Brin
Eu nunca quis machucar ninguém, mas eu penso agora, se algum dia eu tive alguma escolha sobre isso. Se qualquer um de nós teve. O que poderíamos ter feito diferente?
Obito nasceu na família errada. Um pai que o criou desde cedo para ser apenas uma arma. Quando Madara o encontrou ele nem mesmo sabia o próprio nome, e com 12 anos, não sabia fazer nada além de matar. Isso, claro, eu soube bem depois.
Itachi, aos sete anos, deixou de ser criança. A responsabilidade de seis vidas caindo em seus ombros, as visões em detalhes recaindo sobre sua mente ainda infantil e colocando nele um peso grande demais. Sasuke me contou que ele passou meses acordando aos gritos em casa, os pais indo de hospital em hospital, terapeutas. Ele nunca mais foi o mesmo.
Sasuke sempre esteve no escuro. Vendo o que acontecia com o irmão que tanto amava e de repente havia se isolado dele. Sendo deixado para trás ao ver os pais se preocupando tanto com o irmão que ele passou a ser uma figura de pano de fundo muitas vezes. Ouvindo aquele impulso mental que sempre o puxava para coisas tão negativas.
Alguma vez tivemos alguma chance nessa farsa?
Meu avô, no entanto, sempre estivera certo. Tentar desafiar o destino estava no meu sangue.
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— SEANATHAIR?
— Sea, mo sionnach beag?
—Eu sou um menino ruim? — Jiraya olhou para o neto, surpreso pela pergunta inesperada. Caminhavam por uma trilha na floresta perto da cabana, voltando do rio depois de uma tarde de pescaria.
—Por que a pergunta, Mo dhuine beag?
O pequenino pulou um tronco, calado por alguns instantes. As cicatrizes haviam esbranquiçado há algum tempo, mas ainda pareciam muito evidentes no rosto pequeno.
—Eu sinto... — o loirinho finalmente falou. — Às vezes... que tem algo mau em mim. Algo muito mau.
Jiraya suspirou. Parou e virou-se para o neto, agachando-se à sua frente. Os olhos de Naruto pareciam velhos, antigos demais.
—Não se preocupe, Sionnach. Há algo mau dentro de todas as pessoas. Assim como há algo bom dentro de todas elas. Não tem como ser um, sem o outro.
—Mas... — o garoto franziu a testa e abaixou a voz, falando perto de seu ouvido. — Essa parte má me assusta, Seanathair.
—Isso quer dizer que seu lado bom é forte. — O homem falou com simplicidade. — Enquanto o mal assustar você, Naruto, quer dizer que está no caminho certo. A partir do momento que o mal não o surpreender mais... isso quer dizer que você vai ter que lutar. — A criança tremeu, e o homem tocou os macios cabelos do neto. — Há uma luta dentro de todos nós.
Naruto assentiu, aceitando o carinho de seu avô. Mas aquela pergunta ficou na sua cabeça, nunca dita.
E o que acontece se mal dentro de uma pessoa for mais forte que o bem?
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— Você gosta de quebrar as pessoas. Agora eu vou te quebrar.
Era como flutuar em um rio escuro, em águas calmas. Ele não via nada, não sabia nada, não era nada.
— Não vai sobrar nada.
As vozes se faziam distantes. Tudo era distante, enquanto estava mergulhado no nada.
— Naruto...pare...
Ele não precisava sofrer. No fundo da sua mente, havia apenas o sentimento de "entregue-se" "é mais fácil assim" "não haverá mais dor" "eu vou tomar sua dor, Naruto."
E havia dor demais. Dor demais, tanta dor, tanto sofrimento, tanta perda. Havia tanto ódio, e raiva, e ele só queria sumir.
— Por favor Naruto...pare...isso não é você...
Ossos quebrando, gritos. Em algum plano estranho ele conseguia sentir parte do seu corpo. Sabia que estava sorrindo. Podia sentir sangue em suas mãos, o barulho de carne contra carne.
—Vou quebrá-los, como quebraram Brin.
Era tudo mais fácil. O nada era tão mais fácil.
—Naruto...você vai matá-lo.
Seus olhos piscaram, aquela voz...
—Naruto!
Sasuke.
Forçou os olhos. Sim, Sasuke. Sasuke ferido. Hinata caída. E dor. Doía tanto...mais tanto.
Havia flashes, lutou para abrir os olhos na água. E havia lama, e rostos, e gritos.
— Vo-você não é humano!
Menos dor. Tanta dor.
Abra os olhos. Ele tinha que abrir os olhos. Aquela angústia, o alcançava. Não era mais vazio. Abriu a boca e começou a se afogar.
— NARUTO!!
Abriu os olhos, em um ofego. Havia chuva. E gritos. Seus olhos piscaram, e se encontrou com rostos chocados. Havia dor em seu corpo, e sangue, muito sangue. Pensou que era seu até olhar para baixo e ver uma massa sangrenta no chão a sua frente.
Olhou os próprios punhos, cobertos do líquido vermelho, os azuis espantados.
—Naruto...
Uma voz hesitante o chamou e encontrou os olhos escuros assustados. Ele tinha o chamado, era dele o grito.
—Sasuke... — sua voz saiu rouca. Mais pessoas o chamavam, mas só via Sasuke. Havia medo nos olhos dele. Muito medo. Medo de si, e Naruto não entendia. O que havia acontecido? Como chegara ali? Como...
Sentiu uma dor aguda no pescoço, e puxou com os dedos um objeto fincado ali. No mesmo momento sentiu-se zonzo. Tentou se erguer, mas caiu de joelhos. Virou o rosto apenas para se deparar com os vencedores o rodeando, com armas, tranquilizantes. Estava tão confuso.
Sentiu seu corpo ceder, e caiu para frente, apenas para ser amparado. Olhou para cima e reconheceu a máscara de Corvo.
Itachi...
Foi apenas um nome sem voz. E foi a última coisa que fez antes de tudo escurecer de vez.
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Por um momento, Itachi pensou que aquela seria o instante. Era ali que ele perderia os dois novamente. Naquele momento, ele não se importou com qualquer fachada. Ao ver o que acontecia pelas câmeras, ele apenas correu para salvar seu irmão, mas ao chegar à clareira, com Sasori em seu encalço, só havia caos e sangue.
Naruto.
Não, no momento em que olhou para a destruição, no momento em que olhou em seus olhos, quando ele apenas deslocava os braços da lontra, naquele momento ele soube que não era Naruto ali. Não era o garoto que havia conhecido e aprendido a amar nesses últimos meses.
Era algo mais sombrio, mais antigo, mais poderoso e implacável.
Paralisou ao ouvir o barulho agourento. Por segundos, seus olhos focaram em Sasuke no chão, seu corpo protegendo o da garota Hyuuga com o dele mesmo, quase desmaiado, os olhos assustados, hipnotizados em Naruto.
E então Naruto virou a cabeça por sobre o ombro, o fitando diretamente, removendo a máscara com um movimento lento.
—Ewen.
Toda a floresta parecia em silêncio, toda criatura viva sabia que devia temer o que havia ali, e ele também sabia, seu corpo sabia, os outros vencedores que entravam na clareira sabiam. Aquela força esmagadora, opressora, colocou alguns deles de joelhos.
E ele estava sorrindo. Um sorriso calmo. Um sorriso de alguém que já matara tantas vezes, que aquele seria apenas mais uma.
— Aeron. — Sussurrou, caindo de joelhos, oprimido.
Ele continuava sorrindo, então voltou seu pescoço de volta à sua presa. Lontra. O Cobra havia fugido no meio da luta, ou já estava morto em meio àquela destruição.
—Pare.
A voz de Sasuke saiu mais fraca e assustada que já havia ouvido desde criança. Ele tencionou. Ele balançou a cabeça, como se sacudisse algo, erguendo suas mãos nuas para o corpo quebrado no chão.
—Não é você...não é você...NARUTO!!
As mãos de Itachi tremiam, até que sentiu a força opressora sumir. Ele caiu de joelhos. Em um segundo Itachi sentiu zunir atrás de si um disparo, e no outro, o garoto que tentava erguer-se, caiu novamente.
Tranquilizantes.
Correu até ele, sem pensar, o amparando. E quando notou os azuis, confusos, sabia que ele havia ido embora. Era Naruto. Era Naruto ali. Mas isso não importava mais. Tudo havia mudado. Olhou para o irmão, que parecia em choque.
A partir daquele momento, tudo virou um inferno.
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Respire
Sasuke obrigava-se a obedecer a própria ordem, encolhido na maca no furgão. As cenas de tudo que acontecera passavam em sua cabeça, sem parar. Ele só queria esquecer. Aquele medo irracional.
Sasuke nunca estivera tão assustado. Ele achou que conhecia medo quando assaltantes invadiram a sua casa e fora feito de refém, quando Itachi teve seu primeiro ataque e pensou que iria perder seu irmão. Ou o medo que sentiu ao entrar na sala de Obito e ver o corpo de Naruto que parecia sem vida, e, o pior de todos, quando acordara naquele quarto com Naruto abaixo do seu corpo, ferido e aterrorizado.
Esse medo fora diferente. Ele não temia por Naruto, mas sim Naruto.
Não. Não era Naruto. Não era seu Naruto.
Ele quase havia morrido. Hinata foi espancada na sua frente, e não sabia se ela estava viva. Ele nunca havia visto algo tão brutal como aquilo. Havia visto os sinais de brutalidade em Naruto depois que Obito o machucou, mas era a primeira vez que via algo assim pessoalmente. Era a primeira vez que sentia medo pela própria vida. Era a primeira vez que achou que veria alguém morrer brutalmente na sua frente.
Mal percebeu quando começou a se debater, no momento em que alguém o tocou, gritou.
—Sasuke, sou eu, acalme-se. Sasuke...
Ele continuava gritando, até sentir uma dor no braço, e seu corpo flutuar. Abriu os olhos e viu a máscara do seu irmão, que falava baixo perto de sua cabeça, a mão segurando a sua. Virou o rosto grogue, e viu que estavam sozinhos. Achara que Itachi havia ido no furgão com Naruto, mas ficava feliz que ele estava ali. Que ele estava com ele.
—Ni-san... — murmurou, de modo perdido.
Por favor diga que aquilo não foi real, eu quero ir embora. Eu quero ir para casa.
Sabia que era o choque, que só precisa controlar-se. Ele sabia. Ele sabia! Era um Uchiha, eles tinham o controle, eles nunca o perdiam.
Eles não choravam.
— Vai ficar tudo bem, eu prometo, no fim vai ficar tudo bem.
Ele queria muito acreditar naquilo
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Quando Hinata abriu os olhos, seu corpo inteiro doía. Seu braço direito estava imobilizado, havia bandagens em seu pescoço e parte do seu peito, onde sua pele tinha uma sensação estranha e fragmentos dos acontecimentos chegavam aos poucos.
Quando Hinata abriu os olhos, não eram os olhos de seu pai, ou de seu primo que estavam lá, embora no fundo, a criança que ela fora alimentara essa esperança. Ela esperara até mesmo os azuis de Naruto, de acordar com o sorriso dele e sua preocupação, e aquela paz e segurança que sentia ao redor dele. Não. Hinata acordou com o par de olhos escuros de Sasuke Uchiha, a analisando, sentado em uma poltrona ao lado da sua cama. Piscou, aturdida, enquanto nenhum dos dois desviava o olhar.
Sasuke também não parecia na sua melhor forma. Cheio de curativos, uma roupa de hospital. Embora diferente dela, o Uchiha conseguia parecer bonito até com o rosto repleto de hematomas. Notou que os olhos dele estavam diferentes. Pareciam perdidos. Pareciam atormentados. Era como se ele estivesse chorando por dentro.
Foi então que tudo o que acontecera caíra como uma bomba em sua cabeça. Tentou erguer-se, mas a mão dele a impediu.
—Naruto... —murmurou, obedecendo hesitante enquanto ele a fazia deitar novamente.
—Está melhor do que você, acredite. Apenas dormindo. O corpo está bem. — O Uchiha desviou os olhos. — Apenas exausto mentalmente.
O rosto dela não relaxou, e Sasuke recostou-se na cadeira.
—Eu não gosto de você. — Ele falou, calmo. Hinata piscou, e então assentiu. — Mas você salvou minha vida.
—Não fiz por você. — Rebateu.
Sasuke franziu a testa. Ela estava diferente, confiante. Ou talvez sempre fosse assim, e nunca ninguém havia a percebido.
—Eu sei que não. E por isso devo a você mais ainda.
E com isso ele ergueu-se, lhe dando as costas. Hinata não sabia o que pensar.
—Uchiha.
Ele parou, virando a cabeça levemente.
—Eu também não gosto de você. E não preciso que pague favor algum.
Sasuke dessa sentiu vontade de sorrir. Mas não conseguia.
—Vou avisar quando ele acordar.
Quando saiu da sala, Sasuke tinha a sensação engraçada. De que ele tinha mais em comum com a Hyuuga do que já havia pensado. Eles gostavam da mesma pessoa, vinham de clãs influentes que não sabiam como lidar com suas crianças. E eram orgulhosos, não gostavam de dever nada a ninguém.
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Nunca teve sua enfermaria tão movimentada. Ainda mais por pessoas tão problemáticas.
Havia checado Juugo, o rapaz devia ter apanhado bastante, os dois ombros deslocados, uma luxação na perna esquerda e três costelas partidas eram o bastante para deixá-lo quase desmaiado. Além do rosto inchado e cortado quase de forma irreconhecível.
Há muito tempo não via tantos jogadores chegarem ali tão debilitados; realmente algo de muito ruim tinha acontecido. A Hyuuga também não estava em um estado muito bom, o Uzumaki estava dormindo há dias, o Uchiha não tinha se ferido tão gravemente, além da torção no tornozelo, o corte leve na garganta e os ferimentos no rosto. Ele havia sido o único que apesar de ter sido visivelmente agredido não tinha nenhum osso quebrado. Yakushi havia saído da prova apenas com contusões, algumas costelas trincadas e um nariz quebrado, tendo sido liberado.
Suspirou terminando de preencher a ficha de Juugo, e a colocando pendurada ao lado da cama. Mantinha-o sob efeitos de sedativos e analgésicos, por isso dormia. Saiu do quarto o mais rápido que pôde, teria de checar o Uzumaki e a Hyuuga ainda antes de ir falar com Danzou e entregar os formulários.
Quando ergueu o olhar para a porta onde Naruto estava hospedado, parou ao ver o rapaz de pé, os olhos arregalados e confusos, os lábios ressecados entreabertos. Ele voltou a si, os azuis com aquele brilho desesperado, mãos trêmulas os pés descalços, o vestido branco de praxe da enfermaria era longo para ele.
— Onde está Sasuke? E Hinata?
Já esperava ouvir aquilo.
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Quando Kimimaro havia avisado Sasuke que Naruto havia acordado, foi mais que rapidamente para o quarto do rapaz. Tinha tido dois dias para pensar e colocar suas ideias no lugar, mas ainda não fazia ideia do que tinha acontecido naquela noite.
O que tinha acontecido com Naruto.
Nem bateu, somente entrou no quarto, fechando a porta em seguida. Seu olhar foi primeiramente para a maca, o corpo pequeno de Naruto estava ali, encolhido abaixo do lençol parecendo ainda menor, virado para um canto. Se aproximou, vendo os cabelos loiros espalhados pelo travesseiro, como fios de ouro. Parou ao lado e hesitou alguns segundos antes de chamá-lo.
— Naruto?
Não sabia como ele reagiria. O corpo dele tencionou levemente e se esticou, virando em sua direção, rolando na cama. Sasuke o encarou, arrepiando-se ao encontrar os azuis de tom celeste. Naruto parecia melhor, o rosto mais corado do que os dias anteriores. O leve hematoma que tinha na lateral do rosto tinha sumido completamente, mas as olheiras, mesmo com dois dias dormindo, estavam ali. Já pareciam fazer parte dele.
Ele estava recomposto, os olhos perspicazes lhe analisaram de cima a baixo enquanto se sentava. Ficou em silêncio enquanto ele o fazia, e aos poucos via as sobrancelhas loiras se unirem, os lábios carnudos em um bico leve ao pousarem na bota que usava na perna esquerda por causa da torção. Tratou de se explicar.
— Foi... Aquilo.
— Eu sei.
Ele desviou o olhar para as próprias mãos, a franja sobre os olhos azuis.
Sasuke se questionou se deveria estar ali. Ele ainda não conseguia encarar Naruto direito depois de tudo o que havia acontecido. O outro garoto havia deixado bem claro que não queria o ver, mas no momento ele não o expulsou do quarto.
Não é só por isso que está hesitando.
Sentou-se poltrona que ficava ao lado da maca, inclinando-se apoiado nos cotovelos, fixando-se no rapaz. Parecia que nada no mundo poderia abalar a beleza de Naruto, nem a face abatida, nem as roupas, nem o local em que estava.
Naruto parecia ser perfeito de todas as maneiras, e isso o deixava encabulado. Ele de perfil, os cabelos tão belos, os olhos baixos escondidos pelos cílios pálidos, as cicatrizes angulares, a forma bela com que seu rosto se desenhava... Tudo nele era tão... Deslumbrante.
Ele se virou, como se sentisse seu escrutínio, e fechou a cara, o nariz arrebitado se enrugou de uma maneira fofa, mas que não deixava de ser ameaçadora.
— Está me olhando daquele jeito de novo. — A voz era rude, e ao mesmo tempo afável, cansada. — Sei o porquê de estar aqui, mas não posso te dar as respostas que quer. — Mordeu o lábio e completou — Não agora.
Se endireitou na cadeira, as imagens daquela noite passaram rapidamente por sua mente, os olhos de Naruto... Não, não era o mesmo olhar, não era a mesma expressão.
— Sasuke.
— Desculpe, eu estou confuso. — Passou as mãos pelo rosto e cabelos, demonstrando toda sua frustração, cada movimento foi acompanhado pelos olhos azuis. — Como está se sentindo?
As interações dos dois nunca haviam sido tão hesitantes e estranhas, nem mesmo quando se odiavam no começo. Sasuke não sabia como agir, nenhum dois se sentia confortável perto do outro no momento. O clima estava pesado demais.
— Bem. — Sasuke novamente o olhou, mas não pode evitar de acompanhar o movimento dos dedos do rapaz que envolviam a barra do lençol, inconscientemente o comparando com aquele outro Naruto. Aquele ar superior, opressivo, destrutivo; o sorriso sádico, o olhar mortal... Sentiu o ímpeto de sair dali, novamente aquela sensação bizarra de sentir puro pavor se apossou de si. Arregalou os olhos e moveu-se nervosamente na cadeira. — Kimimaro me disse que dormi por dois dias...
— Foi. — Manteve o olhar longe do outro, a voz dele soando triste. — Fiquei preocupado, mas ele disse que era algo.... que não era algo físico.
Silêncio recaiu sobre eles, o ar ficou pesado, Sasuke tentava disfarçar, o coração acelerado. Aquele sentimento lhe sufocando.
Ele havia traído a confiança de Naruto, agido de forma monstruosa. Devia estar pedindo perdão de joelhos, e ainda assim, sua língua não conseguia mover e criar as palavras certas. Porque estava com medo, e dessa vez o medo não era por Naruto e dele o odiar. Não apenas.
— Aquilo que aconteceu... — reuniu toda sua coragem para fitá-lo, encontrando-o já lhe encarando. Não é ele, tentou se convencer, Naruto não lhe faria mal. — Não era você.
O rosto dele fez uma expressão estranha, que não conseguia entender. E logo ela mudou, para algo que ainda não tinha visto nele. Ele nunca havia o visto tão fechado, tão distante.
— Você não me conhece muito bem então, Uchiha.
Uchiha. Há quanto tempo ele não o chamava assim? De forma tão formal?
— Gosto de pensar que sim. E aquele...aquela pessoa não era você, Naruto. — Insistiu.
— Então quem você acha que era?
Naruto o olhou com o rosto levemente virado, como se realmente estivesse curioso com sua resposta. Não havia nada na expressão dele que indicava que sairia algo dali.
Sasuke franziu o cenho, frustrado.
—Você nunca faria algo assim. — sussurrou.
— Eu já fiz coisas piores do que aquilo. — Sasuke o olhou e ele ainda não tinha mudado de expressão. Era como se houvesse quilômetros de distância entre os dois naquele momento. — Você acha que eu nunca matei ninguém?
Isso o paralisou por um momento. Não havia inflexão na voz de Naruto, como se apenas indicasse um fato. Isso o desarmou e o olhou de forma perdida. Naruto assentiu, como se tivesse tido uma resposta.
— Você não me conhece tão bem quanto pensa-
—Você... Você é humano, mas naquele momento eu senti... — Sasuke o interrompeu, tentando expressar aquilo que martelava em sua cabeça. Queria apenas entender. — Senti realmente aquela força, eu vi tudo, como fazia coisas sem sequer se mover-
— Pare.
Foi cortado pela voz fria. Notou Naruto olhar brevemente em direção da porta, como se averiguando se havia alguém ali. Os olhos estavam sérios no seus, inflexíveis.
— Está falando coisas sem sentido.
— Eu sei o que vi! — Sua frustração começou a aumentar. Sentia novamente aquela raiva quente cortar em sua mente, em seu corpo.
Ele está mentindo. Por que ele sempre mente para mim?
— Eu sei o que eu vi. — Insistiu. — Pare de mentir.
Se eu não mentir. Naruto pensou, sem mudar sua expressão. Você vai acabar como o Gaara. A única coisa que pode o salvar é a ignorância.
Naruto o observou. Manteve firme em sua postura, mas sabia que tudo o que Sasuke falava era a verdade. Não se lembrava bem do que fizera. Na verdade, não lembrava de nada além de algumas palavras e quando por fim Aeron o deixou assumir, mas já era tarde.
Ele só sabia que tinha de negar tudo a Sasuke, pois se ele ficasse sabendo seria o fim. Sasuke era esquentado demais, ele nunca se controlaria. Seria a sentença de morte de sua família, e do próprio Sasuke. Sasuke não estava seguro, ele precisava se afastar.
Estava a cada dia mais convicto que a última pessoa que eles queriam morto era Naruto. Depois de verem do que era capaz, ele tinha uma certa ideia para que eles o queriam bem vivo. Aeron estava certo.
Aqueles malditos.
Será que por isso haviam demorado tanto a chegar e impedir aquele massacre de Sasuke e Hinata? Por que sabiam que ele iria interferir?
— Eu só queria que você parasse de...de tentar carregar tudo sozinho. — A voz de Sasuke cortou seus pensamentos. Ele parecia mais frustrado, o rosto lívido, tão parecido com noites atrás quando....
Pare. Não pense nisso.
— ...Não adianta! O que lhe custa? Aposto que para Itachi-
— Não. — Interrompeu, agora com raiva. Ele não tinha tempo para os ciúmes de Sasuke, ainda sobre Itachi. Não quando sabia o quanto Itachi estava sacrificando para proteger o irmão também. — Novamente você coloca seu irmão no meio. Isso não é sobre você ou ele. Ele não tem nada a ver com isso. Você tem que crescer, Sasuke, e sair da sombra dele. Para de invejá-lo! — Não conseguiu conter-se, jogou as pernas para fora da cama e viu se retesar, os olhos seguindo seus movimentos com cautela.
Ele está com medo... De mim.
Por mais que Sasuke quisesse esconder, era evidente que ele estava desconfortável. Naruto ficou triste com aquela constatação, mas tentou engolir tudo, imaginava que isso aconteceria em algum momento.
Isso é bom. Fica mais fácil.
— Eu não tenho inveja daquele vencedor, você continua o defendendo e ele sempre está metido em algo entre a gente. Sempre! Ele te ajudou, ele te amparou, te protegeu, depois você fica querendo dizer que ele não tem nada a ver com isso, é obvio que tem!
A voz de Sasuke saiu cada vez mais alta, frustrada, confusa e difícil de acompanhar. A expressão dele mudou de medo, para frustração, raiva, confusão. Era como naquela noite, e Naruto apenas sabia que aquilo não era bom. Só esperava que alguém aparecesse logo e o expulsasse. Não tinha como lidar com aquilo agora.
— Naruto! Eu vi com meus próprios olhos! Não era você! Aquilo que aconteceu foi fora do imaginável, e eu quero a verdade.
— Não existe 'a gente' nessa situação, isso não é sobre você. Quando vai perceber isso? — O cortou. — E se não achasse que era eu, porque está com medo, Sasuke?
O outro pareceu não saber o que responder a isso, desviando os olhos.
— Tanto era que você sente isso, nesse exato momento você sente medo de mim. Nós dois sabemos disso. — Abrandou-se, mas o Uchiha não dava aquela discussão por terminada, sua expressão raivosa se renovando.
— Naruto, continue assim se escondendo de mim, vai, corra para os braços do meu irmão. Se merecem mesmo. Essa porra toda acontecendo, nossas vidas estão de cabeça para baixo e vocês ainda tentam esconder as coisas de mim? Eu acho que estou dentro disso tudo o bastante para isso ser sobre mim também!
Saber da verdade? Olha onde isso levou Gaara.
— Você não entende. — disse entre dentes, contendo a raiva que Sasuke estava aflorando dentro de si. — Eu...Seu irmão... Já passou pela sua cabeça que ele pode estar fazendo isso por você? — Tentou colocar força nas palavras, para ver se Sasuke entendia a situação um pouco, mas ele parecia ainda mais agitado.
— Você é tão egoísta. Eu tenho direito de saber a verdade!
Naruto trincou a mandíbula e fechou as mãos em punhos, descendo da cama, Sasuke se levantou ambos se encarando com ferocidade.
Há tanto de Noland nele agora.
A voz de Aeron era quieta, guardada.
Naruto sentiu seu coração se comprimir com isso. Quem era Noland?
— Eu sou egoísta? — Sasuke o olhou por cima. Naruto passou a mão nos olhos, cansado, sua raiva evaporando de repente. — Você é uma criança, Sasuke. Se comporta como uma. Não consegue ver nada além do que quer ver. Explode por qualquer coisa quando não tem o que quer na hora que quer. — Balançou a cabeça. — E pede para eu confiar em você, mas não me dá nenhuma razão para isso.
Sasuke estreitou os olhos. Era verdade, no fundo sabia que era verdade o que ele dizia, e aquilo fazia tudo pior. O deixava com mais raiva.
Ele nunca fala a verdade.
Balançou a cabeça, aquela voz novamente. Começava a pensar se era realmente sua consciência, soando tão amarga.
— Eu acho que mereço respostas.
— De mim você não merece nada — A voz de Naruto soou trêmula, não sabia se pela raiva ou mágoa. — Da última vez que te contei algo importante sobre mim, o que você fez, Sasuke? Você não usou isso contra mim?
Todas as palavras prontas que tinha para continuar sumiram ao ouvir, seus ombros de abaixando, sua raiva sumindo. Eles haviam desviado do assunto até aquele momento, mas ao que parecia havia atingido um nervo de Naruto.
— Eu contei meu maior trauma. — A voz de Naruto tremeu e viu os olhos dele marejando. — E você me olhou nos olhos e disse que era mentira naquela noite. Você usou justo aquilo. — Naruto desviou os olhos e o viu limpar o rosto, sua voz baixa. — Eu sei que quem...quem fez aquilo no fim...Quem me machucou fisicamente... você não estava no controle. Nem mesmo deve lembrar de tudo. Nisso eu nunca vou te culpar.
Isso o surpreendeu. Naruto sabia disso? Como? Antes que pudesse perguntar ele continuou.
— Mas antes...antes de tudo sair do controle, ainda era você lá. Você que entrou no quarto. Você que insistiu quando eu pedi para parar... mesmo sabendo o que tinha acontecido comigo, e até isso você usou contra mim. Eu confiei em você. — As memórias do que acontecera naquela noite voltaram aos dois de forma dolorosa. — Eu pedi que parasse, mas você queria provar algum ponto idiota. Me tratou como se eu não fosse nada.
— Eu não...eu nunca quis te magoar. — Disse em voz baixa. — Eu não sei o que...Por Deus, Naruto. Eu amo você. — Foi a única coisa que conseguiu falar.
— Se o amor é isso, eu não quero seu amor. Esse amor me machuca, esse amor destrói nos dois, você sabe bem. Eu não quero... sentir esse tipo de dor, Sasuke.
Sasuke paralisou o movimento que fazia em direção ao outro, se fixando-se no rosto abaixado, os ombros trêmulos. Toda a compostura de Naruto havia ido embora e ele tinha uma expressão de dor visceral no rosto. A visão quebrou o seu coração e sua insistência. Algo em sua garganta pareceu inchar, seus olhos pinicaram para logo marejarem.
Ele havia estragado tudo. Deus, havia estragado tudo.
Naruto tem razão.
Tentou engolir o choro e se encaminhou para a porta, mas antes de sair, murmurou baixo.
— Você tem razão. Nunca quis te machucar, nunca quis que me odiasse tanto. Mas Naruto... não importa o quanto me odeie, um Uchiha só ama uma vez. Sempre vai ser você. E eu ainda vou te merecer, nem que seja a última coisa que eu faça.
...........................
Naruto ofegou quando ele finalmente saiu, levando a mão a cabeça que começava a latejar de uma maneira forte, seu coração acelerado. Aquilo doía tanto.
Ele havia conseguido o afastar, era o que queria, mas a dor era quase insuportável. Recostou-se a cama e se deitou. Após um tempo, resvalou para o sono. Ou desmaiou, não sabia.
Apenas para acordar com vozes por perto.
— Você sabia que ia acontecer, Itachi. Um deles tinha que pagar. Devia apenas ficar feliz por não terem apontado o dedo para seu irmão ou Naruto.
— Eles nunca escolheriam Naruto. Você sabe que não.
Naruto franziu a testa.
— Quando vai contar a ele então? — Sentiu seu corpo tenso, mas não se moveu. Tinha a sensação de que não ia gostar daquela conversa. — Itachi...
— Eu não sei como. Vai ser hoje à noite.
A voz dele pareceu cansada.
— Ela é amiga dele, ou algo assim, não é? Quem eles designaram para executar a ordem?
— O Hyuuga.
— Eles são primos.
— Mas isso não importa para ele. Todos sabem disso.
Ordem.
Executar.
Amiga...
Seus olhos se arregalaram.
Hinata.
Sentou-se na cama depressa. Não havia ninguém no quarto, as vozes vinham do corredor, não sabia como havia ouvido de tão longe. Sentia que sua audição estava mais sensível, mas pensaria nisso depois. Pisou no chão frio sem importar-se com a dor que sentia. Passou pela porta apenas para ver as costas de Itachi e Sasori ao longe. Correu e eles viraram pouco tempo antes de alcançá-los. Parou, os encarando.
— Naruto. — O Uchiha o olhou preocupado. — Seu rosto...tem sangue nele...
— Me conte.
Os dois franziram a testa.
— Eles vão matar Hinata, não é?
Pela cara dos dois, nenhum deles iria contar. Naruto respirou fundo. Seus olhos brilharam e sua voz assumiu um tom claro de ordem, uma ordem impossível de se negar.
— Me conte tudo. Agora.
Os olhos dos dois ficaram nublados. E eles contaram tudo.
..........................
Sasuke tomou aquele caminho sem se dar conta. A briga com Naruto ainda estava em sua cabeça, e controlava aquela vontade tola de chorar. Sasuke nunca fora um chorão. Mas nesses últimos dias estava se superando.
Parou em frente do quarto da Hyuuga, e entrou sem bater. Ele havia prometido avisá-la quando Naruto acordasse. Ia fazer isso.
Encontrou o quarto vazio.
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Seu avô uma vez dissera a Naruto que ele era um soldado nato. Que ele tinha a capacidade de armar as melhores estratégias nas piores situações. E agora ele provava esse ponto.
Terminou de vestir a camisa, puxando o capuz para sua cabeça, ao mesmo tempo que continuava colocando os mantimentos que roubara na bolsa de lona. Remédios, barras de cereais, corda, facas. Não era muito, mas esperava que o suficiente para sobreviver por alguns dias. Assim como um mapa dos arredores que havia ganhado no primeiro dia no colégio. Queria ter sua arma com ele agora, a arma que seu pai lhe dera, mas ela fora perdida há muito no incidente com Obito.
Não havia tempo para lamentos. Pegou o tablet que havia roubado de Sasori e olhou os pontos vermelhos. Havia dois na enfermaria, um no dormitório na ala leste, e outro no da sua ala, que seria ele mesmo. O quinto ponto se encaminhava para a floresta.
Hinata.
Os transmissores que haviam colocado neles geravam sinal para esse aplicativo, e todos os vencedores tinham um para controlar seus movimentos durante as provas.
Ele havia arrancado tudo dos dois. Naruto não se sentia bem com isso, por usar aquele poder assim, fazer as pessoas agirem contra a própria vontade era algo que odiava, mas deixaria para pensar isso depois. Sabia que Itachi e Sasori seriam logo encontrados, trancados no quarto de Itachi. Ele confiava que Itachi não o denunciaria, e sabia que ele havia tentado impedi-lo para seu bem, mas sabia que não havia como os dois se explicarem. As câmeras mesmo já deviam ter mostrado tudo.
Naruto contava com isso para a segunda parte de seu plano.
Por agora, ele tinha que correr. Fechou a bolsa e correu. Quando passava pela porta quase bateu em Sai, que falou algo. O ignorou. Naruto tinha que correr.
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Hinata sabia que havia algo errado. Seguia Neji para a floresta, mas a desculpa dele cutucava sua consciência e seus instintos. Sabia que não estava certo. Seu braço ainda estava imobilizado, engessado, e sentia sua pele repuxar onde o ácido a queimara, mas a mão de Neji em seu ombro, enquanto levava um guarda-chuva sobre os dois não a deixava sair do agarre. Não que não pudesse correr — apesar de que ele a alcançaria. —, mas porque era parecido demais de quando eram crianças. De quando ele ainda era ele mesmo. E ele sabia disso também.
— Neji...
— Estamos quase chegando.
Franziu a testa, e parou, lutando consigo mesma.
— Fale aqui o que tiver de falar.
Ele virou o rosto, surpreso pela atitude dela. Hinata não era daquele jeito, ela nunca o encararia dessa forma desafiante. Confidente. Franziu a testa.
— Tudo bem, pode ser aqui.
Estavam perto do riacho, que descia em um abismo, perto de onde a trilha de biologia era feita. Ela nunca havia ido ali, observou rapidamente o quanto a clareira estava um lamaçal pela chuva dos dias anteriores e o chuvisco que caía. E se virou para seu primo.
Neji a soltou, mas continuou próximo a ela, ela tomou fôlego para falar, mas o perdeu no instante que sentiu algo lhe cutucar na barriga. Ela abaixou o olhar e o ergueu na mesma velocidade, aterrorizada, encontrando os claros de Neji em si, sérios.
— Desculpe por isso, Hinata.
O pior de tudo?
A voz dele parecia arrependida.
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Naruto se abaixou, olhando para os dois a alguns metros. Podia ver tudo mais nítido mesmo no escuro, como se de alguma maneira tivesse ativado a resolução 4K de sua visão. E essa não era a única mudança que havia notado, sua audição perecia dezenas de vezes melhor que antes, ele conseguia ouvir tudo.
Você está usando aquilo, e exagerando.
Não tenho escolha.
Aeron se calou, pois devia saber que era verdade. Ele não tinha opção. Era isso ou perder Hinata.
— Fale aqui o que tiver de falar. — Hinata disse, não estava gostando nem um pouco do modo em que Neji segurava-a pelo ombro.
— Tudo bem, pode ser aqui.
Se aproximou mais, de maneira sorrateira, mas rápida, aquele era o momento de Neji matá-la. Ele sacou a arma da parte detrás da calça e a pressionou na barriga de Hinata.
Não iria permitir isso.
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Sasuke se assustou quando Kimimaro apareceu em seu quarto, já era tarde, quase onze da noite.
— Seu irmão estava preso no próprio quarto com Sasori, os dois estão muito confusos, não sabem como foram parar ali.
Antes que terminasse a frase Sasuke já estava vestindo uma jaqueta e tentava sair o mais rápido possível, o que era difícil por causa da bota. Kimimaro o seguiu, continuando a falar.
— Naruto também sumiu.
— O quê? — voltou—se ao mais velho. — Como assim?
— Simplesmente sumiu. — disse dando de ombros, Kimimaro já tinha certa ideia do porquê, havia visto o sensor do garoto, ele seguia a Hyuuga. Queria contar ao Uchiha, mas achou melhor não se meter além do que já estava.
Como se precisasse.
Sasuke sempre foi muito inteligente, e já ligara os pontos. Seu irmão preso no quarto, Hinata e Naruto desaparecidos... Sinônimo de muita porra acontecendo sem ele saber.
De novo.
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Quando viu o que o outro pretendia, soltou a mochila no chão. Sequer viu quando se materializou atrás do Hyuuga, seu braço o prendeu em uma gravata e gritou o mais alto que pode.
— Hinata, se abaixe!
E tudo aconteceu rápido demais.
A garota se jogou no chão no meio da lama, Neji jogou o guarda-chuva no chão e apontou a arma para trás, por cima da própria cabeça. O estampido foi alto, mas o braço dele não estava mais na garganta do Hyuuga, que se virou rapidamente somente para se deparar com o vazio.
— Mas...
Quando ele virou o rosto, foi acertado com um soco de direita no meio do rosto, seguido de um de esquerda na lateral do rosto. Ele cambaleou, o rosto pálido ganhando cor.
Neji levantou o rosto somente para ter o corpo arremessado longe pelo choque. Ambos rolaram pelo chão coberto de lama, a arma voou longe, Naruto o segurando pelo colarinho, os olhos arregalados dilatados, mandíbula trincada. Sentiu as mãos desesperadas de Neji o empurraram, mas acabou por baixo de Naruto, que o socou na primeira oportunidade.
Os cabelos loiros sujos caíram sobre seus olhos, mas não precisava ver para saber que tinha acertado um murro no nariz — antes — perfeitinho do Hyuuga. Ouviu o grunhir um xingamento.
Mate-o.
Hesitou com a voz amarga em sua cabeça e foi pego de surpresa, ao ser chutado pelo outro, caindo para trás. Logo o punho de Neji o acertou, mas não foi o bastante para que Naruto perdesse o foco.
O próximo soco, agarrou a mão do outro o segurando, e levantou o rosto. A respiração de Neji estava acelerada, a pele tão pálida contrastava com as manchas de lama escura, sangue escorria pelo nariz, os olhos quase brancos o analisavam de uma maneira perspicaz, cheios de ódio e surpresa.
— Ia matá-la. — Se surpreendeu com sua própria voz, grossa, austera. Os azuis se tornaram cinzentos, e seu corpo formigou, não sentindo mais aquele cansaço da corrida. Somente, uma adrenalina maravilhosa, sentia que podia mover o corpo, mas tinha outra força que o tomava parte de si. — Seu monstro.
— Não diga nada, você também não é certinho, Namikaze. Intrometido.
Namikaze.
Então era isso.
— Ela é sua prima. — Nem soube como conseguia falar com tanta tranquilidade.
— Ela é um obstáculo.
O Hyuuga mal fechou a boca e foi puxado, recebendo uma cotovelada de lado no rosto. Caiu no chão, imediatamente se levantando, começando a desviar do chute seguido de um soco, que Naruto desferiu.
Cerrou os olhos e tentou segurar a mão do outro, mas Naruto foi mais rápido, girando o corpo, acertando o antebraço na nuca do Hyuuga, que desequilibrado, se curvou, somente para ser seguro pela nuca e receber uma joelhada no rosto, seguida de uma no estômago. Caiu de joelhos, sangue escorria de sua boca também, os cabelos longos soltos e bagunçados, sem fôlego chiava em busca de ar, a boca aberta, os olhos arregalados. Suas mãos abraçaram o próprio corpo.
Naruto se endireitou, olhando-o de cima. E retirou a faca que havia escondido, aproximando-se. Se controlou para não tremer. Ele tinha que aterrorizar Neji. Não podia demonstrar hesitação.
Deixe-me assumir!
Não deixaria. Ele não cometeria o mesmo erro.
Focou na tarefa.
— Vou cortar sua cabeça fora se preciso, para que aprenda que laços são muito mais importantes do que ordens. — Girou a lâmina deslizando a entre os dedos antes de a segurar com mais firmeza
Agarrou os cabelos dele, puxando o rosto para cima.
— Naruto! — virou-se para a garota, ela parecia em choque. Por um segundo ponderou o que fazia, se estava se deixando levar pela raiva novamente... Não, dessa vez era diferente.
Estava no controle.
O rosto sempre tão belo de Neji estava enrugado em uma careta de dor, os olhos quase translúcidos o olharam, irados. Por um segundo vacilou, olhando Naruto. Pela primeira vez notou aquele brilho animalesco que ele possuía, nos olhos, nas feições, na postura, tudo o tornava superior de uma maneira quase esmagadoramente estranha. Ia além de sua compreensão. Teve os cabelos puxados com brusquidão, e voltou a prestar atenção, desviando o olhar dele.
— Apesar de tudo... — ouviu-o murmurar com raiva. — Ainda olha me olha como eles. — Sentiu a ponta da adaga se aproximar de seu olho, e sentiu o corpo retesar. —Mas, o assunto aqui não é este. — Retirou a faca dali, puxando-o, o forçando a se endireitar. Naruto parou atrás de si encurvado, a lâmina fina tocando sua garganta. — Se você se mover, te corto mais rápido. Ela não tem culpa de nada, nada que aconteceu nesse jogo maldito que nos colocaram.
Naruto puxou seu rosto na direção de Hinata, que estava ainda no chão, parecia estar sentindo dor, pela sua expressão, agarrada ao braço engessado, os olhos arregalados fixados neles.
—Ainda assim ela foi desclassificada por minha culpa. Por algum acaso existe essa regra maldita de ter de matar o jogador que perde. Eu nunca poderia deixar acontecer. Porque eu prometi, não só agora, como antes... — imagens passaram por suas pupilas, mas sumiram rapidamente. — Você iria matá-la, iria sujar suas próprias mãos com sangue como o seu? Você vai embora daqui, e não vai falar nada sobre isso. — Apertou a faca na garganta do rapaz, colocando todo o poder de persuasão em sua voz. Via os olhos do outro tentando manter o foco.
Ele era bom. A mente dele era forte. Naruto não sabia como aquilo funcionava, mas de longe o Hyuuga estava sendo a pessoa mais difícil em que já usara aquilo. Ou talvez só estivesse exausto demais.
— Você não sabe... De nada! — ele disse entre dentes.
Neji tentou empurrar a mão que segurava lâmina, a afastando de seu pescoço. Girando o corpo. Naruto se ergueu e caiu, pela rasteira aplicada pelo outro. A faca voou de sua mão e, tropeçando Neji alcançou a arma e a pegou.
— Se não fizer o que eu digo, vai morrer. Pelas mãos dele. Obedeça. — Naruto ergueu-se devagar, usando os joelhos como apoio, o rosto sujo se levantou, mostrando os olhos brilhando. Aeron estava querendo sangue a todo custo, e não sabia o quanto conseguia o controlar naquele momento.
O Hyuuga pareceu paralisado por instantes, qualquer pensamento ou tentativa de luta esvoaçando de si rapidamente, nem parecia ser ele mesmo, preso naqueles olhos assustadores.
—Se eu não a matar, eles vão. — Para sua surpresa o Hyuuga cuspiu entre dentes. — O mais dolorosamente possível.
Isso o fez ter uma pausa. Pela primeira vez notou certo desespero no olhar do outro. Talvez nem tudo estivesse perdido.
—Não o faça. A deixe ir, damos um jeito. — Por segundos achou que havia o alcançado, mas ele ergueu a arma em sua direção, a expressão convicta. E sabia que não adiantava tentar. — Por quê?
—Eu não tenho escolha.
—Pare!
Sabia que não tinha muito tempo de hesitação por parte dele depois da ordem. Neji estava convicto que fazia a coisa certa de tal forma que ele não podia ser controlado. Sua mente era forte demais.
Se ao menos tivesse o alcançado antes disso tudo...ele teria sido um aliado tão forte.
Não adianta pensar nisso agora, não pode salvar todo mundo. Ele é seu inimigo agora.
Naruto avançou sobre o outro, tentando tomar a arma, mas recuou quando teve o rosto quase acertado por um soco. Olhou o outro fixamente, antes de novamente avançar sobre ele com um soco. Neji desviou para o lado, apontando a arma para seu rosto.
Sem nunca atirar.
Por quê?
— Atire. — A respiração do outro acelerou, e Naruto se perguntou o que ele estava vendo em seu rosto. — Estou esperando, Hyuuga. Você ia atirar na sua prima, mas não consegue atirar em um desconhecido?
Ali, teve a certeza, pela hesitação dele.
Eles não o queriam morto.
Namikaze. Ele me chamou de Namikaze. A prova. Aeron tem razão...eles sabem sobre mim. Eles sabem demais sobre.
Pelo canto do olho podia ver que Hinata se movia. Queria gritar para ela ficar parada, mas em questão de segundos aconteceu. Neji acordou do transe, desviou a arma de si e apontou para ela. Seu coração escapou uma batida, tentou usar qualquer força em si para jogar a arma longe, mas parecia drenado. Então apenas se jogou contra ele com rapidez, os dois caindo na lama, rolando. Quando a arma disparou, Hinata gritou, e Naruto por segundos achou que havia sido ele a ser atingido.
Ficou lá, parado, respirando rápido, o corpo de Neji sobre o seu, ergueu os olhos apenas para ver as orbitas do outro arregaladas, sangue saindo por sua boca. Os olhos nos seus, em choque. Como se não acreditasse que ele havia mesmo feito isso.
Ele também não acreditava.
—Hinata... — A voz de Neji murmurou, ele parecia querer falar mais alguma coisa. Os olhos assustados nos seus, uma mão fria agarrou o seu braço. Engoliu em seco, um frio percorreu sua espinha enquanto o outro agonizava.
—Eu vou protegê-la.
Não sabia se era isso o que o outro queria ouvir ou não, mas ele parou de se mover, os olhos fechando.
—Foi um acidente. — Murmurou. — Foi...um acidente...
Tirou o corpo de cima de si, querendo rastejar para longe
Não precisou conferir a pulsação para ter certeza, era mais do que claro que estava morto. Um tiro, um tiro que o atravessara. Um tiro, e havia tanto sangue em suas mãos. Como o sangue de Juugo. Tanto sangue...
Naruto olhou para as próprias mãos, sem acreditar.
Eu...matei.
Era preciso!
Balançou a cabeça, sem aceitar. Não fazia parte do plano. Não havia planejado isso. E perto do final...se tivesse mais tempo teria o convencido.
Sua cabeça estava sendo inundada por cenas de sangue, gritos, fogo, que nem sabia de onde vinham. Via a si mesmo em meio a corpos em um acampamento destruído. Uma pilha de corpos, e ele fazia-a maior. Tanto sangue...ele era um assassino. Era dele que saia aquele grito raivoso. Era a mão dele que manejava a lança que perfurava os corpos que iam contra si.
E havia seu avô. Havia seu avô, o corpo dele olhando o nada, e raiva, e mais corpos. Tanto sangue. Ele estava sujo, sujo de sangue até sua alma.
A cena sumiu e arregalou os olhos, ainda de joelhos na lama, ouvindo o choro de Hinata atrás de si, sem conseguir encará-la.
Eu sou um assassino.
Você estava a protegendo! Da última vez, não conseguiu, não chegou a tempo, e tudo que lhe restou foi dizimar aqueles malditos que a mataram. Agora ela está viva, então, faça alguma coisa!
As palavras o pegaram atordoado. Sentia-se fraco, drenado. Ele não queria continuar, estava apenas cansado de tudo aquilo.
Não seja fraco! Preferia que ela estivesse morta? Eles vão chegar aqui assim que perceberem seu rastreador fora do colégio! Eles não vão matá-lo, vão matá-la!"
O choro de Hinata o acordou.
Tinha que ser forte.
Ergueu-se depressa, até a garota caída de joelhos, em choque. Sacudiu Hinata, e como última solução, estapeou a face pálida.
— Hinata! — gritou e ela o olhou. Por um momento pensou que ela iria correr de medo de si, mas ela o surpreendeu o abraçando apertado.
— N.Naruto! Ele ia... — Ela não conseguiu terminar, chorando.
— Hinata! Escuta! Eu preciso que você me escute. — A afastou de si, segurando seu rosto, a obrigando a olhá-lo. — Eu preciso que me ajude.
A garota respirou depressa e assentiu. Naruto não sabia se ela estava prestando atenção, mas não tinha tempo.
— Você tem que sair daqui, agora. Aquela mochila — Apontou para o objeto jogado no chão — Leve-a, ela tem suprimentos. Você tem que se manter viva até atravessar a floresta e conseguir ajuda. Não está tão longe. Você pode fazer isso? — seus olhos focaram no braço engessado, nos ferimentos de queimaduras com ataduras.
Céus.
Surpreendeu-se com o olhar determinado. Ela havia parado de chorar de imediato. Era o mesmo olhar de sua visão. Não a garota fraca, mas a arqueira que lhe salvara a vida, a garota que salvara Sasuke. Era aquilo que precisava.
— Me dê sua mão, isso vai doer. Confia em mim. — Ela assentiu estendendo o braço, Naruto pegou o punhal e mais do que depressa apalpou o local e cortou a pele fina, recebendo um pequeno gemido, arrancando dali o rastreador. — Pronto. Agora, ouça com atenção. Não procure seu pai, ele está envolvido nisso. Eu sei que é difícil de acreditar...
— Não, eu acredito. — Ela falou com a voz trêmula. — Eu sei que ele seria capaz. Neji não me mataria sem que ele... —Ela tremeu ao falar o nome do primo. — Eu acredito em você.
Piscou, surpreso com isso, mas continuou. Não tinham tempo.
— Muito bem. Eu preciso que você saia desse lugar, tem alguém a quem possa pedir ajuda? Um lugar para ir? Uma pessoa em quem confie!
Ela fechou os olhos com força, pensando rápido.
— Shino. Meu amigo de infância. Eu confio nele, totalmente.
— Ótimo! O procure, entre em contato com ele assim que sair da floresta, e fique escondida.
— Mas...alguém tem que saber o que está acontecendo aqui! Eu tenho que...
— Escute! Se você...se você fizer isso agora, eles vão saber que fui eu que te ajudei, e vão matar minha família, Hinata. Eu...te imploro. Apenas...espere um pouco.
Ela suspirou e assentiu, ainda hesitante. Mas Naruto sabia que ela faria.
—Mas e você...
—Eu vou ficar bem, tem alguém me ajudando, nós vamos acabar com esse jogo antes do fim. E será sua deixa. — Naruto falou firme, arrancando o colar que usava do pescoço e colocando na mão fria da garota. — Procure Tsunade Senju, quando a sétima semana completar. Será quando agiremos, na última prova. Lhe mostre isso, conte o que aconteceu, ela vai te colocar em contato com meu pai. Não antes, nem depois. Você pode fazer isso?
Ela o encarou profundamente, então assentiu com determinação. Naruto soltou seu rosto e beijou sua testa, a abraçando em seguida, lhe passando toda força que conseguia, sem querer soltarem um ao outro.
— Você tem que ir agora. — Murmurou, a largando devagar. — Vai.
A garota se afastou, olhando para trás com um rosto de dor, Naruto lhe sorriu confortador. Lhe dando força.
— Você vai conseguir. Confio em você.
Essas foram as palavras precisas. Hinata sorriu e correu para a floresta, do jeito que ele lembrava.
A arqueira de suas visões.
Seu sorriso caiu apenas quando ela sumiu. Agora era sua deixa. Pegou o rastreador e a massa que carregava no cinto. Olhou ao redor, tinha que ser rápido, já deviam ter visto que estava ali, seu rastreador o entregaria.
Trabalhou com rapidez, tentando ignorar o corpo de Neji Hyuuga na lama. Conseguiu o que precisava, um tronco podre, que seria facilmente levado pelo rio correnteza abaixo. Grudou o rastreador ali e o jogou no abismo, o vendo sumir nas águas turbulentas.
E assim, Hinata Hyuuga estava morta. Neji Hyuuga a jogara no rio. Seriam meses para encontrarem o corpo. Ele chegara, eles lutaram, Neji perdeu.
Quando eles encontrassem, Hinata já estaria fora de alcance. Sabia a rota daquele rio. Seriam dias com a correnteza forte assim, se sequer desconfiassem e tentassem mesmo achar o corpo antes da tempestade acabar.
Depois pegou tudo que usara, e deu o mesmo destino.
Sentiu uma tontura o apoderar, e a umidade em seu rosto. Passou os dedos sujos de lama, apenas para ver, muito sangue saindo do seu nariz.
Naruto?
A voz de Aeron parecia distante para si.
Se afastava da beira quando invadiram o local. A chuva era torrencial, e reconheceu apenas Tobirama vindo, seguido de outros. Já estava imerso na febre e na dor dos ferimentos. Antes mesmo que eles o alcançassem, ele havia tombado na terra, castigado pela chuva e sem sentidos.
.....
Avô
Minha raposinha
Meu pequeno
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