Capítulo 53
A noite fria assobiava suavemente à janela de Meredith, cuja pele arrepiada estremecia toda a vez que a brisa gélida lhe tocava.
Ela não sentia o frio.
Pergaminhos antigos estavam espalhados pela sua mesa de jantar, os traços certos e a caligrafia feminina recordando-a a quem pertenciam: Amanda Lovelace. Do seu lado esquerdo, outro pergaminho estendia-se em cima da mesa, este com a letra da própria Meredith.
O mapa de Azkaban e o feitiço para comandar os Dementors estava na sua posse e o seu plano estava praticamente pronto para avançar.
Só lhe faltava a coragem e a oportunidade.
Meredith Lovelace tinha uma missão: tornar-se a mais nova Devoradora da Morte que Voldemort já teve nas suas mãos e passar o máximo de informações importantes à Ordem, sem ser descoberta e assassinada por traição.
Para isso, e como nunca fazia as coisas por menos, iria usar a maldição da sua vida a seu favor.
Devagar, pôs-se de pé, enfrentando o seu reflexo na janela, de braços cruzados. A menina que se importava com o que pensavam dela morrera e fora substituída por aquela sombra fria e calculista que a fitava com um olhar decidido no rosto.
Estava na altura de abraçar as Trevas com que nascera.
O seu reflexo sorriu-lhe. As madeixas rosa que pintara no cabelo davam-lhe o ar de mulher que procurava e o batom vermelho nunca mais a abandonara. Estava linda e o seu sangue Veela ainda a tornava mais bela e letal.
Estava pronta.
Os prisioneiros de Azkaban estavam prestes a dever-lhe a vida.
**
Laurel encarou as ruínas à sua frente, o coração a bater mais depressa. A Mansão Ravenclaw erguia-se à sua frente, como se tivesse à sua espera durante anos. Mesmo abandonada e desfeita, a casa era imponente e transmitia a aura de quem é importante e sabe disso.
A ruiva não se sentia em casa ali, tal como a sua mãe não se sentira nunca.
O medalhão brilhava de um azul intenso, cheio de expectativas. À medida que adentrava os aposentos, Laurel sentia o frio do abandono entrar-lhe nos ossos, as tábuas de madeira a tremerem sobre os seus pés.
O quarto da mãe tinha o seu nome escrito na porta.
"Cora Ravenclaw"
Era ali que devia começar a procurar a razão porque a mãe a forçara a ter a magia do Lorde das Trevas a correr-lhe pelas veias mal nascera. Acreditava que tinha sido a sua maneira de derrotar Voldemort mas ainda assim era um fardo demasiado pesado para alguém que tinha acabado de nascer. Cora era inteligente; com certeza sabia que a magia seria incontrolável e perigosa. Teria a esperança que Laurel estivesse preparada para aguentar tal força? Ou teria a certeza absoluta?
Laurel reviveria todos os passos da mãe até descobrir como se livrar daquela maldição.
Começaria pela Mansão Ravenclaw, a qual poucas almas no mundo sabiam da sua existência.
**
Ashley Diggory acordou sobressaltada a meio da noite, como sempre acontecia.
Os pesadelos assombravam-na, todos relacionados com o momento em que percebera que Cedric Diggory tinha partido.
Pôs-se de pé, dirigindo-se à sala de estar com a certeza absoluta de que não iria conseguir voltar a dormir. Ao chegar lá, encontrou Meredith, como todas as noites acontecia. A Lovelace nunca a deixava sofrer de insónias sem companhia, algo que reconfortava o coração da Diggory e lhe dava a volta ao estômago, como se tivesse engolido borboletas e não se tivesse apercebido.
Meredith estendeu-lhe uma caneca de chá fumegante, os olhos negros fixos nela. Ashley sentiu-se envergonhada, o pijama demasiado curto para o seu gosto.
- Pesadelos? - questionou Meredith, mesmo sabendo a resposta.
Ashley assentiu, bebericando o chá.
- Amanhã é a primeira reunião da Ordem. - comentou a Diggory - E o início do meu treinamento. Sirius Black vai ajudar-me a tornar-me exímia em duelo para poder ir em missão.
- Não és muito nova para ir em missão?
- Não és muito nova para te tornares Devoradora da Morte? - questionou Ashley, erguendo as sobrancelhas.
- Está no meu sangue, querida. É o meu destino desde que nasci. - ironizou a Lovelace, fazendo a Diggory rir como só Meredith conseguia.
As duas permaneceram caladas, apreciando o momento e a companhia.
- Hogwarts vai ser muito interessante este ano. - ironizou Meredith, pensativa.
Ashley fitou-a, achando lindo a forma como o cabelo de Meredith lhe caía em ondas negras e rosa pelas suas costas.
- Sim. Muito interessante... - sussurrou, sentindo-se perdida.
**
A casa nº12 de Grimauld Place estava um alvoroço. Os adolescentes da família Weasley, Potter e Granger preparavam as malas para se dirigirem a King's Cross no dia a seguir, rumo a Hogwarts e nenhum estava particularmente entusiasmado tendo em conta a tensão que existia no Quartel General da Ordem da Fénix.
Quando a porta da frente se abriu, todos pararam o que estavam a fazer, surpreendidos.
Harry Potter foi o primeiro a mexer-se. O terror que sentira o Verão inteiro dissipou-se por breves instantes e o rapaz correu de encontro à jovem parada à entrada da casa que era por direito sua.
Remus Lupin foi a seguir.
O lobisomem tremia de raiva. Os olhos safira da filha encontraram os dele por cima dos ombros de Harry e a raiva evaporou-se.
Laurel Ravenclaw estava um farrapo.
- Eu pensei que te tinha perdido... - sussurrou Harry, abraçando-a com força - Nunca te quis deixar para trás...
- Não deixaste. Eu fiquei para te proteger, como sempre vou fazer. - afirmou Laurel, com convicção.
Harry soltou-a, abalado e a jovem jogou-se de imediato nos braços do pai, que suspirou contra os cabelos ruivos sedosos.
- Onde andaste? Estava tão preocupado...
Laurel abanou a cabeça. Estavam muitos olhos curiosos postos nela para conseguir falar. Sirius Black aproximou-se dos dois, afagando o topo da cabeça da sobrinha com carinho antes de pousar a mão no ombro de Remus.
- Venham. Sei de um sítio para falarmos.
Remus assentiu, semicerrando os olhos em direção a Sirius, que não o encarava diretamente.
- Tu sabias onde ela estava este tempo todo, não sabias?! - acusou-o, exasperado.
Sirius encolheu os ombros, culpado. Laurel sorriu, cansada e fez sinal a Harry para que este os seguisse, algo que ele fez prontamente.
No caminho, Laurel encontrou os olhos inteligentes de Hermione. As duas entendiam-se como ninguém e a morena limitou-se a assentir, puxando Ron e Ginny de volta para o quarto, contrariados.
A árvore genealógica dos Black saudou-a, captando-lhe a atenção de imediato. Os olhos procuraram a figura do pai, encontrando-a ao lado do local queimado onde estaria a figura de Sirius.
Regulus Black encarou-a, tão jovem quando morrera. Tão cheio de esperança e coragem, algo que somente Laurel sabia.
- Estive na Mansão Ravenclaw. - contou ela, encarando o pai adotivo.
Remus prendeu a respiração. O medalhão de Laurel brilhava no azul mais puro que existia, como se a jovem tivesse finalmente aceitado o seu legado de uma vez por todas.
- Eu não sei o que o Harry vos contou sobre Voldemort e eu mas... A magia dele corre nas minhas veias. Antes de morrer, Cora preveu a queda de Voldemort. - explicou Laurel, recusando-se a chamá-la de mãe - Ela sabia que Voldemort não morreria tão facilmente e por isso ligou a minha vida à dele através do medalhão. O pacto de sangue neste colar é poderoso e o encantamento era bastante simples, encontrei-o na casa onde os meus pais viviam.
- Visitaste a casa... Deles? - perguntou Remus, com um sabor agridoce na boca ao pousar os olhos na figura do pai da menina.
- O que restou. Os Devoradores da Morte destruíram tudo quando lá foram, exceto o diário da minha mãe. - retirou um pequeno livro da sua mala, agarrando-o com certa repulsa - Cora fez questão de garantir que, caso Voldemort sobrevivesse, não teria a mesma força que tinha quando se ergueu. Ela pensou nisto quando ainda andava em Hogwarts, encontrei os pergaminhos no antigo quarto dela na Mansão Ravenclaw. Procurava encontrar uma maneira de usar a ligação entre os Herdeiros contra Voldemort mas só a descobriu quando ficou grávida.
- Por isso a tua magia descontrolada. - disse Lupin, tremendo.
- Nem é descontrolada, nem sequer é minha. - retorquiu a ruiva, com raiva - Foi a maneira dela de salvar o mundo bruxo e me condenar a mim à porcaria do medo que vivi a vida toda de fazer magia.
- Como é que a destróis? - perguntou Sirius, digerindo a informação.
- Não sei e a única pessoa que sabe é a que mais odeio no momento. - afirmou, fitando Harry - Dumbledore sabe disto. Soube a minha vida toda e nunca me disse. Deixou que eu acreditasse que era amaldiçoada e que a culpa é do meu nome.
- Ele deve ter tido as suas razões... - começou o seu pai, sendo interrompido de imediato por Harry.
- Ele sempre tem, não é? - desdenhou o Potter, posicionando-se ao lado de Laurel.
- O importante é que Voldemort também não sabe como tirar o poder de mim e voltar a possuir toda a Magia Negra que adquiriu ao longo da vida. Está limitado e fará de tudo para me ter ao seu lado como arma.
Os dois adultos trocaram olhares. Harry franziu o sobrolho. A arma. O segredo que ninguém lhe contava. Esconderiam de Laurel também?
A ruiva não parecia interessada no segredo que aquela troca de olhares escondia. A sua mente estava cansada, mal sabiam eles porquê. A sua nova capacidade de Aparatar sem ter idade suficiente esgotava-a e a frustração de ter descoberto tão pouco piorava tudo.
- Onde está Ashley? - questionou, fitando Sirius.
- Em casa de Meredith. Decidiram treinar juntas alguns feitiços e Ashley decidiu aceitar aulas particulares com Snape para melhorar a Poções.
- Ele aceitou? - perguntou a ruiva, surpreendia.
Remus assentiu.
- Aparentemente. - respondeu Sirius, com aversão - Ashley acredita que pode ajudar ter uma perita em Poções numa guerra. Não sei onde tirou essa ideia.
- Ela odeia Poções... - comentou Laurel, encolhendo os ombros - Se ela sentiu, por alguma razão será.
- Laurel... Está na hora de descansares. Voltas a Hogwarts connosco? - perguntou Harry, com certa esperança na voz.
- Sim. Preciso falar com o meu av... Dumbledore. - corrigiu, cerrando os punhos.
- Eu levo-te ao quarto. - ofereceu-se Harry de imediato, despedindo-se brevemente do padrinho e do antigo professor.
Laurel abraçou o pai demoradamente, em seguida o tio. Sirius beijou-lhe a testa, demoradamente.
- Continuas a ser tu. - afirmou, vendo brevemente a expressão do irmão mais novo refletido no rosto da sobrinha - Nada muda isso.
A Ravenclaw assentiu mas no fundo não acreditava nisso.
**
Harry aproximou-se da cama de Laurel, estendendo-lhe uma chávena de chá quente.
- A Sra. Weasley pediu-me que te trouxesse isto.
- Obrigada. Preciso conhecer a família Weasley, parecem ser espetaculares. Como te sentes?
Os dois embrenharam-se numa conversa extensa, com Harry a contar o ataque de Dementors que sofrera durante o Verão, o tribunal no Ministério e os constantes pesadelos com a morte de Cedric. À menção do melhor amigo, Laurel soluçou. Harry abraçou-a de lado, a cabeça dela pousando no ombro dele.
- Andei de um lado para o outro para não pensar nisso, Harry... - sussurrou, entre soluços - Sinto tanto a falta dele... Hogwarts não será a mesma sem ele.
Harry pensou em Cho Chang, corando ao perceber que os sentimentos de atracção pela Seeker dos Ravenclaw não tinham mudado. Ainda assim, esses pensamentos duravam muito pouco quando estava com Laurel. Tudo o que ele recordava era a forma corajosa como a jovem o forçara a ir embora do cemitério sem ela.
Tudo o que pensava era no beijo que tinham partilhado.
Laurel endireitou-se, fitando o rapaz ao seu lado com um sorriso cansado.
- Desculpa, molhei-te a camisola toda. Credo, detesto chorar. Fico com uma cara de troll horrível!
Laurel estava um farrapo e Harry nunca a tinha achado tão bonita.
- Acho que estás linda. - afirmou.
Os Herdeiros de Ravenclaw e Grinffindor fitaram-se. Laurel não gostava de Harry e sabia disso. Harry, por sua vez, não sabia o que sentia.
A Ravenclaw colou os lábios aos dele, num beijo desesperado que não se orgulhava mas necessitava.
E Harry correspondeu na mesma intensidade, esquecendo por momentos a Guerra, o Lorde das Trevas e a cicatriz que todas as noites lhe doía.
Tudo o que importava era o gosto de Laurel e o desespero que os dois partilhavam em esquecer o mundo em redor.
Ficaram ali a noite toda, deitados lado a lado, beijando-se sem pensar em mais nada.
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