Grá Mo Chroí
Foi daidí quem contou à Grá sobre a fada de cabeça vermelha, que ajudava os justos e punia os injustos, que chegava quando as pessoas mais precisavam de ajuda. De todas as histórias que seu daídi contava, aquela era de longe a sua favorita, porque depois ele beijava sua cabeça e dizia que ele era a fada de cabeça vermelha de daídi e otou-san, que ele tinha aparecido quando mais precisava de um Grá.
Daídi dizia muito essas coisas, que o faziam se sentir quentinho e se enterrar mais no peito dele, o primeiro lugar em que se sentiu seguro no mundo. Era ali que ele ouvia sobre as lendas, sobre um deus raposa, sobre Eriú e um povo que entrou no subsolo para escapar de uma guerra. E Grá amava cada uma delas, porque era seu daídi que as contava, com os olhos azuis brilhando e a voz melodiosa que fazia seu peito se mover com cada palavra. Não importava se o tinha acordado por um sonho ruim no meio da noite, daídi nunca ficava zangado, não importando o quanto cansado ele estava: ele sempre, nessas horas, contava uma história para Grá e lhe lembrava do porque havia lhe dado seu nome:
"Grá Mo Chroí. O amor do meu coração. Meu mais querido de todos."
E quando daídi estava em seus dias tristes, onde ele ficava sentado e imóvel, os olhos distantes e o rosto úmido, quando nem mesmo otou-san conseguia o fazer sorrir, Grá subia no colo dele e colocava a cabeça em seu peito, ouvindo seu coração, como naquele primeiro dia, até ele começar a falar; Até ele voltar para eles.
"Grá Mo Chroí." Era o que ele dizia quando o notava ali, enterrando o rosto em seu cabelo.
Aquela era a forma de daídi de dizer eu te amo.
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Tinha um porta-retrato na sala, de um homem com os cabelos vermelhos, como muitos outros. Esse, no entanto, era especial, porque ele também tinha os olhos verdes como Grá e um nome parecido. Um nome que daídi às vezes chamava no meio da noite, ou o soluçava no peito de otou-san quando eles não sabiam que Grá estava olhando. Não era o único nome que daídi chamava, mas era o que o levava para longe por mais tempo.
"Para onde daídi vai, otou-san?" Perguntou um dia, os dois sentados ao redor de daídi, que dormia muito bem enrolado no sofá da varanda. Era um dia ruim, de novo.
"Daídi de vez em quando lembra de muita gente que se foi, Grá."
Otou-san tinha o rosto triste também nessas horas e Grá tinha que o abraçar forte também.
(Otou-san também chamava por nomes à noite, principalmente o tio de Grá. E nessas noites, ele tinha que ligar para o tio Itachi, para saber onde ele estava. E daídi abraçava otou-san e dizia que estava tudo bem.)
"Então ele vai pra longe, pra tentar não lembrar e não doer mais."
"Mas ele sempre volta pra gente."
"Sim. E vamos sempre estar aqui esperando, não é?"
Grá não sabia se era a fada vermelha, mas ele sabia que sempre estaria ali por daídi.
"Sempre vou estar aqui." Concordou. "Por daídi e otou-san."
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Vovó Kushina tinha os cabelos vermelhos como sangue, uma cor mais forte do que os dele, com alguns fios brancos começando a aparecer.. Grá gostava de se deitar no colo dela e brincar com os fios entre os dedos, se enterrando ali e misturando os cabelos dos dois. E mesmo que ele não tivesse vindo do daídi ou otou-san, ele se sentia feliz quando diziam que os cabelos deles eram parecidos.
(E ela sempre sorria quando dizia isso e beijava seu rosto inteiro.).
Ele lhe perguntou sobre os sonhos ruins do daídi, porque ele também tinha sonhos ruins, com gritos e mulheres, e sangue por todo lado. Eles sempre terminavam com daídi aparecendo e o salvando, e dizendo que tudo iria ficar bem.
"Um homem ruim machucou seu daídi." Ela respondeu, com os dedos em seu cabelo. Grá abriu os olhos muito alerta, perguntando onde o homem ruim estava. "Ele não está mais aqui, então não precisa se preocupar."
Franziu o nariz, insatisfeito. Não era verdade. Ele continuava o machucando nos sonhos. Grá queria salvar daídi nos sonhos também, como a fada de cabeça vermelha.
"Oh, meu bem." Sua avó o abraçou mais forte. "Você já o salva. Todos os dias."
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Grá gostava de animais, eles o ajudavam. Então eles iam ajudar Daídi também.
(Talvez não uma cobra. Otou-san não havia ficado feliz ao encontrar fofinho no guarda-roupa).
Daídi e ele frequentemente cuidavam dos animais feridos e os soltavam novamente, otou-san já nem gritava quando encontrava algum deles pela casa, como quando encontrou o cervo que eles esconderam na garagem enquanto sarava de uma pata quebrada.
Um dia eles até encontraram uma raposa machucada e cuidaram dela por semanas. Otou-san naquele ponto havia desistido e apenas resmungava de vez em quando, enquanto secretamente cuidava da raposa também quando achava que eles não estavam olhando.
"Seu otou-san é um tsundere." Daídi riu da sua cara confusa, os dois brincando com o filhote no quintal atrás da cabana, a fazendo fortalecer a perna machucada aos poucos. "Quando eu era criança, cuidei de uma raposa."
"Daídi a soltou depois?"
Ele o olhou com uma expressão triste e não respondeu, apenas beijando sua testa.
Um dia otou-san o levou para a cidade para comprar suprimentos e Grá encontrou um gatinho no beco perto do supermercado. Ele estava ao lado da mãe morta e otou-san o deixou levar para casa com pouca insistência.
Era um gato amarelo e de olhos azuis, que talvez mudassem de cor com o tempo.
Otou-san disse que eles cuidariam dele por um tempo, mas Grá sabia que seria para sempre, ainda mais quando ele viu o sorriso de daídi ao ver o animal em seus braços quando voltaram.
O gatinho seguia daídi para todo lado e subia nele, e o ajudava nos dias ruins como Grá e de vez em quando daídi fazia uma expressão estranha enquanto o encarava.
"Aeron?" Um dia o ouviu falando, encarando o gatinho em suas mãos. "É você?"
Grá decidiu que Aeron seria um bom nome. Afinal, era o deus raposa que havia protegido daídi, e o gatinho iria o proteger do homem ruim dos sonhos.
Otou-san, por alguma razão, havia rido uma manhã inteira quando soube disso.
Daídi havia ficado encabulado e jogado uma vassoura em otou-san.
Grá não entendeu bem, mas Aeron o gato, pelo menos, estava ali para ficar.
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Apenas anos depois ele entenderia, durante aquela viagem para a Irlanda, quando ele lhe contou sobre um legado. Como um dia um anel seria de Grá, como um dia as memórias também seriam dele para passar adiante. Memórias sobre um povo invisível, sobre deuses entre nós, sobre um deles que sempre olharia por eles.
Como daídi carregava as memórias do avô dele, que as passou para Grá, através daquelas lendas, que nunca foram apenas lendas.
Ele não tinha certeza se aquilo era verdade ou não, mas quando comentou isso, seu daídi apenas riu, o abraçando enquanto caminhavam pelo cascalho, em direção a costa ao redor da floresta. Otou-san estava mais adiante conversando com um guia local, os óculos tortos na cara e uma expressão muito atenta de quem claramente não estava entendendo nada do que o outro homem estava falando, mesmo que ele falasse em inglês.
Quando pararam, sentados em um tronco de árvore, pegou na mão menor de daídi. Grá ainda não havia saído da adolescência, mas já havia passado da altura do seu daídi há um tempo, fato que seu otou-san gostava de comentar quando estava com pouco amor à vida.
Observou o anel dele, com as inscrições que sempre o intrigaram. Havia sido do seu avô por anos, apenas recentemente tendo sido passado adiante. E que um dia, ao que parece, seria dele.
"Essas lendas... são meu legado?"
"Não exatamente, não unicamente." Daídi olhava para a floresta, uma expressão saudosa, desejosa no rosto, como se antecipasse alguma coisa. A mão calosa se fechou na sua, um sorriso se abrindo no rosto que parecia quase intocado pela passagem dos anos, o primeiro rosto que sempre lembraria, desde quando ele o tirou daquele galpão anos atrás. "Seu legado, Grá Mo Chroí, é seu nome."
E nesse momento, uma raposa enorme saiu da linha da floresta.
"É só amor."
Notas finais
Agora sim encerramos :)
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