Capítulo 15
Eu odiava as aulas de Química. Era tão cansativo precisar decorar todas aquelas fórmulas químicas, cheias de letras e números. Mas se eu quisesse ser aprovada no vestibular, logo na primeira tentativa, eu sabia que precisaria me esforçar muito mais.
Aquele velho ditado diz que há males que vem para bem, certo? Bem, no meu caso, eu acredito que possa ser verdade, afinal, acho que se eu não fosse tão desprezada na casa da minha família adotiva, talvez eu não tivesse essa sede de ser aprovada de primeira no vestibular, consequentemente, não estudaria tanto.
Não é como se eu não gostasse de estudar - apesar de conhecer o meu desinteresse em algumas disciplinas - mas eu gostaria de passar muito mais tempo, quem sabe até a vida toda, ao lado dos meus pais e das minhas irmãs. Talvez não a vida toda, pois isso já é demais. Mas quem sabe um tempo maior.
Eu fui adotada aos nove anos, portanto, tive apenas oito anos de convívio com a minha família adotiva, menos tempo do que eu passei no orfanato. Mas, apesar de tudo, eu sei que era muito mais feliz lá, onde tinha alguém que se importava comigo e as outras crianças gostavam de mim.
Sei que Teodoro e Guilhermina também se preocupam com o meu bem-estar, mas eu também sei que, devido a essa preocupação comigo, ambos sofrem as consequências.
Bom, eu não pretendo ficar reclamando tanto da vida, afinal, estudo em uma excelente escola e nunca me faltou nada. Tudo o que eu já consegui até aqui, e ainda irei conseguir futuramente, foi graças à piedade de duas pessoas que se dispuseram a me adotar em meio à tantas outras crianças, e me ofereceram o melhor, não é mesmo?
Eu passei tanto tempo perdida em meus pensamentos, enquanto guardava o meu material, que nem me dei conta de que todo mundo já tinha saído da sala. Só percebi que eu estava sozinha, após olhar para os lados e notar o vazio que se instalou ao meu redor. Aquele silêncio de quando não tinha alunos em sala era maravilhoso, e eu bem que gostaria de aproveitá-lo um tempo maior, mas sabendo que daqui a alguns instantes, a moça da faxina vem para organizar a sala, eu me adiantei, até mesmo para não dificultar o trabalho dela.
Eu juro que ia sair da sala de aula, imediatamente. Mas os meus planos foram interrompidos por algo, ou melhor, por alguém. Um alguém de cabelos e olhos castanhos, encostado na porta e segurando alguma coisa, que só em seguida eu soube o que era.
Caio me encarava com o olhar um pouco triste, como no dia em que ele me contou sobre sua mãe. Por um instante eu pude sentir meu coração se derretendo, afinal, eu sou a única pessoa daquela escola que sabe sobre o seu dilema pessoal e, talvez, ele esteja precisando mesmo de uma amiga. Mas logo me recompus. Eu ainda estava muito brava com Caio, com a forma como fui tratada por ele. O meu amigo – ou ex-melhor-amigo, ainda não decidi – sorriu para mim. Era um sorriso tímido e carregado de sentimentos. Mas eu não sorri de volta, é claro. Precisava manter a minha pose de durona. Ele teria que lutar muito se quisesse a minha amizade de volta. Mas, secretamente, bem lá no fundo, eu já tinha o perdoado, e estava morrendo de vontade de voltar ser amiga dele, como estávamos nos tornando.
Percebendo que eu não iria me render assim tão facilmente, ele ergueu um papel que, até então, estava escondido por trás de suas costas. Tinha algo escrito e eu, como a boa curiosa que sou, li na mesma hora.
Eu sei que você disse não querer mais que eu lhe dirigisse a palavra.
Li o que estava escrito no primeiro papel que, imediatamente, foi substituído por outro que ele colocou na frente.
Mas você não disse nada sobre escrever, então...
Eu já estava quase me derretendo com seu gesto. Aquilo provava que ele realmente se importava e queria voltar a falar comigo. Eu disse quase, porque a tacada final veio logo em seguida.
Me perdoa por ter dito aquelas coisas. Você é a única pessoa do mundo que não merece ser tratada de forma tão grosseira.
Eu me arrependo, de verdade, por ter agido feito um babaca com você. Me perdoa, por favor.
E, quer voltar a ser minha melhor amiga? (:
Com o sorriso prestes a brotar em meu rosto, eu me aproximei dele, a passos lentos. Desde que assisti o clipe da Taylor Swift, eu sonhava com alguém escrevendo para mim, exatamente daquele jeitinho que ele tinha feito. Mas nos meus pensamentos, eu também teria um papel em mãos para escrever a minha resposta. Só que isso que ele acabou de fazer, foi melhor do que em meus sonhos imaginativos.
Eu poderia dizer futuramente que já vivi uma cena de filme colegial. Não era um cena romântica, é claro, já que Caio e eu somos amigos e nada mais. Mas um clichê de filme adolescente, bem, aquilo era sim. E eu adoro clichês.
“Desculpa, Elena”, ele pediu. “Eu...”
Não esperei que ele completasse a fala. Pulei em seu pescoço - mesmo sabendo que eu morreria de vergonha por causa da minha atitude tão impensada -, abraçando-o tão apertado, que eu pude sentir as batidas frenéticas do seu coração. Provavelmente, era a alegria de ter sua amiga de volta. Não sei exatamente, porque as poucas vezes que o meu coração batia tão forte, era quando o Edu se aproximava de mim.
Se fosse em qualquer outro momento, eu teria ficado brava comigo mesma por ter me atirado daquela forma. Mas eu estava feliz porque, assim como ele parecia sentir minha falta, eu também sentia a falta dele, e muita.
“É claro que eu te desculpo", eu disse, após me distanciar dele. Seu rosto estava corado, como eu nunca imaginei que veria, alguma vez. Eu nunca conheci um garoto que corava tanto. Na verdade, acho que eu nunca tinha visto um garoto com o rosto ruborizado, e aquilo era bem fofo. “Só não faz mais isso comigo, tá? Eu não quero mais passar tanto tempo sem falar com você.”
E era a mais pura verdade, apesar de não ter sido tanto tempo assim. Caio me fazia bem, de um jeito que ninguém mais conseguia fazer. É claro que eu amava conversar com Guilhermina, ou passar um tempo com Teodoro, mas Caio me fazia bem de um jeito diferente. Era bom tê-lo como amigo. Era bom saber que alguém está sempre disposto a te fazer sorrir, quando o mundo da própria pessoa não anda nada bem.
“Eu prometo que não vou mais fazer", ele respondeu. “Você é muito importante para mim, Elena, bem mais do que imagina. Eu não vou mais te magoar.”
Sorri satisfeita. Eu era importante para alguém. Pelo menos para uma pessoa nessa vida. Aquilo aquecia o meu coração e eu só quis abraçá-lo ainda mais, dizer que ele também era importante para mim. Mais até do que Edu, talvez. Era estranho pensar isso, mas sim, era a verdade.
Eu sempre fui bem carente de afeto, seja ele qual fosse, materno, fraterno, ou de amizade. Talvez eu esteja sendo uma boba, mas saber que eu sou querida por, pelo menos três pessoas – Teodoro, Guilhermina e agora Caio – me deixa tão feliz, de um jeito que eu não consigo nem explicar.
Quando foquei em seu rosto, novamente, vi um lindo sorriso se formando em seus lábios, e, na mesma hora, senti meu coração bater mais forte, como... Não sei. Como eu só sentia com uma pessoa.
Bobagem, aquilo era pura besteira. Caio é meu melhor amigo e tudo o que eu sentia era felicidade por tê-lo de volta em minha vida.
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