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Capiítulo IV

O último semestre do meu 2° ano na Udesc foi completamente arruinado por Leandro. Posso afirmar com absoluta certeza: a única coisa boa que tive durante aqueles meses, foi a minha viagem para São Paulo nas férias de fim de ano.

O meu 3°ano também começou muito ruim. Como eu já havia dito, depois do episódio na cozinha Leandro mal falava comigo. Mas, por outro lado, ele começou a arcar com todos os custos do meu apartamento, por isso fui guardando o meu salário inteiro, todos os meses, a partir daquele ano.

Em março de 2010, surgiu o boato na Udesc de que o Muralha estava me traindo. Eu realmente não dava a mínima para as traições dele - na verdade, eu achava bom porque ele tinha alguém pra aliviar o tesão e não chegava mais perto de mim - mas, algumas pessoas começaram a desconfiar que havia algo estranho no nosso relacionamento. Como esperado, Alice veio me perguntar o que estava acontecendo e, por medo, eu não disse nada, acabamos discutindo feio e não nos falamos mais.

Perder a amizade de Alice foi doloroso, mas fazê-la achar que eu não confiava nela, foi horrível. A amizade dela era tão importante pra mim que acabei me afastando de todos depois disso, voltei a ser aquela pessoa fria de 3 anos atrás. As únicas coisas que me interessavam eram o trabalho e a faculdade, nada além disso.

No dia 19 de maio, uma empresa que gerenciava obras de arte, muito famosa no Brasil, me ofereceu o estágio perfeito. Tive que largar o meu emprego na loja para ocupar o cargo, mas como seria remunerado, não haveria problemas.

Minha última entrevista antes de começar a trabalhar seria em particular, com o presidente da empresa: Edgar Gonzáles. Ele me ia me dizer qual cargo iria ocupar, que horas eu começaria, o que teria que fazer e etc.

Era dia 25 de maio, acordei às 7:30 da manhã, tomei um banho rápido para afastar o sono, vesti uma saia lápis preta, uma camisa social branca e uma sandália de salto fino não muito alta, optei por deixar meu cabelo solto, passei apenas gloss e rímel. Antes de sair do banheiro, fechei os olhos, apertei o pingente do meu colar como de costume, e tentei trazer a paz da minha mãe para dentro de mim. Peguei meu óculos de grau, minha bolsa, e saí do quarto.

Ao chegar na cozinha, vi Leandro sentado na mesa. Quando me aproximei um pouco mais, ele fez mansão de se levantar para sair do cômodo.

— Não precisa levantar, - disse enquanto partia o bolo - já tô saindo!
Ele se sentou novamente.

— Tá nervosa? - perguntou em um tom receoso.

Fiquei um pouco surpresa por ele dizer aquilo, fazia semanas que eu não ouvia a voz de Leandro.

— Um pouco. - me encostei na pia.

— Não precisa, você sabe que esse estágio já é seu. - ele sorriu de leve ao me encarar - Você está linda!

— Obrigada! - disse enquanto limpava as mãos.

— Quer que eu te leve?

— Acho melhor não, tenho que saber como funcionam as linhas de ônibus que vão para lá.

— Como quiser! - dei alguns passos para sair da cozinha e ainda sentado, Leandro segurou minha mão gentilmente, com intuito de me fazer encará-lo - Boa sorte, e tenha cuidado!

— Obrigada. Vou ter! - sorri de leve e saí de casa.

Durante o trajeto, acabei perdendo um dos ônibus pela confusão que fiz com as linhas, mas ainda assim consegui chegar na G-Arts com 20 minutos de antecedência. Ao entrar no hall da empresa, fui em direção à recepcionista.

— Bom dia, Srta. Fernández!

Eu já havia dito muitas vezes para Mercedes me chamar apenas pelo meu nome, mas ela achava melhor me tratar com mais formalidade.

— Bom dia, Mercedes. Tudo bem?

— Estou bem. O senhor Gonzáles te espera no 5° andar! - ela sorriu gentilmente depois de um longo suspiro meu - Fica calma, vai dar tudo certo!

— Obrigada. - sorri em resposta e saí andando.

Tentei controlar a respiração enquanto estava dentro do elevador. Aquela reunião era crucial para decidir o meu estágio naquela mega empresa, se o senhor Gonzáles não gostasse de mim, acabaria tudo!

A G-Arts seria uma oportunidade ótima para colocar em prática as coisas que aprendi, sem contar que daria uma baita valorização no meu currículo.

Pisquei algumas vezes e voltei para a realidade ao escutar o barulho daquela porta de metal se abrir. Eu nunca tinha ido até aquele andar, as outras reuniões foram dirigidas por Marcelo Silva - o gerente da empresa - no 2°ou no 3° andar. O último andar era exclusivo para a sala de Edgar e suas reuniões com os outros diretores.

Respirei fundo, me direcionei para o lado esquerdo indo de encontro com a recepcionista; uma mulher branca, de cabelos loiros, amarrados em um coque perfeito, ela aparentava ter por volta de 30 e poucos anos.

— Bom dia. Meu nome é...

— Aksa Fernández! - ela nem levantou o olhar para falar comigo - O Sr.Gonzáles está em uma reunião no momento, quando acabar, ele pede para você entrar!

— Okay! - fui para as poltronas, meio incomodada com a forma que ela falou.

Me sentei, olhei para o relógio e vi que era 8:50. Minha reunião havia sido marcada para às 9:00, provavelmente ocorreria um atraso.

— Não fica mal, a Lívia trata todo mundo assim! - uma voz masculina disse sussurrando e sorrindo.

— Fico feliz por não ser a única! - sorri em resposta.

O rapaz aparentava ser alto, tinha cabelos escuros (quase preto) e liso, olhos castanho claro, e sorriso tão bonito quanto o dono. Ele usava uma camisa preta simples, um colar prata que dava destaque para a mesma, uma calça jeans clara e tênis.

— Então você é a famosa Aksa Fernández? - ele virou um pouco o corpo para me encarar.

— Famosa? - me virei também.

— Sim. A garota que passou em 1°lugar na prova de seleção da Udesc à pouco mais de dois anos. Alguém com seu nome, sua idade e suas notas, não passa despercebida! - ele sorriu enquanto se recostava na poltrona e cruzava os braços.

— Você estuda lá? - levantei uma das sobrancelhas com dúvida.

— Esse é meu último semestre lá. - ele estendeu a mão para mim - Prazer, meu nome é Dante. - apertei sua mão - Tô cursando direito no vespertino.

Senti minha pressão baixar, paralisei ao escutar aquilo. Dante estudava no mesmo turno que Leandro, além de eles terem entrado, praticamente, juntos na Udesc - mesmo em cursos diferentes, ambos estavam cursando o último período. Será que ele era amigo daquele monstro e estava ali para me vigiar?

— Tá tudo bem? - ele se inclinou um pouco e encostou sua mão em meu braço - Você ficou pálida!

— T-tá tudo bem sim, - gaguejei sem querer enquanto piscava rápido - acho que é o nervosismo pela reunião!

— Quer que eu pegue água para você? - ele olhava atentamente em meus olhos - Meu pai não vai se importar se você sair um pouco pra pegar um ar.

— Seu pai?

— É. Sou filho do Edgar! - me faltou ar naquele momento. Meu Deus, só piora - Vou pegar um copo d'água pra você!

Nem consegui recusar, estava sem palavras. Essa perseguição doentia não iria acabar nunca?

— Aqui, bebe. - me estendeu um copo de vidro - Talvez ajude você a se acalmar! - tive dificuldade para levar o copo aos lábios - Meu Deus Aksa, você tá tremendo. Vou chamar alguém! - ele fez menção de sair, mas segurei seu pulso.

— Não precisa, eu tô bem. Foi só uma queda repentina de pressão! - menti.

— Certeza?

— Sim, não precisa disso. - ele se sentou novamente e fiquei um tempo em silêncio - Sei que acabamos de nos conhecer, mas posso te fazer uma pergunta?

— Claro. O que você quer saber?

— Você conhece o Muralha? Da turma de zootecnia? - tentei disfarçar meu nervosismo ao máximo para perguntar aquilo.

— Conheço, - meu coração parou por alguns segundos - mas, digamos que nós dois não nos damos muito bem!

— Como assim? - estava aliviada e curiosa ao mesmo tempo.

— Tivemos um problema quando estávamos no segundo ano. Ele era como uma bomba que estava sempre prestes a explodir e eu não corro de briga! - ele sorriu com a cabeça baixa - A gente acabou saindo no soco por causa de um boato que surgiu na Udesc. Depois disso, começamos a evitar ao máximo estar no mesmo lugar que o outro porque sempre sai briga quando isso acontece! - ele mordeu o lábio inferior para cessar o riso - Por que a pergunta, gatinha?

— É que a gente namora há um ano e dois meses, como vocês estudam no mesmo turno, achei que você pudesse conhecer ele!

— Assim, eu não quero que se sinta ofendida, mas por que você tá há tanto tempo com aquele merda? - Dante parecia inconformado - Os surtos deles são perigosos Aksa! Se ele partiu pra cima de mim quando foi contrariado, imagina o que ele pode fazer contigo.

Aquelas palavras me fizeram lembrar do que acontecia quando Leandro surtava. Meu coração acelerou, minhas mãos apertaram involuntariamente a madeira da poltrona, cheguei até a engolir seco, e o filho do Gonzáles percebeu isso.

— Ele não te obriga a ficar com ele. Obriga? - lágrimas surgiram em meus olhos e abaixei a cabeça para ele não ver, mas era tarde demais - Aksa? - Dante se inclinou um pouco mais e puxou meu queixo com delicadeza, me fazendo olhar em seus olhos - Ele já encostou em você?

As lágrimas ameaçaram cair. Engoli seco outra vez e uma das lágrimas desceu, ele encarou meus olhos, com uma das mãos em meu rosto na intenção de me passar segurança.

Eu precisava acabar com a minha prisão, precisava me livrar de Leandro.

— Ei, confia em mim. - ele enxugou meu rosto com o polegar - Eu posso te ajudar! Só preciso de uma palavra sua.

Meus lábios começaram a formular a palavra "socorro". Olhei nos olhos de Dante, respirei fundo e abri a boca para dizer.

— Srta. Fernández, o senhor Gonzáles te espera na segunda sala à esquerda.

Olhei para o corredor e vi um homem entrar no elevador, enquanto a recepcionista lhe desejava um bom dia. Virei meu rosto rapidamente para Dante e perdi a coragem por causa da interrupção.

— Eu preciso ir! - me levantei rapidamente, sem dar tempo dele me impedir.

Caminhei em passos rápidos, enquanto enxugava as lágrimas do meu rosto. Não podia esquecer o porquê de eu estar ali, a reunião tinha que ser meu único e principal foco!

Respirei fundo e bati na porta. Gonzáles abriu a mesma com um sorriso no rosto e estendeu uma das mãos, indicando que era para eu entrar.

Edgar era um pouco mais alto que eu, seu cabelo tinha uma cor escura - igual o de Dante - com alguns fios brancos aparentes que davam elegância, seus olhos tinham um tom de castanho bem claro, seu sorriso era acolhedor e tranquilizante. Ele usava um terno preto, feito sob medida, que ficava destacado em sua pele clara, dando a impressão de um homem calculista e autoritário. Edgar, mesmo com 44 anos, era muito bonito e não aparentava nem um pouco ter sua idade.

Assim que ele fechou a porta, me estendeu uma das mãos.

— Prazer, Edgar Gonzáles. Presidente da G-Arts! - ele sorriu.

— Aksa Fernández, estudante de Administração Empresarial. - sorri também.

Seus olhos saíram dos meus, desceram até meu pescoço e pararam em cima do meu colar, logo em seguida, ele voltou a encarar meu rosto, analisando cada centímetro. Edgar franziu o cenho, demonstrando estar com dúvida, mas, pareceu deixar o assunto para depois.

— Você tava chorando? - esperou alguns segundos - Foi o Dante? - ele fez uma cara de decepção - Meu filho tem 24 anos, mas age como se tivesse 15.

— O Dante não fez nada Sr.Gonzáles. Nós estávamos conversando, eu lembrei de algumas coisas e... - abaixei o olhar rapidamente - acabei me emocionando.

— Você parece um pouco triste. - ele inclinou um pouco a cabeça para o lado - Preciso me preocupar com o motivo da sua tristeza?

Será que todo mundo dessa família sabe ler expressões faciais?

— Não! - respondi rápido demais - Só fiquei emotiva por uma lembrança, nada além disso.

Edgar analisou meu olhar por alguns segundos com uma feição de dúvida. Ele sabia que havia um motivo sério para eu ter chorado no dia da entrevista que iria decidir o meu estágio, mas não disse nada além de:

— Tudo bem, se você está dizendo. Sente-se, por favor. - puxou a cadeira em frente à sua - Me desculpe pelo atraso, tive uma reunião inesperada. - ele rodeou a mesa e sentou em sua cadeira, que mais parecia uma poltrona.

— Sem problemas. - sorri e deixei qualquer lembrança de Leandro bem longe de mim.

— Conversei com Marcelo sobre você, ele me disse coisas muito interessantes. - sorrimos - Resolvi tomar a liberdade de conferir seu histórico escolar e fiquei surpreso com tudo que vi! - seus olhos pareciam brilhar - Notas excelentes desde o 1° ano no Ensino Fundamental, passou em dez universidades diferentes, ficou em 1° lugar no vestibular da oitava melhor faculdade estadual do país, está entre os cinco alunos destaques da Udesc ... Uau. Agora eu entendo porque a diretora da sua universidade te indicou sem pensar duas vezes!

Eu sempre fui péssima em receber elogios, por isso, apenas sorri por ver o quão surpreso Gonzáles estava.

— Como você já deve saber, vamos contratar mais dois alunos do seu curso. - acenti com a cabeça - Cada um vai receber o cargo de acordo com as notas, e como você, Srta.Fernández, me surpreendeu muito - ele sorriu outra vez enquanto se recostava na cadeira - será minha assistente.

Fiquei um pouco confusa ao ouvir aquilo. Ele disse que havia se surpreendido com as minhas notas, porque iria me colocar como assistente?

— Estagiários não podem trabalhar mais de 6 horas por dia, por isso você não vai ser uma assistente comum, até porque eu já tenho a doce Lívia - ele disse em um tom sarcástico enquanto se levantava arrumando o botão do paletó - Sei do seu potencial Aksa, por isso quero te mostrar o mundo do empreendedorismo pessoalmente, mas só posso fazer isso se for minha "secretária pessoal".

— Desculpe Sr.Gonzáles, acho que não entendi direito! - eu realmente estava com dúvida.

— Se você ocupar qualquer outro cargo nessa empresa, vai aprender as coisas, por meio de algum dos muitos funcionários que têm aqui e eu não quero isso. - eu ainda não entendia muito bem e ele percebeu - Os funcionários daqui vão ensinar os outros estagiários a serem bons administradores, como se fossem Diretores da empresa. Mas, eu vou te ensinar a administrar uma empresa como se você fosse a dona dela! E o único modo de eu ter contato direto contigo durante seu tempo aqui, é te nomeando minha "secretária pessoal".

— E o que fez o senhor me diferenciar dos outros estagiários? Por que eu e não eles?

— Eles estão na Udesc porque precisam fazer a vontade dos pais ricos; já você, se esforçou para estar aqui. - ele escorou na mesa com as mãos no bolso da calça, ficando ao meu lado, enquanto eu ainda estava sentada - É simples Aksa: você lutou, conquistou isso tudo por mérito seu; eles receberam por causa do sobrenome que carregam. Eu não preciso de sobrenomes, preciso de profissionais! - ele inclinou a cabeça para o lado novamente - Entendeu?

— Acho que sim. - pisquei algumas vezes.

Ele sorriu e voltou para a sua cadeira.

— Sua sala fica aqui nesse andar, a Lívia irá mostrá-la para você, seu horário é das 9:00 às 15:00. Como a senhorita já está quase no fim do 5° período, por enquanto vai apenas analisar contratos, estudar cláusulas e estratégias, com o tempo, vou introduzindo você em alguns assuntos da empresa para entender melhor a prática de administração. Alguma dúvida?

— Sim, só mais uma. - ele cruzou os dedos em cima da mesa, mostrando que estava atento à minha pergunta - Quem vai ser meu supervisor?

Ele abaixou a cabeça e sorriu.

— Eu.

Fiquei com um pouco de receio ao ouvir que Edgar seria meu supervisor, ele parecia muito entusiasmado com o meu cargo.

Será que eu vou conseguir ser a administradora que ele espera?

Saí da sala do meu chefe pensando nisso. Eu estava feliz por Edgar ter visto algum potencial em mim, mas, saber que o dono de uma empresa tão grande iria me ensinar as coisas pessoalmente, era um pouco assustador.

Nos primeiros dias, fiquei um pouco perdida por acompanhar Edgar em praticamente todas as reuniões e compromissos que envolviam o lado administrativo da empresa, ele realmente estava me fazendo ter um olhar de CEO e não de Diretora.

Hoje, há 9 meses estagiando na G-Arts, aprendi coisas que jamais pensei em ver. Os outros alunos do meu curso que estão aqui, não aprenderam 30% do que Edgar me ensinou.

Confesso que o cansaço aumentou bastante porque precisei me inscrever em um curso de inglês, espanhol e francês que dava aulas nos fins de semana com professores nativos, uma semana depois de começar meu estágio.

No curso, o diálogo e a pronúncia eram tidas como essenciais, por isso os alunos conseguiam alcançar a fluência com mais velocidade. Pode parecer impossível, mas aprendi a falar o espanhol com perfeição depois de um mês e alguns dias, demorei dois meses e duas semanas para aprender a falar o inglês com fluência, e quatro meses para ser considerada fluente no francês.

Por causa dessa estranha velocidade para aprender três línguas diferentes, decidi fazer alguns testes para saber o valor exato do meu QI, e o resultado foi de 152. Depois dessa descoberta, a minha extrema facilidade para aprender, guardar e reproduzir informações, ficou clara.

Eu estava na sala de reuniões com Edgar e o diretor financeiro da empresa, Bernardo Campos. Ambos estavam discutindo alguns lucros e prejuízos que a G-Arts havia apresentado nos últimos meses.

— Temos só mais um assunto a considerar Edgar, - Bernardo dizia - o projeto de descobertas da empresa, não está apresentando lucros tão significativos. Devíamos considerar a hipótese de acabar com ele, para darmos mais atenção à compra de quadros famosos.

— Não seria um bom investimento! - eu disse enquanto estava com a cabeça baixa e arregalei os olhos ao perceber que os dois haviam me escutado.

— O que você disse? - o diretor financeiro parecia um pouco incomodado com a minha intromissão.

Só tinha feito um comentário, não era para ele ter sido considerado. Eu nunca me envolvia nas reuniões, apenas ouvia e depois analisava as decisões tomadas.

Meu coração começou a acelerar, fiquei inquieta, engoli seco e direcionei meu olhar para Edgar, que parecia surpreso e curioso com a minha interrupção.

— Fui eu que te fiz uma pergunta e espero que você me responda, secretária. - o diretor disse dando ênfase ao "secretária".

Bernardo tinha por volta dos 51 anos, trabalhava na G-Atrs há 9, por isso conhecia todas as ações da empresa e não admitia que ninguém, além do Sr.Gonzáles, tratasse desses assuntos em sua presença.

Edgar direcionou um olhar furioso para Bernardo, pela forma de desprezo que o mesmo havia falado comigo. Ele abriu a boca para me defender, mas, respondi antes que ele pudesse fazer isso.

— Eu disse que não seria um bom investimento! - usei um tom de voz um pouco mais firme.

Eu poderia perder meu emprego, mas não deixaria ele se referir à mim daquela forma.

— Eu posso saber que propriedade você tem para falar sobre esse assunto?

Em outras palavras, ele estava dizendo "Quem é você para falar sobre isso comigo?"

Olhei para Edgar, que parecia me dar permissão para expor meu raciocínio. Endireitei minha postura e mostrei confiança ao expor minhas idéias.

— Em minhas análises sobre as últimas ações da G-Arts, vi que o projeto desenvolvido para a descoberta de novos talentos tem dado um lucro mensal de 0,5%, enquanto a compra de quadros famosos, dá um prejuízo de 1 à 2% quando não são vendidos pelo preço que foram adquiridos!

— E? - Bernardo esnobou.

— O projeto tem dado lucro, acabar com ele seria a mesma coisa que tirar dinheiro da empresa.

— O projeto é um lucro extra, já a compra de quadros é um lucro fixo. - Bernardo disse com certeza.

— A compra de quadros tem a possibilidade de ser lucrativa, o que faz dela um investimento baseado em sorte. Pelo tempo que trabalha nesse ramo Sr.Campos, sabe que uma empresa não trabalha com sorte! - Edgar sorriu ao ouvir aquilo - Além de lucros sólidos e garantidos, a descoberta de novos talentos tem dado credibilidade para a G-Arts, projetos sociais são bem vistos por novos parceiros!

— E a senhorita sabe explicar porque eu não vejo sentido algum no que você acabou de dizer? - Bernardo soltou um sorriso cínico.

— Porque você tem a visão de um Diretor, e ela tem a minha visão! - Edgar disse e o sorriso de Bernardo desapareceu - Não vamos mudar nada no projeto e a atenção que a compra de quadros está recebendo, é mais que suficiente. Se não existe mais assuntos a serem tratados, podemos dar essa reunião como encerrada!

O Sr.Gonzáles se levantou da cadeira, apertou a mão de Bernardo, enquanto eu apenas assenti com a cabeça para o mesmo e fomos em direção à porta de saída.

— Parabéns Aksa! - o presidente da empresa disse ao entrarmos em sua sala.

— Pelo que, Sr.Gonzáles?

— Sei que você me chama de "senhor" por respeito, mas, não tem ninguém nessa sala além de nós dois, Aksa. Pode me chamar de Edgar! - sorri em concordância - Você acabou de mostrar que tem ainda mais potencial do que eu imaginava. O jeito que expôs suas idéias de forma direta e clara, mostrando que estava familiarizada com o assunto, foi incrível!

— Muito obrigada senhor... - ele arqueou as sobrancelhas - Edgar! - sorri e ele também.

— Acho que já tomei muito seu tempo, pode ir almoçar Srta.Fernández! Você precisa repor as energias para a outra reunião que teremos à tarde. - ele sorriu e sentou em sua cadeira.

As informações naquela empresa corriam na velocidade da luz. Não demorou muito para que as pessoas soubessem do acontecido na sala de reuniões, e como esperado, as especulações sobre o meu suposto "caso" com Edgar, aumentaram ainda mais.

A idéia de estar dormindo com Edgar, só para ter mais valorização na empresa, me deixava furiosa porque eu conquistei aquele cargo pelo meu esforço. Aprendi três línguas diferentes em quatro meses, estudei cada ação daquela empresa enorme, montei estratégias, li centenas de contratos, fui em dezenas de reuniões com Edgar, estava aprendendo sobre Administração Empresarial há pouco mais de três anos... Tudo isso, para dizerem que eu cheguei onde estou por transar com o meu chefe?

Seis meses depois do acontecido na sala de reuniões, as especulações só aumentavam. Principalmente depois de descobrirem que Edgar havia se mudado para Florianópolis alguns dias depois da minha contratação. O lugar onde eu trabalhava, era só uma das filiais da G-Arts, a sede/matriz da empresa estava no Rio de Janeiro, e era lá que Gonzáles morava.

Os boatos diziam que Edgar havia ido para Florianópolis apenas para ver o potencial da nova estagiária, por isso ocupou o cargo de presidente daquela filial por alguns dias; depois ele voltaria para o Rio. Mas, por algum motivo, ele decidiu se mudar para Florianópolis e administrar a sede oficial da G-Arts à distância, por tempo indeterminado. Maioria dos trabalhadores achavam que o motivo da mudança repentina, era a Srta.Fernández aqui; mas, eu acreditava que era por causa de Dante, já que o único filho dele estudava naquela cidade.

Eu estava há três anos e oito meses estudando na Udesc. O tempo máximo que eu podia estagiar, era dois anos, e eu já estava na G-Arts há um ano e três meses. A preocupação sobre o que eu iria fazer depois que a faculdade acabasse, começou a me incomodar. Leandro ainda não aceitava o término em hipótese alguma, e eu não sabia se a empresa iria me contratar depois que meu estágio acabasse.

Era dia 10 de setembro, uma quarta feira normal do meu último período na Udesc. A aula de Negociação e Desenvolvimento de Lideranças, estava prestes a acabar e eu precisava me preparar para o teste de Internacionalização de Empresas, que aconteceria no horário seguinte.

Quando o professor liberou a classe, peguei meu fichário e algumas canetas para revisar a matéria durante o intervalo, mas antes de sair da sala, senti uma mão puxar meu braço com força; era Alice. Ela praticamente me arrastou pelos corredores e só me soltou quando entramos no banheiro feminino.

— Você vai me explicar, agora, o que está acontecendo Aksa! - ela estava com raiva, mas não levantou a voz.

— Como assim, Alice? - tentei disfarçar o nervosismo.

— Primeiro, você se afasta de todos os seus amigos da Udesc assim que começa a namorar com o Muralha; depois se afastou de mim e do Gus sem dar a mínima satisfação. - ela parou alguns segundos e seguiu o raciocínio, um pouco mais calma - Você mudou Aksa! Depois que começou a morar na mesma casa que o Leandro, você se tornou distante, triste, amargurada e quieta demais. Você não é assim amiga, eu conheço você. Por favor, me deixa te ajudar!

Eu estava feliz por Alice ainda se preocupar comigo, mas, senti medo de falar o que realmente acontecia entre eu e Leandro.

— Não tá acontecendo nada, Alice! - baixei a cabeça para segurar o choro e me virei para sair do banheiro.

— Eu não queria te contar porque achei que você fosse ficar brava, mas, o Dante que estudava na turma de Direito, veio conversar comigo. - ainda de costas, levantei a cabeça e arregalei os olhos - Ele me disse que você ficou tensa e até passou mal, quando ele comentou sobre o temperamento do Leandro. Não mente pra mim amiga, por favor. - ela me virou com cuidado, segurou meu rosto e acariciou minha bochecha com o polegar - O Muralha já bateu em você?

Acabei chorando sem perceber, não conseguia controlar as lágrimas e me senti segura perto de Alice. Abracei ela com a maior força que consegui no momento e entre os soluços, sussurrei:

— Por favor, me ajuda!

Ela me abraçou forte também, mas alguns segundos depois, ouvi a porta de um dos banheiros ser aberta. Me afastei de Alice pelo susto e vi Helena, a namorada do Gus.

— Meu Deus, me desculpa, eu não queria atrapalhar o momento de você duas.

— Sem problemas. - eu disse sorrindo, com o braço em volta da cintura de Alice.

Helena se direcionou para a pia e lavou as mãos. Depois me deu um abraço e disse, em um tom quase inaudível:

— Cuidado Aksa, as paredes desse lugar tem ouvidos!

Ela se afastou e direcionou um sorriso, um tanto duvidoso, para mim; depois saiu do banheiro se despedindo de Alice.

A frase de Helena me causou um sentimento estranho, mas não liguei muito. Fui para a aula feliz por saber que Alice iria me ajudar, teríamos que esperar até termos uma prova concreta, mas eu ficaria na casa dela para evitar outro surto de Leandro. Voltei para casa com um sorriso largo no rosto.

Eu tinha que seguir o plano: passar a noite em casa e ir para a casa de Alice depois do expediente na G-Arts amanhã. Eu precisava de tempo para fazer as malas e, principalmente, não podia levantar suspeitas e correr o risco de Leandro desconfiar de alguma coisa. Parecia que tudo ia dar certo, mas por algum motivo, eu estava com um pressentimento horrível.

Ao entrar no meu apartamento, tranquei a porta como de costume, mas imediatamente ouvi o estouro de algo sendo quebrado na parede, bem ao meu lado da minha cabeça e senti os cacos violentos em minha pele.

— VOCÊ ACHA QUE EU SOU OTÁRIO?

Ainda de frente para a porta, senti minha alma tremer ao ouvir Leandro dizer aquilo. Não tive coragem de virar. Comecei a chorar por saber o que estava prestes a acontecer!

Ele segurou meu cabelo com brutalidade, depois me jogou no chão com a maior força que conseguiu.

— Não Leandro, por favor! - as lágrimas desciam com força, enquanto meu coração disparava.

— EU NÃO SOU IDIOTA! EU SEI QUE VOCÊ TÁ CONVERSANDO COM AQUELE FILHO DA PUTA DO DANTE, - ele me deu um chute na barriga com tanta força que fiquei tonta - SEI QUE VOCÊ PEDIU AJUDA PRA ALICE. - outro chute.

Leandro fazia academia cerca de 2 ou 3 vezes por semana e era mais alto, naturalmente, ele era muito mais forte que eu, mas quando ele surtava, a força dele ficava imensurável. Precisei só desses dois chutes para começar a cuspir sangue!

Tentei me levantar e acabei levando um soco forte, dessa vez no rosto. Leandro não batia no meu rosto, ele sabia que qualquer idiota veria as marcas e perceberia o que realmente acontecia naquela casa, mas hoje tinha alguma coisa diferente, ele estava com ódio indescritível de mim.

Não consegui contar quantos chutes e socos levei, alguns golpes foram no rosto, outros no resto do corpo.

Me lembro que estava quase inconsciente, mas senti as mãos de Leandro no meu cabelo novamente, me arrastando pelo chão até me prensar parede.

— QUANDO VAI ENTENDER QUE VOCÊ É MINHA, PORRA? - ele apertou meu pescoço com força - NINGUÉM, AKSA, NINGUÉM VAI TIRAR VOCÊ DE MIM. SABE POR QUE? - ele apertou ainda mais - EU MATO VOCÊ ANTES QUE ISSO ACONTEÇA!

Não conseguia encostar meus pés no chão, estava totalmente sem ar e Leandro parecia não ligar para isso. Tudo ficou embaçado, minha cabeça doía em um nível surreal e eu não tinha forças para tirar as mãos dele de mim. Eu ia morrer, sentia isso.

— Por favor. - sussurrei com as minhas últimas forças.

Leandro me olhou mais uma vez e apertou um pouco mais as mãos em volta do meu pescoço antes de me soltar. Caí com força no chão e respirei pesadamente até conseguir me virar de bruços. O sangue que saía da minha boca e do meu nariz dificultavam ainda mais minha respiração. Minha visão continuava embaçada, a pressão dentro da minha cabeça parecia eterna, precisava tossir, mas não tinha forças.

Lembro de ver Leandro arremessando meu celular na parede com força, mas não conseguia reagir. Deitei a cabeça no chão como um sinal de rendição; não iria lutar se a morte viesse, qualquer coisa seria melhor que passar o resto da minha vida com Leandro.

Meus olhos ficaram pesados e eu apenas os fechei, sem me importar se iria acordar ou não.

Para minha infelicidade, quando acordei o dia já tinha amanhecido e eu estava deitada na minha cama com um aparelho de respiração no nariz e alguns fios no peito. Não estar em um hospital, significava que eu ainda estava presa a Leandro.

Tentei me levantar e senti uma dor forte no corpo todo, um homem veio até mim e gentilmente encostou meus ombros na cama.

— Ei, calma. Você não pode fazer esforço! - minha vista estava prejudicada pelo inchaço dos olhos, mas ainda consegui demonstrar desconfiança e ele percebeu - Meu nome é Daniel, sou médico e primo do Leandro. Lembra de mim?

Queria não lembrar de Daniel! Foi ele quem me deu o atestado médico na última vez. Me deixava em pânico saber que veria Daniel em minha casa só por um motivo.

Leandro apareceu no quarto e se escorou no batente da porta com os braços cruzados.

— Bom... Acho que já vou indo. - Daniel disse, arrumando suas coisas - Volto daqui algumas horas para ver como você está!

Segurei sua mão como um pedido desesperado para que ficasse e senti meus olhos encherem d'água. Daniel olhou para Leandro, como se pedisse permissão, mas achou melhor ir embora antes de ter uma resposta.

Assim que Daniel saiu, Leandro entrou por completo no quarto. Virei o rosto para o lado contrário quando percebi que ele havia se sentado ao meu lado na cama.

— Você sabe que seria muito mais fácil se aceitasse tudo isso. Então, por que dificulta tanto as coisas? - ele perguntou em um tom triste e senti seu olhar em mim, mas continuei com a cabeça virada - Não vou pedir pra você falar comigo, seria desumano demais exigir isso depois de tudo que aconteceu. Mas, não vou deixar você ficar longe de mim! - ele se levantou lentamente da cama para sair do quarto, mas parou a pouco centímetros da porta - Eu já levei o atestado médico na G-Arts, na Udesc e no seu curso. Você precisa descansar, daqui três semanas sua rotina vai voltar ao normal!

Ao ver Leandro saindo tranquilamente do quarto, eu percebi que não importava o quão submissa eu fosse a ele, em algum dia, entre um surto e outro, ele acabaria me matando sem remorso algum. Eu tinha que me livrar dele de alguma forma, mas teria que fazer isso sozinha. Eu precisava tentar!

Era dia 3 de novembro, 19:23 da noite. Meu coração estava acelerado, minhas mãos começaram a tremer e eu não conseguia prestar atenção em nada do que a professora de Gestão da Inovação Tecnológica estava dizendo.

Fica calma, Aksa. Tem gente observando você! - eu pensava.

Demorei um mês e alguns dias para montar aquele plano. Qualquer erro, qualquer falha, poderia resultar no meu enterro, por isso eu precisava ter cuidado. Respirei fundo e olhei no relógio: 19:25. Chegou a hora!

O tempo parecia não passar, dois minutos pareciam duas horas, eu só queria sair daquela sala. Não estava aguentando mais aquilo!

Olhei para o lado e vi a Aksa levantar da carteira, provavelmente ela iria ao banheiro.

Eu estava preocupada com ela, as coisas haviam piorado muito.

O Leandro apareceu na Udesc com um atestado médico para a Aksa um dia depois da nossa conversa no banheiro. Eu sabia o que havia acontecido, sabia que ela não tinha sofrido um acidente, mas não podia colocar a vida dela em perigo. Tentei ligar para ela centenas de vezes durante aquelas semanas, mas só caía na caixa postal.

Fiquei um pouco mais aliviada ao ver ela voltar para a faculdade, mas percebi que estava tudo diferente de novo. A Aksa não fazia nem questão de me dar um "boa noite" quando chegava, ela me ignorava o tempo todo, provavelmente por medo, e eu não sabia o que fazer.

Eu não queria colocar a vida da minha melhor amiga em risco por fazer alguma besteira, ou por tomar uma atitude sem pensar direito. O Leandro era filho de um policial, eu não podia cometer erros!

Voltei para a realidade quando senti meu celular vibrar dentro do bolso, por causa de uma mensagem.

"Tem uma carta no último bolso da sua mochila; pega ela com cuidado e disfarça as expressões faciais quando for ler. Não entra em pânico Alice, eu preciso de você calma!" - Aksa.

Fiquei paralisada por alguns segundos e levei um tempo para digerir o que eu tinha acabado de ler.

Olhei ao redor rapidamente e peguei a carta na minha mochila (eu não sabia como ela tinha parado ali, mas, parecia ser uma coisa importante). Fiz o mínimo de barulho possível, olhei ao redor rapidamente outra vez, respirei fundo e comecei a ler.

"Sei que você deve estar assustada, mas, confia em mim. Eu montei um plano pra conseguir denunciar o Leandro, sem ter a possibilidade dele ser inocentado, e você vai ser uma das peças principais!

Leia a carta inteira e presta bem atenção no que você tem que fazer.

Primeiro: Quando você for liberada, aproveita a movimentação do intervalo e pega sua mochila. Vai direto para o portão de entrada da Udesc, vai ter alguém te esperando lá.

Segundo: Dentro do envelope tem a chave reserva do meu apartamento, o porteiro já sabe da visita de vocês.

Terceiro: Estacionem à alguns metros da entrada do meu prédio. Assim que vocês desligarem o carro, conte 30 segundos mentalmente e vocês vão ver o Leandro saindo.*Se isso não acontecer, volta pra Udesc e esquece o plano!*

Quarto: Assim que vocês entrarem no meu apartamento, pede para a outra pessoa ligar para a polícia, mas, não finalizar a denúncia se a ligação cair no 11°batalhão porque é lá que o meu sogro trabalha.

Quinto: Enquanto ele liga, vai direto para o quarto de hóspedes e olha dentro da segunda porta do guarda-roupa embutido. A prateleira de baixo tem um fundo falso! De trás da madeira tem um mini computador, nele estão as imagens das câmeras que eu instalei há um mês atrás. As imagens são fortes Alice, mas eu preciso que você grave todas porque elas são as minhas provas contra ele!

Sexto: Quando a polícia chegar, entrega as provas para eles e me manda mensagem. Não deixa eles irem embora até o Leandro chegar em casa; entendeu?!

Se você olhar no relógio nesse exato momento, vai ver que faltam 4 minutos para o intervalo.

Eu preciso da sua ajuda Alice. Preciso que você faça tudo o que eu pedi!

Tenha cuidado e não expresse nervosismo, tem gente observando você!"

Olhei no relógio e faltavam exatos quatro minutos para o intervalo. Dobrei a carta com cuidado e a coloquei dentro do meu caderno, comecei a guardar minhas coisas silenciosamente.

Eu precisava ser rápida, mas cautelosa.

Ao ser liberada, andei em passos largos até o portão e vi Dante fazendo um sinal para eu entrar no carro.

— Você sabe o que a gente precisa fazer? - ele perguntou quando fechei a porta - A Aksa só me disse a velocidade que eu tenho que manter enquanto estiver dirigindo até a casa dela!

— Caramba. Além dos minutos, ela calculou até a velocidade do carro? - perguntei surpresa, usando um volume baixo.

— O quê? - Dante inclinou a cabeça para o lado e me olhou.

Jesus, como esse homem consegue ser tão lindo?

Foco, Alice. Foco!

— Nada. Só dirige!- olhei para a frente - Eu te falo o caminho.

Assim que entrei no banheiro feminino do segundo piso, fui conferir todas as portas para ver se eu estava sozinha. Não podia ir no que ficava perto da minha sala, lá seria o primeiro lugar que Helena procuraria quando percebesse a minha demora.

Vocês devem estar se perguntando o porquê da namorada do Gustavo ser a informante do Leandro, quando se trata do meu comportamento na faculdade. Vou fazer um breve resumo: a Helena ficava sério com o Muralha, mas, quando ele me viu pela primeira vez, tudo mudou. O Leandro não queria nada sério com a Helena, mas ela sentia uma paixão tão doentia que concordou em participar de todo o plano para ele me conquistar!

Os dois combinaram de estar na festa do Zé aquele dia, e o papel da Helena era fingir estar interessada no Gus, ficar com ele e depois de um tempo começar a namorar com ele, só pra impedir que algum relacionamento sério surgisse entre mim e o Gustavo. Ela sempre soube que só estava sendo usada - tanto na época que ele queria me conquistar, quanto na época que ele começou a me trair - mas, continuou fazendo as vontades dele por causa do "amor" que sentia!

Era 19:28 quando mandei uma mensagem para Alice. Eu conhecia minha amiga, com certeza ela ficaria um pouco em choque e precisaria de uns dois minutos para fazer o que pedi.

Peguei meu celular e liguei para Gustavo às 19:30 em ponto. Eu ia precisar de mais tempo para convencer ele a me ajudar!

— Alô?

— Oi Gus.

— Aksa?

— Sim, sou eu. - respirei fundo e abaixei a cabeça - Preciso que você me faça um favor!

— O quê?

— Preciso que você chame o Leandro pra sair agora, nesse exato momento, e mantenha ele fora de casa até eu te mandar mensagem.

— Por que?

— Gus, por favor, eu não tenho tempo pra te explicar isso agora. Eu respondo qualquer pergunta sua quando isso acabar, mas, eu preciso de você!

— Aksa, você se distancia de mim sem dar motivos, passa meses sem me desejar um "bom dia", some de todo mundo sem dar aviso prévio e depois me liga, às 19:33 pedindo para eu chamar seu namoradinho pra sair? - ele parecia bravo - Me diz, por que eu deveria fazer isso por você?

Deixei uma lágrima cair sem querer.

— Porque eu posso não acordar amanhã! - disse em um tom triste e Gustavo pareceu ficar surpreso - Sei que eu decepcionei você Gus, sei que me afastar de você daquela forma foi totalmente injusto, mas acredite: eu nunca teria feito isso se não tivesse um bom motivo. - outras lágrimas desceram - Sei que você tá chateado comigo, mas por favor, eu preciso da sua ajuda Gus!

Ele ficou alguns segundos em silêncio e eu comecei a achar que meu plano iria dar errado. Todos os cálculos, os testes, as provas, não teriam valor algum se o Gus não me ajudasse.

— De quanto tempo você precisa?

Sorri largamente e chorei ainda mais ao ouvir aquilo.

— Não sei exatamente, talvez 20 ou 30 minutos. Mas, você só pode deixar ele ir embora quando eu te mandar mensagem. Tá bom?!

— Tá.

— Muito obrigada, Gus! - sorri sem acreditar que meu plano iria dar certo.

— Me agradece depois, quando você responder as minhas perguntas. - concordei ainda sorrindo - Não sei o que está acontecendo, mas tenha cuidado!

— Você também! - disse e ele desligou a chamada.

Quando saí do banheiro, o intervalo já havia começado. Fiquei fingindo que estava estudando durante eternos quinze minutos, para ninguém desconfiar de nada.

Voltei para sala e vi que Alice não estava lá, com certeza ela já tinha chegado no meu apartamento.

No mesmo dia que Daniel foi lá em casa me examinar, tirei fotos do meu corpo inteiro - as marcas, os hematomas, os cortes. Comprei mini câmeras e instalei no apartamento alguns dias depois que pude sair da cama; fiz uma coisa que irritava Leandro, de propósito, porque eu precisava de provas concretas para incriminá-lo.

Eu não queria que Alice ou Dante vissem o vídeo que mostrava as agressões, ele era pesado demais, mas, eu precisava das gravações e só eles poderiam fazer isso.
Meu coração quase saiu pela boca quando senti meu celular vibrar.

"Eles chegaram!" - Alice

Imediatamente, mandei uma mensagem para Gustavo dizendo que ele já podia levar o Leandro para casa.

Guardei meu celular e quando olhei em volta, percebi o olhar pesado de Helena sobre mim.

Não me dei o trabalho de dizer alguma coisa para ela, eu precisava chegar em casa antes de Leandro, afinal de contas, eu era vítima. Juntei minhas coisas e saí com pressa da Udesc, corri praticamente o caminho todo até a minha casa.

Havia duas viaturas na porta do meu prédio, os policiais estavam do lado de fora - provavelmente, esperando por Leandro.

Minha ficha só caiu quando vi Alice olhando ao redor com um olhar meio desesperado. Ela soltou um suspiro de alívio quando nossos olhares se cruzaram, eu comecei a chorar e corri para seus braços sem pensar duas vezes. Abracei-a com força e chorei igual uma criança ao me sentir segura depois de quase três anos.

— Acabou, amiga. Acabou! - ela dizia enquanto chorava junto comigo.

Percebi Dante chegando perto de mim e estendendo os braços para me abraçar. Não sei explicar, mas perto dele, eu sentia segurança e confiança, como um "porto-seguro".

— Eu sinto muito Aksa, por tudo! - ele disse chorando enquanto passava o polegar em minhas bochechas - Me desculpa, eu devia ter denunciado ele no dia da entrevista. Eu podia ter evitado tanta coisa e ...

—Shhh... Tá tudo bem. - acariciei uma de suas mãos que ainda estavam em meu rosto - Já passou!

Enquanto ainda estava abraçada com Dante, percebi outro carro chegando. No meio de tantos rostos presentes naquele lugar, vi Leandro saindo do veículo com uma expressão de ódio.

Meu coração acelerou em um ritmo fora do normal, quando o vi caminhando em minha direção com pressa e raiva. Em questão de segundos me lembrei de todas as agressões - o primeiro tapa, a primeira surra... - e senti meus olhos encherem d'água. Engoli seco, senti calafrios e uma sensação de que meu sangue estava gelando ainda dentro das veias. Como um ato reflexo, me soltei dos braços de Dante e dei um passo para trás ao ver seus punhos fechados.

Leandro era a única pessoa que conseguia me fazer sentir daquela forma. Haviam cerca de oito policiais em volta de mim e mesmo assim, eu senti medo dele!

Dante se colocou em minha frente, quando percebeu que ele estava chegando perto demais.

Os policiais fizeram a abordagem antes que Leandro fizesse outra besteira, não deram nem chance de ele ligar para o pai.

Ao vê-lo dentro do camburão, se afastando aos poucos, senti uma coisa que eu ansiava a anos: liberdade. Sorri e chorei de emoção porque finalmente meu pesadelo tinha chegado ao fim. Eu sabia que teria que participar de algumas audições jurídicas para conseguir a condenação de Leandro, mas, só de vê-lo longe de mim, já me sentia livre!

No outro dia, acordei no horário de sempre e fui para a empresa como de costume, mas, assim que coloquei os pés na recepção, a Lívia disse que o senhor Gonzáles queria conversar comigo, em particular. A caminho da sala dele, comecei a pensar que poderia ser por causa de Dante ou dos boatos que estavam correndo na empresa.

— Bom dia, Aksa! - ele disse com um sorriso contagiante.

— Bom dia Sr.Gonzáles. O senhor mandou me chamar? - perguntei enquanto entrava calmamente na sala.

— Sim, queria conversar sobre um assunto contigo. - ele apontou para a cadeira em sua frente e eu me sentei - Fiquei sabendo do que aconteceu ontem; e sinto muito!

— Tá tudo bem, o pior já passou! - sorri tentando aliviar o clima.

— É sobre isso que eu queria conversar com você! - ele me direcionou um olhar preocupado e meu sorriso se desfez - Seu ex-namorado é filho de um policial corrupto, Aksa. Eu não quero te desanimar, mas, eu duvido que ele passe mais de quatro meses dentro de uma penitenciária; e quando sair, ele vai procurar você! - pisquei algumas vezes tentando digerir aquela informação - Acredite, já vi isso acontecer outras vezes e eu não quero que você tenha o mesmo destino das outras mulheres!

Olhei para o chão, mexi nos nós dos dedos e fiquei alguns segundos em silêncio.

— O senhor acha que seria melhor eu voltar para São Paulo? - olhei em seus olhos tentando achar um refúgio ou algo que pudesse me ajudar naquele momento.

— Seria uma boa idéia, mas, tudo que você fez para chegar até aqui, vai pro lixo. Tudo que você aprendeu até agora, tudo que eu ensinei a você, vai ser desperdiçado.

— Mas, essa é minha única opção! - comecei a ficar um pouco desesperada, sobre o que iria fazer.

— O Dante precisa fazer uma especialização na área dele, e eu preciso voltar a administrar pessoalmente a sede da G-Arts. Vamos voltar para o Rio de Janeiro no início do ano que vem; você pode ir junto, se quiser! - franzi o cenho - Seu curso vai se encerrar daqui umas duas ou três semanas e você já tem 20 anos; se vier com a gente, posso te oferecer um cargo fixo na sede.

— Por quê? - ele franziu o cenho e inclinou a cabeça levemente para o lado, demonstrando que estava com dúvida - Por que o senhor está me ajudando? - olhei fixamente em seus olhos e ele se endireitou na cadeira - Não quero parecer grossa ou ingrata, mas, nós não temos nenhum laço sanguíneo. Não existe nenhum motivo para o senhor me ajudar e me defender tanto!

— Eu já disse, você é diferente. Não consigo, e nem quero, imaginar tudo o que você passou com o Leandro. Mas, só de haver a possibilidade de acontecer algo ainda pior contigo, eu já não consigo dormir! - ele olhou para o chão brevemente, como se estivesse escolhendo melhor as palavras que iria usar - Além do mais, todas as oportunidades que eu te dei até hoje, são mérito seu!

Olhei dentro dos olhos de Edgar e vi preocupação, talvez até um pouco de medo. Não entendi o motivo de ele se preocupar tanto comigo, eu era só uma estagiária.

— Não precisa me dizer a sua decisão sobre a mudança agora. - ele disse, tentando aliviar o clima - Pensa com calma, conversa com a sua família e me dê a resposta quando se sentir pronta. - assenti com a cabeça - Mas, se a sua resposta for "sim", a gente já começa a ver melhor sobre o lugar onde você vai ficar e o cargo que vai ocupar na sede.

— Obrigada pela preocupação Edgar!

— Por nada, Aksa. - ele sorriu enquanto olhava para alguns papéis - Você já pode ir!

Confesso que fiquei um pouco desconfiada no início, essa proposta de Edgar parecia boa demais para ser verdade. Ele estava certo, Leandro viria atrás de mim quando saísse da cadeia e eu não podia esperar por isso, mas me mudar para o Rio de Janeiro com o meu chefe e seu filho, era um tanto estranho.

Aproveitei minhas férias para conversar com a minha família sobre tudo o que havia acontecido: as agressões, a prisão de Leandro, a proposta de Edgar. Minha tia ficou sem acreditar em tudo que eu tinha passado com aquele monstro, a Letícia ficou extremamente irritada por eu não ter contado nada para ela e o Murilo só queria bater no meu "ex"; Luiz foi o único que pensou na proposta do meu chefe como prioridade, já que as outras coisas haviam sido resolvidas. Depois de alguns dias, eles pensaram melhor e disseram para eu aceitar a proposta de Edgar; disseram que eu teria mais chances no ramo de empresas se estivesse trabalhando ao lado de um empresário como Edgar.

Minha família não ia deixar eu continuar morando em Florianópolis, então eu tinha duas opções: voltar para São Paulo ou me mudar para o Rio de Janeiro. Depois de roer todas as minhas unhas e passar várias noites sem dormir, decidi aceitar a proposta de Edgar.

Precisei vender o meu apartamento em Florianópolis e usar boa parte do dinheiro que havia guardado, para conseguir comprar outro apartamento no Rio. Estava tudo decidido, eu iria ficar na parte Administrativa da sede da G-Arts e começaria a trabalhar cerca de uma semana depois da minha mudança.

A parte mais difícil foi me despedir da Alice e do Gus. Eu amava muito os dois, e deixá-los foi uma das coisas mais difíceis e dolorosas que já fiz. Eles foram super compreensivos em relação ao meu motivo de ir embora, mas, não conseguiram disfarçar que, no fundo, eles queriam que eu ficasse em Florianópolis (até eu ficaria, se pudesse escolher).

— Tá nervosa? - Edgar me perguntou.

Por alguns minutos, até me esqueci que já estávamos no aeroporto.

— Na verdade, não. Só tava pensando na Alice e no Gus. - olhei para o chão rapidamente, depois o encarei - Acha que eles vão ficar bem?

— Claro que vão, Aksa. O Leandro é um babaca, mas, não é burro o suficiente para mexer com a filha de um empresário e o filho de um político. - ele me olhou tentando passar segurança - Eles vão ficar bem! Você tem que pensar em você mesma agora. - sorrimos.

Quando nosso vôo foi anunciado, fiquei ainda mais nervosa. Dante percebeu o quanto eu estava tensa, por isso me estendeu uma das mãos enquanto eu ainda estava sentada. Andamos de mãos dadas até o portão de embarque, mas, "travei" à alguns metros da porta do avião, meu corpo ficou rígido sem motivo algum.

— Ela tá bem? - Edgar perguntou enquanto se aproximava de nós dois.

— Tá, sim. - Dante me olhou por alguns segundos - Pode ir pai, daqui a pouco a gente te encontra dentro do avião.

Edgar saiu andando e deixou nós dois lá.

— O que foi, meu amor? - ele soltou minha mão e acariciou meu rosto - Quer desistir?

— Não, acho que só estou com medo! - olhei para cima, tentando encará-lo.

— Não precisa ficar com medo, vai dar tudo certo. Você já fez isso uma vez, e ainda estava sozinha, lembra?

— Eu tinha 17 anos, Dante. As coisas são diferentes agora!

— Verdade, agora você tem 21. - ele sorriu e eu também - Aksa, eu sou quatro anos mais velho, e não tenho metade da maturidade e responsabilidade que você tem! Eu entendo que você já passou por muita coisa, mas, dá uma segunda chance pra você mesma. Meu pai consegue ver um potencial gigante em ti, eu também consigo, então por que você não tenta? Se der errado, é só voltar para casa!

"O sentimento de tentar é bem melhor que o arrependimento de não ter ido atrás!" - disse sorrindo.

— O quê? - Dante inclinou a cabeça levemente para o lado.

— É só uma frase que a minha avó dizia.

— Entendi. - ele sorriu e depois colocou as mãos em meu rosto outra vez - Não precisa se preocupar, não vou deixar nada de ruim acontecer contigo enquanto estiver lá! - ele beijou minha testa, como se quisesse concretizar o que havia acabado de falar.

— As pessoas estão achando que nós somos um casal! - rimos.

— Acho bem improvável isso acontecer! - rimos ainda mais.

— Eae, vamos? - ele me estendeu a mão de novo.

— Vamos!

Mais uma vez tive que recomeçar; mais uma vez tive que deixar meus demônios do passado e enxergar esperança onde não havia. Não foi fácil, nenhuma das duas vezes foi, mas eu precisava daquilo!

" Não importa onde você parou, em que momento da vida você cansou, o que importa é que sempre é possível e necessário recomeçar. Recomeçar é dar uma nova chance a si mesmo, é renovar as esperanças na vida, e o mais importante: acreditar em você de novo! [...] " - Carlos Drummond de Andrade.

*Se virem algum erro, relevem por favor!*🥺

Preparados para conhecer a Aksa na versão CEO?😍

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