CAPÍTULO 1 - Energia
Se Cassandra Castillo fosse alguma coisa, essa coisa seria inteligente. Ou persuasiva, mas ela considerava essa palavra um tanto quanto depreciativa, já que ninguém considerava persuasão algo assim tão legal. De toda forma, ela era o tipo de pessoa capaz de vender uma piscina em formato de pênis para uma chácara de freiras e dar bons motivos para isso.
"O pensamento de sexualização do órgão masculino não deveria ser algo a se levar em consideração. A escandalização está na mente das pessoas e é de conhecimento público que Jesus não faria algo com suas próprias mãos que fosse escandalizar alguém, além do mais, esses tipos de pensamento vem completamente do homem e de sua mente corrompida. É claro que o valor está bem abaixo da tabela...".
Como dito, inteligente.
Marketeira nata, Cassandra havia sido a peça chave da ascensão de muitas celebridade e pessoas que viviam da imagem, era a cabeça pensante em gerar conteúdo para muitas blogueiras, instagramers, youtubers, além de empresas grandes. Tudo no anonimato. Ou quase.
Seu contato era passado apenas para a mais alta elite e, na tarde passada, havia recebido uma ligação de nada mais e nada menos que Lincoln Ullmanov, um dos agentes musicais mais influentes da atualidade, sendo responsável por pessoas como Nicky Minaj, Taylor Swift e Now United com um pedido de urgência e super secreto.
Ele não havia dito valores, mas a bolada que tinha em mente era algo com muitos zeros.
O que talvez, infelizmente, fosse ser obrigada a recusar já que o trânsito até o escritório de Lincoln não parecia estar colaborando e a tempestade que caía sobre ela fosse assustadoramente forte.
Os raios cortavam o céu do meio da tarde; as nuvens cinzas e carregadas pairavam sobre sua cabeça com promessas de destruição e as gordas gotas caíam pesadamente sobre o capô do carro com pesar.
Ela observou o celular mais uma vez, vendo que precisava estar no escritório em três minutos.
— Será que dá para ir mais rápido?
— Claro — respondeu o taxista, sorridente — que no. ¿Que quieres que haga? ¿Volar y pasar arríba? — que não. O que quer que eu faça? Você e passe por cima?
Cassandra estreitou os olhos para o seu cochicho pelo espelho do retrovisor.
— Sí, si tienes algún botón que haga que este viejo pueda volar te estaría muy agradecida. — Sim, se tem algum botão que faça com que essa lata velha voe eu ficaria muito agradecida, retrucou na mesma língua, fazendo as bochechas do homem ficarem vermelhas.
— Chegamos — informou o motorista assim que estacionou em frente ao enorme prédio espelhado onde ficava o escritório, constrangedores vinte e três minutos depois.
Ela lhe deu um sorriso nada gracioso antes de sair do carro e correr pela chuva até a entrada.
Era um prédio luxuoso, notou, já que conseguia ver seu reflexo pela estrutura de vidro espelhado que revestia todo o edifício. Claro que Lincoln não estaria enfiado em qualquer canto chinfrim, mas achou um exagero ter que fazer um cadastro na recepção e passar sua bolsa por um detector de metais para poder entrar, mesmo quando o porteiro confirmou com o agente de segurança que ela tinha sido convidada.
Alguns minutos depois, ela finalmente conseguiu chegar ao elevador. Precisou correr porque o babaca que estava dentro não fez a menor questão nem de fingir que tentou segurar o elevador para ela, como faria uma pessoa normal com uma quantidade mínima de empatia.
— Mierda — merda, praguejou, meio para toda a situação e meio para sua bolsa escorregando pelo ombro e para o cabelo que deveria estar parecendo com um poodle molhado.
O cara no canto torceu o nariz ao olhá-la por trás dos óculos escuros.
Ele era estranho. Estava usando uma roupa inteiramente preta, óculos escuros, boné e o capuz do moletom canguru por cima, como se não quisesse ser reconhecido. Além disso, estava com o pé quebrado, se firmando em duas muletas. A única coisa que ela realmente pôde ver sobre ele era que ele tinha uma tatuagem no pescoço e que também haviam desenhos nas suas mãos - e isso provavelmente porque ele tinha que segurar as muletas e não podia esconder as mãos nos bolsos.
Cassie notou que seu andar já havia sido acionado e esperou no canto do elevador enquanto a caixa de aço subia vagarosamente até o 19º andar. Aproveitou aqueles instantes para poder se observar no espelho e ver o quão catastrófica estava sua situação.
Como havia previsto, os cabelos castanhos que mal passavam de seus ombros estavam com mais frizz do que achava aceitável, a roupa, que consistia em uma calça jeans, botas e uma camiseta do Star Wars com Han Solo e Princesa Leia de baixo de um blazer com ombreiras, estava cheirando a cachorro molhado por conta do cheiro do táxi que havia pegado e a bolsa ainda escorregava do seu ombros, além da maquiagem estar meio torta.
Ela havia realmente tentado fazer um delineado nos olhos grandes, num verde tão escuro que pareciam castanhos, mas havia falhado vezes demais e já estava atrasada o suficiente, o que agora lhe fazia parecer com olheiras já que não havia limpado direito.
Passou o dedo abaixo dos olhos para afastar as marcações de maquiagem e observou o rosto redondo e os lábios carnudos por um instante antes de sorrir e notar que poderia passar por aquilo se prendesse o cabelo e passasse um perfuminho e ficasse suficientemente distante de Lincoln para que ele não pudesse ver a base escorrida, mas quase enfiou o dedo no olho quando o elevador parou com um solavanco e ela teve de se segurar nas barras que cercavam o elevador.
As luzes se apagaram, dando lugar às luzes alaranjadas de emergência.
— Mierda! — grunhiu novamente, apertando o botão do 19º repetidas vezes.
— Ah não... — o homem a seu lado grunhiu, se apertando mais contra a parede, passando a mão no rosto. Cassie apertou o botão com mais veemência, não queria ficar presa ali com aquele estranho.
Aparentemente, apertar aquele botão não adiantava de nada, o que fez a mulher bufar de frustração. Foi então que ela notou o pequeno telefone de emergência ao lado do painel e o tirou do gancho, levando-o até a orelha e aguardando pacientemente até alguém da manutenção atender seu chamado.
Quando a resposta chegou, notou que não havia muito o que fazer. Um raio tinha danificado a rede elétrica de todo o quarteirão e eles estavam presos ali até que os bombeiros chegassem para resgatá-los ou que conseguissem ligar o elevador no gerador do prédio. A orientação foi apenas manter a calma e aguardar.
Tudo bem, pensou, contando que o celular tivesse bateria o suficiente para que ela passasse todo o tempo de espera jogando Candy Crush e praguejando em todas as línguas que conhecia por causa do dinheiro que estava perdendo por aquela série de infortúnios.
Cassie cutucou o painel com as unhas durante toda a ligação, sem realmente prestar atenção no cara que estava com ela, então, quando se virou botando o telefone no gancho, se arrependeu de ter dito para o síndico que estava tudo bem ali.
O homem parecia em pânico.
Tinha tirado os óculos escuros e estava com os olhos arregalados encarando algum ponto específico no chão, apoiado no encontro das paredes daquele cubículo de metal para poder largar as muletas e se segurar nas barras de ferro que serviam de apoio no elevador.
Cassandra o encarou com curiosidade e percebeu que seus planos com Candy Crush estavam cancelados quando ele tirou o boné e jogou no chão.
— Está tudo bem? — perguntou, chamando a atenção do rapaz.
Ele ergueu os olhos para ela por um mísero segundo e a ignorou solenemente, como tinha feito desde o começo.
Cassie franziu o cenho. Déjalo ir a la mierda, pensou. Nenhuma entidade divina que a estivesse observando podia dizer que ela não tentou ajudar aquele pretenso ser de luz depois de ter perguntado se estava tudo bem e recebido como resposta um total e enorme nada.
A mulher procurou dentro da bolsa pelo celular e, sem nenhuma surpresa, viu que não havia sinal ali e que sua bateria estava em 29%, o que significava uns trinta segundos de funcionamento.
Ela se lembrou que tinha excluído o Candy Crush, então sua única opção era aquele jogo ridículo do dinossauro que só aparecia quando não havia internet. Cassandra achou que aquele era o fundo do poço, mas estava errada e foi quando um homem manco tomou o celular de sua mão com um puxão que percebeu esse fato.
— Ei!
— Você não pode colocar isso na internet! — ralhou ele, enfiando o celular no bolso da frente da calça.
Colocar na internet? Meu filho, eu tenho coisa mais importante para fazer do que ficar gravando essa sua cara feia!
Ela não sabia do que ele estava falando, mas então reparou no que realmente estava acontecendo quando ele arrancou o moletom canguru e jogou no chão.
Cassandra até poderia ter reparado que ele tinha os braços grandes cobertos por tatuagens, mas a questão de estar presa no elevador com um cara suado que estava tirando a roupa e tinha roubado seu celular meio que desviou seu foco para o problema mais urgente.
— Me devolve! Por que eu iria colocar isso na internet? — grunhiu, encarando enquanto ele andava sem a muleta e se apoiando no gesso da perna quebrada como se aquilo não doesse e como se ele não fosse acabar quebrando o pé. De novo.
Ele bufou em resposta.
E então começou a tirar a camiseta.
Cassandra considerou seriamente em enfiar a mão no bolso dele e pegar o celular, mas considerando o seu estado estranhamente fora do ar, tinha medo de que ele fosse um marginal e lhe desse um soco, já que ele não estava dando um bom exemplo de boa índole.
— Esse lugar está encolhendo! — afirmou pela primeira vez, a voz em um misto de pânico e desespero, o que não deixou que ela repasse no quão grossa e arrastada ela era. O ladrão de celulares passou a mão sobre a cabeça raspada, desnorteado. — Estou ficando sem ar!
— O quê? Não está nada encolhendo aqui, seu louco! Me devolve meu celular, eu vou chamar a polícia!
Era uma afirmação meio estúpida de se fazer, é claro, porque ela ainda não tinha descoberto uma forma telepática de entrar em contato com a polícia e seu celular estava com aquele completo lunático - mas era justamente isso o que estava a seu favor, certo? Ele não estava em condições de prestar atenção em qualquer questão técnica naquele momento.
Em resposta, ele colocou as duas mãos na barra de ferro a sua frente, começando a hiperventilar. Cassandra franziu o cenho.
— Eu não consigo respirar! — afirmou, botando tanta força nas mãos que seus braços (musculosos, não vamos negar) estavam tensionados e os nós dos dedos estavam brancos. — Acho que vou desmaiar!
— Ei, ei, ei! — ela se aproximou assim que viu seu rosto ficando branco e seu corpo pendendo para trás, ficando as suas costas para impedir que o estranho ladrão de celular caísse e batesse a cabeça no chão. Ela tinha limites morais muito rígidos, então mesmo que ele tivesse roubado seu celular, ela não o deixaria cair e morrer. Além disso, as câmeras não estavam funcionando, então havia uma grande possibilidade de ser acusada de homicídio se isso acontecesse, o que seria péssimo. — Relaxa, não vamos cair! Além do mais, a taxa de morte é bem menor se estivermos no chão e olhá só! Estamos no chão! — sorriu, abanando a si mesma depois de fazer força para deitar aquele homem de pelo menos 90kg em suas pernas.
— Você não está me ajudando! As paredes estão diminuindo, esse lugar é muito pequeno e não tem ar para nós dois aqui! — ele socou o chão para demonstrar seu ponto com mais intensidade e Cassie se segurou para não erguer as sobrancelhas.
Será que aquilo podia ser considerado algum tipo de ameaça? Do tipo "não tem ar para nós dois aqui, então um de nós tem que morrer e será você"?
Bom, ele não parecia estar em condições de tentar um homicídio, de qualquer modo. Ele literalmente estava deitado no seu colo e morreria da mesma forma que uma uva passa, totalmente desidratado, se ela não conseguisse fazê-lo se acalmar.
Cassandra Castillo sabia que era persuasiva e lidava bem com pressão - social, pelo menos. Em algum lugar de seu cérebro deveria ter um protocolo para convencer uma pessoa de que era fisicamente impossível que aquele lugar diminuísse sozinho e que eles não estavam vivendo em Jogos Mortais nem nada assim. Mas, naquele momento, ela realmente não sabia muito bem o que fazer. Seus pensamentos eram uma mistura de "Dios mio", "Carajo" e "por que estou pensando em espanhol?".
— Deixa de ser pirado, está tudo bem! O elevador só parou porque faltou energia, vamos ficar aqui algumas horas, mas...
— Horas? — Seus olhos se arregalaram e ele tentou se sentar. — Eu não posso ficar horas aqui, eu vou morrer aqui dentro!
— Não, não vai!
— Eu to passando mal! — afirmou se abanando. — Pelo amor de Deus, chama ajuda, eu to morrendo!
Cassie tentou ficar em pé e chamar a segurança, a fim de conseguir pôr um fim naquele martírio que estava lhe desconcertando, mas ele a segurou pelo braço, se apoiando completamente sobre ela.
— Estou tentando chamar ajuda!
— Não me deixa sozinho! — grunhiu, segurando-a pela cintura.
Não tinha como aquele dia ficar pior!
Cassie tentou fazer algo para se ajudar, mas o elevador deu um solavanco e o homem regurgitou, deixando que tudo o que seu estômago ainda não havia digerido jorrasse por sua boca enquanto vomitava em seus pés.
A luz do elevador se acendeu e eles começaram a subir.
Aparentemente, havia sim como seu dia piorar.
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E foi dada a largada! Espero que vocês gostem do primeiro capítulo, o restante está incrível, eu juro! Eu e a gabiriordan estamos ansiosissimas para saber do feedback de vocês ♥
Digam pra gente o que estão achando!?
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