Capitulo 54 IV - Etapa um: Antidepressivos
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Uma semana depois...
Vejo os olhos da minha orientadora do grupo de apoio. Os lábios dela se mexem, bem devagar, enquanto ela vai explicando como será a rotina dessa semana.
- Vamos começar com você, Antonella. Já está pronta para falar? - Cristal pergunta, abrindo um sorriso gentil e perfeito.
Eu seguro firme a ponta do meu suéter preto, a cor predominantes que usei por toda semana. Preto não era só a cor do luto, porque eu não estava sofrendo pela morte de ninguém. Eu estava dizendo a mim mesma que era a última semana da escuridão que me envolvida.
Eu não a queria mais. Ela não morreu, eu também não a matei, mas decidi deixar ela ir embora depois de um tempo. Pode parecer maluquice, eu sei, mas ela era uma outra versão de mim que esteve comigo, me alimentando e me mantendo de pé.
Eu não podia ignora-la. Não podia negligenciar sua importância. Foi nela que eu me mantive forte, que caia e levantava. Ela merece o meu respeito e justamente por isso o preto nas roupas. Única forma digna de homenagea-la.
- Olá, me chamo Antonella. - Eu digo, parando de brincar com o meu suéter.
Olho para cada um das pessoas que estão numa espécie de círculo. Cada um deles começou a tomar antidepressivos no mesmo dia que eu, então foi bom entrar no grupo de apoio e ver que aquilo não só me afetou... eles também foram vítimas.
Vítimas do antidepressivo.
- Olá Antonella. - Todos dizem em unissom, eu respiro fundo abrindo um fraco sorriso.
Coragem, Anne. Você não fez e sofreu isso tudo para morrer no meio do caminho.
- Comecei a tomar antidepressivo a uma semana. - Eu começo dizendo, com a voz fraca. - Eu já sofri muito, mas nunca tinha ingerido essa droga!
Todos rirem, e eu tambem acabo soltando uma risada colocando o cabelo colorido demais para trás da orelha que cai em suaves cachos pelas costas.
- Lembro-me da primeira pílula que ingeri. - Eu digo passando a língua pelos lábios rececados. - Eu não senti nada, apenas o gosto amargo ficou na minha língua pelo resto da manhã. Mas a pílula da noite... mexeu comigo pela primeira vez.
Eu pauso. Respiro fundo, passando as mãos suadas pelo macacão jeans que está preso a minhas pernas magras, bem mais magras do que eu me lembro.
- Eu vomitei a noite inteira. Eu queria colocar aquele remédio para fora, mas ele foi a única coisa que não saiu de dentro de mim. - Eu digo contorcendo o rosto em uma cara de nojo. - Agnes, minha companheira e amiga de quarto, segurou os meus cabelos praticamente a noite toda. Eu a agradeço sempre por isso, porque eu estava me sentindo sozinha. - Eu digo abrindo um sorriso, sentindo as lágrimas caírem.
- Continue, Antonella. - Cristal, a orientadora diz segurando firme a minha mão, abrindo novamente o seu sorriso perfeito.
Eu a perguntei no primeiro dia que sentei nessa roda, nesse grupo de apoio. Como ela podia ser feliz? Como ela podia sorrir e ficar tão bem. Na verdade eu gritei com ela, e todos ficaram quietos, ela apenas disse, alguém precisa ser o pilar desse grupo.
- Na manhã seguinte, eu já estava com muito frio, não queria sair da cama. Não tinha forças. Não tinha vontade. Não tinha fome... - Eu digo e abro um sorriso. - Margarida me preparou uma sopa, foi a única comida que conseguiu ficar no meu estômago desde então.
Eu olho para os olhos de todos que estão ali, dando força para continuar a contar, a falar, a descrever os meus dias.
- Após a consulta com a Dra. Sansez, eu lembro que voltei para o quarto e o enfermeiro me fez tomar a pílula, mesmo eu me esperniando, mesmo eu gritando. Mesmo eu dizendo a ele que não conseguia. - Eu digo emocionada. - Não era olhos frios dele que me incomodavam, afinal era o trabalho dele garantir que eu tomasse os remédios. O que me incomodou foi minha reluta, eu nunca lidei bem com a dor, e naquele dia eu preferia tomar uma surra do meu pai do que tomar aquilo. - Eu digo, secando as lágrimas com lenços de papel que Doralice sempre trazia.
Doralice era uma adolescente com depressão. Ela foi mandada para cá após tentar se jogar na frente de um carro. Ela perdeu os pais num assalto no banco, não conseguiu lidar bem com o luto e a sua tia a internou aqui a pouco menos de dois meses.
Ela é alta, pescoço esguio. Está vestindo uma calça jeans, um tênis e uma blusa de manga grande. Seus cabelos loiros são escorridos, ela quase não consegue prende-los. As olheiras fundas ocultam seus olhos de esmeralda.
- Obrigada. - Eu a agradeço secando as lágrimas e asoando o nariz.
- Sempre que precisar. - Ela diz docemente.
- Naquela noite eu não tive nenhum pesadelo, era estranho não sonhar com nada. Era apenas eu e minha mente guerriando contra a vontade de desistir. Eu não podia deixar que ela ganhasse, porque eu não queria mais desistir! - Eu digo jogando o lenço no lixo que fica no meio da roda. - No outro dia eu levantei determinada a caminhar, a comer, a rir, a me divertir a não ir contra a nada, eu era a garota do sim naquele dia. - Eu digo rindo e todos me acompanham.
- Não deu certo com você também? - Lucas pergunta me encarando com seus olhos negros.
- Não. - Eu digo cabisbaixa.
- Lamento. - Todos dizem alto, eu digo após eles, baixinho.
- Eu mal consegui comer, uma coceira me deixava nervosa e muito vermelha. Fiquei na enfermaria, com a pele toda irritada. E cortaram as minhas unhas, envolveram cada uma das minhas mãos em uma tala para não me machucar. Veronica entendeu que não era uma tentativa raivosa de nada, e eu fiquei aliviada. - Eu digo e Megan me oferece um copo de água.
Após beber toda água, eu respiro, sentido-me melhor.
- Depois do quarto dia eu já não conseguia dormir, nem comer. O pouco da sopa que eu comia mexia tanto com o meu estômago que eu ficava horas com dores de barriga. Fora a diminuição estressante de peso, náuseas e tontura. Estava gritando por dentro algo do tipo: Você quer me matar ou me ajudar? - Eu digo e todos rirem.
- Fico aliviada de saber que é doloroso para todos. - Valquiria diz abrindo um sorriso triste.
A história dela é até engraçada, na verdade a palavra certa é inusitada. Ela foi separada da irmã gêmea Megan quando a mesma foi diagnosticada com bulimia. Valquiria não reagiu bem ficar longe da gêmea idêntica, então ela disse aos pais que iria se internar também.
Mas ela não tinha nenhum problema psicólogo diante da visão dos pais, eles apenas a ignoraram por meses. Ela estava sofrendo de depressão e saudades, e quando a situação estava bem crítica eles a colocaram aqui.
Elas estão na última etapa do progresso um, o que é uma boa notícia. Terão alta daqui a poucos dias.
- Agora parece que o remédio está fazendo efeito. As consultas com Veronica aumentaram de tempo, o que é ótimo. Sair agoniada de uma consulta de quinze a vinte minutos me deixava tão frustada, agora tenho quase uma hora para tagarelar. - Eu digo rindo e todos me acompanham. - Acordei hoje com fome, consegui me alimentar bem sem vomitar ou ficar presa no banheiro. Dei uma volta inteira no pátio sem sentir tontura ou náuseas. Hoje foi o primeiro dia bom nessa semana. - Eu digo e todos batem palmas.
Naquele dia eu não conseguia entender o porquê batinham palmas. Mas desde que entrei nesse grupo de apoio eu entendi que eles comemoram todas as vitórias, sejam elas grandes ou pequenas como a minha.
Todos juntam a mão ao se levantarem, mantendo o círculo. Antes eu os achava confusos, falsos até. Mas agora eu compreendo cada dor deles, mesmo a minha para mim ainda sendo confusa. Pelo menos eu entendo alguém.
No final de cada sessão em grupo, fazemos essa roda e dizemos em voz alta, como se fosse uma parte de oração o lema da clínica que também é o seu nome.
- Sobreviver não é o bastante.
Todos se abraçam e seguem na direção desejada. Eu caminho devagar pelo corredor, paro na sala de dança que também é a de lazer.
- Anne, aqui! - Agnes grita exageradamente agitando as mãos para atrair minha atenção.
Eu sigo na sua direção, mas paro ao ver os olhos dela. Meu corpo todo paralisa, minhas lágrimas incontroláveis caíem por meu rosto, eu ando rapido em sua direção e ela me envolve com seu braços.
- Me desculpa por tudo o que eu disse...
Seguro firme o corpo de Jane que também está chorando. Ela segura o meu rosto, com o olhar preocupado e assustado.
- Você está bem? Por que está desse jeito! - Ela me pergunta e eu seco suas lágrimas.
- Tá tudo bem, é só um remédio de merda. - Eu digo a ela que rir, e eu a puxo para senta onde Agnes guardava o lugar.
- Vou pegar algum doce para nos. - Agnes diz piscando para mim e se despede de Jane.
- Não rouba nada da cozinha, Agnes! - Eu digo a ela que dar de ombros e sai. - Ela tem umas mãozinhas nervosas. - Eu digo a Jane que se concentra em mim.
Depois do segundo dia, Jane veio me visitar. Eu falei tantas coisas maldosas para ela, disse para ela ir embora e nunca mais voltar. Ela ficou claramente triste e magoada, achei que ela nunca mais voltaria mesmo.
- Tá tudo bem...
- Não está! - Eu a interrompo segurando suas mãos. - O que eu disse a você não era verdade. Era um lado meu maldoso demais e eu sei que estou errada. Você sempre ficou ao meu lado, nos piores momentos, não merecia ter ouvido as palavras que eu disse num momento de fúria. Eu... estou controlando isso, resolvendo isso na terapia com Veronica. Eu nunca mais vou me comportar daquele jeito neurótico com você. Nunca mais! - Eu digo a ela que abre um sorriso.
- Eu... me separei do meu marido. - Ela diz calmamente. - Nisso você tinha razão, ele me tratava como lixo e ainda me traía. Estou bem melhor sem ele. - Ela diz com a voz magoada.
- Eu sinto muito, Jane. -
Eu a abraço forte. Aquele casamento da Jane já tinha acabado a muito tempo, eles morava em casas separadas e quase não se falavam. Ele só procurava ela para o sexo e isso ela não merece.
- Como está você e o Gabriel? - Jane pergunta segurando mais firme as minhas mãos.
Eu e o Gabriel...
- Normal - Eu digo a ela que me avalia com seus olhos. - Ele veio aqui, mas eu já estava mais calma, conversamos, rimos. Estamos normal. - Eu digo a ela.
Normal.
- Normal significa o que? - Ela me pergunta e eu rio.
- Bem, nada exagerado e forçado. - Eu digo a ela que continua a me investigar. - Ele ficou mais distante quando... tentou avançar as coisas e eu falei que não.
- Você disse não...
- Meu corpo está ou estava ligado ao Bernardo. Ainda não cheguei a essa etapa. Agnes diz que meu corpo quer um enquanto meu coração está tombado pro lado do outro. - Eu suspiro. - Mas não foi por isso que eu me internei, ao menos não a porcentagem toda. No momento eu tô focada com a minha saude mental. - Eu digo abrindo um sorriso.
- Estou até surpresa.
- Se você vier aqui amanhã, eu vou estar rabugenta. - Eu digo e ela rir. - É apenas um dia positivo e outro não. Um dia após o outro que dizem né?
Ela me puxa para um abraço apertado.
- Estou orgulhosa que depois de uma tempestade você continua a desbravar o oceano de emoções.
- Estou orgulhosa também, que ao menos eu estou tentando e cuidado de mim. - Eu digo encarando os seus olhos.
- Chega de choro e bora comer chocolate! - Agnes volta com vários tabletes de chocolate escondidos no casaco.
- Você...
- Fica calma, Magarida me deu porque vai vencer daqui a dois dias. - Ela diz piscando para mim e rimos dela.
Ela se joga no nosso meio, e ficamos ali comentando chocolates e jogando conversa fora.
Não revisado.
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