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Capitulo 42 II - Tive que seguir em frente

Maratona: Conhecendo o seu outro lado. Segundo capítulo.

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@nia_escarlate

Seis anos atrás...

Ele está demorando muito. — Eu digo já impaciente para Ananda que está devorando um sanduíche de queijo.

— A enfermeira deve ter tido um imprevisto. — Ananda explica após mastigar bem.

Eu olho para a morena, que suga o líquido do refrigerante pelo canudo, fazendo um barulho irritante.

— Não devia estar comendo as coisas do piquenique. — Eu digo e ela abre um sorriso.

— Não vai querer me ver com fome, Ella. — Ananda diz tentando ser ameaçadora e abocanha novamente seu sanduíche que parece realmente está com uma cara ótima.

Eu olho novamente o relógio do celular. Ele está uma hora atrasado. Espero que ele tenha um ótimo motivo, sabe o quanto eu odeio atrasos.

— Acho que tomei refrigerante demais. — Ananda diz se levantando. — Vou ao toallet, senhorita. — Ela diz fazendo reverência me arrancando um sorriso.

— Não demore muito, milady. Não é educado ficar horas no banheiro. — Eu digo me levantando também entrando na brincadeira dela.

Ela é uma excelente amiga, sabe que preciso me distraí um pouco. Relaxar.

— Não saiam sem mim pro piquenique. — Ela diz apontando o dedo pra mim.

— Como se você já não tivesse comido toda a cesta! — Eu grito enquanto ela vai caminhando para porta.

— Nossa, você percebeu que estava chovendo? — Ananda pergunta ao parar em frente a janela.

— Está chovendo? Será que...

Antonella! Não crie coisas na sua cabeça. Senta a bunda ali, e come um chocolate. Eu não demoro. — Ela manda com a voz mais seria e eu respiro fundo e faço o que ela disse.

Ela também não quer se preocupar, atoa. Mas é inevitável. Está chovendo muito, e daqui de dentro, na sala de estar, não pra ouvir o tanto de água que cai do céu escuro.

Dou uma generosa mordida em uma barra de chocolate enquanto disco o número decorado de Gabriel. Infelizmente cai na caixa postal. Eu reviro os olhos enquanto mastigo, e vou em direção a porta.

Algo dentro de mim está estranho. Meus pelos estão arrepiados, mesmo usando uma jaqueta. Quando abro a porta eu vejo o carro de Gabriel encostar na vaga, solto um suspiro de alívio e vou até a estrada o esperar após encostar a porta.

— Por que demorou tanto? — Eu pergunto preocupada.

— Vamos entrar, Antonella. — Ele diz passando por mim.

Eu seguro o seu braço o impedindo de andar, eu encaro os seus olhos marejados e raivosos. Algo dentro de mim se revira, nada está bem.

— O que aconteceu? — Eu pergunto à ele que fecha os olhos respirando fundo.

— É melhor entrarmos...

— Ananda está lá dentro, não quero a preocupar. Pode dizer o que for, Gabriel. — Eu digo soltando o seu braço ficando na frente dele. 

Flagrei o meu pai transando com... uma puta qualquer! — Ele diz nervoso. — Na nossa casa! — Ele diz e passa as mãos nos olhos enquanto olha para cima.

— Eu... sinto muito. — Eu digo com sinceridade.

— Essa não é a primeira vez que eu pego ele transando com outras. Esse é o motivo das nossas brigas! Ananda... Ela acha que é porque quero sair de casa. O que me preocupa é ela! — Ele diz nervoso, passando as mãos pelos cabelos.

— Ananda vai entender, Gab. Não precisa a proteger sempre. — Eu o aconselho e ele me encara.

— Se eu não fizer, quem vai? — Ele pergunta agora sério. — Minha mãe não liga para ela por que é adotada! Gina... nem se fala. Meu pai, está piorando na doença e acha que precisa enfiar o pau em todas as vaginas que ver pela frente... estou tão cansado. — Ele diz se sentando na cadeira branca que fica perto da porta.

— Ananda pode se proteger sozinha. Ainda tem eu. Eu vou proteger ela com unhas e dentes se for necessário. — Eu digo e ele solta uma risada.

— Eu sei que vai. — Ele diz e olha para frente.

Além disso, aconteceu mais alguma coisa que não quer me falar? — Eu pergunto ainda o sentindo tenso.

— Eu te amo. — Ele diz se levantando e ficando na minha frente. — Eu te amo muito...

— Parece que está se despedindo... — Eu comento baixinho.

— Eu nunca vou esquecer você. — Ele diz puxando o meu queixo para cima. — Porque eu te amo mais que tudo. É um sentimento tão... calmo. Tão sincero, tão genuíno. Espero que isso nunca mude, ao menos o meu não vai. — Ele diz com lágrimas nos olhos.

— Do que está falando? — Eu pergunto rindo. — Claro que meus sentimentos não vão mudar, Gab. Eu te amo. Sempre foi te amar. — Eu digo e quando ia beija-lo ele desvia.

— Meu pai ligou pro comandante do exército. Eles vão me buscar daqui a pouco.

Parece que tudo a minha volta parou. Não consigo acreditar que isso está acontecendo. Gabriel me envolve em um abraço apertado, suas mãos envolvem a minha cintura com delicadeza.

Minhas lágrimas jorram silenciosamente. Só é possível ouvir o som da chuva a nossa volta. Eu o empurro, para poder admirar o seu rosto que está vermelho.

Você tem que ir mesmo? — Eu pergunto nervosa. — Podemos falar com...

— Não. Já está decidido. — Ele me corta me dando um beijo no topo da cabeça.

Porque está tão estranho, irritado e grosseiro? — Eu pergunto a ele que não diz nada. — Eii, fala comigo. — Eu peço virando o seu rosto pro meu.

Eu não me apresentei ano passado. Eu... faltei. Fui no outro dia com um atestado médico que me fez não ser aceito. — Ele explica e eu o encaro confusa.

— Porque você... que dia era?

Ele coloca as mãos no bolso da jaqueta. E olha para o chão. Uma dor me consome por dentro, uma sensação de culpa me corrompe lentamente.

— Foi no dia da minha crise, não foi? — Eu o pergunto, ele me encara.

Não quero que se sinta culpada. — Ele diz e eu respiro fundo tentando controlar as lágrimas.

Você devia ter ido, Gabriel! Alyssa tem razão, eu sou a pedra que te afunda. — Eu digo indo para a chuva.

— Ella, onde vai? — Ele pergunta rindo atrás de mim.

— Embora! Eu não vou conseguir ficar aqui sem ser egoísta. Eu quase te pedi pra ficar, sendo que você já ficou. Por muito tempo. — Eu digo sinto as lágrimas se misturarem com a chuva grossa.

— Ella! A culpa não foi sua. — Ele diz segurando o meu braço.

— Mas foi por minha causa! Eu... não posso mais ser a pedra de ninguém. Vai embora! — Eu digo puxando o meu braço de volta.

— Eu não posso ir embora assim, Ella. — Ele diz e eu paro de andar. — Eu amo você! Eu nunca senti nada assim, e eu gosto de toda a confusão que você causa em minha vida. — Ele diz e eu comprimo os meus lábios para o choro não sair.

— Só vai... embora! — Eu digo me virando pra ele. — Acabou...

Eu não vou terminar com você, Ella. É apenas um ano. Um ano. — Ele diz se aproximando.

— Eu não quero ser egoísta...

Eu sou. Quando se trata de você eu sou sim egoísta. Eu vou voltar, Ella. — Ele diz parado em minha frente. — Por você eu vou voltar. Vou escrever várias cartas de amor, levar uma foto sua para admira a noite e de dia. Você vai estar sempre no meu coração. — Ele diz e eu quase me derreto em lágrimas.

— Você promete? — Eu pergunto a ele que abre um sorriso.

— Eu prometo se prometer ser minha pra sempre? — Ele pergunta enquanto se aproxima de mim.

— Eu prometo. — Eu digo e ele acaricia o meu rosto.

— Eu prometo. — Ele diz e seus lábios tocam os meus.

Mas, sem tudo são flores. Naquele tarde, após me despedir de Gabriel, eu senti que nunca mais o veria. A culpa por ter feito ele passar por isso, mas a dor da perda, me fez cair no poço de solidão extrema.

Eu peguei na adega de Valentina algumas garrafas de vinho. Reuni coragem e força para amenizar a minha dor. Quando enchi a taça com o líquido avermelhado puxado para o roxo, senti que estava desgraçado a minha vida conscientemente.

— Um brinde. — Eu digo a levantar a taça. — As ações que tomamos conscientemente e que a culpa não será de ninguém, além de mim mesma. Um brinde a solidão. — Eu digo fazendo o brinde com outra taça vazia em cima da balcão de mármore branco.

O líquido desceu rasgando, o gosto era amargo, mas logo depois ficou doce. Os pensamentos ainda estavam revoltos, mas o corpo estava um pouco mais relaxado.

Aquele gole, foi o primeiro de muitos.

Atualmente...

— Você não respondeu nenhuma das minhas cartas... — Ele comenta e eu o afasto pelos ombros o encarando confusa.

— Que cartas? — Eu pergunto e ele me olha como se eu soubesse do que ele estava falando. — Você que não respondeu nenhuma das minhas.

— Não recebi nenhuma carta sua. — Ele diz magoado.

— Eu também não recebi nenhuma carta sua. — Eu digo e lembro vagamente do que Bernardo me disse sobre coisas escondidas.

— Valentina. — Ele diz com raiva. — Não sei porque estou tão surpreso. Isso é do feitio dela. — Ele diz ao se levantar da cama.

— Porque ela faria isso? Ela não tem motivo algum. — Eu digo contrariada.

Antes era Bernardo, agora é Gabriel que tem algo contra Valentina...

— Foi ela. Tenho certeza. — Ele diz e respira fundo. — Mas isso não precisa ser conversado agora. — Ele diz me encarando.

— Como você... ficou depois que eu fui pro exército? — Ele pergunta como quem não quer nada.

Nunca ficávamos sem assunto antes, mas agora parece que o silêncio é um muro de concreto bem grande entre nós.

— Bêbada. — Eu digo rindo.

— Você bebeu? — Ele pergunta rápido. — Ingeriu bebida alcoólica depois de tudo que já passou por causa dela, Antonella? —  Ele pergunta irritado.

— Pode abaixar a bola por que você não tem razão pra ficar assim. — Eu digo gesticulando com a mão.

— Não tenho?! Você lembra de tudo que passou? Das atrocidades que Fábio fez com você enquanto estava bêbado? — Ele pergunta sério cruzando os braços.

— Eu lembro que você foi embora! Que eu fiquei sozinha... — Eu digo a ele querendo levantar da cama porém ele me trava.

— Está dizendo que a culpa é minha? — Ele pergunta horrorizado.

— Você não pode voltar depois de seis anos achando que foram apenas seis horas da minha vida longe de você! — Eu digo apontando o dedo na direção dele. — A culpa é minha, por ter apoiado minhas inseguranças em você, ter feito você o meu mundo sabendo que algum dia você iria embora! — Eu digo sentindo as lágrimas surgirem junto com um desconforto no estômago.

— Eu tive que ir. — Ele diz e eu rio cruzando os braços.

— E eu tiver que seguir em frente. — Eu digo a ele que me encara. — Não foi a bebida que transformou Fábio em um machista! Não foi a bebida que o transformou de pai e marido zeloso à agressor! Também não foi a bebida que fez ele matar a minha mãe, me espancar quando tinha vontade e quase matar você e a Ananda. Ele não estava fora de si! Aquele ali era o Fábio de verdade. A bebida foi só um combustível para as loucuras dele. — Eu desabafo sentindo o meu peito apertado.

— Eu...

— Você não tem o direito de me julgar com a sua moralidade, Gabriel! Não somos mais adolescente apaixonados! Somos adultos e as suas palavras tem um peso maior do que quando estava saindo da sua boca. — Eu explico a ele não o deixando falar.

Eu pauso molhando os lábios para continuar.

— Eu nunca culparia você. Foi bom você ter ido. Eu me encontrei sozinha. Eu aprendi a amar os meus defeitos, a ser segura e responsável pelas minhas atitudes. Minhas crises? Era eu que suportava a maioria delas sozinha! Porque eu preciso ser auto dependente. Não dava mais para andar nas suas costas enquanto te carregava pra um buraco negro de emoções. — Eu digo e limpo as lágrimas teimosas que insistem em sair.

— Eu sinto muito que tenha passado por isso tudo sozinha, Ella. Eu sinto todos os dias desde que fui embora que a culpa é minha. Você não precisa enfrentar o mundo sozinha. — Ele diz se sentando na ponta da cama, tocando os meus pés cobertos pela manta azul.

— Eu quero ficar sozinha. — Eu digo olhando para a janela.

Os raios de sol estão começando a ficar fortes.

— Vou respeitar o seu espaço. — Ele diz com a voz embargada.

Sinto-o se levantando da cama, ele não diz nada. Ele pega as coisas dele no sofá que tem ao lado da cama.

— Volto a noite. É minha vez de ficar aqui. — Ele diz e sinto-o me encarar.

— Pode trocar com alguém? Eu realmente não quero falar com você hoje. Estou muito... confusa. — Eu digo o encarando.

Seus olhos azuis estão tristes e isso faz algo dentro de mim se quebrar.

— Na verdade, não precisa. Não posso fugir de você pra sempre. Até mais tarde. — Eu digo e ele abre um sorriso fraco.

— Até mais tarde, Ella. — Ele diz e sai porta a fora e eu respiro fundo.

Jogo minhas costas na cama hospitalar. Eu quero muito ir pra casa, ou acordar desse pesadelo. Ele voltou, ele está aqui mesmo e eu não posso o evitar. Não conseguiria mesmo que quisesse, ele sabe o quanto é importante pra mim e alguma parte mim vibrou de felicidade quando sentiu que ele estava aqui.

Eu fecho os meus olhos, tentando relaxar entre todos os pensamentos e sentimentos confusos que minha mente não me deixa esquecer.

Estou no mínimo, extremamente, confusa.


Não revisado.

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