argumento. E aquilo era sério demais para que eu debochasse. — E uma delas é aceitar minha proteção... Melissa, preciso que a partir de agora aceite ser acompanhada pelos meus seguranças. Mas não somente um, prefiro que esteja acompanhada de um pequeno grupo e... — Ele hesitou, como se o que fosse pedir a seguir seria um pouco complicado. —... E que aceite ficar em meu apartamento até que tudo se resolva.
— Você está falando sério? E-eu... Não quero ter que dividir o mesmo teto com você! — Minha negação se devia obviamente pelo receio de quais seriam as consequências em ficar no mesmo ambiente que Sebastian Johnson... Principalmente em morar juntos. O que poderia acontecer se nos víssemos todos os dias?
— Eu sei que a ideia não é satisfatória, mas o lugar mais seguro para você estar é em meu apartamento. É mais fácil de ser protegido e a entrada e saída de pessoas é monitorada. Ninguém estranho vai entrar sem ser notado... — Eu não queria ter que ficar ouvindo os pontos positivos sobre me mudar, mesmo que temporariamente, para seu apartamento.
— E a minha liberdade? Eu não vou poder sair de seu apartamento? Eu tenho uma vida, sabia?! E amigos! O que meus amigos irão pensar de mim? — Finalmente uma peça se encaixou em meu cérebro quando mencionei meus amigos. Adicionei: — E a segurança de Lilly e Will? E se eles também estiverem correndo risco de vida?
Sebastian respirou fundo, tentando controlar o seu humor pela minha remessa de perguntas.
— Você não irá perder sua liberdade e ainda assim poderá sair. Eu sei que tem uma vida, mas todas as suas saídas serão mais restritas, talvez tenha que evitar frequentar ambientes não muito seguros, como uma boate, mas precisará ser acompanhada pelos seguranças — respondeu o CEO. Todavia, ainda assim minha liberdade não era a maior das minhas preocupações. — E sobre seus amigos... — Não gostei do momento de hesitação, mas o olhei fixamente, aguardando sua próxima resposta: — Eles também estão sendo monitorados, mas talvez precisem ser alertados sobre a necessidade de tomar mais cuidado. Creio que a vida deles não esteja em risco, já que o foco desse indivíduo é em me atingir, e é você quem ele quer... Machucar.
Não gostei da forma que ele soou. Uma parte minha encontrava-se aliviada por finalmente poder contar a Will e Lilly o motivo de minha aflição, mas a outra se amedrontava mais ao pensar no quanto a minha vida estava em risco.
— E todas essas precauções e cuidados com a minha segurança... Por quanto tempo eu devo tolerar isso?
Aparentemente Sebastian não estava ansioso em responder aquele questionamento. Ele finalmente se distanciou, ajeitando as abotoaduras de sua camisa, como se fossem as coisas mais interessantes. Porém, durou pouco tempo até seus olhos verdes voltarem a encontrar os meus, como se fossem incapazes de ficarem distantes do meu rosto.
— É um plano a longo prazo... Até que a identidade do indivíduo por trás do acidente seja descoberta... Até que consigamos... — O CEO hesitou novamente, tentando buscar a palavra mais apropriada para completar suas intenções com o indivíduo que desejava me machucar.
— Matá-lo? — pressupus, recordando da conversa com o detetive em seu escritório. Sebastian não queria envolver a polícia, pois suas intenções eram nem um pouco apropriadas. Ele não pretendia seguir a lei para punir essa pessoa.
— Puni-lo — contrapôs, não concordando com a minha escolha de palavra.
Me encolhi com a sensação que tomou meu corpo, com a ideia de haver alguém, sem um rosto, mais cheio de uma fúria inerente, buscando atingir Sebastian Johnson. Voltei a encarar o CEO imediatamente quando um novo questionamento rondou minha mente.
— Você tem alguma ideia de quem pode estar por trás disso... E por que estaria fazendo tudo isso para atingi-lo? — Foi perceptível o quanto ele gostaria de ter uma resposta certa para aquelas perguntas. E pela primeira vez notei Sebastian Johnson sem o controle sobre algo.
Eu pulei da poltrona quando sua mão esquerda acertou com força a mesa. Meu coração se acelerou em meu peito, assustado por aquele comportamento agressivo e raro de Sebastian. Nunca o vi daquela maneira... Frustrado e tenso.
— Me desculpe, Melissa, não queria assustá-la, mas... Me deixa aborrecido não ter respostas para suas dúvidas. — Sebastian passou a mão em seu cabelo, um gesto raro feito por ele, despenteando seus fios tão bem arrumados. — Mas sim, eu tenho uma ideia de quais pessoas poderiam estar por trás do acidente... E há muitos motivos para motivar alguém a tentar me atingir...
— Por que você é tão odiado? — Não pude controlar tal pergunta. Sebastian poderia ser insuportável em alguns momentos, mas a ponto de alguém querer me matar por ser sua namorada?
Ele soltou um riso, e não era de divertimento.
— Bem, eu já fiz muitas coisas que causaram desagrado em algumas pessoas... Não sei se você sabe, mas eu fiz uma empresa falir apenas para fazer meu pai perder muito dinheiro... E não foi somente ele quem perdeu muito dinheiro. Outras pessoas também. Devo admitir que foi uma decisão completamente imatura, apenas em busca de vingança... — Sim, eu sabia daqui, pois Seth havia me contado, mas não tinha noção do quanto aquilo poderia voltar para assombrar Sebastian, e principalmente a mim. O CEO cerrou o punho esquerdo, observando sua mão avermelhada pelo soco na mesa, e completou, surpreendendo-me mais: —... Mas eu não me arrependo, Melissa.
Engoli em seco. Ele deveria se arrepender, pensei. E naquele momento percebi que ele estava enganando a si ao dizer que eu o tinha mudado. Não. Sebastian Johnson só seria capaz de mudar se admitisse seus erros. O pai dele merecia ser punido, mas não precisava fazer o mesmo com outras pessoas, que não tinham nada a ver com a relação doentia entre pai e filho.
— E você acha que pode ser seu pai por trás disso? — Para mim foi difícil fazer tal pergunta. O pai dele o odiava tanto a ponto de querer minha morte? Se sim, Seth poderia estar envolvido também?
— Não tenho certeza, mas eu tenho uma equipe trabalhando e focada em encontrar quem pode estar por trás disso. Pelo menos nessa parte você pode ficar tranquila... Somente preciso que você siga as regras que lhe informei. — Como se fosse simples, pensei. Ao menos Lilly e Will também ficariam seguros. A parte difícil seria contar tudo aquilo a eles. Como meus amigos reagiriam? — Melissa... — O olhei ao ouvir meu nome sendo dito por aquela voz e o acentuado sotaque britânico. — Sei o quanto isso pode ser difícil para você, mas insisto que ao menos pela primeira vez aceite me obedecer. Não estou pedindo isso porque quero ter controle sobre você... É porque eu prefiro mantê-la próxima a mim, de todas as formas possíveis, mesmo que acabe me odiando, do que conviver sabendo que a fiz sofrer mais ou... Ou que causei a sua morte.
Morte. Eu realmente não estava vivendo em uma comédia romântica. Isso não existia em comédias românticas, certo? A mocinha nunca morria. Ela poderia até correr risco de vida, mas sempre era salva pelo cavalheiro — na armadura de prata e montado em seu cavalo branco ou usando um terno de marca e em seu carro importado. Mas se eu terminasse sendo assassinada, minha história não seria em nada um romance e sim um suspense. Preferia que se tornasse um livro de autoajuda do que aquilo.
— Eu irei aceitar suas regras — concordei. Era uma surpresa para mim, mas somente eu sabia o quanto era sentir medo, ter que verificar todas as janelas e portas, ficar assustada com o vento batendo a janela. Não queria ter que continuar vivendo daquela forma. Preferia ter que suportar conviver com Sebastian Johnson do que ter uma arma apontada para minha cabeça.
Um sorriso de alívio perpassou pelo rosto do CEO. Eu não pude retribuir tal sorriso, porque não havia alívio. Sebastian sempre seria uma lembrança de uma insegurança que nunca imaginei viver. E bem em meu interior desejei que aquilo mudasse. Eu não tinha medo de Sebastian, mas das consequências que poderia sofrer por estar com ele... Por amá-lo. E também desejei que ele fosse capaz de perceber seu próprio erro. Nada que eu fizesse seria capaz de mudá-lo. Tal feito dependia somente dele.
— Obrigado, Melissa. Prometo que não irei complicar a situação — disse ele. Havia sinceridade em seu tom, o que me transmitiu mais confiança.
Fiquei de pé, percebendo que finalmente havia concluído nossa conversa — que havia durado mais tempo que eu esperava. Antes de partir, o olhei diretamente, observando seu semblante cansado sendo coberto por uma máscara de alívio não duradoura.
— Sebastian — chamei-o, mas não era necessário. Seus olhos ainda estavam fixos em mim, se recusando a afastá-los, atento a cada expressão e movimento que eu fazia. — Tenho um último pedido a fazer para você...
— Se estiver no meu alcance. — Sim, estava, pensei.
— Pode, por favor, proteger meus pais e minhas irmãs? Eu tenho medo do que pode acontecer com eles, mesmo talvez eles não correndo risco algum... Não sei se eu seria capaz de conviver com a culpa de fazê-los sofrer... — Meu pedido afetou Sebastian, mesmo não tendo essa finalidade. Diferente dele, eu tinha muitas pessoas com a qual me importar.
Ele assentiu, para logo em seguida me dar sua palavra de que os protegeria. Confiei nele. Aquilo era a única coisa que eu poderia fazer, pois estava fora do meu alcance intervir diretamente.
Sabia que Sebastian Johnson tinha dinheiro o suficiente para contratar um exército de seguranças. E se ele realmente importava comigo, como dizia, deveria saber que eu me importava com outras pessoas.
Pensei nos outros clichês. Pensei em Tom, Alex, Louis, no Doutor Charles e até mesmo em Jacob... Será que eles estariam seguros? A única forma de mantê-los seguros seria me distanciar deles. Enquanto eu ficasse longe deles, ninguém suspeitaria do quão importante cada um deles era e foi para mim.
— Meus seguranças a estão aguardando lá embaixo — avisou Sebastian. Assenti, mas fui incapaz de formular um agradecimento. — Boa sorte na sua entrevista, Melissa.
Travei quando coloquei a mão sobre a maçaneta da porta. Como Sebastian sabia sobre a entrevista? Será que ele tinha alguma coisa a ver com aquilo? Quis questionar, mas preferi não arranjar motivos para discutir. Certamente ficaria furiosa se soubesse que havia alguma intervenção sua em relação a aquilo. Se houvesse, o que eu faria? Eu precisava do emprego, de qualquer forma. Eu precisava do dinheiro para tirar minha mãe daquela casa, daquela cidade, e lhe ofertar uma vida melhor. Engoli meu orgulho e falei:
— Obrigada.
Fechei a porta atrás de mim, sem olhá-lo uma última vez. Mesmo sabendo que passaríamos os próximos dias, talvez semanas e meses — fora de cogitação a ideia de passar anos — ao seu lado, dividindo o mesmo apartamento, nunca me senti tão distante dele. Eu não conseguia fazer um comentário provocativo, xingá-lo, ou sorrir apaixonadamente. Todos esses sentimentos foram suprimidos pelo medo esmagador que tomava meu peito. O medo pela minha vida, a vida dos meus amigos, das pessoas que amava. Mas uma coisa era certa, eu também temia pela vida de Sebastian. Eu não conseguiria conviver comigo mesma se o perdesse, sendo a causadora de sua morte.
Sair do escritório do CEO não me trouxe alívio. Meus ombros permaneceram pesados, com a sensação inquietante de algo à espreita. E realmente havia alguém à espreita. Não saber o que seria de mim, o meu futuro incerto, me frustrava a cada minuto. Meu coração batia ansioso, e eu só queria que ele se acalmasse. Ficar ansiosa em nada me ajudaria durante a entrevista, somente me atrapalharia a ter um bom desempenho.
O segurança me seguiu até o elevador. Passamos pela secretária, que me deu um sorriso, mas fui incapaz de retribuir. E eu desejava sorrir. Necessitava. Precisa demonstrar ser forte. Pelos próximos dias que passaria com Sebastian não poderia permitir que visse o quanto encontrava-me afetada por toda aquela situação.
Adentramos o elevador e apertei o botão para o térreo. Talvez quanto mais ficasse distante daquele prédio, mais me sentiria melhor. Comecei a respirar fundo, buscando algo em minha mente para me tranquilizar. Havia sim motivos para me sentir aliviada. Lilly e Will também seriam protegidos, assim como minha família. Todavia, meus amigos mereciam saber a verdade. Por um momento cogitei em retirar o celular da bolsa e fazer uma ligação para Lilly. Se ela estivesse na empresa, poderia já dar aquela notícia imediatamente. Preferia fazer aquilo pessoalmente do que por mensagem ou ligação. Mas como o tempo era curto, decidi deixar isso para fazer mais tarde. No entanto, tal decisão não faria nenhuma diferença.
Meu celular tocou no interior da bolsa, fazendo-me assustar com o som repentino no ambiente silencioso. Enfiei minha mão na bolsa e envolvi meus dedos no aparelho, já trazendo-o diante de mim e visualizando a tela. O nome de Lilly brilhava no visor trincado. Estranhei o motivo de sua ligação repentina. Talvez ela tivesse ficado sabendo que eu estava na empresa? Ela desejava contar sua decisão final? Teria escolhido ir trabalhar para Luke Strawford?
Achei melhor atender a ligação ao em vez de ficar criando teorias. Coloquei o aparelho próximo à orelha e falei, tentando soar animada para saber qualquer novidade que fosse me contar:
— Ei, Lilly, já está no trabalho ou está me ligando para contar alguma novidade?! — Aguardei por sua resposta, sentindo-me mais tranquila por estar falando com alguém confiável, e ansiosa para contar a verdade. Porém, aquele não era o momento correto.
Elizabeth não falou nada imediatamente. Escutei uma respiração pesada e depois de alguns segundos uma voz masculina disse:
— Nós pegamos sua amiga Elizabeth. Ela está conosco e é melhor não dar um pio sobre isso, senão vamos machucá-la. — Imaginei por um segundo que se tratasse de uma piada de mau gosto. Mas era o número de Lilly e eu a conhecia bem para saber que jamais brincaria com algo tão sério.
Meus olhos dispararam imediatamente para o segurança ao meu lado. O que eu deveria fazer? Alertá-lo? Ele me ajudaria em algo? A resposta para aquele questionamento veio a seguir.
— Se você contar algo para os seguranças ou ao seu namoradinho, com certeza nunca mais irá ver sua amiga... Está me ouvindo? — Não consegui emitir uma palavra. Parecia que minha garganta tinha se fechado, impedindo que qualquer som fosse emitido. — Responda!
— S-sim... — gaguejei, usando de toda energia possível para conseguir emitir aquela simples palavra.
O segurança me olhou, ainda atento a qualquer movimento meu. Controlei minha expressão, temendo estar parecendo assustada demais. Se eles suspeitassem de algo, poderiam tentar intervir naquela ligação e Lilly sairia machucada.
— Ótimo. Agora você deve fazer o que mandarmos, está entendendo? — sentenciou o homem.
Eu nunca me imaginei passando por tal situação. Eu estava sendo ameaçada... Chantageada pela segurança de Elizabeth. Aquilo era real ou eu tinha chegado a um nível insano de loucura?
— Sim — falei, controlando minha voz para não soar embargada.
— Sabemos que você está na Johnson Enterprise. Por isso, quando sair do prédio, você não deve ir com seus seguranças. — Quando o escutei dizendo aquilo, ao mesmo tempo as portas do elevador se abriram.
Me deparei com a entrada deslumbrante do prédio, algumas pessoas circulando por ali, seguindo com suas vidas como se nada de ruim estivesse acontecendo. Mas comigo acontecia algo terrível. Lilly. Eu só conseguia pensar em minha amiga e o que deveria fazer.
Eu deveria obedecê-los. Era a única forma de manter a segurança dela.
O segurança saiu do elevador e aguardou que eu o seguisse. Hesitei. Minhas pernas subitamente tinham ficado fracas, como se eu tivesse perdido a capacidade de movimentá-las.
— Srta. Fontoura? — chamou-me o segurança. Estranhei o fato daquele desconhecido saber meu nome sem ao menos ter me apresentado. Mas ele provavelmente sabia tudo sobre a minha vida. Era seu trabalho, recordei.
— Saia do prédio, Melissa — ordenou o homem. Estranhei ainda mais ser chamada pelo primeiro nome por alguém que somente era constituído por uma voz em minha imaginação. Uma voz que nunca tinha escutado em toda a minha vida.
Não disse nada. Sai do elevador e fui acompanhada pelo segurança até nos encontrarmos do lado de fora do prédio, num dia relativamente quente da primavera.
— Estamos te vendo — alertou a voz no telefonema. Meus olhos vagaram com urgência para todos os lados, a procura de alguém. Mas como eu poderia identificar uma pessoa que nunca tinha visto? Decidi buscar por alguém ao telefone, mas isso era como procurar uma agulha no palheiro. Haviam dezenas de pessoas ao telefone em Nova Iorque. Como eu poderia saber qual seria a responsável por estar me manipulando? — Haja com naturalidade. Não deixe seus seguranças suspeitarem de nada, ou você sabe o que pode acontecer com sua amiguinha.
Controlei minha expressão, temendo demonstrar meu medo. Se eles suspeitassem de algo, o bem-estar de Elizabeth iria por água abaixo.
— O que você quer? — Tomei coragem para perguntar, mas a resposta era óbvia.
Continuei percorrendo com o olhar toda a visão que tinha diante de mim. Das ruas movimentadas, calçadas apinhadas de gente. Nada fora do normal no centro de Manhattan.
— Queremos você, Melissa. — Eu deveria ter pressuposto tal resposta antes de perguntar.
Eles tinham sido mais espertos do que eu. Tinham conseguido pegar alguém que eu considerava importante demais, justamente com a finalidade de me atrair até eles. Aparentemente atingir Sebastian era muito importante, a ponto de querer machucar duas pessoas. Lilly não tinha nada a ver com Sebastian, mas ela tinha tudo a ver comigo. Para controlar Sebastian me usariam, para controlar a mim usariam Lilly. No fim das contas, todos sairiam machucados.
— O que eu devo fazer? — Sabia que aquela era a pergunta certa a ser feita, que foi prontamente respondida.
— Há uma van preta estacionada diante do prédio, a poucos metros de onde você está. Preciso que se afaste dos seus seguranças. Invente qualquer desculpa para eles não a seguirem e venha até aqui — mandou o homem misterioso. Meus olhos vagaram até o segurança, ainda aguardando que eu o acompanhasse.
Tudo parecia passar lentamente. O tempo, principalmente. Engoli em seco e tentei suavizar minha expressão.
— Claro, Lilly! — Tentei soar entusiasmada e ergui meu dedo para o segurança, pedindo por um minuto de privacidade. — Preciso falar com a minha amiga, ok? É algo muito importante e gostaria de um pouco de espaço!
Movimentei minha mão, pedindo que ele se afastasse. O segurança não pareceu muito satisfeito com a minha ordem.
— Estarei a esperando no carro — avisou ele, se retirando como pedi.
Acompanhei o segurança se afastando, se unindo a um grupo de outros homens trajando terno. Era verdade então, percebi. Sebastian colocaria na minha cola um grupo de seguranças apenas para minha proteção. Mas era tarde demais. Aquele grupo deveria estar protegendo Lilly, não a mim. Nada valeria me proteger, se eu não quisesse ser protegida. Aquela era a única chance que eu tinha para conseguir fazer o que homem da ligação havia me ordenado.
Procurei a tal van preta e ela realmente encontrava-se ali. Um automóvel como aquele poderia facilmente passar despercebido no meio de tantos carros em Nova Iorque.
Dei o primeiro passo em direção a van, descendo as escadas diante do prédio, e atravessando a calçada aos poucos. Meu pé hesitou por um segundo quando um pensamento incomodo surgiu: e se fosse mentira? E se eles não tivessem pegado Elizabeth, mas sim somente seu celular? Não havia nada que comprovasse que ela tinha sido sequestrada por eles. Decidi desafiá-lo.
— Como você quer que eu acredite que realmente está com a minha amiga? — Talvez o maior erro meu foi ter feito aquele questionamento.
O homem não disse nada, e nem precisou, pois escutei algo que respondia minha dúvida.
— Meli... — Lilly chamou meu nome, a voz embargada, quase soando estrangulada. Eles a estavam controlando para que não gritasse. E aquela era a voz dela.
Mesmo não gostando de estar errada, eu reconheceria a voz de Lilly em qualquer lugar. Era minha amiga que eles tinham pego. E eles tinham a possibilidade de fazer qualquer mal contra ela.
Eu não sabia como reagir. Lágrimas formaram em meus olhos, mas as controlei para que não fossem derramadas. Eu queria chorar pela minha amiga, por estar causando aquilo a ela, quando sempre prezei por seu bem-estar. Novamente, por minha culpa, eu a estava fazendo sofrer. E isso estava acontecendo porque tomei a decisão errada semanas atrás. Porque agi impulsivamente. Porque eu era uma completa idiota. No entanto, me martirizar não resolveria a situação.
Eu era impulsiva sim, e deveria usar aquela característica ao meu favor. Se Elizabeth estava correndo risco de vida, pouco me importava em deixar Sebastian Johnson convivendo com a dor de me perder. Eu não poderia conviver com a dor de perder Elizabeth. Ela me valia mais do que qualquer coisa na minha vida.
Naquele momento um filme passou em minha cabeça. Todos os bons momentos ao lado da minha melhor amiga, a pessoa que confiei meus segredos mais obscuros, que consolou-me durante as crises de choro, que perdoou meus erros, e salvou minha vida. E como eu retribuía tudo isso? Colocando-a em uma terrível situação, que custaria sua vida.
E uma coisa era certa: Lilly valia mais do que a mim. Portanto, se fosse para alguém sofrer ali, preferiria que fosse eu do que a ela.
Terminei de cruzar a calçada em direção a van preta. No instante que estava próxima o suficiente, a porta deslizou, abrindo-a. Tudo aconteceu muito rápido. Dois pares de braços me puxaram para o interior do veículo. Não pude reagir, muito menos me defender. Minhas mãos foram apartadas, e não consegui manter meus dedos segurando o aparelho celular. Escutei quando o mesmo caiu no chão, sobre a calçada. O celular não me valia de nada, mas certamente compreendi o motivo de ter sido descartado daquela maneira. Era uma das formas que eu poderia ser rastreada por Sebastian Johnson e sua equipe.
Eu enxerguei o interior do veículo por um momento, mas não pude visualizar o rosto dos sequestradores, pois estavam cobertos por máscaras que deixavam somente seus olhos visíveis. Porém, meus olhos buscaram por Lilly e a encontraram ali, encolhida em um canto da van, as mãos atadas por uma abraçadeira e a cabeça coberta por um saco preto.
Escutei a porta da van sendo fechada com um baque forte. Fui empurrada em um dos bancos, minhas mãos unidas e sendo aprisionadas como a de Lilly. Tentei visualizar algo que fosse reconhecido por mim. Encarei o rosto do sequestrador mais próximo, tentando identificar alguma familiaridade em seus olhos, mas nunca tinha visto aquelas íris antes. Minha cabeça foi coberta por um saco preto e fui sentenciada a ficar presa, sem informações acerca do mundo lá fora.
Mas uma coisa eu sabia: eu tinha sido pega, assim como Elizabeth, e precisava pensar em alguma forma de livrar nós duas daquela situação. Ou ao menos conseguir livrar minha amiga. Se fosse para alguma de nós duas sair viva daquilo, seria ela.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro