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Capítulo 78

Na manhã seguinte, as três amigas compararam os seus horários, com uma tranquilidade que qualquer uma delas apreciava. O sabor da normalidade era tão doce quanto era raro e, portanto, deveras apreciado.

- Ninguém escolheu Cuidados com as Criaturas Mágicas? - questionou Laurel, indignada.

- Amiga, só tu gostavas das aulas do Hagrid. - comentou Meredith, encolhendo os ombros - Dois fanáticos por bichos perigosos. Nós só lá estávamos porque gostamos do Hagrid.

- Sim, ele é extremamente simpático mas as aulas... - Ashley encolheu os ombros, num gesto idêntico ao da namorada - Nem tanto.

- Francamente! Olha, melhor para mim, pode ser que o Hagrid encontre um Nundu e traga para cá... - disse Laurel com os olhos brilhantes de entusiasmo.

Ashley franziu o sobrolho.

- Os Nundus não são extremamente letais e impossíveis de domesticar?

Laurel piscou, fitando a amiga com um ar sonhador.

- E então?

- Então que ela quer ser comida por um. - resmungou Meredith, com uma risada baixa - És demais, Laurel.

A Ravenclaw sorriu.

- Eu sei.

- Preciso ir para Herbologia. Vemo-nos depois? - perguntou Ashley, beijando Meredith suavemente.

- Claro. Depois contamos-te como foi Defesa Contra as Artes Negras. Quero ver como o Snape se vai sair. - disse Laurel.

- Lindamente, de certeza. O homem quer lecionar aquela disciplina há anos. - Meredith revirou os olhos, a falta de entusiasmo visível em toda a sua postura - Hora da tortura, aqui vou eu!

- Não sejas assim! - ralhou Ashley, a eterna defensora de Snape - Ele é um ótimo professor!

- E eu sou a sua maior fã! - ironizou a Lovelace, deixando um beijo na bochecha de Ashley - Vai para a tua aula, flor.

As duas Slytherin acenaram na direção da Hufflepuff, que saiu aos pulinhos pelo campo fora.

Snape aguardava-as com a expressão carrancuda de sempre e a sala ajustada à sua pessoa: escura e aborrecida. Laurel acenou aos Grinffindor, que frequentavam aquela aula com os Slytherin, recebendo um sorriso singelo de Harry, uma careta de Ron e um acenar entusiástico de Hermione.

Quando se sentou na mesa ao lado de Meredith, notou o olhar indesejado de Draco Malfoy posto em si, sentado na mesa mesmo à sua frente.

- Perdeste alguma coisa aqui? - questionou friamente.

- A nossa amizade, ao que parece. - respondeu o outro, com honestidade - Laurel...

- Estás a incomodar-me, importaste-te de me deixar em paz?

A mesma frase, a mesma frieza, o mesmo olhar de desdém. Draco rangeu os dentes, virando-se para a frente com irritação. Atrás de si, Laurel suspirou, fixando os olhos em Snape,de forma a prestar o máximo de atenção possível.

- A Magia Negra é vasta, variada, em constante mutação e eterna. Combatê-la é como lutar com um monstro de muitas cabeças que, sempre que um pescoço é cortado, faz brotar uma cabeça ainda mais feroz e inteligente que a anterior. Estão a lutar com algo que é flexível, mutável, indestrutível.

Laurel observou Snape, fascinada com cada uma das suas palavras. A sua forma de ensinar era idêntica à de Barty Crounch Jr., o falso Moody que lecionara aquela disciplina no ano anterior. Para ambos, a Magia Negra era uma arma poderosa, algo a respeitar mais do que a temer, uma força mutável e tentadora.

Como uma entidade própria.

Para Laurel, a Magia Negra era uma parte dela que não lhe pertencia, um pedaço fora do seu corpo, uma arma a usar. Ainda assim, reconhecer aquela parte de si fazia-lhe sentido, apesar de abominar por completo o facto de ter uma parte de Voldemort dentro de si.

Perdida em pensamentos, a jovem voltou a focar-se ao ouvir a voz de Hermione, que respondia a uma pergunta de Snape sobre feitiços não-verbais.

Como sempre, Snape fazia questão de antagonizar os Grinffindor fosse porque razão fosse.

- Uma resposta copiada quase palavra por palavra de O Livro Básico de Feitiços, Grau 6. - comentou o professor, sumariamente - mas correta no essencial.

- Pelo menos respondeu. - resmungou Laurel, que sequer levantara o braço para Snape não implicar com ela.

O professor lançou-lhe um olhar tão atravessado que a ruiva tapou a boca com a mão, evitando rir e esperando que Snape prosseguisse para suspirar de alívio.

Quando a aula terminou e todos os alunos saíram da sala, incluíndo Meredith a pedido da Ravenclaw, Laurel pôs-se imediatamente de pé, o livro de Defesa Contra as Artes Negras encostado ao peito e uma expressado séria no rosto, aproximando-se de Snape com uma dúvida na ponta da língua.

- Professor...

- Miss Ravenclaw, agradecia que não fizesse aquele tipo de comentários na minha aula. - Snape fez um trejeito com a boca, os olhos faiscando de irritação ao olhar para Laurel - A menina está cada vez mais parecida com o seu tio no que toca à insolência, algo que não tolero nas minhas aulas.

- Aceito isso como um elogio. - ripostou a ruiva, com toda a calma do mundo - O meu tio foi um herói e morreu com honra, algo que não acontece a todos.

- O que quer de mim, Miss Ravenclaw? - questionou o professor, visivelmente irritado.

- O senhor sabe mais do que ninguém sobre Magia Negra. Depreendo que esteja a par da minha situação?

- Vagamente. - respondeu Snape, endireitando-se - Refere-se à sua situação com o Lord?

Laurel assentiu, fitando o chão de forma pensativa.

- A Magia Negra, a parte que Voldemort adquiriu durante anos, está viva dentro de mim. Eu sinto-a como uma extensão do meu corpo, estou a aprender a controlá-la como se de um pedaço do meu corpo se tratasse mas... A verdade é que não me pertence. É magia roubada, a qual só pode ser devolvida de livre vontade, correto?

- Exatamente. Vejo que a menina andou a estudar o trabalho da sua mãe?

Laurel pestanejou, surpreendida. Snape cruzou os braços em frente ao peito, observando a jovem à sua frente com mais calma.

Ela recordava-o de Cora, alguém que simplesmente fora impossível de detestar.

- Cora Ravenclaw foi a pioneira da investigação sobre o processo de transferir magia de um corpo para o outro, Laurel. Era uma mulher brilhante e claramente não descansou enquanto não teve as respostas às suas perguntas. Tudo o que já leu sobre magia roubada foi a tua mãe que escreveu ou investigou.

- Há um livro na biblioteca, na secção proibida...

- Escrito por Cora Ravenclaw, publicado como Christian Raven, o pseudônimo da sua mãe. - fez uma pausa, deixando a jovem pensar por breves instantes - As mulheres não tinham a voz que têm hoje, Miss Ravenclaw.

- Não fazia ideia... Quer dizer, eu li o diário e sabia que era do seu interesse mas... - Laurel mordeu o lábio inferior, tentando organizar os pensamentos - Bem, o senhor conhece a investigação da minha mãe, certo? Eu só gostaria de saber o seguinte: quando a magia é roubada, pode quem for roubado utilizá-la à mesma? Quer dizer...

- Um bruxo poderoso pode aprender a canalizar e utilizar a sua magia, mesmo que esta esteja presente no corpo de outra pessoa. - respondeu Severus, entendendo as verdadeiras intenções da Ravenclaw - O Senhor das Trevas pode vir a descobrir como usar a ligação entre ambos para seu proveito. Mesmo que não lha entregue, Laurel, ele poderá vir a conseguir canalizar uma parte do poder que lhe roubaste, mesmo que seja uma ínfima parte. A Magia Negra, ainda por cima, é mutável e traiçoeira, nunca nos podemos esquecer disso.

Professor e aluna fitaram-se, com respeito. Por fim, Snape rematou o assunto, deixando Laurel ainda mais perturbada do que já estava:

- O Senhor das Trevas irá conseguir usá-la para seu proveito, Miss Ravenclaw. Não só a Magia que lhe corre nas veias, como a sua própria energia vital. Uma não sobrevive sem a outra e o Lord saberá eventualmente a poderosa ligação que existe entre vós...

- Ele poderá enfraquecer-me, usar a minha vida...

- Para fortalecer-se a si próprio.

**

- Isso é que foi uma conversa longa. - comentou Meredith, quando Laurel se aproximou dela.

Aquela era a aula de Poções e a Ravenclaw não estava particularmente animada. Slughborn tratara-a como uma celebridade, algo que a ruiva detestava. Ainda assim, era uma aula e Laurel, apesar de ligeiramente atrasada, procurou prestar atenção, evitando ao máximo cruzar o olhar com o de um certo Slytherin irritante.

- ...Alguém sabe me sabe dizer o que é isto?

A mão de Hermione ergueu-se imediatamente.

- É Veritasserium, uma poção incolor e inodora que obriga quem a bebe a dizer a verdade.

- A minha favorita. - ironizou Laurel, relembrada da situação no Ministério, meses antes.

Meredith deu uma risadinha.

- ... É Poção Polissuco, professor. - respondeu Hermione, sendo novamente a mais rápida a levantar o braço.

- Não vais responder a nada? - perguntou a Lovelace, estranhando a quietude da Ravenclaw.

- Não, deixa a Hermione brilhar.

- É Amortencia!

A expressão de espanto de Slughborn fez Laurel sorrir, orgulhosa da Granger. Ela era a prova viva de que não é necessário ser-se puro sangue ou mestiço para triunfar no mundo bruxo, bastava ter neurónios, interesse e a magia a correr-lhe nas veias.

Laurel inspirou fundo, curiosa. Amorcentia era das poções mais perigosas e traiçoeiras de fazer, sendo também a mais interessante para a Ravenclaw, que gostava de um bom desafio.

- Que cheiro sentes? - perguntou Meredith, debruçando-se na direção da amiga depois de Hermione ter mencionado que a Poção do Amor tinha um cheiro diferente para cada pessoa.

- Que tens tu a ver com isso? A curiosidade matou o gato, Mer. - comentou a ruiva, provocando-a.

Meredith revirou os olhos. Um sorriso bobo desenhou-se-lhe nos lábios lentamente, os olhos negros muito brilhantes ao fitar o caldeirão onde a Poção do Amor se encontrava.

- Malmequeres. - disse a Lovelace, encantada - Por Merlim, eu amo aquela miúda.

As bochechas de Meredith coraram intensamente, tornando-se quase da mesma cor que o seu batom vermelho. Laurel observou a amiga assimilar as suas próprias palavras, feliz e encantada pelo que acabara de ouvir.

- Eu disse o que eu penso que disse? - questionou a morena, embora soubesse a resposta.

- Disseste pois mas acho que devias dizer a...

- Ashley. Por Merlim, eu preciso dizer à Ley! Mas, o Slughborn...

- Vai, eu invento uma desculpa. - Meredith olhou para a ruiva, incerta - Do que estás à espera? Vai!

- Obrigada, Lau!

E correu porta fora, deixando Laurel a rir baixinho.

Quando os olhos cinza de Draco pousaram em si novamente, Laurel corou intensamente, sem que quisesse.

Nunca diria a ninguém que, para ela, a Poção do Amor cheirava a ele.

Livros abertos numa tarde de Inverno.

O cheiro das tardes que passara com ele a estudar.

E o seu perfume.

**

- LEY!

Ashley virou-se na direção da voz da namorada, o sobrolho franzido em confusão. A Hufflepuff estava num dos seus períodos livres e aproveitava para conversar com Hannah Abbott, uma das poucas colegas da sua Casa com quem falava.

- Mer?

Meredith parou em frente a Ashley, ofegante. Quando se endireitou e recuperou o fôlego, sorriu, radiosa. Mesmo depois de uma corrida, Meredith Lovelace conseguia ser linda como se nada tivesse acontecido.

- Estou apaixonada por ti. - disse, de chofre.

Ashley engasgou-se. Hannah Abbott soltou uma risadinha, saindo dali sem sequer se despedir. Mesmo que o fizesse, ninguém a escutaria.

- Estou apaixonada por ti. - repetiu Meredith, preenchendo o silêncio de espanto que se instalara entre elas - Na verdade...

- Eu também estou apaixonada por ti. - interrompeu a Hufflepuff, sorridente - Amo-te, Meredith Lovelace.

- Era eu que ia dizer isso primeiro! - exclamou Meredith, indignada - Ia dizer que te amava, Ashley Hufflepuff.

As duas sorriram, as faces coradas, os olhos brilhantes.

O estômago cheio de borboletas esvoaçantes, como deve acontecer quando nos apaixonamos.

Antes que Meredith pudesse abrir a boca, Ashley puxou-a para si, beijando-a apaixonadamente, inspirando o cheiro dela.

Como se fosse a última vez, pensou a Hufflepuff, envolvendo-a num abraço apertado.

**

Nundu é aquela criatura maravilhosa que está na media, apareceu no filme Animais Fantásticos e Onde Encontrá-los.

Espero que gostem do capítulo! <3

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