Ewen
Maldições eram temas comuns nas histórias que meu avô contava. Como os filhos de Lir, transformados em Cisnes pela mão da própria madrasta. Ou como o rei Fergus tentou amaldiçoar o rei Cathal e acabou ele mesmo atingido. E, minha favorita, a maldição do poeta Carbury contra o cruel rei Breas.
Todas elas tinham algo em comum: A intenção de causar o dano. Vovô dizia que era o comum dizer na Irlanda, em se ter cuidado no que lhe é oferecido, porque o mal está na intenção e o veneno pode estar em um mero olhar de um coração rancoroso.
"O rancor, sionnach beag, é o combustível para se amaldiçoar vidas."
Mesmo naquela época, eu guardei essas palavras no meu coração, mas foi bem mais tarde que eu aprendi a verdade nelas da pior forma possível.
O rancor semeia o mal até no coração do mais nobre dos homens; pode os transformar em verdadeiros monstros.
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O BARULHO DA PORCELANA QUEBRADA ECOOU PELO QUARTO ASSIM QUE A PORTA SE FECHOU ÀS COSTAS DE MADARA, mas Obito queria mesmo que o vaso tivesse acertado o outro em cheio.
Eles o estavam descartando.
A cadeira voou para a parede, o vidro da mesa se partiu.
Haviam o trancado naquele quarto por dias, longe de tudo, e agora simplesmente o descartavam como se não fosse nada, como se não o tivessem quebrado anos atrás, o usado por tanto tempo.
Ele sabia que o fato de decidirem o tirar do país não significava nada além de uma falsa segurança, que na verdade ele seria morto no momento em que pisasse fora dali, e fariam tudo parecer um acidente. Lhe davam falsa segurança, mas ele sabia o que aconteceria.
Todos aqueles putos sabiam.
Respirou rapidamente na destruição do quarto, o cabelo caindo pelo rosto vermelho, os dentes trincados. Soltou o grito enfurecido antes de cair de joelho em meio ao vidro e madeira quebrada.
Naruto, eles o tirariam Naruto. Sabia que se saísse dali, não o veria mais. Nagato não poderia protegê-lo por muito tempo. Por mais que odiasse o homem, sabia que o único motivo de não terem levado para uma base ainda era a sua manipulação sútil, e o fato de Tobirama ser um sádico e convencer a todos que deveriam esperar e ver o que aconteceria. Como se ele fosse uma maldita cobaia, tudo se tratava disso, desde o começo.
Tudo sempre se tratou de Naruto e de como poderiam usá-lo. Como tinham o usado.
"Você tem que tirá-lo daqui. Ele é seu, não deles."
A voz fez com que erguesse a cabeça rapidamente, os olhos ferozes vagando pelo quarto enfurecidos, em busca do inimigo. Não havia ninguém.
"Olhe só para você, patético no que se tornou."
—Quem está ai! — gritou erguendo-se cambaleante, as palavras saindo em arfadas furiosas. Iria matar quem ousava zombar de sua angústia.
"Fraco. Você é fraco, um homenzinho de fato patético."
Seguiu a voz, agora com cautela, a mão em um caco de vidro, pronto para atacar.
"Aqui, siga-me, eu posso ajudar. Eu posso entregá-lo a você." Parou em frente ao espelho, a única coisa intacta na sua fúria. Era dali que vinha a voz. Da imagem refletida ali. A sua imagem.
"Não" pensou confuso, vendo sua própria boca se mexer. "A voz vem de mim. Como?"
—Ele é nosso e de mais ninguém. E eu sei como podemos tê-lo, para sempre dessa vez. Para isso você buscou e guardou as correntes não foi? Revirou o mundo em busca delas.
Sua imagem tinha olhos vermelhos e um sorriso insano.
Havia enlouquecido de vez.
Tocou a superfície fria. A palavra saiu da sua boca sem que percebesse.
—Davlin.
A outra imagem sorriu.
E tudo escureceu.
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Kimimaro checou as costelas, voltando a enfaixá-las. Era a única injuria que não tinha sido totalmente curada, ainda assim estava em um processo bem mais avançado do que seria possível, levando-se em conta que as injurias eram piores que as de Sasuke, que teria apenas alguns dias antes de poder tirar a faixa de contenção.
Durante todo o processo o garoto estava calado, assim como Nagato Uzumaki, que sentado em uma poltrona observava tudo o que fazia, com os olhos sérios. Quando checara Sasuke horas atrás, o Uchiha mais novo também estava bem calado, apenas respondendo o que lhe era perguntado. O rosto, os olhos pareciam anos mais velhos do que uma semana atrás.
Havia algo a mais, algo que faltava.
Franziu levemente a testa. Checou novamente os ferimentos nas mãos. Um deles agora era apenas uma cicatriz branca. O outro estava quase fechado. Surpreendente.
—Está sentindo algum desconforto que queira me dizer?
Finalmente os olhos azuis se fixaram nos seus. Eles também estavam diferentes. Estavam velhos, como sempre, mas aquela angústia que vira antes, aquela raiva que sempre parecia tão aberta, havia sumido. Ou ele estava apenas mais difícil de ler.
— Dor. — Ele falou com a voz mais clara do que imaginava. — Quando respiro.
Assentiu, checando isso também.
— Irá sentir certo desconforto por um tempo, uma das costelas rompeu e lesou o pulmão esquerdo. Já está curado. — Ele fitou o adolescente ao falar isso, mas não havia surpresa nos olhos azuis que o fitavam diretamente agora. — Ele tem um pouco de febre. — Kimimaro olhou para Nagato dessa vez. — Como a infecção se foi, provavelmente devido ao estresse, mas se piorar deve me chamar. Quanto a dor, infelizmente teremos que cortar a morfina, não é recomendável doses regulares, mais do que ele já foi exposto sem muitos efeitos colaterais. Irei passar um opioide mais fraco.
Nagato apenas assentiu, os olhos no sobrinho que havia voltado a olhar para algum outro ponto do quarto, a expressão voltando a se distanciar. Por um momento pensara que ele estava em choque ainda, mas ele apenas parecia...distraído.
Apenas quando saia do quarto, após os exames de Naruto serem checados Kimimaro notou o que havia de diferente.
—Por sinal... — o garoto voltou a fitá-lo da cama, o rosto levemente avermelhado pela febre. — Falcão ainda pode voar.
Nagato estreitou os olhos com isso, mas Naruto apenas moveu os lábios de forma quase imperceptível, os olhos se abriram levemente, quase sorridentes.
—Eu sei.
O jovem médico assentiu, saindo pelo corredor sem olhar para trás.
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Sasuke olhava para o lençol branco de forma distante. Tinha certa noção de Itachi silencioso a seu lado, o bastante para responder quase automaticamente a suas perguntas curtas.
Ainda podia sentir Naruto ali, em sua mente. Era quase como se ele estivesse ali no quarto, o olhando. Imaginava se seria o mesmo para ele. Como se a batalha que travaram juntos, mentalmente, houvesse deixado aquela conexão estranha ainda mais forte.
Sasuke.
Olhou para o lado, Itachi estava calado, olhando algo em um Ipad. A voz era um pouco distante, como se a ouvisse por trás de uma porta, mas estava lá. Franziu a testa.
—Está sentindo algo?
A voz de Itachi era calma, mas algo nos olhos dele o entregavam. Preocupação.
Negou com a cabeça, até perceber que ainda tinha que falar.
— Talvez precise descansar os olhos. — O irmão assentiu quando os fez, relaxando o corpo ainda dolorido. Costelas trincadas, uma torção no tornozelo. Cortes por todo o corpo, as queimaduras em seu braço repuxavam e provavelmente iam deixar cicatrizes.
Sentiu de leve o toque em sua testa e quase sorriu. Fazia tempo que Itachi não fazia isso, ele devia realmente ter se assustado. Pensava se outra pessoa conheceria esse lado do irmão. Talvez Shisui, o primo que fora o mais próximo de um irmão mais velho para eles, e que sempre se dera tão bem com Itachi. Onde andaria Shisui?
Quem é Shisui?
A voz era mais alta agora, e quase podia visualizar Naruto, olhos azuis curiosos. Sorriu levemente. Naruto estava falando consigo. Mais cedo tivera essa impressão, mas agora tinha certeza.
Meu primo. Quase um irmão.
Sua respiração ficou mais leve, e a escuridão começou a mudar. Estava novamente entre as sequoias, agora perto de um riacho onde lembrava de ter visto a raposa vermelha quando criança. Naruto estava lá, sentado perto do rio, os pés na água. Usava, novamente, a roupa do baile, menos a capa que estava no chão ao lado da lança. Os cabelos voavam ao vento.
Sasuke sorriu, sentando-se do lado dele, os pés na água fresca.
— Isso é um sonho? — questionou, mesmo sabendo que não.
—Só se for seu, estou acordado na enfermaria agora. — Naruto piscou, se concentrando. — Parecendo distraído, Kimimaro está me examinando. Não sei como consigo fazer isso.
—Você sempre foi distraído, nada muda. — brincou levemente, recebendo um bico leve do outro e água no rosto. — Ei!
—Você começou. Você está bem, Sasuke? — os olhos azuis o fitavam com intensidade.
—Dolorido, mas vou viver. Você?
—Aeron me curou. — Ele deu de ombros. — Está curando, mas é complicado. Ele curou o mais grave, o resto vai ser mais lento. Muita energia, vou ter febre por uns dias.
—Vocês sempre conversam? — lembrou de Noland na sua gaiola, e sentiu certa tristeza. Naruto fungou, mas havia um sorriso ali quando assentiu. Sasuke franziu a testa, pensando no deus, e na fúria com que ele o atingiu por ter machucado Naruto. No olhar frio em sua direção, contrastando com a forma com que Naruto o abraçava, a raposa olhando-o com quentura nos olhos. — Como...ele é? Para você.
A pergunta foi cautelosa. Era claro que Aeron amava Naruto. Muito claro. A forma como ele amava era que não conseguia entender. Era diferente da forma com que Aeron olhara Noland na gaiola. Havia tristeza ali, remorso até, mas amor...só Naruto.
—Aeron sempre foi...um protetor. Ele cuidava de mim, cuida, embora de um jeito pouco...ortodoxo às vezes. Nem sempre concordo com o que ele diz, quase nunca, mas sei que ele sempre quer meu bem de alguma forma. O problema é que ele não liga muito para quantas pessoas ele pode machucar no caminho.
Sasuke assentiu, lembrando da maneira como ele falara que teria que destruir Noland, que seria suposto ser sua alma gêmea. De algum modo, sabia, que Aeron nunca machucaria Naruto de propósito.
—Eu acho que... — Naruto o olhou de forma curiosa, como se apenas no momento esse pensamento se formasse. — Deve ser como ter um irmão mais velho. Como você e Itachi. — Sasuke o olhou de forma duvidosa e Naruto sorriu de forma triste. — Você não vê, não é? Você é a pessoa mais importante do mundo para Itachi, Sasuke. Eu...lembro de todos eles, todos os outros que vieram antes, e eu nunca vi Ewen olhar para alguma versão de Noland como ele olha para você.
As bochechas de Sasuke esquentaram e sentiu um calor bom no coração. Ele sabia disso, no fundo sabia.
—Itachi sempre foi mais pai do que irmão para mim. — Murmurou, lembrando o quanto sempre queria impressionar o irmão, o fazer orgulhoso. Quando alcançou a adolescência, e o irmão começou a estagiar para uma agência, esse sentimento se tornou rivalidade, mas o amor entre os dois sempre esteve lá.
Naruto sorriu com isso. E então lembrou.
Ewen.
Suspirou, os olhos azuis tristes no riacho.
—Temos que falar com ele. — Sasuke o olhou, curioso com a mudança na voz. Os olhos escuros preocupados. — Ele, Ewen, ainda carrega tanta culpa...
O sorriso de Sasuke morreu ao perceber de quem ele falava, sentindo um peso no peito.
—Você o culpa? — Naruto o perguntou, tocando sua mão fria, o fitando nos olhos. Sasuke suspirou olhando para o céu.
—Não. Itachi nunca...fez nada contra mim, mais do que cuidar de mim. Até os ciúmes que eu sinto de vocês... — olhou Naruto, que continuava o fitando. — Eu consigo entender a dor dele agora. — Tocou o rosto de Naruto, que pareceu relaxar com o toque, fechando os olhos. — Eu consigo entendê-lo mais do que qualquer um agora.
Sasuke passou o polegar no rosto quente. Sasuke amava Naruto, nunca amara ninguém como amava Naruto. E amava Itachi, seu irmão, até pouco tempo sua pessoa mais preciosa, agora ele dividia esse lugar com Naruto. Com o pensamento limpo da influência de Noland, aquilo era claro agora.
E Itachi amava Naruto. Ele via nos olhos dele. Ele sabia que Naruto pensava que era Ewen que amava Aeron, mas Sasuke conhecia Itachi bem. Se tivesse que arriscar, diria que o que Ewen sentia, naquele ponto, seria apenas necessidade de redenção com Aeron e Noland. Naruto não era Aeron. E Itachi, Sasuke sabia que Itachi não era o mesmo que Ewen, de alguma forma. Se ele não era Noland, e Naruto não era Aeron, Itachi não era apenas Ewen.
Itachi amava Naruto, não Aeron. E um Uchiha só amava uma pessoa a vida inteira. Por azar, a pessoa era a mesma para os dois. E um dos três, sempre sairia machucado daquela situação.
Sabia que Naruto ia tentar resolver isso, provavelmente tentar aliviar a culpa de Itachi, de Ewen, pois ele era assim. Temia que tudo piorasse, mas não o impediria. Por ele, por si mesmo, e por Itachi, sabia que aquele confronto devia acontecer. Assim como o dele com Itachi também deveria em breve.
A mão dele tocou a sua que passava nas cicatrizes no rosto tão bonito com carinho. Olhou Naruto, ali, de olhos fechados, quase ronronando com o carinho. Ele olhou Naruto, fitando o perfil suave, sentindo a preocupação por Itachi que emanava dele, como se a dor dele ecoasse mesmo ali e se perguntava de forma melancólica, quem não amaria Naruto?
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Itachi estava exausto. Apenas naquele momento, o peso de tudo o que acontecera nos últimos dias o tomou. Andou quase como um bêbado da enfermaria para seu apartamento, pronto para tomar um banho, dormir por algumas e retornar para o lado do seu irmão antes que ele acordasse novamente. Mesmo que agora estivesse apenas descansando, a imagem dele naquela cama, desacordado e vulnerável era terrível, depois de dias sem saber se ele acordaria.
E havia Naruto. Da última vez que o vira ele parecia tão pequeno sendo levado por Nagato. Desacordado, quebrado em tantos sentidos. Sasori tentara descobrir algo para si do paradeiro do outro garoto, mas nada chegara de concreto, apenas o fato que ele estava sob atendimento médico como Sasuke. Nem mesmo Kimimaro lhe trouxera mais notícias.
Abriu a porta, jogando seu cartão chave na mesa. Esticou os músculos doloridos, enquanto removia sua gravata do uniforme, terno e camisa pelo caminho, sendo desorganizado ao menos daquela vez ao deixar as peças caírem pelo chão.
Apenas ao chegar ao quarto ouviu o barulho. Parou de forma abrupta, tenso. O som de gavetas se abrindo. Vidro batendo. Já era noite, e tudo estava uma penumbra, exceto por uma luz tênue que sabia vir do banheiro na suíte. E era de onde também vinha o barulho. Caminhou pelo quarto, silencioso abriu a gaveta do criado mudo, pegando a arma que deixava no fundo falso. As únicas pessoas que tinham acesso a seu quarto eram Sasuke e Sasori, ninguém mais teria como entrar ali. Franziu a testa, a arma pronta enquanto olhava cuidadosamente através da porta entreaberta do banheiro.
Havia, de fato, alguém no seu banheiro, procurando algo no armário e nas gavetas da pia. O estranho usava um capuz vermelho e estava de costas para a porta. Ele soube que foi notado no momento em que o estranho parou de se mover. Iria abrir a porta quando a voz o surpreendeu.
—Você não vai atirar em mim.
Parou de forma abrupta, os olhos se arregalando levemente ao reconhecer a voz. Abaixou a arma e abriu a porta de vez quando a figura finalmente o olhou por cima do ombro.
—O que diabos faz aqui, Naruto!
O outro o ignorou, voltando a fuçar suas gavetas.
—Nunca ouvi você falando palavrão antes. — Veio o murmúrio, na voz rouca e baixa, meio enrolada. Não soube como reagir a isso por alguns segundos, apenas olhando a cena absurda como um idiota. Isso até Naruto erguer a mão para a parte mais alta do armário e retroceder com um gemido de dor, segurando suas costelas e se vergando encostado na pia.
Correu ao outro enquanto ele tossia murmurando algo que não entendeu além de estava bem — o que era claramente uma mentira — e que precisava se sentar. Não pensou muito antes de erguê-lo com facilidade e sentá-lo no balcão da pia larga de mármore.
Esperou que a respiração do outro se estabilizasse, enquanto massageava suas costelas levemente. Notou que ele estava descalço, usava a calça de tecido fina branca da enfermaria, e o capuz por cima, que Itachi agora percebia que pelo tamanho claramente não era seu.
Era obvio que ele havia fugido da enfermaria onde estivera.
E o mais obvio ainda é que não havia sido uma ideia muito boa.
Apenas quando a respiração do outro normalizou voltou a perguntar, dessa vez mais calmo.
—O que faz aqui, Naruto? — Estava realmente curioso. Imaginava que se ele fugisse, deveria para estar com Sasuke, não ali.
—Procurando seu remédio para dor. —Murmurou. — Cortaram minha morfina.
Itachi o encarou. Os olhos azuis estavam um pouco turvos, o leve curvar de lábios provava que ele não devia estar realmente lúcido. Franziu a testa ao notar como o rosto estava vermelho, os cabelos suados pregados na testa. Abaixou o capuz vermelho e não houve nenhum protesto quando passou a mão na testa, afastando os fios úmidos.
—Merda! — sibilou, dessa vez ele mesmo abrindo as gavetas apressadamente, largando sua arma no chão.
Naruto estava queimando. Não tinha ideia de como ele estava de pé daquela forma. Conseguiu achar a cartela de comprimidos antitérmicos e mais do que depressa correu para fora do banheiro a procura do copo de vidro na sua cabeceira.
Quando voltou Naruto ainda tinha uma mão abraçando suas costelas e um sorriso estranho. Encheu o copo com água da torneira e entregou ao outro que murmurou algo sobre mais drogas. Praticamente o obrigou a beber, a água caia mais nele mesmo do que na garganta do garoto, mas conseguiu. Abaixou o copo e passou a mão no rosto, se inclinando na pia. Tanto para apenas umas horas de sono.
— Inferno...
— Já são três palavrões em menos de dez minutos, Ewen. — Veio o murmúrio grogue. Ia retorquir quando finalmente notou toda a frase. Sua cabeça ergueu-se tão rapidamente que seu pescoço doeu. Os azuis o fitavam ainda enevoados pela febre, mas o sorriso havia ido embora.
—Do que me chamou?
—Ewen. — A sobrancelha loira se ergueu levemente. — A não ser que prefira Itachi. Ou Pierre. Ou Kaito. Ou Seo. Ou John. Ou Edgar. Ou qualquer outro desses, pode escolher.
A voz dele parecia mais clara, e o coração de Itachi batia forte, um senso de horror o invadindo. Seu rosto pálido encarou o outro sem saber o que falar.
—Como...
—Aeron me contou. Tudo. E tudo foi... — ele fechou os olhos — Se encaixando. Como se tudo sempre...estivesse na minha cabeça, todo o conhecimento. Como...um filme estranho.
Era assim. Era exatamente assim que se sentia sempre. Geralmente acontecia aos 6, 7 anos. Dependendo do quanto cedo se encontrava com um deles. Um dia acordava e estava tudo lá, tudo o que precisava saber. E então vinham os pesadelos horríveis, a visões insuportáveis de sangue e dor e morte e traição e... tudo.
—Eu fecho os olhos e vejo Sasuke morrendo todo o tempo..., mas não é o Sasuke. E então sou eu, mas não sou eu. — Ele balbuciou e então os olhos se abriram e se fixaram nos seus, duros. — Você sabia, o tempo todo. Sempre soube.
Era agora. Desviou os olhos, ou tentou, mas uma mão fria capturou seu rosto, o obrigando a olhar aqueles olhos azuis que sempre o atormentavam. O mesmo rosto, quase o mesmo rosto. Conseguia ver todas as pequenas diferenças. Os olhos violeta de Castiel, a cicatriz no lábio de Ian. Os cabelos mais rebeldes e escuros de Rodolfo, e o sorriso mais ladino de Steve, e o mais inocente do pequeno Isaak. Os olhos mais tempestuosos de Aeron.
(Aeron o olhou com tanto ódio quando estava morrendo. Eles quebraram Castiel até a insanidade, até não restar nada do garoto mais inteligente que conheceu. E Ian prometeu que voltaria para casa, Pierre o esperou a vida inteira. Isaak só tinha 15 anos e estava com tanto medo. Nunca encontraram o corpo de Steve e Rymura. Rodolfo tinha o coração tão puro e nem mesmo sabia a razão de estar sendo morto-)
Naruto. Que agora lhe olhava de modo tão frio e calculista. O aperto de ferro que o segurava no lugar. Os olhos azuis com o mesmo poder de Aeron, um poder que podia sentir no ar, quase como se circulasse na sua pele, vibrando, querendo sair. Como se lesse cada pecado de sua alma, e se tornasse o juiz e o carrasco.
Esperava tudo naquele momento. As mesmas palavras que Aeron cuspiu enquanto morria. As palavras que merecia, como traidor, mentiroso. Ingênuo que os prendeu aquele tormento sem fim, de que a alma quebrada à sua frente era mais vítima do que todos eles.
Não esperava o rosto dele mudar para uma expressão triste. A mão que antes o agarrava de forma dolorosa, passar suavemente por seu rosto, em um carinho leve. Em um suspiro a testa dele, ainda quente, se recostou na sua e quase recuou de surpresa.
—Me perdoe.
Essas duas pequenas palavras foram como um chicote, e se afastou de vez encarando o outro sem acreditar. Os olhos mais arregalados. Imaginando se havia ouvido direito. Tentou falar algo, mas estava chocado demais. A mão de Naruto ainda estava estendida no ar, o rosto agora o encarando de forma dolorida por segundos, até ele abaixar a mão e suspirar, desviando o rosto para as mãos em seu colo.
— Me perdoe. — Ele continuou após um tempo, a voz baixa, e novamente Itachi tremeu tentando compreender o que acontecia. — O que Aeron fez foi cruel. Ele sabia que você o amava, que faria qualquer coisa por ele. Foi tão...egoísta.
—Naruto... — abriu a boca para falar, mas não sabia o que dizer. Os azuis voltaram a lhe encarar, com certa tristeza.
— Eu...estou fazendo de novo. — Ele riu sem humor, passando a mão no rosto. — Te obrigando a me ajudar e ficar perto de mim depois de tudo...você deve me odiar. Você tem que me odiar, Ewen.
Se encolheu ao ouvir o nome.
—Vocês dois, e Davlin... vocês...tudo isso foi minha...
—Para! — finalmente recuperou a voz, se aproximando do outro e segurando seu rosto. Suas mãos tremiam e sabia que estava perto de chorar, depois de tantos anos estava perto de chorar. Diferente dos olhos vazios que via agora tão frequentemente em Naruto, os que o encaravam agora estavam atormentados. Doloridos. — Eu fiz a droga do pacto! — falou com a voz tremula. — Eu traí você. Eu traí Noland. Eu falei a ele que você estava usando seu dom nele, o controlando, quando eu sabia que você o amava mais que tudo no mundo, e por isso ele...meu irmãozinho, apenas se jogou daquele penhasco, eu...matei Davlin. Eu contei o seu segredo. No fim eu...matei vocês três...eu...
—Ewen...
—NÃO ME CHAME DE EWEN!
Naruto ficou tenso em suas mãos por segundos quando gritou. Murmurou desculpas enquanto repetia o gesto do outro de minutos atrás, recostando a testa na dele.
Estava tão confuso.
—Por favor, Naruto...eu não quero ser ele mais...
—Shh...— Sentiu a mão em seu cabelo, fazendo um carinho. — Não foi sua culpa. Eu não culpo você. Nem Sasuke culpa você, Itachi.
—Ele sabe... — sussurrou com horror.
—Eu contei a ele. Contei tudo. Não vou esconder mais nada dele. — ia falar algo sobre isso, mas para seu horror sua voz saiu em um soluço cortado. Sentiu os braços ao seu redor, o confortando. Sua cabeça foi para o ombro do outro, as mãos se fechando ao redor do corpo menor e agora tão mais frágil. A voz do outro sussurrou de forma bondosa. Tão Naruto. — Você já sofreu tanto sozinho. Não sofra mais sozinho, Itachi. Estamos aqui por você agora.
—Me perdoe...me perdoe...
—Não há nada para perdoar, mas se quer ouvir isso... — ele removeu sua cabeça de onde estava com gentileza, as mãos segurando seu rosto, e eram tão pequenas que pareciam mãos de criança. O rosto de Naruto era tão bondoso ao fitar o seu, limpando o rastro de lágrimas que não paravam de cair.
(Como o rosto de Rodolfo quando entrava naquele porão, os escondendo da Gestapo, arriscando sua vida com um sorriso no rosto).
— Eu te perdoo. Eu perdoei Ewen, Itachi. E eu espero que um dia ele possa perdoar Aeron também. Que eles possam se perdoar.
—O pacto...
—Você...Ewen estava perdido. Ele não sabia o que fazer e sua dor foi usada. A briga dela não era com vocês, era com Aeron. Entende? Não há o que perdoar. Se perdoe. E... talvez...me perdoe. — Encarou os olhos muito azuis com nova devoção. Sentiu uma fisgada em seu peito, e teve a certeza de que o que sentia por Aeron não era nem uma ínfima parte do que sentia por Naruto naquele momento.
Não eram cicatrizes e tragédias que diferenciavam Naruto dos outros. Não era poder. Era isso agora. Era a compaixão dele.
Não notou que erguia a mão até tocar no rosto do outro. O viu fechar os olhos e se inclinar em sua mão após segundos. Passou os dedos no contorno do rosto devagar, hipnotizado.
Não notou o que fazia até ser tarde. No mesmo momento que inclinou o rosto e recostou os lábios no do outro sentiu ele tencionar. Uma descarga leve percorreu seu corpo, sua mente nublou. Um som estranho saiu de seus lábios, quase animalesco quando voltou os lábios com mais força. Não viu mais nada. Suas mãos estavam na nuca loira, a puxando para cima.
O beijo se tornou desesperado. Era melhor do que sempre imaginou, do que podia lembrar. De Ian. De Aeron. Imagens dele e de Ian pareciam se mesclar e se fundir na realidade, ao ponto de não saber o quanto dali estava acontecendo, e o quanto era apenas uma memória, como as memórias em que costumava se perder sempre. As mãos trêmulas se agarravam firme em seu braço, indecisas entre o afastar ou se segurar enquanto se inclinava trôpego, sugando o que pudesse, já sem controle.
Rompeu o beijo sem ar, as respirações aceleradas, o banheiro quente. Colou a testa na do outro vendo os azuis entreabertos.
—Ian... — murmurou, e quase podia ouvir a cacofonia de sons do lado de fora do pequeno sobrado em Paris. Voltou a beijá-lo ainda com mais vontade, quase o deitando sobre a bancada. Já não sabia, ou pensava claramente.
Se jogou mais contra ele em um movimento brusco, a mão de Naruto foi para o lado e o copo se estilhaçou no chão com estrondo. O puxou de volta a posição inicial e voltou a beijá-lo, o erguendo da bancada, as pernas se segurando em sua cintura para não cair, o levou tropeços de volta para o quarto e para a cama.
Itachi se colocou sobre ele e voltou a beijá-lo sem perceber que o outro não reagia. Largou sua boca e voltou a beijar o ombro com reverência se colocando entre as pernas do mais novo, as apartando sem resistência. Com uma mão se apoiava no colchão, com a outra passeava devagar pelo corpo machucado, gentilmente, até se infiltrar na calça frouxa, apertando sua coxa com firmeza. Apenas quando se preparava para remover aquela peça conseguiu ouvir o soluço que o outro não conseguiu segurar. Olhou para cima e viu os olhos fechando com força, a cabeça virando de lado no colchão, os lábios sendo mordidos para abafar um soluço.
E tudo voltou ao lugar. A cacofonia morreu e arregalou os olhos. Não era Aeron. Não era Ian.
Parou se dando conta do que quase fizera, assustado. Retrocedeu respirando rápido, saindo de cima do garoto que se encolheu virando de lado e de costas para si em posição fetal.
—Me desculpe, Itachi... — ouviu a voz baixa e rápida, embargada.
O rosto de Itachi se retorceu de dor e raiva.
— Você se entregaria por culpa, Naruto? — perguntou sem conter a dor na voz.
O outro se encolheu mais ainda.
Itachi puxou os cabelos sentando-se na cama de costas para o outro.
Por Deus, eu quase agi como Obito!
— Eu não o quero assim, Naruto. Eu nunca te quis assim... Eu nunca te machucaria de novo...
— Talvez eu mereça que você me machuque, Itachi. — Virou e encontrou o rapaz sentado, o rosto molhado de lágrimas. Tão diferente do de Aeron... Ele não era Aeron.— Por sempre acabar machucando você, mesmo agora...
— Pare com isso! — o segurou pelos braços o obrigando a fita-lo. — Pare de colocar toda a culpa sobre você, ficar agindo sempre como o protetor!
— Como você faz?
Se calou com isso, fitando o sorriso ainda gentil do outro.
—Depois de tudo...
Deu um suspiro frustrado. Ao que parecia, as coisas que haviam acontecido com ele haviam deixado uma cicatriz pior do que pensava.
— Você se entregaria para uma pessoa que não ama apenas para fazê-la se sentir melhor? Eu nunca...nunca se tratou de sexo, Naruto. Eu queria que você...que ele me amasse.
— Aeron te amava. — Ele falou com a expressão agoniada, verdadeira. — Ele realmente te amava.
— Não dessa forma. Ele sempre me amou como um amigo. Não dessa forma. Dessa forma sempre foi Noland. Assim como sempre vai ser Sasuke, não é?
Naruto não negou, desviando os olhos dos seus de forma triste.
— Por mais que vocês briguem, que ele faça merda, sempre foi ele. E eu sei que por mais que eu queira, nunca vai ser diferente. Eu nunca consegui competir. Aeron mataria por mim, em um tempo, mataria por Davlin, mas morreria, e sempre morre por Noland.
— Eu...vi o que ele sentiu. Você tem que saber que se ele pudesse ter escolhido de verdade...Teria sido Ewen. Você... — Ele parou, o encarando com sinceridade. — O amor de Aeron por Ewen não era apenas de amigos. Agora mesmo...isso... — ele apontou para os dois. — Era mais ele do que eu...por uns segundos...é confuso, os sentimentos se misturando... Aconteceu tão rápido...Ele nem se deu conta do que fazia até parar.
Sentiu uma pontada com aquilo. Aquilo não importava mais agora. Via nos olhos de Naruto o desespero de lhe dar algum consolo, e sem saber como fazê-lo, quase riu, de forma amarga. Apesar de tudo, com tudo o que passara, Naruto era mesmo inocente, uma criança.
—Mas o seu por mim é. Você ama Sasuke.
—Eu...amo. — Ele o fitou com tristeza. — Amo tanto que dói. Eu realmente sinto...
—Não. Apenas...não diga que sente muito. Eu amo meu irmão, Naruto. Eu realmente o amo. Ele é minha prioridade. Eu demorei a perceber, mas eu sei que ele não é o Noland. Como eu sei que você não é Aeron, nem nunca vai ser.
Naruto assentiu com um suspiro cansado. Os lábios dele ainda estavam vermelhos pelos beijos violentos, o cabelo que parecia recém-cortado estava bagunçado. Só então Itachi reparou em todos os pequenos hematomas e curativos. Os olhos azuis ainda pareciam tristes, exaustos.
—Naruto... — Itachi suspirou, olhando-o de forma triste. — Tudo o que aconteceu...quando você era criança... — viu o garoto tencionar, os azuis escurecidos o olhando em dúvida, cautelosos. — E Depois Obito, e Sasuke...você tem que entender que não foi sua culpa. Sua aparência não é motivo para ninguém te machucar dessa forma, nunca. Nem seus sentimentos por alguém.
—Eu sei disso...
—Não, você não sabe, ou não teria me deixado ir tão longe assim, mesmo não querendo nada disso. Há uma cicatriz Naruto...você a esconde bem, mas há uma cicatriz.
O garoto o olhou de forma confusa e temerosa, vulnerável, e Itachi sabia que estava certo. Assim como sabia que Naruto não o ouviria tão facilmente. Teria que falar com Sasuke.
Sasuke.
Sentiu uma onda de culpa o tomar ao pensar no irmão. E nos problemas que surgiriam com o que acontecera ali, pois sabia que Naruto contaria a ele. Ele dissera que não esconderia nada de Sasuke, e quando isso vinha de Naruto, pelo que vira, era de verdade.
Suspirou. Complicações.
— Eu acho que devo ir. — Naruto murmurou, a voz mais grogue depois de todo o abalo emocional e os remédios. Itachi ia pedir que ficasse, mas sabia que não deveria. Não quando o simples fato de Naruto morder o lábio como fazia agora lhe deixava tão consciente do que quase havia feito.
Do que ainda queria fazer.
Continuou sentado e em silêncio enquanto o outro voltava ao banheiro, saindo de lá já com o capuz. Ele parecia ainda um pouco fora de balanço, mas temia a reação dele se tentasse ajudar. Tensão havia voltado a cada linha do corpo pequeno.
Apenas quando ele saiu do quarto tratou de segui-lo, só então se dando conta de não fazia ideia de como ele havia invadido seu dormitório em primeiro lugar. Chegou a tempo de vê-lo abrir sua porta com um cartão-chave branco. O garoto viu seus olhos no objeto e tratou de guardá-lo de volta no bolso do capuz.
— Eu, hn, peguei emprestado. — Balbuciou.
—Você roubou uma chave universal. — Corrigiu, a testa franzida.
—Peguei emprestado. — Replicou. Ele parecia que ia sair, e então parou, virando-se totalmente para encará-lo. Itachi não conseguia decifrar aquela expressão. — Sasuke vai sair vivo daqui.
Piscou os olhos ao ouvir aquilo. Os azuis estavam duros, determinados.
— Você disse que ele é sua prioridade. Se as coisas saírem mais do trilho, se tiver que escolher um de nós para sair daqui...
— Eu o escolheria. — Cortou depressa, sem hesitar. Preferia não pensar nessa situação acontecendo, mas sabia que era exatamente isso que faria.
Ele amava Naruto. Realmente começava a amá-lo mais do que Ewen jamais amou Aeron, mas Sasuke era seu irmão. E daquela vez eles eram realmente os irmãos que Ewen e Noland deveria ter sido um para o outro. Era seu dever protegê-lo.
Essa pareceu a resposta certa, e um sorriso pequeno adornou os lábios do outro garoto.
—Nós vamos quebrar esse maldito pacto. — Naruto firmou. — E vamos tirar ele daqui vivo. Eu não vou deixá-lo morrer Itachi, nenhum de vocês dois.
E com isso ele saiu pela porta. Quando Itachi finalmente saiu do torpor e olhou para corredor, não havia nem sinal de que ele estivera ali em primeiro lugar.
Havia ensinado apenas uma pequena parte das entradas e saídas secretas, assim como Sasuke sabia de algumas, mas pelo jeito o garoto havia explorado o bastante para saber de tantas outras que nem ele sabia.
Sorriu, sentindo uma sensação estranha. Tristeza, alívio. As coisas estavam saindo muito diferentes do que pensava.
E pela primeira vez pensava que isso podia não ser uma coisa tão ruim.
.............
Nagato nunca havia sentido aquele nível de emoção. Raiva, mágoa, traição. O braço seguro de Kushina era a única coisa que o impedia de avançar em Minato. No homem que um dia confiara mais que tudo. Que via como um irmão mais velho, quase como um pai.
Fora um idiota.
—Você o deixou lá para morrer! — sua voz era alta e furiosa. — E Konan...talvez ela nunca acorde! Você me disse...me prometeu...Eu odeio você, Minato!
—Nagato...— o homem suspirou, tentando novamente o alcançar, mas recuou. Minato abaixou a mão com uma expressão dolorida. — Eu tentei, eu juro que eu tentei tirar Yahiko de lá, todos tentaram, se ficássemos um segundo a mais, todos teriam morrido, toda a equipe, eu não podia pedir isso a eles...Nagato, espera, Nagato!
Ignorou a voz enquanto saia da sala, ganhando o corredor. Kushina logo atrás o chamava.
Iria sair daquela casa, e nunca voltaria. Iria destruir Minato por isso.
—Nagato! Espera!
Parou com o agarro abrupto da irmã. Os olhos iguais aos seus estavam assustados, cheios de lágrimas. Ela havia chegado no meio da briga, nem mesmo entendia o que havia acontecido. Nagato estava tão furioso.
—O que aconteceu Naa...
—Seu marido! — ele gritou, puxando o braço do dela com força — Por causa dele Yahiko foi torturado até a morte, e Konan está presa na droga da cama de um hospital, talvez para sempre!
Os olhos dela se arregalaram.
—Nagato, eu sei que Minato nunca...
—Vá em frente! O defenda! Ele é sua família afinal, sempre foi sua família Kushina! Eu sempre fui apenas a caridade de vocês dois, o ponto negro na sua família perfeita.
—Isso não é verdade! — ela gritou horrorizada. — Nagato! Você é meu irmão, eu te amo, Minato e Naruto amam você!
Ele riu sem humor. O rosto sincero e machucado da irmã o deixava ainda com mais raiva. De Minato, de si mesmo. Só queria sair daquele lugar. Voltar para o hospital. Quando saiu sua voz era venenosa.
—Nunca se tratou de amor. Agora arrumem outra babá para o filho de vocês, algum idiota para cuidar dele enquanto vocês viajam. Isso se Minato não acabar o fazendo ser morto também!
Voltou a se virar pronto para sair de vez até ver o garotinho no pé da escada. Os olhos azuis o fitavam machucados pelo que dissera, assustados. Kushina fez um som de surpresa e dor ao também perceber que o filho estivera lá o tempo todo.
A culpa o corroeu por segundos e mais do que depressa abriu a porta de lá para sempre. A última coisa que ouviu foi um soluço infantil chamando pelo seu nome.
Abriu os olhos cinzentos de forma abrupta. Seu pescoço doía pela posição em que dormira na poltrona. A primeira coisa que percebera, com os resquícios do sonho ainda frescos, fora que a cama da enfermaria estava vazia. Ergueu-se de supetão, vendo os lençóis bagunçados. Procurou no bolso o cartão-chave, depressa, até lembrar que havia deixado no capuz. E que este havia sumido.
Naruto havia saído do quarto.
Correu para a porta e ela de fato estava ainda aberta. Ao menos ele não havia o trancado ali dentro. Ganhou o corredor, sabendo que ele não podia ter ido muito longe sem ter sido parado. Perguntou aos guardas o mais discretamente possível, mas ninguém havia visto nada. Xingou-se baixo. Teria que olhar nas câmeras, antes que o garoto se metesse em mais problemas do que já estava. Nunca imaginava que ele poderia se erguer no estado em que estava.
Quando voltou ao quarto estava pronto para chamar alguém para vigiar sua volta, apenas para encontrar Naruto deitado na cama, como se nunca tivesse saído. Seu capuz estava de volta na poltrona.
Fechou a porta, conferindo a veste e encontrando lá seu cartão, o colocou no bolso dessa vez e parou ao pé da cama, o coração ainda acelerado.
O outro estava de olhos fechados, de barriga para cima. Sem dúvidas fingindo que dormia.
—Aonde foi?
—Ao banheiro. — A resposta foi curta, os olhos ainda fechados.
—Roubou meu cartão para ir ao banheiro.
— Estava apertado. — Dessa vez um olho muito azul se abriu. — E não roubei nada. Peguei emprestado.
— Devia ter me acordado. — Sentou-se, não querendo lidar com o outro, realmente. Mesmo sabendo que ele mentia naquele instante. Não com aquele sonho tão vivido na sua mente. — Não devia se levantar com esses ferimentos.
—Eu me curo rápido agora. — O outro voltou a fechar os olhos. — Talvez se cortar meus dedos eles cresçam de novo. Não avise isso a Tobirama, ele pode ter ideias.
Fechou a cara: — Isso não tem graça, Naruto.
—Culpe as drogas. — O menino murmurou. Nagato sabia que ele estava o distraindo e provocando. — Não precisa ficar aqui, Nagato, pode chamar outra pessoa para ser minha babá.
Quase recuou ao ouvir isso. Sabia agora que ele o provocava mesmo. Usando sua própria tirada de anos atrás. O sonho ainda vivo em sua mente, aquela lembrança o fez franzir a testa, sentindo aquela mesma culpa o corroer.
Apenas ficou em silêncio, os dois não falaram mais nada, e em pouco tempo Naruto voltara a dormir.
............................
—Sasuke.
Dessa vez estavam de volta ao templo budista. Naruto estava o esperando sentado no banco, fitando poço no centro do pátio.
Podia ouvir o mantra ao longe, a brisa batendo em seu rosto enquanto caminhava até ele, sentando-se ao seu lado como haviam feito das outras vezes antes da ilha. No mundo real, ambos dormiam, descansando.
A cabeça loira recostou em seu ombro, o corpo se inclinando no seu buscando conforto. E ele apenas sabia.
— Aconteceu algo. — Não era uma pergunta, e Naruto não negou. Sasuke sentia certo medo vindo dele. Tocou seu rosto e os azuis tristes se fixaram nos seus.
—Fui falar com Ewen. Eu...o beijei, Sasuke.
Soltou o rosto de Naruto devagar. Os olhos azuis desviaram dos seus.
—Você o ama. — Sasuke sussurrou vendo a expressão derrotada do outro.
— É diferente. — Naruto voltou a encará-lo, olhos urgentes. — De nós dois, é diferente.
—Então por quê?
Tempos atrás, sentiria raiva, traição. Agora apenas tristeza e medo. Cansaço. Um dos três, um dos três sempre sairia machucado. Talvez fosse ele afinal. Talvez dessa vez fosse ele.
— Eu o machuquei tanto já, eu apenas pensei que... tornaria as coisas mais fáceis, e acabei o machucando mais. Machucando vocês dois. Talvez Aeron e eu não sejamos tão diferentes no fim de tudo...
Sasuke não suportava aquela tristeza em Naruto, mas não conseguia avançar e confortá-lo naquele instante. Fechou os olhos com força.
—Se... você amá-lo, se for para fazer você feliz...eu vou entender. — Foi a coisa mais difícil que dissera na vida, mas sabia que era verdade. — Talvez essa seja a resposta, o fim dessa maldição, talvez se nos afastarmos... — fechou a boca, não querendo falar aquilo, de nenhuma forma.
E quem não amaria Itachi? Que se sacrificou por tanto tempo, que sofreu por tanto tempo pelos dois. Para protegê-los. Para se eximir de uma culpa que nem mesmo era totalmente sua. Ele realmente conseguia entender, por mais que sentisse algo amargo no peito.
Em comparação a ele, que duvidou de Naruto, que não foi diferente daqueles idiotas e o forçou até quase o quebrar. Sasuke não conseguia entender como Naruto o amava. Não depois de ver que parte da escuridão em Naruto tinha seu rosto. Sua marca.
Naruto se afastou dele, os olhos arregalados.
Ele é leal. Ele faria qualquer coisa pelas pessoas que ele ama. Qualquer coisa. Você vai protegê-lo. Você não vai duvidar dele, nunca. Talvez fosse daquilo que Aeron falara no fim das contas.
—Eu não entendo a razão de você me escolher, Naruto. O que eu posso ter para você me amar?
—Idiota. — Naruto o olhava com os azuis arregalados. — O que você pode ter...— ele repetiu incrédulo. — Você não se enxerga de verdade, Sasuke. Você não viu o que fez? Acha que qualquer outra pessoa teria me tirado de onde eu estava preso? O fato de estarmos aqui, nesse lugar, não te diz nada?
Sasuke foi pego de surpresa com isso, e o olhou incerto.
—Eu disse a você, o que me liga a você não é nenhuma maldição. Vou provar para você, que é você e ninguém mais. — Naruto falou de forma definitiva, tocando seu rosto. — Eu vou provar, Sasuke.
Os olhos azuis tinham um fogo nele. Um fogo vivo, e determinado. Ele riu e tocou no rosto menor com carinho em resposta. Então lembrou de tudo o que vira na mente dele. Conseguia entendê-lo.
—Você não é nada parecido com Aeron. Acredite em mim. Nada.
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