Estamos em pleno verão europeu, por isso o sol só está se ponto quase nove horas da noite. Quando chegamos no final da tarde na casa de Leon, já conseguimos ver uma fila de carros, que são entregues a manobristas, enquanto que os convidados se dirigem para o interior da casa.

O chefe não quis arriscar uma discussão com Leon, por isso mandou nós três para a missão. Eu não estava nem um pouco confortável com Guilherme debaixo do mesmo teto que Leon, muita coisa poderia dar errada, principalmente com o que eu teria que fazer.

Donato tinha conseguido que uma das moças que o ajuda com Speranza, ficasse até mais tarde para poder vir a missão. Meu irmão dirigia o carro, ele estava calado, mas percebi que estava apertando o volante com uma força além do necessário, pois as juntas de seus dedos já estavam esbranquiçadas.

Nenhum de nós três estava feliz por estar ali, Guilherme por odiar o meu pai pelo que lhe fez no passado, eu e meu irmão por termos péssimas lembranças da última festividade como essa que fomos, pois foi nesse dia que ganhei as minhas cicatrizes.

Fico me perguntando o que Guilherme pensaria ou faria, se soubesse como tudo de fato aconteceu, pois disse para ele que as ganhei quando mais nova, mas nunca contei como e nem o porque.

Assim que saltamos do carro nos olhamos e então entramos na casa. Tudo estava arrumado como se fosse um grande chá da tarde, as pessoas usavam roupas leves, mulheres com vestidos soltos e os homens de bermuda e camisa polo.

O festival de verão como Leon gostava de chamar, era um encontro de vários mafiosos, alguns parceiros dele outros futuros sócios, onde cada chefe escolhia seu melhor atirador para competir numa disputa de tiro ao alvo, onde o ganhador levava uma alta quantia em dinheiro e as vezes alguns faziam apostas mais escusas.

Leon sempre quis que Lucio participasse, mas nunca o conseguiu convece-lo. Quando eu ainda estava na família participei de alguns jogos, cheguei a ganhar todos que entrei, com exceção do último.

Caminhávamos pelo jardim tranquilamente, os convidados conversavam, algumas crianças corriam pelo gramado enquanto os últimos preparativos para o torneio ficavam pronto.

Se alguém desavisado entrasse naquela festa, pensaria que era alguma festividade normal de pessoas da alta classe social, contudo, entre nós estavam os maiores chefes de carteis e mafiosos do mundo.

Nos sentamos numa mesa em posição estratégica, para conseguir observar tudo que se passava no jardim. Não demorou muito e Leon veio em nossa direção, ele era o anfitrião perfeito, todo sorridente e falando com todos em sua casa.

- Que bom que vocês finalmente chegaram! – Ele olhou para nós três – Vejo que o chefe de vocês resolveu atender ao meu pedido e mandar o menino dos papéis com vocês, pois bem, preste atenção como as coisas funcionam aqui garoto, pois se algo acontecer aos meus filhos você será o responsável.

- Boa tarde para você também Leon – Guilherme se levantou para encarar meu pai de igual para igual – Pode ficar tranquilo que o garoto aqui, sabe muito mais sobre como você age do que você imagina, além do mais, acredito que você vá se reunir com seu novo sócio no seu escritório da adega estou certo?

Vejo meu pai se surpreender.

- Como você sabe da existência desse cômodo? – Ele olha acusadoramente para mim e para meu irmão, que bebe seu champanhe tranquilamente.

Guilherme sorri para Leon, pega uma taça da bandeja de um dos garçons que estava passando e a bebe.

- Como disse, o garoto aqui sabe muito mais do que você imagina.

Meu pai não responde mais, vejo que suas engrenagens estão funcionando para entender o homem a sua frente, que mal tinha trocado duas palavras com ele mais cedo naquele dia e agora fala que sabe sobre os cômodos secretos da casa, como se tivesse os frequentados a vida toda.

Eu nunca contei para ele sobre esse escritório, na verdade, eu mal contei sobre o meu tempo que fiquei aqui. Ninguém fora da família sabe sobre esse lugar, mas tenho certeza que meu pai acha que falamos algo e de certa forma, ele não está errado, provavelmente meu irmão contou para meu noivo, contudo, deve estar pensando sobre o que mais falamos.

Me lembro que guardar segredos sobre esconderijos da casa era uma coisa sagrada, que quem dava com a língua nos dentes sobre tais lugares era severamente punido. Já presenciei algumas dessas punições, o que sempre me fez ficar quieta, acho que Leon fazia propositalmente para nos assustar e nos deixar calados. Além disso muitas vezes eu fui responsável por cuidar dos homens após eles receberem suas punições.

Poucos eram considerados de confiança para conhecerem os segredos de Leon e seus locais de negociação, então se você fosse eleito era melhor não pisar na bola caso quisesse continuar com todas as partes do seu corpo ou até mesmo vivo.

Um senhor acompanhado de sua esposa e sua filha se aproximam de Leon o tirando do seu transe. O casal frequentou muito a casa de Leon quando eu era mais nova, eles eram simpáticos comigo, ao contrário de sua filha, essa eu tinha vontade de fazê-la de algo para minha querida Glock.

- Vladimir! - Leon abraça e beija o homem - Fico feliz que vocês conseguiram vir! Lembra dos meus filhos.

Dou um sorriso para o casal, vejo que Don também os cumprimenta meio sem jeito.

- Nicolly! - Leon abraça a filha deles - Vi seu último vídeo, você estava maravilhosa!

- Obrigada Leon, meus seguidores me motivam a sempre continuar a produzir esse tipo de conteúdo, falando nisso, você se incomodaria se eu registrasse a competição?

- De forma algum, você só sabe que certas pessoas não gostariam de aparecer...

- Fique tranquilo, prefiro que a câmera fique só em mim.

Ela se vira para mim e Donato, ao ver meu irmão, lhe abraça e beija seu rosto, ela está com um vestido que seus peitos não pulam de seu decote por muito pouco,  e ela faz questão de esfregar eles no rosto do meu irmão, que não levantou para falar com ela.

Desde que nos conhecemos, Nicolly dava em cima de Donato, meu irmão nunca deu muita atenção para ela, principalmente depois que soube que ela me maltratava, várias vezes ela levava crédito por coisas que eu fazia, ou falava minhas ideias como se fossem dela, ela chegou a me bater algumas vezes quando éramos mais nova, mas também apanhou bastante.

Nicolly apesar de fútil, não é burra, ela sabia que meu irmão assumiria os negócios do meu pai, pelo menos naquela época e estava investindo no pote de ouro dela. Sempre competíamos por tudo, fosse na escola, nas aulas de tiro ou até mesmo por garotos.

- Nina! - Ela fala meu nome num tom mais agudo do que o necessário e faz questão de me abraçar, como se fôssemos melhores amigas.

- Nicolly - Tiro suas mãos delicadamente do meu corpo - Quanto tempo.

Nicolly após me abraçar nota a presença de Guilherme, que até então estava quieto e observando tudo a sua volta. Não gosto da forma que ela olha para ele, mais não gosto nem um pouco.

A mulher apesar de ser uma pedra no meu sapato, era bem bonita. Nicolly tinha 1,65 de altura, seu corpo era violão, olhos cor de esmeralda e cabelos negros que contrastavam com sua pele absurdamente branca.

Vejo ela olhar Guilherme de cima a baixo, ela levanta uma de suas sobrancelhas e abre um sorriso sedutor, sinto meu sangue de ferver pra arrancar aquele sorriso de seu rosto, mas não podia, até porque Leon ainda não sabia de nosso envolvimento.

- Esse é Guilherme, um amigo de meu filho.

Leon apresenta meu noivo ao casal e sua filha, que faz questão de dar dois beijos no rosto de Gui, se demorando mais do que o necessário. Leon percebe o interesse de Nicolly e faz a coisa que eu mais odiei.

- Guilherme, Nicolly é praticamente de casa, tenho certeza que ela poderá lhe mostrar o lugar e como o festival funciona, não é mesmo minha querida?

- Claro, sou praticamente a segunda filha de Leon. - ela envolve o braço de Guilherme.

- Então está resolvido, você será a acompanhante do amigo de meu filho, já que os dois estão bem ocupados hoje.

Guilherme não tem tempo de negar o pedido, ele me olha um pouco desesperado com a situação, esse não era o seu plano, mas Leon soube direitinho o deixar ocupado e evitar que meu noivo ficasse bisbilhotando por aí. Vejo Nicolly o arrastar para longe, pendurada em seu braço, vejo que Guilherme está desconfortável,  mas como bom agente sabe manter o disfarce.

"Essa noite prometia ser bem longa!"

- Bom, acho que talvez tenhamos um casal no final da noite. - Leon fala rindo e fazendo com que o casal o acompanhe nas risadas e eu trincar o maxilar.

O casal se despede de nós três, Leon se vira para mim e Don, e vejo que estava na hora de colocar o seu plano em ação.

- Donato, Lúcio está precisando de ajuda na competição, você o encontrará no depósito.

Leon nunca pedia por favor, ou falava algo como um pedido, era sempre uma ordem que deveria ser obedecida o mais rápido possível.

- E quanto a você Nina, seu acompanhante já chegou - Ele olha para meu vestido - Você deveria estar com uma roupa mais parecida com a que usou no leilão, venha, vou te levar até ele.