Capítulo 16
Eu fiquei bastante encantada com o carinho entre Nanda e seus pais. Aquela era a relação que eu gostaria de ter com os meus pais adotivos, uma afeição mútua, cercada de amor e atenção.
Regina sempre me dizia que eu deveria ser grata por ter - nas palavras dela - sido liberta daquele lar de crianças remelentas. Bem, eu era grata e bastante, não que eu concordasse com as suas palavras, pois para mim, todos os que vivem lá no orfanato, são crianças e adolescentes maravilhosos.
Mas para mim, o que importa não é apenas o fato de estudar em uma boa escola ou morar em uma casa grande. Sim, ter o amor das pessoas que eu também já estava aprendendo a amar. Sei que Teodoro gosta de mim, eu sinto o carinho dele comigo e eu também o adoro, mas as palavras de Regina não param de martelar na minha cabeça. Ele nunca vai ser o seu pai, ela dizia sempre que tinha a oportunidade.
Parando de devanear tanto, nós tínhamos ido até a casa de Nanda para fazer um trabalho em grupo. Eu e as meninas estávamos quase completando todas as pesquisas, até a hora em que a mãe da minha colega apareceu no quarto com uma bandeja em mãos.
Nós ficamos muito felizes e gratas, já que todas estávamos com muita fome. Foi neste momento que as meninas começaram a falar sobre diversos assuntos, inclusive sobre garotos.
A vergonha que eu senti quando elas me perguntaram se eu já tinha beijado alguém, não foi pouca. Eu sei que as meninas são bem mais descoladas do que eu. Era bem constrangedor conversar com elas e perceber que, enquanto as três tem sempre alguma experiência para contar, seja ela sentimental ou em qualquer outra área, eu não tinha nenhuma. Eu me sentia a mais boba de todas as criaturas. Aquela que passou dezessete anos de vida, sem fazer nada além de assistir filmes, isso quando eu não estava arrumando a casa, é claro.
"Então, você nunca beijou?", Sabrina me perguntou, como se não acreditasse no que dizia.
Neguei com a cabeça, morta de vergonha, afinal, eu estava conversando com três garotas que já tinham experimentado aquela sensação que eu tanto ansiava experimentar também.
Eu sabia que o meu rosto tinha se convertido em um vermelho vivo. Minhas bochechas estavam em chamas e, por mais que eu tentasse, não conseguia olhar para elas. A expressão de espanto presente no rosto de Sabrina não me deixava muito à vontade.
"E não tem nenhum problema nisso", Nanda disse, tentando amenizar o meu constrangimento, aliás, ainda bem que ela estava por perto. Se eu não estivesse me sentindo tão constrangida, iria agradecê-la por me salvar.
"Mas, e vocês? Como foi o primeiro beijo de vocês?", eu quis saber. Eu estava bastante curiosa, tanto para saber o que elas sentiram na hora do primeiro beijo, quanto se foi muito ruim, como todo mundo diz que são todos os primeiros beijos.
"Bom, o meu", foi Sabrina quem começou, "eu tinha doze anos e foi com o meu primeiro namorado."
"É serio que você já namorou, Sabrina?", Juliana perguntou. Parecia bastante surpresa. Admito que eu também fiquei um pouco surpresa, já que a minha colega nunca demonstrou interesse em namorar sério com ninguém. Mas saber disso é bem importante para que eu aprenda a não julgar ninguém pelo que eu acho.
"É claro que sim, Ju. Mas não durou muito tempo, só três meses, por isso que quase ninguém sabe", ela soltou um sorrisinho e fez um coque alto em seus cabelos escuros, antes de prosseguir. "Mas depois eu descobri que namorar não é para mim, pelo menos não por agora. Eu prefiro curtir minha solteirice."
"Principalmente se for com o Caio", Juliana comentou, com um leve sorriso no rosto, como quem sabia de mais coisa do que qualquer outra pessoa.
Não entendi ao certo, mas aquilo me incomodou um pouco. Quer dizer, eu adoro o Caio, ele é um grande amigo e eu iria ficar feliz se ele encontrasse uma garota que o faz bem. Mas a possibilidade de imaginar os dois se beijando, me inquietava um pouco, o que é bem esquisito, tendo em vista que eu já flagrei os dois juntos.
Mas isso não importa, sei que é apenas ciúme de melhor amiga, já que, caso ele comece a namorar, eu posso ficar de escanteio.
"Ah, o Caio é um amigo", ela disse, mas, não sei porquê, não me convenceu muito. "Eu acho até que ele gosta de outra pessoa." Seu tom era desanimado.
Aquela frase ficou cravada em minha mente. Ele gosta de outra pessoa? Será que o meu amigo gosta de alguém e eu não sei?
Mas, se o Caio gosta de alguma garota, por que ele não me contou? Eu gostaria de saber se o meu amigo está interessado em alguém. Eu me abri para ele, revelei os meus sentimentos pelo Edu, gostaria que ele tivesse um pouquinho mais de consideração e confiasse em mim.
Agora a minha chateação era real. Não por ele gostar de alguém, mas por Caio não ter confiado em mim o suficiente. Sei lá, eu poderia até ajudá-lo com a tal garota. Não que eu tenha alguma experiência em relacionamentos, mas conheço sobre garotas.
"Eu sempre desconfiei que essa amizade colorida de vocês dois não ia acabar bem", Nanda constatou. "Pela sua carinha, acho que você está começando a gostar do Caio. Estou errada?"
"Está sim", Sabrina disse firmemente, parecia querer convencer a si própria. "Agora chega de falar de mim, é a vez de vocês. Elena quer saber como foi o primeiro beijo de vocês duas."
"O meu foi com treze anos, mas não foi nada bom", Juliana sorriu. Ela se ajeitou na cama, antes de continuar. "Contando agora é até engraçado, mas na época foi horrível. O garoto também nunca tinha beijado, e, meninas, ele me babou inteira, juro. Foi um completo desastre, principalmente, porque estávamos saindo de um restaurante e ele tinha acabado de comer cebola. Então, vocês já podem imaginar o hálito, não é?"
"Nossa, Ju, deve ter sido horrível", Sabrina comentou.
"Você não tem ideia do quanto. Juro que se eu pudesse voltar ao tempo, jamais teria o beijado."
Até agora, de todas as que eu já ouvi, aquela tinha sido a pior experiência. Não consigo me imaginar beijando alguém que acabou de comer cebola. Se bem que, se fosse o Edu, eu não importaria nem um pouco.
"Já o meu foi com a mesma idade da Sabrina, doze anos", Nanda iniciou. "Foi um constrangimento tão grande. O garoto era cinco anos mais velho que eu e, é claro, bem mais experiente. O problema era que eu não sabia nem que precisava abrir a boca para beijar e o pior ainda estava por vir. Ele precisou perder um tempo me ensinando como se beijava. Eu me envergonho até hoje quando lembro disso. Ainda bem que o garoto foi aprovado em uma faculdade em outra cidade e não corro o risco de vê-lo, tão cedo."
A cada depoimento das meninas, eu temia ainda mais. E se o meu primeiro beijo fosse desastroso? Pior, se o garoto risse de mim porque eu nunca beijei? Todas as possibilidades me deixavam com medo e ansiosa.
Eu queria fazer o meu melhor. Gostaria que fosse perfeito, como os primeiros beijos das protagonistas dos livros que eu leio, com direito até a música do Ed Sheeran tocando ao fundo.
"Ouvindo vocês falando, eu fico pensando em quando for a minha vez", confessei, honestamente. A vergonha ainda tomava conta de mim, mas eu criei coragem para falar com bastante sinceridade.
"Você não precisa se preocupar, Elena, e nem beijar alguém só por beijar", Juliana sorriu, gentilmente para mim.
"Verdade", Nanda concordou. "Se você beijar alguém que faça seu coração bater mais forte, pode ter certeza que vai ser o melhor beijo da sua vida e terá valido a pena."
Imediatamente, meus pensamentos foram transportados para Edu. Era ele quem fazia meu coração bater mais forte. Era ele quem eu queria beijar. Mas, e se ele não quisesse me beijar?
Bem, é claro que a possibilidade de ele não me querer é bastante real, afinal, tudo indica que Edu está com Madalena. Me esforcei para não parecer tão triste perto das meninas, elas não precisavam saber sobre os meus sentimentos.
"As minhas outras experiências antes do Tiago foram bem desastrosas", Juliana sorriu, escondendo o rosto entre as mãos. "Mas com ele foi tudo tão... tão mágico e encantador. Acredite se quiser, mas até hoje, após quase dois anos de namoro, eu ainda me sinto como uma pré-adolescente que nunca foi beijada, quando estamos juntos."
"Já eu tive péssimas experiências depois do meu primeiro beijo", Sabrina comentou. "É claro que nenhuma delas foi com o Caio, porque ele beija muito bem." Ela parou por um instante e eu notei que a minha colega se arrependeu de ter dito aquilo. "Mas não se preocupe tanto com isso, Elena, as vezes o primeiro beijo é maravilhoso, mas o segundo pode ser horrível, isso depende muito de quem você esteja beijando." Ela fez uma pequena pausa, antes de prosseguir. "Se for com o Caio, por exemplo, tenho certeza de que você não iria se arrepender.
Olhei para ela, me sentindo confusa. Por que ele voltou para essa conversa?
Sabrina pareceu compreender minha confusão, pois logo emendou:
"Você não percebeu nada de diferente nele?"
Pensei à respeito. Bem, eu não percebi nada de diferente nele. Só que nós nos aproximamos bastante, nessas últimas semanas. Tirando isso, não, não notei nada demais.
"Ele parece gostar muito de você, Elena." Nanda complementou que Sabrina dizia. "E não é de hoje." Ela lançou um olhar para amiga, parecia pedir permissão à Sabrina para prosseguir falando, tive essa impressão, após minha outra colega fazer um gesto em afirmação. "Lembra que quando você entrou na escola, tinham alguns garotos que ficavam fazendo bullying com você?"
Confirmei. Eu não poderia esquecer disso, por mais que fosse meu desejo. Foram momentos que marcaram muito, de forma negativa, em minha vida.
"Depois de algum tempo eles pararam, não foi?", ela fez mais uma pergunta, arrancando outra confirmação minha. "Foi porque Caio pediu, aliás, ameaçou todos eles, caso não parassem de fazer aquilo com você. Nós nos conhecemos há muito tempo, e desde que você foi estudar na nossa escola, ele não parava de falar sobre a garota tímida da nossa turma. Precisava ver como os olhos dele brilhavam sempre que tocava no seu nome."
Eu lembro, sim, que após um longo período sofrendo bullying, aqueles garotos pararam de ficar pegando no meu pé, e lembro também que, apesar de andar com eles, Caio não agia como os amigos, pelo menos não comigo. Mas eu nunca imaginei que ele tivesse feito algo assim, agido como um verdadeiro... Como um verdadeiro príncipe de contos de fadas age.
"E você?", Juliana perguntou, os três pares de olhos me fitando, esperando que eu dissesse alguma coisa. "Gosta dele?"
Se eu gosto dele?
"Gosto", afirmei. "Claro que gosto. Ele é meu amigo."
Mesmo que eu ainda tivesse digerindo aquilo tudo que foi dito, vi quando Sabrina revirou os olhos.
"Então", ela falou, atraindo minha atenção. "Você não vai se importar se nós ficarmos juntos? Eu e o Caio?"
Pensei nos dois juntos, imaginei meu amigo e aquela garota linda juntos, assumindo para todos os demais amigos que eles resolveram se acertar. Ele... Ele se apaixonando por ela. Isso me incomodava, não me agradava nem um pouco. Mas eu não tinha esse direito. Nós somos amigos, e eu tenho que desejar o melhor para ele.
"Não", respondi a pergunta dela, mas no fundo eu sabia que não estava completamente segura da minha resposta. "Eu não vou me importar."
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