Capítulo 20
Se a minha vida fosse um filme, eu gostaria que ela fosse como uma daquelas comédias românticas dirigidas por Garry Marshall. Mas ela estava bem longe disso. E quando eu digo isso, estou falando sobre a parte do romance, e, talvez da comédia também.
Bem, eu não posso reclamar tanto. Penso que as coisas estão até melhorando um pouco, já que Teodoro passa mais tempo em casa do que passava antes e, com a presença dele, Regina nunca me trata mal, muito pelo contrário, ela age como se fosse uma mãe exemplar.
Mas neste exato momento, o meu pai não está em casa e, é claro que caso Regina me encontre de saída, irá me obrigar a preparar o seu café, como faz todos os dias. Foi por isso que eu desci as escadas o mais rápido que consegui, em uma tentativa frustrada de não dar de cara com ela.
“Já preparou o meu café?”, escutei sua voz ecoando por trás de mim. Meu susto não foi pouco. Foi como quando estamos assistindo a um filme de terror e o personagem dá de cara com o vilão.
Juro que eu pensei que tivesse passado despercebida desta vez.
“Guilhermina já está preparando”, respondi, com a voz fraca. Guilhermina se dispôs a preparar o café de Regina todas as manhãs, exatamente para evitar que eu me atrase. “Eu estou quase atrasada para a aula.” Bem, não era uma exata verdade, mas também não era mentira. Atrasada eu não estava, mas já estava em cima da hora.
“Essa função não é da Guilhermina, ela é sua”, ela respondeu, pausadamente, tentando parecer o mais assustadora possível. E conseguiu.
A cada passo que Regina dava, para mais perto de mim, meu coração acelerava ainda mais. Eu sempre senti medo daquela mulher, desde que eu entrei naquela casa pela primeira vez e tentei abraçá-la para agradecer por ter me adotado, mas ela não permitiu, me afastando de perto dela, dizendo que, caso eu ousasse a chamá-la de mãe, ela me expulsaria de lá.
“M-mas foi ela quem se ofereceu para preparar.” Tentei me justificar, mas fui interrompida.
“Se você não quiser que a sua querida Guilhermina seja despedida, trate de fazer o que eu mandei.”
Guilhermina despedida era a última coisa que eu gostaria que acontecesse. Não por mim, mas por ela. Eu conheço as suas necessidades, ela precisa do emprego, assim como as pessoas desta casa também precisam dela, e eu não posso deixar que Regina faça a crueldade de mandá-la embora.
Fiz o que ela mandou e me apressei para preparar o café, exatamente do jeito que a minha mãe adotiva gosta. Não muito forte, mas também não muito fraco. Com um pouco de adoçante e na sua xícara específica para beber café.
Dessa vez eu nem deixei que Guilhermina tentasse me impedir, por ela e por mim também. Eu não podia me atrasar mais. O fim das aulas já estava batendo na porta, eu não gostaria de ficar com a imagem da aluna que sempre chega atrasada.
“Mais alguma coisa?”, perguntei, implorando internamente para que a resposta fosse não.
“Não. Agora você pode ir", ela sorriu, como quem estivesse me provocando. E era exatamente isso o que ela fazia, não é mesmo? “Espero não receber mais nenhuma reclamação por conta de seus atrasos na escola.”
Respirei fundo, engolindo mais uma de suas provocações, sem retrucar.
Se acalma, Elena. Já está acabando. Falta pouco para você receber a sua carta de alforria.
♡♡♡
Para não perder o costume, eu cheguei atrasada, mais uma vez. As vezes penso que Regina faz essas coisas de propósito, só para que eu me atrase.
Mas isso não importa agora, não depois de eu ter encontrado Edu sozinho na cantina da escola, após ter tido mais uma discussão com Madalena.
Eu juro que não entendo o motivo pelo qual aqueles dois brigam tanto.
Eles ainda não assumiram nada, e, ao que tudo indica, acredito que nem chegarão a assumir. Mas isso não me deixa feliz, muito pelo contrário, eu gosto demais do Edu, e é exatamente por isso que eu desejo que ele seja feliz. Apesar de saber que não é recíproco, eu também quero o bem da minha irmã adotiva.
“As coisas com Madalena não andam muito bem, não é?”, me juntei a ele naquela cantina tão solitária.
Não tinham segundas intenções na minha atitude. Naquele momento, eu não era a Elena que sempre foi apaixonada pelo Edu. Eu era apenas uma pessoa disposta a oferecer minha amizade para alguém que não parecia nada bem.
“De você eu não preciso esconder que Madalena tem um gênio difícil. Eu realmente não sei muito bem a forma certa para lidar com ela. Isso cansa.”
Sim, isso cansa. E como cansa ter que medir as palavras certas para falar com outras pessoas. Não poder ser você mesmo.
“Se você gosta mesmo dela, acho que vai aprender a gostar até dos seus defeitos. Sabe, Madalena não é fácil, mas acho que a mãe dela é a maior responsável por deixá-la daquele jeito. Eu acredito que Regina faça a coisa errada, pensando que está fazendo a coisa certa, não por mal.”
Por um instante eu nem acreditei que estava fazendo aquilo. Defendendo Madalena e até Regina. Mas era o que eu sentia. Regina amava as filhas e tinha um carinho especial por Madalena. Quanto à minha irmã adotiva, eu acredito que no fundo ela não seja tão cruel quanto aparenta ser comigo.
“Esse é o problema, eu não sei se gosto dela o suficiente para suportar seu jeito. Madalena é linda, foi bom ter ficado com ela, mas sinto que nós dois... não é para acontecer.”
“Eu entendo e respeito, Edu, só te aconselho a não tomar nenhuma decisão precipitada, para não se arrepender depois.”
Ele parecia conformado. Talvez não gostasse tanto de Madalena, e é isso que eu não entendo, as vezes. Se uma pessoa não gosta da outra, por que inicia um relacionamento? Não estou julgando, mas acho que eu não teria coragem de ter algo mais sério com alguém que não fizesse meu coração bater mais forte.
“Você vai à nossa festa de formatura, não é?”, ele perguntou. Quando eu percebi que seus olhos estavam voltados para minha direção, juro que eu fiquei extremamente nervosa.
“Sim”, respondi somente. Eu não queria correr o risco de falar demais e acabar estragando tudo.
“Então, quer ir comigo?”
Ele estava me convidando para ir com ele? É isso mesmo? Eu não estou ficando maluca?
Olhei para aquele garoto por quem sempre fui apaixonada, pensei em Madalena, em mim mesma, e... Pensei em Caio. Não sei o motivo, mas ultimamente ele vem ocupando meus pensamentos bem mais do que eu gostaria.
Sim, é claro que eu queria ir com Edu. Quer dizer, eu deveria querer ir com ele. Então, por que tanta dúvida na hora de responder a uma simples pergunta? Era só dizer sim ou não. Aliás, era só dizer sim.
“Claro", precisei voltar atrás, após perceber que respondi rápido demais. Eu precisava me controlar. "Digo, sim, pode ser uma boa.”
Ele sorriu para mim - o sorriso mais lindo que eu já vi - antes de sair da cantina.
Aquilo só podia ser um sonho. E eu não queria acordar nunca mais.
Até ontem Edu estava saindo com Madalena e hoje ele me convidou para ir com ele à formatura.
Madalena. Eu não posso esquecer a minha irmã adotiva. E se ela ficar com muita raiva de mim e me odiar pelo resto da vida? Eu não quero magoá-la. Apesar de tudo, ela e Samara são mais importantes para mim do que qualquer garoto. Elas são minha família, afinal.
“Ei", olhei para o lado e vi que Caio já estava ali bem perto, falando comigo. "Eu quero falar com você.”
Ele parecia nervoso com alguma coisa, mas ao mesmo tempo ele sorria para mim. Um sorriso que quase fez meu coração derreter.
“Espera só um pouquinho? Eu preciso falar primeiro, caso contrário, acho que vou explodir.”
Ele assentiu, me encorajando a continuar. Caio era a única pessoa que sabia sobre a minha paixão platônica pelo Edu, com certeza, como meu amigo, ele iria ficar feliz por mim.
“O Edu me convidou para ir com ele à formatura.”
O meu colega não teve a reação que eu esperava. Aliás, ele não teve reação nenhuma. Isso foi meio decepcionante. Eu esperava que ele se animasse junto comigo.
O sorriso desapareceu do seu rosto, e seus olhos já não me encaravam mais.
“Que bom!”, meu colega disse, desanimado. Não parecia que estava muito feliz. “Você deve estar feliz, afinal, é o Edu, hã?
Sua falta de empolgação quase me desanimou. Eu estava tão feliz por ele, por acreditar que ele e Sabrina estavam se entendendo. Por que o meu amigo não parecia ter ficado feliz por mim?
Não era fácil pensar que ele estava com a Sabrina, não sei por qual razão, mas me incomodava um pouco pensar nos dois juntos, só que eu ficava feliz apenas por imaginar que ele também estava feliz.
“Mas o que você queria me dizer?”, perguntei, me esforçando para não deixar a animação ir embora.
“Ah, não. Não era nada demais. É só que...”, ele parecia ansioso e, pela primeira vez, desde que nos tornamos amigos, Caio estava medindo as palavras antes de falar, como se não quisesse despejar qualquer coisa. “Eu não sei se vou à formatura.”
Não pude evitar que a decepção tomasse conta de mim. Eu queria tanto que ele fosse, eu... Eu queria passar meu último dia como estudante do ensino médio com a pessoa mais importante para mim, daquela escola. Uma das mais importantes, eu diria, já que a professora Patrícia também se tornou alguém que eu gostava muito e faria questão de tê-la na minha vida.
“Como não?”, perguntei, indignada. Ele não podia fazer isso. Era a nossa formatura. Ele deixaria de ir para a nossa confraternização?
Por algum motivo, eu senti a decepção me invadir. Eu queria que ele estivesse, queria mesmo, ele é meu amigo, o melhor amigo que eu já tive em toda a minha vida, e saber que não estaremos juntos para confraternizar com os nossos colegas, me desanimou bem mais do que eu esperava.
“Talvez eu esteja viajando. A minha irmã me chamou para ir à casa do noivo dela, no interior, e, sei lá, talvez eu vá, no final das contas.”
“É uma pena, Caio. Eu queria muito que você estivesse lá também.”
“Mas você já vai ter o Edu, aliás, eu fico feliz por você. De verdade.”
Eu nem falei que ele não parecia nada feliz por mim. Mas tudo certo, talvez o meu amigo esteja enfrentando mais uma daquelas fases difíceis.
E, sim, é verdade. Eu vou ter o Edu, e deveria estar vibrando com isso.
De repente, me lembrei de outra coisa.
“Você não vai nem querer se despedir da Sabrina?”, perguntei, sentindo uma coisinha bem incômoda dentro de mim, quando falei o nome dela.
"Eu tenho o número dela", ele justificou. "Não vamos perder o contato, somos amigos."
"Claro", murmurei, me sentindo ridícula. Como assim? Eu estava... com ciúme? Não, não poderia ser, eu não sinto ciúme de Caio, só um ciúme de amigo mesmo, nada mais.
"Bom", ele falou, seus olhos percorrendo por todos os lugares daquela escola, menos em mim. "Boa sorte com o Edu."
Eu passei um curto tempo encarando ele, e sentindo meu coração bater mais forte. Eu não queria que ele me desejasse sorte com Edu, porque... Porque eu não sei se quero estar com Edu. Na verdade, eu preferia que fosse ele, fosse Caio quem estivesse comigo. Mas aparentemente, ele não deseja o mesmo.
"Boa sorte com a Sabrina", disse.
Ele me olhou com surpresa, como se não entendesse o que eu estava querendo dizer. Mas tenho certeza de que ele sabia muito bem. Não vamos perder o contato, foi o que ele disse, não foi? E ela também tem interesse nele, como a própria deixou bem claro.
Bem, que sejam muito felizes, então. Eu não me importo com isso, não mesmo. Sou uma boa amiga, e se a felicidade dele é ao lado dela, que seja feliz com ela. Gosto de Sabrina e sei que ela faria qualquer garoto feliz.
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