Capítulo 2
O cuzão que a vida transformou em meu irmão, aguarda no ponto de ônibus da escola infantil. Ele não nota que eu reduzo a velocidade antes que o necessário, é provável que está, como sempre, com o pensamento na filha ou em um dos tantos problemas que pensa que tem.
O ver me lembra da nossa pré-adolescência regada de armações; do início da fase adulta cheia de descobertas e pegação, ao menos até ele engravidar uma da suas garotas. Sou o único que sabe o quanto custou para o Elio desistir de uma fase da vida, que ele mal começara a viver, para se dedicar a um bebê. Ele temeu o novo mundo que se desenhou à sua frente e impôs que o seguisse; ele doa tudo de si para a filha... Apenas eu sei que o meu irmão está perdido, e não faço ideia de como ajudar ele a encontrar um novo caminho.
Paro o carro em frente a ele e abro a porta. Elio aparenta estar mais cansado que o normal, e decido não o provocar com uma alta e longa buzinada.
— Você fodeu com a minha vida. — A voz dele soa triste, ainda que seja uma reclamação. Ele afivela o cinto de segurança e, ao invés de me xingar, estuda a janela ao seu lado.
— Pode me dizer que merda eu fiz? — Volto a seguir o fluxo dos carros.
— Colocou a estranha da vizinha dentro da minha casa.
— Tem um tempo que não colo lá.
— Tanto faz, cuzão. Tudo começou naquele maldito churrasco que você armou. — O tom de queixa da conversa, não é novidade; a voz controlada, é o que me preocupa.
— O que tá pegando?
A postura do Elio muda e o sinto se encolher.
— A dona Enésia faleceu.
— A senhora que a Lupita curte?
— A própria.
— Não me fode, cara! — Acerto um soco no volante. — Por que não me ligaram? Como a Lupi está?
Elio se move brusco sobre o banco.
— Está preocupado com a estranha da vizinha? — Ele eleva o tom de voz. — E o que me diz da Carmen?
— A Gatinha? O quê ela tem a ver com essa história?
Busco brevemente a face dele, e encontro Elio surpreso com a pergunta. Ele endireita a postura e suspira alto, como que para expulsar algo ruim de dentro de si.
— A Carmen viu a Lupita chorar, e não tive como manter ela longe de tudo aquilo.
— Levou a Gatinha com você para o enterro?
— O que eu podia fazer? A Carmen só se acalmou, depois que aceitei levar ela para se despedir da dona Enésia... A quem estou enganando? O que ela queria era estar com a estranha.
A pista a nossa frente continua com todos os carros em movimento e, pela primeira vez, me vejo desejando que tivesse trânsito.
— A morte da senhora deixou você assim? — pergunto sem poder o encarar de verdade.
— Assim como?
— Sei lá, cuzão. Pensativo.
Elio volta a estudar a calçada além da janela ao seu lado. Ele deixa o silêncio crescer, nos envolver e decretar o fim do assunto.
— Não teve um único parente da dona Enésia na droga do enterro.
— É o quê?!
— A Lupita cuidou de tudo e teria velado a senhora sozinha, se nós não juntássemos a ela.
— Como essa senhora terminou só?
— Problemas familiares... — A voz dele soa baixa, quase incompreensível.
A necessidade de endireitar a postura deixa o corpo do Elio e passa para o meu.
— Você está com medo de acabar sozinho no próprio velório? — O ronco do motor ecoa solitário por longos segundos. — Seu arrombado de merda, para de bancar o tristinho e responde a porra da pergunta!
— O que devo imaginar, cuzão? — Ele torna a engrossar a voz. — Eu tenho a droga de uma família fodida.
— Seu cu. Está me ouvindo? Seu cu que tem uma família fodida.
— Sério? E o que é a arrombada da Lindalva?
Eu estaciono em frente ao prédio, no qual o Elio trabalha, satisfeito por poder focar o olhar nele no momento crítico de toda a nossa conversa.
— A porra da mãe biológica. Foi você que deu esse nome pra ela.
— Posso chamar a Lindalva como eu quiser, isso não muda o fato de que ela é a mãe da Carmen.
— Família são os seus pais que estão lá quando você precisa, mesmo que se comporte como um completo imbecil. Família é a Lupita que sempre perdoa os seus vacilos.
— A estranha da vizinha?! Não me fode. Seu cu que ela é família.
— Viu isso? Se preocupa com as pessoas que cagam pra você, e pisa em cima de todos que estão ao seu lado.
— Não tenho tempo a perder com uma conversa bosta como essa. — Ele abre a porta e, antes que possa deixar o carro, eu agarro o punho e o detenho.
— Seu medo é que ninguém vá ao seu enterro? Pois faça você o que quiser, eu vou estar lá. Vou contar todas as merdas que você aprontou em vida, e berrar pras paredes que você foi sim um grande cuzão, mas jamais deixará de ser o meu irmão.
O punho dele relaxa e, pela primeira vez no dia, eu vejo Elio sorrir.
— Valeu, irmão. — Ele deixa um tapa em minha perna.
Divisória
O complexo universitário me convida a consultar o quadro de aulas e verificar em qual sala eu deveria estar. A palma vazia reclama da falta de peso; o corpo treinado insiste em seguir o trajeto, que ele conhece de cor, e me lembra de que preciso largar o cigarro ali. Dou um último trago e assisto a bituca se perder entre o cascalho aos meus pés, alcanço a bala no bolso da calça e jogo uma dentro da boca sem me importar com o sabor, ativo o alarme do carro e sigo em direção aos prédios.
Não posso parar o girar impulsivo da cabeça, que procura rostos conhecidos nas tantas pessoas que caminham ao redor. As expressões preocupadas e cansadas continuam por ali, é estranho não encontrar entre elas um colega de curso.
— O que faz aqui? — A voz feminina desperta uma fraca lembrança, e me faz mover o corpo em busca de mais informações. — É a droga de um perseguidor? — Jaque me intima.
— Perseguidor não faz o meu estilo, Gata. — A ideia me faz rir. — Prefiro ser perseguido.
— Não enrola e diz de uma vez o que faz aqui. — Sem receio, a loira me enfrenta e fascina de uma forma que nenhuma outra mulher conseguiu.
— Não que eu deva alguma explicação pra você, — eu a provoco — mas tenho uma palestra pra dar.
Jaque ri alto e debochada, e não se importa com os olhares curiosos que atrai para si.
— Teria conseguido me enganar, se dissesse que é o turista veterano de um curso qualquer.
— Eu sei. Sou jovem e bonito, não pareço com um cara independente e assalariado.
— Está mais para o tipo que conta uma história diferente pra cada mulher.
Pego o celular em meu bolso e consulto a hora.
— Eu preciso ir, Gata. — Guardo o aparelho. — O professor Mauro me espera.
— Que incrível! Ele ao menos sabe o nome de um professor — a loira debocha.
— Também conheço o caminho pro auditório. Me observe.
Dou as costas para a Jaque e finjo não notar a sua presença seguindo os meus passos. Entro no prédio, caminho entre os alunos, e nem isso a intimida.
— Fala sério! — Um amigo me nota. — Então o nome do palestrante está certo?
— Não dava nada por mim, em cuzão?
— Ainda não dou. Quero ver que merda vai virar essa palestra.
— Vai se foder.
Ignoro os risos dele e entro no auditório.
— Você não é o único cara que se chama Oscar. — Jaque insiste em me perseguir.
— Tem razão. Essa é a sua chance de anotar o meu sobrenome, vai precisar dele para stalkear as minhas redes sociais.
— Se estiver mentindo, é um homem morto.
— É bom saber que me restam muitos anos de vida.
Eu observo o professor Mauro descer do palco.
— Oscar. — Ele caminha em nossa direção. — Que prazer receber você aqui.
— O prazer é meu, professor. — Eu aperto a mão do homem em cumprimento.
— Ouvi dizer que está indo bem na carreira. Tenho colegas impressionados com o seu desempenho.
— Tenho pouco tempo de empresa. Não é hora de vacilar.
— Sempre soube equilibrar lazer e responsabilidade. É disso que gosto em você.
A mulher de atitude desperta o meu interesse, e não vejo razão que impeça de procurar por ela pelo lugar vazio. Impetuosa como é, ela não deixou o auditório e nem se importou de ser pega me encarando.
— Aluna sua? — Aponto para a loira sentada na última fila de poltronas.
— Ela cursa uma disciplina comigo, mas é aluna da civil.
— Civil? Que interessante.
— Nem palestrou e já está paquerando aluna? Eu acabo de elogiar você, rapaz — o professor me repreende aos risos.
— Conheço da balada. Fiquei surpreso de encontrar ela aqui.
— Que bom que não escolheu ser professor ou estaria encrencado pro resto da sua vida. — Ele prende o meu ombro e me faz o seguir até o palco.
○○○
Minha garganta, um tanto áspera e cansada, reclama de ter trabalhado por horas. A loira que me aguarda na porta do auditório, não se importa com as horas que gastou ouvindo sobre a carreira na área automotiva.
— Quantos anos você tem? — Ela não tenta esconder o sorriso predador. — Quarenta?
— Vinte de quatro. — Eu paro em frente a loira e estudo de perto o seu sorriso.
— Como conseguiu virar engenheiro automotivo tão rápido?
— Emendando a graduação com a especialização, mas, caso não se lembre, eu expliquei durante a palestra que estou no fim do curso.
— Perdi essa parte, estava distraída com coisas mais interessantes. — A voz dela soa carregada de malícia. — Você é um cara dedicado, não?
— Não faz ideia.
O corpo curvilíneo se move e diminui o espaço que nos separa. As íris caramelo prendem o meu olhar ao dela.
— O que vai fazer agora?
— Eu deveria almoçar e ir trabalhar, mas posso deixar a comida pra outra hora.
— Quer vir comigo conhecer o banheiro do auditório?
— Você vai primeiro, ou vou eu?
— Espere no último privativo.
As tantas poltronas vazias nos dão cobertura. O chão acarpetado abafa o som dos meus passos, e a sutil movimentação não desperta o interesse do professor Mauro, que atende um último aluno empolgado.
Eu entro no banheiro. Caminho calmo e uso o tempo para verificar todos os espaços e garantir que estamos a sós. Ocupo o local combinado; mal tenho tempo de encostar a porta, e logo o privativo é preenchido quase por inteiro por nossos corpos.
— Devo avisar você de que sou o tipo de garota que vai direto ao ponto.
— Me convidar para um tour no banheiro deixou isso bem claro, Gata.
Impacientes, os lábios dela encobrem os meus; a língua esperta pede passagem e acaricia a minha boca certa do que faz.
— Sabia que você beijava bem — Jaque sussurra.
— Faço outras coisas extremamente bem.
— Me mostra — a loira pede ansiosa.
Alcanço o pescoço dela. O cheiro doce invade as narinas e incita todos os meus instintos; a pele quente e macia é condutora dos beijos.
— Quer serviço completo? — eu pergunto sem me afastar.
— Aqui não. Apenas nos dê um bom tempo.
As costas de Jaque se chocam contra a parede. Eu mergulho a mão sob a fina blusa e tenho o prazer de sentir ela estremecer com o toque suave dos meus dedos; a palma encontra o seio nu e, por instinto, se encaixa a ele.
— Isso... — As pálpebras da mulher se fecham. Os dentes torturam os lábios em uma excitante demonstração de prazer. O quadril inquieto se lança contra meu a procura de um contato que acaba por não encontrar o seu objeto de desejo.
Alcanço o ouvido dela.
— Você é uma verdadeira pimenta, não é? Saborosa e capaz de causar grandes estragos.
Empurro a perna entre as dela, os nossos corpos se encaixam além do apropriado, o que não nos impede de buscar a fricção no lugar certo. Levo a boca para junto da dela e encontro a língua quente à espera. Nos acariciamos sem pudor ou limites, ambos ansiosos por prazer.
Os lábios úmidos e avermelhados se abrem... inspiram... Emitem baixos gemidos, incendeiam e me fazem desejar a mulher nua.
— Deve ter ouvido isso antes... mas você é sexy... como o inferno.
As sobrancelhas de Jaque se curvam, confusas. As palmas delicadas alisam o meu rosto. A boca provocante alcança a minha e deposita um curto beijo ali.
— Você...
Eu aumento a pressão sobre ela. Deixo as mãos correrem livres pelo corpo provocante, e assisto a mulher se entregar novamente ao prazer.
— É ótimo nisso, sabia?
— Será que posso entrar... pra sua lista ... de foda amiga? — Eu alcanço o seio e brinco com o mamilo excitado. A reação ao toque é melhor do que eu esperava: a loira sobe uma perna, a prende ao meu redor e deixa sua área sensível exposta para mim.
— Me deixe chegar lá... Depois eu penso nisso.
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