Capítulo 7.
Laylah se encontrava desaparecida. No começo estava calmo, pois ficamos sabendo que nosso Pai havia chamado ela quando conversávamos, mas mesmo após isso não voltei a vê-la e estava no meu ápice de preocupação.
Seguindo o último que ela nos disse eu e Miguel continuamos os nossos treinos normalmente, utilizando-os também como um escape para não pensar constantemente nela. Lúcifer às vezes aparecia, e outras vezes ele também simplesmente sumia. Estava tudo tão... Estranho.
Tinha progredido muito, não fazia nada além de treinar até mesmo sozinho quando o Arcanjo devia cumprir com as suas obrigações. O Querubim dizia com frequência o quanto eu estava melhorando, já conseguíamos ter lutas justas, mas eu continuava sendo vencido por ele.
O mesmo acontecia com o castanho, no começo eu apenas me defendia, mas depois de uns quantos treinos tudo estava quase totalmente equilibrado. Sentia-me orgulhoso, poder lhes dar dificuldade na arena já era um sucesso para mim, eles eram e sempre seriam os melhores guerreiros existentes no céu.
Aguardava eles para mais um treinamento enquanto delineava o raio que tinha na empunhadura da espada, esse desenho era a parte da arma que eu mais gostava. O de cabelos escuros prometeu que não faltaria, principalmente porque queria ter uma "conversa de extrema urgência e seriedade comigo", como ele tinha dito.
Afastei meu dedo do raio quando senti minha pele queimar, e ao olhar notei como o desenho se encontrava em um tamanho menor em meu dígito, mas assim como apareceu rapidamente se desvaneceu. Soltei a arma assustado, ultimamente só me aconteciam coisas inexplicáveis, era como se algo estivesse saindo de controle.
-A espada agradece a sua consideração com ela.
Lúcifer e Miguel vinham em minha direção, sendo o Querubim o que tinha falado. Levantei a minha espada e olhei-os estranhado, nunca me acostumaria a vê-los juntos e em paz, mesmo isso soando triste.
-Você realmente veio – Disse olhando Lúcifer.
-Prometi que viria, sou um anjo de palavra – Ele respondeu fazendo sua arma aparecer. – Quero que façamos algo diferente neste treino, veremos se você realmente aprendeu algo.
-O quê você tem em mente? – Perguntei empolgado.
-Você e eu contra Miguel, depois iremos trocar e serão Miguel e você contra mim.
-Nunca achei que eu poderia dizer isto – Falou o Arcanjo. – Mas a tua ideia é brilhante Lúcifer, a melhor que você teve até agora.
-O quê? – O de cabelos escuros indignou-se. – Preciso relembrar quem teve a ideia dos treinos?
-Vamos começar logo – Era cansativo ter que controlá-los para que não brigassem. – Estou confiante em que vamos vencer, Lúcifer.
-Viu, Miguel? Cedo ou tarde ele irá virar uma versão minha, só não tão boa quanto a original.
-Isso não parece legal – Dissemos eu e meu irmão.
Antes que Lúcifer pudesse replicar, parei ao seu lado ficando em guarda obrigando-o a fazer o mesmo para não ser atacado por Miguel. Meu dedo estava novamente queimando, mas ignorei a ardência porque o foco era vencer, ou pelo menos perder dignamente.
O Arcanjo começou a dar golpes que conseguimos defender em sincronia com Lúcifer, parecendo que sempre tínhamos lutado juntos. Em alguns momentos o Querubim precisava nos defender a ambos pela minha falta de reflexos, mas velozmente eu conseguia voltar à luta e revidar os ataques por parte do meu irmão conseguindo acertá-lo, provocando um sorriso de orgulho no de cabelos escuros.
Não tinha noção de quanto tempo tinha passado até que chegamos à conclusão de que não venceríamos Miguel e ele tampouco nos venceria, mais de cem golpes e defesas foram executadas e mesmo assim não existia um vencedor.
-Acho melhor fazermos a troca – Falou Miguel. – Lutar contra Sebastiel se tornou uma tarefa difícil, é quase como lutar contra meu igual.
-Eu não posso falar o mesmo porque primeiro, não sou humilde, e segundo, não existe ninguém igual a mim.
-Ainda – Dei umas batidas nas costas de Lúcifer.
Devia admitir que me sentia poderoso lutando ao lado dos meus irmãos, tinha a sensação de ser indestrutível. Eu e o Arcanjo formávamos uma boa dupla quando de lutar se tratava e isso estava sendo notável no treino, mas não tirava o fato do nosso irmão continuar sendo ótimo no que fazia.
No decorrer dos treinamentos pude reparar que enquanto Miguel se ressaltava nas defesas, Lúcifer se ressaltava nos ataques. Eles eram bons em ambas às coisas, mas se diferenciavam nesses aspectos por serem as suas especialidades.
De um momento pro outro me vi sozinho, meus irmãos tinham se juntado e era eu contra eles. Não deixei o pânico me invadir e defendi a primeira investida de parte deles, colocando força sobre a minha espada para que ela não se desestabilizasse. Um, dois, três, quatro golpes tentaram me atingir, mas me salvei de cada um deles ficando muito mais seguro de mim mesmo ao perceber que eu podia lhes dar batalha. Afinal, tinham sido eles os que me ensinaram tudo que eu sabia.
A irritação já era perceptível no rosto do Querubim, pois não lhe fazia graça não poder me acertar, mas eu o olhava com um sorriso desafiador desfrutando o meu pequeno momento de glória. A situação se inverteu quando finalmente o Arcanjo realizou um movimento que alcançou o lado esquerdo da minha armadura, criando uma oportunidade de me atacar que não foi desperdiçada pelo meu irmão de cabelos pretos.
Cantei vitória muito cedo, pois os dois guerreiros aproveitaram a minha pobre defesa para arremeter em minha contra me deixando nervoso ao não conseguir me proteger de tudo. Não queria e nem podia perder, queria lhes demostrar o que tinha aprendido para assim deixá-los orgulhosos.
Com a ideia de dar-lhes orgulho em mente, a queimação no meu dedo se tornou insuportável causando que mordesse fortemente o meu lábio para não reclamar, estava totalmente arrependido por ter brincado de delinear o desenho da minha arma. Miguel estava preocupado e eu consegui ver isso, mas quando ele ameaçou em parar a luta eu neguei com a cabeça sinalizando que não era preciso, eu podia continuar.
Uma luz se acendeu na minha cabeça, e aproveitando o momento de preocupação do castanho o golpeei com a espada fazendo com que Lúcifer começasse a gritar com ele por não estar atento. Desconhecia alguém mais competitivo que o Querubim.
Os gritos do de cabelo escuro fizeram efeito, pois o Arcanjo não demorou em voltar ao ataque. Ambos realizaram um movimento que com certeza não tinham me ensinado e olhando-o parecia quase impossível de ser efetivado: Eles pularam e as suas asas apareceram, nunca as tinha visto e se não estivéssemos no meio de uma luta teria perguntado se elas eram reais. O seu tamanho superava por muito as minhas e a dos restantes dos anjos. Ainda no ar eles executaram um giro completo e dando um grito voaram em minha direção me apontando com as espadas, provocando que eu me perguntasse se haviam combinado aquilo e apenas estavam aguardando o momento perfeito ou simplesmente tinha acontecido.
Fazendo o que meu instinto mandou, coloquei o meu joelho esquerdo no chão enquanto flectia a perna direita ao mesmo tempo em que colava horizontalmente a espada encima da minha cabeça escutando a colisão das armas contra a minha, mas quando isso aconteceu uma potente luz se desprendeu de mim protegendo-me, ocasionando que Miguel e Lúcifer fossem lançados junto com as suas espadas a vários metros de distância de onde me encontrava.
As asas deles os envolveram escudando-os da queda, mas comecei a me preocupar quando elas desapareceram e eles continuaram no chão imóveis. Tinham caído um pouco afastados um do outro, motivo pelo qual quando corri até onde estavam não soube de quem me aproximar primeiro. Finalmente, depois de alguns segundos duvidando, andei em direção ao meu irmão de cabelos pretos ficando de joelhos ao seu lado e cutucando-o levemente.
-Lúcifer – O cutuquei com mais força.
-Volta a me cutucar e te deixo sem mão – Respondeu ele ainda sem abrir os olhos.
-Graças ao Pai você está bem – Ignorei a sua ameaça. – Por que você não levantou?
-Descobri que o chão do paraíso é confortável – Ele abriu os olhos. – E Miguel?
-Vou ver ele agora.
-Que adorável, você me escolheu em primeiro lugar.
-Não começa, Lúcifer.
Levantei e caminhei até o Arcanjo, o qual nos olhava com um pequeno sorriso no rosto.
-Você também achou o chão confortável? – Perguntei divertido estendendo a mão para ajudá-lo a levantar.
-Acho que até os Arcanjos merecemos um descanso – Disse ele aceitando minha ajuda.
-Desculpem pelo que eu fiz – Falei quando o Querubim chegou até nos ajeitando a sua armadura. – Eu nem sequer sei como isso aconteceu.
-Não precisa se desculpar, irmão – Miguel sorriu com carinho.
-Precisa sim – Comentou o de cabelos escuros. – Não gosto de ser lançado pelos ares.
Abaixei a cabeça envergonhado, visualizando que o raio no meu dedo tinha voltado a aparecer e desta vez não tinha sumido, razão pela qual fiz a espada desaparecer para poder cruzar os braços e esconder as mãos.
-Lúcifer! – O castanho olhou-o com desaprovação. – Estamos orgulhosos de você Sebastiel, mesmo tendo diferentes formas de demostrar isso. Você acabou de desbloquear o seu poder, tenho certeza de que aquilo foi uma minúscula parte do que você pode fazer.
-O meu poder? – Falei animado. – Como eu consegui desbloqueá-lo?
-Possivelmente ele se ativou para te proteger – Replicou o Querubim.
-Eu preciso contar ao Pai – Disse Miguel colocando as suas vestes normais fazendo a arma e armadura desaparecerem. – Ele me pediu que lhe avisasse quando isso acontecesse.
-Por que? – Perguntou Lúcifer bruscamente.
-Eu não sei, provavelmente irei descobrir agora. Até mais irmãos, e Sebastiel, estou orgulhoso de você.
-Obrigado, irmão.
Vimos como ele desaparecia no meio de uma forte luz, e quando já não conseguimos visualizá-lo fechei os olhos para fazer com que as minhas roupas de anjo aparecessem.
-Você não deveria deixar de usar a sua armadura – Falou o meu acompanhante.
-Acredite, venho usando ela continuamente e tem deixado de ser confortável – Disse rindo. – Estas roupas são o verdadeiro paraíso, você deveria usá-las com maior frequência.
-Prefiro a minha armadura, assim estou sempre pronto para qualquer batalha.
-Qualquer batalha? – Olhei-o com estranheza. – Estamos no lugar mais seguro que poderia existir.
-Veremos por quanto tempo – Ele sussurrou.
-O quê você queria falar comigo? – Mudei o assunto. – Disse que era urgente.
-Antes de começar, preciso que você me prometa que apenas vai escutar e aceitar o que vou te dar, sem questionamentos.
-Eu não posso prometer isso.
-Sebastiel, vou dizer algo incomum: Por favor.
Olhei-o por alguns segundos, percebendo que no seu olhar não tinha a seriedade de sempre.
-Está bem, eu prometo.
-Eu quero que você tenha isto e não tire por nada, aconteça o que acontecer.
Ele desprendeu um cordão do seu pescoço que eu não tinha visto até então, pois ele estava debaixo da sua armadura. Era grande e parecia pesado, pendurado nele havia um rubi em formato de lâmina o qual era envolvido por uma serpente de prata. O cordão era magnífico.
-Nosso Pai me deu isto, mas eu fiz algumas mudanças nele – Aceitei o presente e coloquei-o em meu pescoço sentindo arrepios. – Ele disse que eu saberia o que fazer com ele e a quem entregá-lo, e eu soube. Eu quero que você saiba que quando chegar a hora não pedirei que escolha um lado, pois eu sei qual irá escolher e prometo que está tudo bem com isso. Se eu fosse um bom irmão, acredite que eu pararia tudo simplesmente para não te ver envolvido nisso porque você é um grande irmão Sebastiel, o único que pelo menos tentou me acolher junto com a Laylah. Quando precisar de mim ou quando apenas quiser me ver o cordão irá te guiar, mas nunca permita que alguém o tire de você. Eu sempre estarei para você Sebastiel, afinal, é o que os irmãos fazem, não é?
-Se eu fosse humano com certeza estaria chorando – Brinquei para disfarçar que tinha ficado emocionado.
-Se você fosse humano eu te detestaria.
-Posso te abraçar? – Perguntei após alguns segundos em silêncio.
-Não abuse do meu afeto – Respondeu ele com seriedade misturada com um pouco, muito pouco de diversão.
Avancei em direção a ele com a intenção de abraçá-lo para irritá-lo, mas parei abruptamente quando um frio recorreu o meu corpo e senti um vazio dentro de mim, me fazendo tropeçar nos meus próprios pés provocando que Lúcifer tivesse que me segurar para não cair.
-Sebastiel? Sebastiel, o que houve? – Ele me olhava preocupado.
-Eu não sei... Tem algo errado – Não conseguia falar corretamente, algo me impedia de fazê-lo.
O Querubim ia replicar, mas foi interrompido por um grito de horror que foi escutado em todo o paraíso. Um grito que jamais iria esquecer. Eu e meu irmão dividimos um olhar antes de começar a correr apressadamente ao local do qual tinha vindo o som.
Chegamos ao mesmo tempo que os três Arcanjos, os quais usavam as suas armaduras prontos para nos defender. Notamos que todos nossos irmãos estavam ali, formando um círculo ao redor de algo do qual estava me aproximando enquanto me abria espaço entre os anjos e sentia o vazio aumentando.
Ao chegar ao centro das atenções, não conseguia acreditar no que estava vendo. Caí de joelhos no chão e me arrastei até chegar ao lado de Sophia, quem segurava o corpo da minha irmã, da minha pequena, minha Laylah. Ocupei o lugar da minha irmã de cabelos loiros e coloquei a cabeça da ruiva cuidadosamente no meu colo, não queria olhar para ela e vê-la tão... Machucada, mas sabia que ela precisava de mim.
-Irmão – Ela sorriu com tristeza.
-Oi pequena – Segurei a sua mão. – Vai ficar tudo bem.
-Laylah – Miguel se ajoelhou ao meu lado enquanto Rafael se colocava ao lado da nossa irmã. – Rafael vai te ajudar, ele vai te curar.
O moreno fechou os olhos e começou a sussurrar palavras que eram incompreensíveis para mim ao mesmo tempo em que passava suas mãos sobre o profundo corte que ia desde o peito até a barriga de Laylah, mas não estava funcionando. Quando o Arcanjo da cura conseguia fechar a ferida, ela voltava a se abrir expulsando um estranho líquido preto.
-Rafael... Rafael – A ruiva segurou com as suas mãos trêmulas as dele. – Não há o que se possa fazer.
-Eu vou te salvar Laylah, eu vou – Respondeu ele com a voz carregada de desespero.
-Miguel – Disse ela. – Faça-o parar.
-Mas irmã...
-Por favor... Não há o que fazer.
Miguel olhou Rafael e este se afastou cobrindo o seu rosto, deixando-se ser abraçado por Gabriel.
-Pequena – Falei e ela me olhou apertando a minha mão com as poucas forças que lhe restavam, estava gelada e sua pele perdia a cor. – Não me deixa.
-Este é o meu destino, eu vi – Sua voz saía em sussurros. – Eu te amo irmão, me perdoe por ir assim.
-Eu prometi que te cuidaria e eu não cumpri minha promessa... Eu sinto tanto Laylah, me desculpa, me desculpa. Eu te amo pequena, não me deixa.
-Não é... Tua culpa, Sebastiel – O líquido preto começava a sair pela sua boca fazendo-a engasgar. – Nem a tua, Miguel. Vocês... Cuidaram-me e me amaram... Tanto, e eu amo vocês, muito.
-Nós também te amamos, irmã. Todos nós, eternamente – Disse Miguel sorrindo levemente tentando se manter forte.
-Eternamente – Disseram todos os anjos, até mesmo Lúcifer.
Levantei minha vista enquanto mentalmente pedia ao Pai que salvasse a ruiva, notando que o comum sol do nosso lar tinha sido substituído por nuvens cinza e pequenas gotas que começavam a cair no meu rosto. Estava chovendo no paraíso.
-Sebastiel – Olhei minha irmã pela última vez. – Eu amo você... E, por favor... Vença... Por mim.
Os olhos de Laylah se fecharam e abracei com força o seu corpo lhe pedindo que voltasse a mim, ela não podia ter ido embora, ela não podia estar morta. Senti como o seu corpo agora sem vida começava a desaparecer entre os meus braços e soltei um grito que desgarrou a minha garganta quando entendi que ela tinha me deixado, para sempre.
O sorriso dela, o seu olhar, seu cheiro, seu abraço, tudo passou pela minha cabeça rapidamente, deixando cada vez maior e profundo o vazio que agora existia em mim e que nunca me abandonaria.
Os braços de Miguel me envolveram em um abraço e a mão de Lúcifer se colocou no meu ombro, mas eu não podia lhes devolver o consolo pela perda, pois só conseguia pensar em que eu iria achar quem fez isso com ela mesmo que aquilo me custasse tudo. Eu encontraria o responsável e o faria sentir o que eu sentia, porque nada, nunca, iria se comparar a perder ao anjo que eu mais amava, minha eterna pequena e doce Laylah.
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