Capítulo 8
KATE
— Acho que estou apaixonada.
Nina falou assim que colocou os olhos em mim. De pé, ao lado da porta do táxi, me esperava. Com o vestido mais sexy que tinha — palavras delas, segundo a mensagem que me enviara mais cedo —, de um tom de azul bem forte. Pouco de seu corpo estava coberto. O tecido se limitava a esconder pouca coisa desde a metade de suas coxas até o busto.
A conhecendo bem, sabia que não iria me dar sossego. Meu tira teima era o olhar afiado e o meio sorriso que se destacava nos lábios finos.
— Não exagera, Nina. Isso não é nada demais.
O que era verdade. Havia uns bons três anos que não sabia o que era curtir a noite. E a última não terminou exatamente bem. Não mesmo. E obviamente que Nina estava lá. Deixar Natasha sozinha sempre foi difícil, mas depois de tanta insistência acabei cedendo. Mas levando em consideração que a noite terminou comigo em uma delegacia depois que dei um soco em um cara por tentar forçar algo com uma menina, evitava ao máximo qualquer coisa que pudesse me tirar do sério.
E os homens encabeçavam a lista. Principalmente os que encontrava em um bar.
— Nem lembrava mais que o tinha. Só achei depois de procurar muito no meu guarda roupa — baixei os olhos e analisei o vestido. Não sabia se era somente uma impressão minha ou o quê, mas algo me dizia que ele estava consideravelmente mais curto e mais decotado do que me recordava.
A abertura entre meus seios era bem reveladora.
— Pois eu repito que estou apaixonada. Meu Deus, acho que sinto palpitações... — a expressão de deleite que fez quase me fez gargalhar. No quesito atriz, ela tirava de letra.
Parei diante dela pondo as mãos na cintura, o que se demonstrou ser um grande erro, Nina logo se animou e se aproximou de mim. Fiscalizando meu corpo inteiro. Pegou em minha mão e estreitou os olhos.
Perigo máximo.
— Deixa eu ver esse arraso todo.
— Nina...
— Desconheço quem seja — bufei e me deixei ser girada no lugar. Ressabiada ao extremo, ela pensava com todas as letras que eu fosse uma obra de arte dados os suspiros e gritinhos animados.
— Arrasando desse jeito, duvido que não consiga nada — disse quando dei o giro completo.
Rolei os olhos.
— Não me arrumei pra encontrar homem, garota. Isso aqui sou eu entrando na sua doidera depois de séculos em um vestido que estava pegando poeira. E mesmo que diga o contrário, o que eu não preciso é terminar na cama de ninguém.
— Pois eu discordo completamente, amiga — sua mão tocou em meu cabelo, seus dedos arrumando os fios sobre meu ombro. — Um pouco de sexo casual nunca fez mal a mulher nenhuma, é só saber encontrar um cara que não seja imbecil e que também não tenha o documento pequeno, porque isso aí seria muita sacanagem.
— Nina, não vou fazer sexo.
Dando um risinho de lado, abriu a porta do táxi e me deu passagem. Quando cruzei por ela, quase me sentando, sua voz sussurrada ricocheteou em meu ouvido.
— Pois acho que não só precisa, como deve.
Sexo casual. Nem sabia mais o que era aquilo.
(...)
— Vamos repassar o plano mais uma vez. Primeiro, você vai aceitar pelo menos que um cara te pague uma bebida. Segundo, vai mexer esse corpinho que Deus te deu e se soltar um pouco, extravazar toda a tensão e adrenalina. E por último, por tudo que é mais sagrado, beije pelo menos uma boca, umazinha só, só pra sair dessa seca.
Nina realmente levava as coisas muito a sério.
— E se não aparecer ninguém decente? Não vou compartilhar saliva com algum idiota nojento — pontuei séria. Cruz credo. Jamais. Preferia não beijar nunca mais na vida.
— Beije uma menina, então — ela deu de ombros quando passamos pela entrada do bar, me fitando sobre os ombros. Logo a música alta adentrou meus ouvidos e quase os tampei. — Vai que gosta, nunca se sabe.
Balancei a cabeça e sorri abertamente.
A filosofia que ela seguia era clara e simples. Por que se prender a um gênero esperando algo que ele não podia oferecer, se no outro lado da cerca eu encontraria tudo isso e mais um pouco com a pequena diferença de que não seria um pau que teria pela frente?
De todo, ela não estava tão errada assim.
Porém, eu dispensava. Minhas loucuras quando mais novas me mostraram algumas coisas.
A primeira coisa que avistei foi a gritaria quando um cara lambeu o pescoço de uma mulher, que deitada sobre o balcão, parecia estar muito satisfeita por ter línguas desconhecidas sobre ela.
Crispei a boca.
— E é daquilo que você precisa — Nina apontou a mulher e fiz que não na hora. — Uma boca que te deixe de pernas bambas e falta de ar.
— Só se for de nojo. Olha pra cara daquele homem, acho que ele nem tem todos os dentes na boca — cruzei os braços e esperei que ele se virasse. Rimos alto quando o sujeito se virou e sorriu, revelando todo o espaço vazio em sua boca. — Eu disse.
— Sai pra lá, encosto — sua voz saiu num tom de descontentamento gritante, parecia sentir asco e repulsa. Novamente, eu estava certa. — Pior que o meu ex, e olha que aquela desgraça era feia que doía.
De olhos arregalados, foi a vez dela fazer uma cara de desgosto.
— Por que namorou ele então? — perguntei. Não que eu tivesse nada com os relacionamentos dela, mas o último era tão feio que até Natasha fez cara feia. Perguntou por que o tio era esquisito.
Ainda bem que ela não disse na frente dele. Natasha teve a compaixão de esperá-lo ir ao banheiro antes de jogar a bomba no meu colo.
— Pena, não sei, eu devia estar bêbada quando ele me pediu e depois não tive coragem de terminar logo de cara... — virando o rosto para me olhar, levantou as mãos e fez um muxoxo com a boca — Acho que preciso de um homem bem gato pra curar minha ressaca dos brucutus. Daqueles que façam um sexo bem selvagem e gostoso. Quero ter dificuldades de andar no dia seguinte. Sabe aquela pegada que te faz gozar só com uns amassos?
Gargalhei.
— Nisso eu concordo, até por que... — parei na hora ao notar um ser que atrás de Nina levantava as sobrancelhas e sorria na minha direção. A criatura achou que aquilo fosse uma permissão e chegou bem próximo de nós duas.
— Meninas... — bêbado, fedorento, dentes amarelos ao extremo.
— Não, obrigada. Não estamos interessadas — fui séria e sucinta sem dar brechas. O homem murchou e saiu sem falar nada.
Se a noite se resumisse àquilo, eu viraria uma freira.
— Meu pai, mais fria que isso só a neve do inverno — Nina disse sorrindo. — Tenho medo de você, já te contei? Algo me diz para não irritá-la...
Batucando os dedos no queixo, tinha o olhar atento em mim. Umedeci os lábios e devolvi o sorriso.
— Bem... por que será?
Paciência não era a minha maior virtude. E nem a calma. Por fora eu aparentava estar tranquila, mas por dentro era um vulcão prestes a explodir quando me tiravam a paz.
Depois de uns minutos comecei a me acostumar com o ambiente. A música já não me incomodava tanto e consegui relaxar. Mais alguns homens tentaram se aproximar e nós duas nem pensamos muito ao descartá-los. O menos horrível teve a incrível façanha de ter quase todos os dentes na boca.
— Não acredito! — Nina exclamou surpresa — Amo essa música.
Ela fechou os olhos e balançou as mãos no ar. Pelo menos ela se divertiria.
A batida era contagiante e bem dançante até, com o único adendo de que não conseguia entender muito bem o que a letra dizia. Não que eu não soubesse inglês, mas porque a voz se confundia com a multidão que falava russo. Tentei por mais alguns segundos e nada.
— Não tô conseguindo entender — falei apontando para o ouvido.
— Não precisa entender, só sentir a energia e se deixar levar.
Grande ajuda.
Gostava de saber o que estava dançando ou cantando. Vai que fosse uma dessas músicas que retratavam a mulher como uma vagabunda? Virei o rosto procurando a origem do som e dei de cara com um cara perto de mim.
Perto até demais.
Parecia impressionado.
Olhos arregalados e pupilas bem dilatadas.
Será que tinha me confundido com alguém?
Se bem que ele parecia com tudo, menos russo.
O que atraiu meu olhar instantaneamente foram suas tatuagens. Subiam por seu pescoço e chegavam à cabeça. Traços pretos e vermelhos. Até o piercing no nariz era intrigante. Resumo, bonito. As feições eram finas e nada exageradas. Também não era todo marombado. Mas os músculos dos braços marcavam bem as mangas da camisa.
Esperei que falasse alguma coisa, minha impressão foi essa, mas antes disso, uma loira molhada dos pés a cabeça o agarrou pelo pescoço. Retesei ao ver que a bunda da mulher estava virtualmente toda de fora. O short jeans tinha um palmo de comprimento e mais parecia uma calcinha.
Abri mais os olhos e os tirei da bunda da desconhecida, tornando a encarar o cara novamente. Seus braços não retribuíram o abraço, e nem foi preciso. A loira o puxou pelos ombros e o beijou, ele não soube reagir. Foi a impressão que tive. Parecia estar abismado e chocado.
O beijo foi dado com ele me olhando a todo o momento. Nem piscava, também não movia os lábios. Esquisito e constrangedor. Ela o engolia e o homem aceitava as investidas me secando. Maluquice. Soltei um murmuro e pisquei, parando de prestar atenção no que faziam. Não era da minha conta.
Girei o corpo e dei as costas para eles.
— Vamos beber alguma coisa? — chamei Nina que dançava de olhos fechados, sorriso escancarado e braços erguidos.
— Hã? — se assustou com a minha mão que a cutucou, mas logo acenou com a cabeça, sorrindo de lado a lado. — Vamos, só se for agora.
Pedimos duas doses de tequila e viramos de uma vez. Espremi os olhos e soltei o ar. Não lembrava que ardia e queimava tanto, mas era revigorante. Pedimos mais uma e em um gole só desceu pela garganta. A terceira foi caprichada. Tossi com a queimação intensa e forte.
— Uau, tu é boa de copo — Nina gargalhou antes de gritar o barman. — Adoro isso.
Sorri. Aquele momento podia ser expresso em uma palavra. Saudade.
Depois que fui mãe deixei tudo para trás. Meu foco era minha bailarina. Mas por um momento, me desconectei de tudo. Minha saúde mental pedia um descanso.
A quarta dose transbordava do copo e pingava no balcão de madeira. Choquei o copo com o de Nina em um brinde rápido. Pronto. Mais álcool correndo em minhas veias. Não que eu ficasse bêbada rápido demais, mas sentia meu corpo solto. Os braços e pernas se moviam sem parar. Numa urgência de não ficarem parados.
— Já sei — Nina gritou pegando em meu braço. Ela gargalhava afobada, me sacudindo e mexendo a cabeça completamente alucinada.
— O que?
— Sobe no balcão e faz um body-shot. Uma loucura pelos velhos tempos.
Olhos arregalados demais e sorriso exultante demais. Ela queria me deixar maluca.
— Nem pensar — neguei avidamente. Como se eu fosse deixar estranhos se aproveitarem de mim tão descaradamente.
— Vai, Ekaterina. Por mim... — a filha da mãe fez a mesma cara pidona de Natasha e grunhi com a cara de pau dela. Disse não mais uma vez, bem enfadonha. Nina não se deu por vencida. Começou a incentivar os clientes a gritarem meu nome. Quase a matei por fazer aquilo. Olhei para trás e um bando de gente que nunca tinha visto na vida berrava incessante.
— Ekaterina, Ekaterina, Ekaterina... — homens e mulheres, rindo espalhafatosos. Respirei fundo e gemi incrédula. Aquilo só podia ser uma piada. Qual foi. Só queria espairecer, e não virar o centro das atenções.
E para a minha completa ruína, me dei por vencida. A gritaria foi gigantesca. Até o barman entrou na onda e apertou não sei o que fazendo que um uivo soasse pelo bar.
Pra que fui ver aquele filme? Sabia muito bem o que significava.
Estendi os braços e as dançarinas me ajudaram a subir no balcão. Evitei olhar para as pessoas e desistir no meio do caminho. Meu vestido... não sairia ileso daquilo.
Deitei e a probabilidade de terem visto minha calcinha chegava aos cem por cento. Não devia ter bebido tanto. Perdia os limites dependendo da concentração de álcool no sangue.
Fechei os olhos e esperei. Era preferível não ver. Talvez assim o tempo passasse mais rápido e minha humilhação fosse ligeira. Seria, se eu não tivesse virado o rosto e encontrado o tal homem. Mais próximo do que nunca, a ponto de sentir sua respiração tocar em meu pescoço.
— Olá, Ekaterina.
Sabia que ele não era russo.
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