Pedras na sua testa
2050 palavras de puro afeto juvenil e diversão embaraçosa.
Aproveitem ⏳
A câmera não era muito boa, o quarto de Polly estava com uma péssima iluminação e a reforma na casa ao lado poderia atrapalhar um pouco a gravação. Mesmo assim, aqui estavam eles...
— O que você quer que eu diga? — Polly pergunta ao melhor amigo, Mathias, escondido atrás da câmera.
— Fala sobre você — ele diz a ela, dando um zoom em seu rosto.
Polly revira os olhos castanhos, o movimento sendo pego na filmagem. Seus curtos cabelos castanhos balançando quando ela cruza os braços, os óculos de armação amarela escorrendo pelo nariz sardento.
— Eu sou uma menina — diz com impaciência.
— Alice no País das Maravilhas também era, agora diga algo novo para o público.
— Matt, isso é chato pra caralho — Polly bufa, girando em sua cadeira e jogando a cabeça para trás.
— Você não pode dizer essa palavra, isso tem que ser livre para todos os públicos — Mathias protesta, abaixando a câmera para que a garota veja seu olhar reprovador.
Mathias tem cabelos longos e castanhos, o qual gosta de amarrar em um coque atrás da cabeça. Ele possui olhos pretos e bochechas gordinhas que Polly gosta de apertar até ficarem vermelhas.
— Minha bunda é livre para todos os públicos — respondeu com um sorriso atrevido.
Mathias solta um som chocado e vira a câmera para si.
— Peço perdão por isso, senhores telespectadores, Polly é um pouco... Polly.
•••
— Começa falando seu nome — sussurra ao fundo.
— Eu sou Polly — Polly diz e revira os olhos novamente.
— Bom! E quantos anos você tem, Polly?
— Por que está me perguntando isso? Você sabe a resposta...
Mathias franze o cenho, gesticulando para que Polly pare de ser uma chata, a gravação vai demorar um século se ela não cooperar.
— Tenho dezesseis.
— Quinze — Mathias corrige.
— Faço dezesseis em sete dias!
— Oito dias.
— Hoje não conta — Polly berra mal humorada.
— Conta sim — ele abaixa a câmera para corrigir a garota.
•••
Quando a gravação volta, vemos Polly digitando algo no computador, ela parece concentrada. Mathias passa algum tempo filmando, esperando que Polly fale ou faça alguma coisa. Em certo momento, ela conserta a coluna e desvia o olhar da tela, olhando para Mathias com explícito tédio.
— Não quero fazer isso.
— Vamos lá, isso é importante para mim — Mathias insiste.
Polly passa mais algum tempo sendo filmada, dessa vez olhando direto para a câmera. Ela parece pensar e depois de algum tempo ela diz:
— Tudo bem... Desculpa.
•••
Polly volta a olhar para a câmera, ela está sentada na cama, tem as pernas cruzadas e um urso de pelúcia marrom repousa em seu colo.
— Eu gosto de invadir casas, mas não para roubar, eu não sou esse tipo de adolescente — ela para um pouco, como se esperasse alguma reação de quem assisti-la no futuro. — Eu gosto da adrenalina, sabe? — pausa mais um pouco. — Eu já roubei um carro uma vez.
— É mentira! — Mathias fala no meio de sua pausa.
— Como você sabe? Você não estava lá — Polly cruza os braços de forma petulante e é a vez de Mathias revirar os olhos.
— Eu sei tudo sobre você — ele diz e os dois ficam em silêncio, porque essa é uma frase estranha de se dizer.
Não deveria ser estranho. Eles se conhecem desde o fundamental, estão sempre juntos, se Polly roubasse um carro com toda certeza seria Matthias quem estaria no banco do carona. Ainda assim, foi estranho... Porque de todas as verdades que Polly sabe e Mathias quer esconder, é que ele está completamente apaixonado por ela.
•••
Polly ainda está na mesma posição quando Mathias reinicia a gravação.
— Eu gosto de música — continua como se não tivesse sido interrompida. — Eu canto e toco violão.
Polly morde o lábio inferior e olha na direção de Mathias com os olhos cerrados, expressão que ela só faz quando tem um dilema difícil.
•••
A imagem da câmera é focada no violão que Polly mantém ao lado da cama.
— Ei, Polly, o que é isso?
— Oh, isso? Essa coisinha velha?
— Sim, essa coisinha que claramente não é velha.
— Ora, Matthew, é um violão — Polly brinca, forçando uma voz boba que só se vê em comerciais de TV.
— Você vai tocar pra gente?
— Eu vou tocar para você.
— Espera, o quê?
•••
Polly agora está segurando o violão, o urso jogado ao fundo. Ela respira fundo e enxuga as mãos na calça de flanela rosa que está usando. Mathias está confuso, a câmera tremula um pouco e ele se pergunta o que está acontecendo, porque Polly nunca esteve tão nervosa para mostrar seus talentos no violão antes.
Um último suspiro é dado e ela começa a cantar, uma melodia suave e uma letra cheia de lembranças, uma velha canção dos Tribalistas que os dois ouviam no fim da tarde quando iam assistir a novela.
— Você é assim, um sonho pra mim — Polly canta com a mesma voz doce e tranquila de sempre, a voz que assola os sonhos de Mathias e preenche as horas do seu dia com alegria, mas há algo diferente. — E quando eu não te vejo... — talvez fosse o olhar intenso no rosto de Polly ou a falta de um familiar sorriso, talvez fosse a forma como sua voz falhava em ansiedade e suas mãos tremiam. — Eu gosto de você e gosto de ficar com você, meu riso é tão feliz contigo...
— Polly... — e Mathias tem que interrompê-la, porque de repente tudo isso parece sério demais, mais sério do que apenas Polly cantando uma canção boba para seu documentário bobo.
— Meu melhor amigo é o meu amor — continua e sua voz está tremendo e talvez haja algumas lágrimas nos cantos do olhos já que Mathias não está tendo exatamente a reação que ela esperava.
— Polly, para! — Mathias abaixa o braço que segura a câmera, a imagem caindo para o lado.
— Ei! — Polly reclama de algo, a música parando. — O que foi? Por que fez isso? Eu estava no meio de uma seresta aqui, sabia?
— Não pode fazer isso! — Mathias repreende irritado.
— Uma seresta?
— Brincar com meus sentimentos.
— Como assim? — ela parece confusa, mas... Não pode ser, pôde?
Polly sabia que Mathias gostava dela e deixou bem claro que não estava interessada em expandir o relacionamento deles, então ela não estava realmente se declarando estava? Porque Polly não gostava dele.
— Quer saber? Vai se fuder — Mathias explodiu, pegando a câmera e saindo do quarto.
— Matt! — ouvimos Polly chamar ao fundo.
•••
Mathias se afasta da câmera assim que a liga, sentando-se em uma cadeira e começando a falar.
— Tudo bem, meu nome é Mathias e eu estou gravando esse vídeo porque minha melhor amiga é uma idiota... — ele se interrompe, o plano era não falar sobre a Polly.
•••
— Meu nome é Mathias, eu tenho quinze anos e quero ser diretor de filmes de ação um dia, mesmo que a Polly ache que eu seria melhor dirigindo comédias românticas... — ele para. — Droga, eu falei nela de novo...
•••
— Eu... — sua voz trava, existe um nó em sua garganta. — Eu estou chateado com o que a Polly fez... — confessa baixinho, quase como se tivesse medo de ser escutado. — Ela sabe que eu gosto dela e ela fica zombando disso... — ele coça a cabeça e franze o cenho de forma confusa. — Ela estava... Só brincando, não é?
•••
Mathias não aguenta passar muito tempo longe de Polly. É por isso que ele começa a rever os vídeos que eles gravaram.
Esse em particular é interessante, Mathias não se lembra de tê-lo gravado, é apenas Polly, segurando a câmera de uma forma tão torta que só é possível ver os lábios dela e uma parte do pescoço.
— Oiii, Matt! E público imaginário! É a Polly aqui, quer dizer, é claro que é a Polly, quem mais seria? — ela brinca e Mathias realmente ri. — Matt, quando estiver vendo esse vídeo, espero que estejamos namorando — Polly faz uma pausa e Mathias também se engasga ao ouvir. — Quer dizer, você não precisa namorar comigo nem nada — ela solta uma risada estrangulada — A essa altura eu acho que já fiz minha seresta, então você já deve saber que eu gosto de você!
E eu sei que você também gosta de mim e eu sinto muito por demorado tanto para perceber que... — ela morde o lábio e um sorriso involuntário surge. — Você é o garoto certo Matt, sempre foi — a imagem muda e Mathias consegue ver os olhos emoldurados por óculos amarelos da amiga. — Somos bons amigos e eu pensei... — Mathias prende a respiração, sem saber como reagir a tudo isso. — E se fôssemos bons namorados?
— Polly? O que está fazendo com a minha câmera? — a voz dele na gravação é ouvida e Polly trata de desligar a câmera.
•••
Voltamos a apenas Mathias, que conseguiu parecer ainda mais triste.
— Então, parece que a Polly gosta mesmo de mim...
•••
A gravação retorna com Mathias posicionando a câmera em um pequeno muro, é possível ver um grande quintal gramado, uma casa ao fundo e Mathias traz uma violão em uma das mãos.
— Tudo bem — ele respira fundo. — Eu sei o quanto a Polly gosta dessas coisas românticas, mesmo que ela não admita, então eu vou fazer uma serenata sob o luar.
Mathias se vira na direção da casa, agachando-se para pegar algo no chão. Ele se levanta com uma das mãos cheias de pedrinhas, arruma sua calça jeans que está caindo e mira uma das pedras na direção da casa.
— Polly! Ei, Polly! — ele chama e arremessa uma pedrinha na janela do quarto da amiga.
Não funciona de primeira e Mathias joga mais e mais pedras.
— Matt? O que você está fazendo? — em algum momento Polly aparece na janela.
Mathias não consegue parar o movimento a tempo, seu braço já está lançando mais uma pedra e dessa vez ela acerta a testa de Polly, que cai para trás, desaparecendo da filmagem e da vista de Mathias.
— Ai meu... Polly? Merda! Polly! — Mathias se desespera, soltando o violão e as pedrinhas no chão, ele coloca as mãos na cabeça, dá uma volta ao redor de si mesmo e pega a câmera, correndo na direção da casa e socando a porta.
— Mathias? — é o pai de Polly quem abre.
Mathias não responde nada, entrando na casa e correndo para o quarto de Polly, ele abre a porta com violência e se desespera ao ver a garota jogada no chão do quarto.
— Polly, Polly, por favor me diz que você tá bem — se ajoelha ao seu lado, a câmera rolando pelo tapete.
— Matt? — Polly choraminga meia confusa com tudo.
— Tem sangue! Tem sangue pra todo lado!! — ele se desespera e sacode os ombros da garota, um filete pequeno de sangue escorrendo do lugar onde a pedra tocou.
É possível ver na gravação da câmera os pés do pai de Polly parados na porta do quarto.
— O que você fez com a minha filha? No que estava pensando, Mathias? — o homem pergunta em tom raivoso.
— Eu sinto muito, eu... É seu aniversário e eu estraguei tudo... Eu... Polly... — Mathias continua a se desesperar.
E apenas porque Polly tem certeza de que vai morrer por causa da sua CLARAMENTE GRAVE LESÃO NA CABEÇA ela diz:
— Eu amo você.
Mathias se engasga e precisa respirar fundo para tentar entender o que ouviu. Ela acabou de dizer... Ela disse mesmo...
— Mas eu te acertei com uma pedra — balbucia com confusão.
— Tudo bem.
— Eu não consegui fazer minha serenata, eu... Você merecia... Eu...
Polly revira os olhos e no canto da gravação conseguimos ver o momento exato em que ela se inclina para beijar o garoto. Mathias finalmente cala a boca e os pezinhos do pai de Polly batem no chão com impaciência, porque o fedelho do Mathias acaba de acertar sua menininha com uma pedra e agora está beijando ela?
— O hospital vai adorar te ouvir cantar pra mim — Polly diz após o beijo, porque é claro que ela quer ouvir a serenata de Mathias.
E apesar de não saber cantar tão bem, do seu violão ter sido roubado, o filme destruído, sua nova namorada ter levado cinco pontos na testa no dia do aniversário dela e seu sogro parecer odiá-lo, Mathias nunca esteve tão bem com a ideia de cantar para alguém, porque esse alguém é Polly e, como diz a letra, meu melhor amigo é o meu amor.
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