Capítulo 7
Eu cheguei tão feliz em casa, que poderia até mesmo assistir P.S. Eu Te Amo, sem derramar uma lágrima sequer. Talvez apenas algumas, bem pouquinhas, já que eu nunca consigo segurar as lágrimas quando assisto esse filme.
Acho que aquele foi o dia em que Edu conversou comigo durante um tempo maior, mas eu ainda sentia uma pontada de culpa, porque ele estava com Madalena, apesar de não terem assumido nada ainda, e, a partir do momento que eles decidiram ficar juntos, eu não podia mais gostar dele tanto assim. Só não sabia o que fazer para desgostar do meu colega.
Entro no meu quarto, sem lembrar de fechar a porta, e me jogo em cima da cama, completamente extasiada de felicidade. Acho que o fato de ter passado algumas horas longe desta casa, de Regina e das suas filhas, foi suficiente para que eu me sentisse melhor.
Fico um longo tempo encarando o teto, sem ter nenhuma reação, a não ser sorrir feito uma boba. Uma boba apaixonada, é exatamente isso que eu sou.
É claro que eu não tenho chance alguma com ele. Edu pode conquistar qualquer garota que quiser, a maioria das meninas da escola sentem algum tipo de atração por ele, o que não é para menos, visto que Edu é um dos garotos mais lindos que eu já conheci.
Os pensamentos continuavam martelando na minha cabeça, porque eu fui notada pelo Edu, ele olhou para mim mais do que cinco segundos, e isso era tudo o que eu queria. Ou melhor, quase tudo, porque, de fato, eu queria muitas outras coisas e a principal delas, era que todos da minha família adotiva me aceitassem e gostassem de mim.
Era estranho e confuso lembrar de tudo o que eu vivi antes e depois de ser adotada. As memórias ainda estão bem nítidas na minha mente. Eu me recordo que a assistente social entrou no dormitório das meninas, informando que um casal gostaria de me conhecer. Meu coração disparou no mesmo instante. Eu tive pouco tempo para me preparar, mas aquele curto período serviu para que eu ensaiasse para fazer tudo certinho e não deixar escapar qualquer possibilidade de ser adotada.
O mais interessante é que quando os meus olhos se encontraram com os de Teodoro, eu tive a certeza de que queria ser sua filha. É estranho lembrar disso, mas eu senti que ele era uma boa pessoa. Dizem que isso é bastante comum, que as crianças sabem quem é bom e quem é mau. Já no caso de Regina, toda a minha impressão em relação a ela, foi que eu achei aquela mulher linda, parecia ter saído da capa de uma revista, e, apesar de não trazer consigo uma expressão muito contente em seu rosto, eu acreditava que teria orgulho de dizer para todo mundo que ela era a minha mãe. A mulher mais bonita que eu já conheci era a minha mãe.
Mas com um tempo eu percebi que isso jamais seria possível, porque Regina não queria que eu fosse sua filha e, talvez, se eu soubesse disso antes de ser adotada, eu pedisse para continuar no orfanato e me recusasse a ir com aquele casal que tanto me encantou. Eu já tinha nove anos, não era mais uma criança que estava na primeira infância, talvez o juiz levasse a minha vontade em consideração. Mas o meu desejo de ter uma família falava mais alto do que tudo. Eu só não sabia naquela época, que eu já tinha uma família e irmãos muito mais amorosos lá no orfanato.
“A mesa do jantar não está posta", ouço a voz de Regina bem próxima de mim, interrompendo o estado de hipnagogia em que eu me encontrava. “Levante desta cama e vá fazer algo de útil.” Sua voz soava áspera, o tom de desprezo sempre presente.
Fui despertada dos meus devaneios da forma mais cruel possível. Mas aqueles míseros minutos que eu passei sonhando com Edu e lembrando da minha vida no orfanato, foram suficientes para que eu criasse um pouquinho de esperança e tivesse forças para enfrentar mais um dia turbulento.
“Eu já estou indo, Regina.” Respondi somente. Eu não podia retrucar uma ordem dada por ela. Regina tem a minha guarda, pela lei ela é a minha mãe e eu preciso obedecê-la, mesmo fazendo isso contra a minha vontade.
O restante da noite foi exatamente como todos os outros dias. Eu tive que fazer todas as vontades de Regina e suas filhas. Só que dessa vez eu tinha as boas lembranças do dia para me distrair enquanto eu trabalhava. Teodoro, sempre atencioso, fez questão de me ajudar, enquanto ele estava por perto, e, antes de ele desaparecer para o seu quarto, até Regina me tratava bem. Ele perguntou como foi meu dia, mas eu respondi com poucas palavras, pois as três estavam por lá, e eu temia que meus momentos de alegria enfurecesse elas.
Notei que Regina e Madalena se incomodaram bastante com o pequeno sorriso que eu não conseguia esconder, já Samara era sempre mais dispersa, não se importando muito com o que acontecia à sua volta. Parecia que elas não gostariam de me ver contente. Parece não, após os últimos acontecimentos eu tenho certeza que elas não desejam a minha felicidade, como eu desejo a delas. Mas isso não importa mais.
Tudo o que importa é que daqui a alguns meses eu vou me formar no ensino médio e estou estudando muito para conseguir aprovação em uma boa Universidade. Sei que os cursos que eu tenho vontade de fazer, não são tão concorridos assim, mas sei também que os estudos são muito importantes, independente de qual faculdade queremos cursar.
Eu não quero mais atrapalhar tanto a vida da minha família adotiva. O Teodoro paga uma escola cara para mim, mesmo contra a vontade da esposa, então, todo meu desejo é completar logo dezoito anos para conseguir um emprego para que ele não gaste tanto comigo e deixá-lo livre de qualquer responsabilidade financeira.
♡♡♡
Quando eu cheguei na escola, o meu olhar varreu todo o local, buscando encontrar Edu. Não que eu tivesse esperanças de que ele falasse comigo, mas apenas o fato de vê-lo já fazia o meu coração palpitar. E mais uma vez aquele sentimento de culpa me invadia. Eu não podia pensar nele, desta forma, seria errado cobiçar o garoto com quem minha irmã está saindo, mesmo que Madalena não me considere sua irmã.
Eu não quero parecer uma maníaca obsessiva, mas... Será que eu estou parecendo uma maníaca obsessiva?
Não, essa não é a minha intenção. Eu só queria ser notada por ele, apenas isso.
Notei uma pessoa se aproximando de mim e acompanhando os meus passos, enquanto eu caminhava para a sala. Mas não era quem eu gostaria que fosse. Mesmo assim, tentei não parecer tão desinteressada como fiz da última vez em que conversamos.
“Bom dia, Elena”, ele iniciou. “O que achou do fim de semana?”, Caio perguntou, após se aproximar um pouco mais de mim, caminhando lado a lado comigo. Seu rosto não parecia tão sério e fechado, como nos outros dias.
Eu estava achando bem estranho sua aproximação repentina. Talvez ele só esteja tentando ser agradável comigo, depois que fizemos aquela atividade juntos.
“Achei bem legal. Eu gostei bastante de sair com vocês.” Respondi com sinceridade. Eu realmente gostei demais de ter saído com eles, acho até que ter amigos fora do orfanato é bem melhor do que eu imaginava, e olha que eu gostava da maioria das crianças de lá. Me peguei várias vezes tentando descobrir como estavam, se já tinham sido adotados ou se permaneciam lá, mas como já disse, Regina nunca me permitiu manter contato com ninguém de lá, e eu nunca quis pedir para Teodoro, já que a mulher vivia dizendo para eu não importuná-lo com estas coisas, pois ele tem assuntos muito mais importantes para tratar.
Lá no orfanato eu tinha muitos amigos/irmãos, mas a maioria não tinha a minha idade e os outros nós íamos perdendo o contato, à medida que fossem adotados, porque, os casais que chegavam lá preferiam adotar crianças mais novas e com as características físicas bem diferentes das minhas.
Foi uma verdadeira surpresa quando eu fui adotada. Teodoro disse que quis me adotar assim que me viu. Eu não sei muito sobre sua vida, pois não costumo perguntar, mas Guilhermina me falou que há muito tempo, quando ele ainda estava com sua primeira namorada, Teodoro já dizia que tinha vontade de adotar uma criança, e parece que os dois compartilhavam o mesmo pensamento, segundo Guilhermina, foi uma jovem que ele amava muito.
“A gente sempre marca algum encontro nos finais de semana", ele voltou a falar, me fazendo lembrar que eu não estava fazendo o caminho até a sala, sozinha. “Seria interessante se você começasse a sair mais vezes com a gente.”
Percebi um brilho diferente nos olhos de Caio, como eu nunca tinha visto antes. Na verdade, eu nunca tinha me permitido olhar para ele mais do que dois segundos. Pelo menos agora, o meu colega não me assusta mais como antes, quando eu tinha meus 10, 11 anos, e ele não tinha um bom círculo de amigos.
“É, pode ser", respondi com a voz um pouco fraca e sentindo as bochechas esquentarem. Não sei porquê, mas eu fiquei um pouco envergonhada de estar ali conversando com ele no corredor da escola. Caio sabia ser bem desconcertante quando queria, principalmente nas vezes em que observava meu rosto de forma tão atenta, como fazia naquele momento.
Nós continuamos caminhando lado a lado, com ele puxando assuntos aleatórios do dia a dia enquanto eu respondia as suas perguntas.
Eu nunca fui muito boa com diálogos, por isso prefiro apenas me limitar a responder apenas o que as pessoas perguntam. É como se, dessa forma, eu não saísse da minha zona de conforto.
Escutei um barulho como se algo tivesse caído no chão, mas não dei tanta atenção, até que ouvi alguém chamando meu nome.
“Elena", virei de costas, e encontrei Edu falando comigo. “Você deixou o seu estojo cair.”
“Ah", respondi, ainda tentando me manter mais discreta que eu conseguisse, se é que isso é possível. Já não sei como fico diante dele, e isso é bem embaraçoso, porque manter a discrição é tudo o que quero, guardar essa paixão que sinto por meu colega, e não deixar que ele, nem ninguém, perceba. “Obrigada, Edu.”
Ele cumprimentou Caio e passou por nós, e eu continuei encarando as suas costas dentro da camisa da farda, até que ele sumisse de vez. Era uma visão linda de se admirar. Ele era lindo de qualquer jeito, até mesmo de manhã cedo, com aquela cara de quem ainda estava com sono.
Droga! Por que eu tinha que gostar de uma pessoa que não liga a mínima para mim? Machuca tanto saber que enquanto eu sonho acordada - e às vezes até dormindo também - com ele, o Edu sai com outras garotas.
“Limpa a baba.” Eu me assustei ao ser despertada. Caio estava de braços cruzados ao meu lado e com o olhar fixo em mim.
Encarei seu olhar de volta, sem entender o que ele queria dizer.
“A baba", ele respondeu, como se adivinhasse os meus pensamentos, “escorre quando você olha para o Edu.”
Corei. E acho que corei muito. No tom mais forte de rosa, ou vermelho, sei lá. Meu rosto esquentou tanto, que parecia um vulcão prestes a entrar em erupção. Eu estava babando pelo Edu? Céus! Eu pensei que não estivesse dando bandeira. Não era para ele e nem ninguém saber.
“E-eu não estou b-babando", respondi o óbvio, após passar a mão pela minha boca e conferir que não tinha baba nenhuma. Eu só esperava não gaguejar tanto, mas o nervoso me pôs naquela situação embaraçosa.
Mas percebi que ele já não olhava mais para mim, e aquele brilho que eu tinha percebido até pouco tempo, já não estava mais presente no rosto dele, era como se alguma coisa tivesse mudado seu humor, de repente. Garoto estranho, uma hora parece bem, mas na outra, muda completamente.
“Relaxa, Elena", ele disse, ainda com os braços cruzados. “Se você gosta do Edu, deveria falar com ele.”
Falar com ele? Esse garoto deve estar surtando, só pode. Eu nunca vou contar para o Edu que eu sonho com ele desde os meus quinze anos de idade e que eu já fantasiei com ele aparecendo na casa dos meus pais adotivos para calçar o famigerado sapato de cristal em mim, após eu perdê-lo em um baile, à meia-noite.
Estou delirando demais, né?
É, talvez sim, eu esteja delirando. Mas quando não estamos felizes com nossa própria vida, acho que o que mais fazemos é sonhar acordados, pensar, fazer planos para o nosso futuro, de que seja melhor do que de fato está sendo, pelo menos é assim que acontece comigo.
“Eu n-não gosto do Edu”, respondi, gaguejando outra vez. Sou uma péssima mentirosa, eu sei. Mas ninguém pode dizer que eu não tentei.
Caio pareceu não acreditar muito em mim. Mas isso não importa. Eu só espero que ele não conte nada para o Edu e para ninguém. Se isso chega nos ouvidos de Madalena, ela vai me odiar ainda mais, mesmo sabendo que eu não tenho nenhuma chance com Edu.
Pelo menos ele não pareceu dar muita importância para o fato de que eu estava com o rosto em chamas.
Sério mesmo, minha vontade era cavar um buraco mais fundo do que o poço de Kola e me enterrar dentro dele, até que meu colega esquecesse que me viu, como ele mesmo disse, babando pelo Edu.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro