"Os mortos não falam"
CAPÍTULO ONZE
"Os mortos não falam"
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- Sêmen? Está dizendo que tinha sêmen nela? - Vinícius indagava, indignado, para Louise, no quarto onde fazia o interrogatório. Ela assentiu com a cabeça e ele franziu o cenho, furioso. - Como assim?
- É exatamente isso que você está pensando! Também estou chocada - ela respondeu, erguendo as sobrancelhas.
Ele respirou fundo, tentando se controlar. A raiva que sentia pelo assassino de Alice se intensificou mais ainda, tornando difícil de suportar.
- Então, ele disse que temos a certeza de que, quem matou Alice, foi um homem? - Ele perguntou, revoltado.
- Não necessariamente. Mas temos a certeza de que um homem estava com ela em seus últimos momentos de vida. Ela estava em uma festa. Não sabe de nenhum cara que ela se interessou aqui? Eles poderiam ter ido lá, tido relações e, de alguma forma que iremos descobrir, ter sido assassinada. Ou o pior pode ter acontecido! Ela pode ter sido estuprada! Lembra das ações dela na festa?
- Bem, sabemos que ela foi violentada por Rodrigo e Christian na infância. Mas, aqui na festa, não acredito que ela iria querer fazer algo com alguém. Ela parecia estar sóbria e, pelo que vimos ainda pouco, bastante determinada a desmascarar o governador. Se algo aconteceu, foi sem o consentimento dela. Ela dançou com Fernando Minene, o asiático da turma, mas como ele não dançava bem, ela o desprezou. Então, houve a briga do Tomas com o Caio. Ela dançou com o Caio, mas ele estava tão alterado com a bebida, que também o dispensou. Em seguida, dançou comigo e com... - Fez uma pausa, para se lembrar, enquanto Louise anotava tudo - Beatriz Drummond!
- Nossa principal suspeita! Ela já devia estar sabendo que a garota que ela conversava pelo aplicativo, era a Alice nesse momento. Deve ter ficado com raiva, e desejou matá-la. Essa hipótese permeia a minha mente de uma forma...
- Ela estava bêbada para querer isso - Ele completou - Você deve entender... Se perguntasse a Beatriz sobre sua sexualidade, ela diria que era heterossexual até a morte. Ela já namorou Renan por uns dois ou três meses. Não deu certo porque ela não gostava dele, nem nunca gostou de garoto algum. Mas seu pai é um ultraconservador. Jamais toleraria isso.
- Entendi...
- Bem, acho que é isso. Fomos ver os fogos, mas Alice ficou em casa.
- Mais alguém ficou com ela na casa?
- Sim! Christian e Isabela nem saíram. Beatriz acompanhou a gente nos fogos por um tempo. Acho que, quando deu umas 00:30, ela foi de volta para casa, mas pouco tempo depois a vi novamente umas 01:30 da manhã, na outra festa.
- Hum, entendi. Sabe se mais alguém foi para a casa durante a outra festa?
- Provavelmente, mas não sou capaz de dizer quem. Nem quantos. Estava entretido demais lá - ele fez uma pausa, respirando fundo - Como me arrependo disso... Nunca bebi assim, sabe? Ainda mais ficando bêbado! Parecia ser tão pouco...
- Sei. Então sabe que não deve fazer isso novamente, mas ainda irei investigar isso. Aliás, preciso saber quem preparou as bebidas e quem soltou os fogos?
- Miguel Cordeiro fez os dois. O nosso estagiário de biologia - ela levantou as sobrancelhas, surpresa. Mas não falou nada, apenas anotou tudo em seu bloco de notas.
- Quando as pessoas ficam embriagadas, elas podem ficar mais violentas, sabe? Talvez, um simples "não" em uma dança ou uma zombaria pode ser, para uma pessoa, razão para estuprar e matar alguém.
- Você acha?
- Já vi gente tirando vida de outra pessoa por motivos ainda mais fúteis...
- Que bizarro.
- Veja, já são meio dia e meia. Que tal continuar me contando sobre a história enquanto a gente almoça em um restaurante aqui perto? - Perguntou ela, levantando-se e o convidando para sair. Ele concordou e a acompanhou. Quando chegaram na sala, notaram que Emily fazia comida enquanto Rodrigo estava sentado no sofá da sala, assistindo TV.
- Onde foram os outros? - Perguntou a detetive ao político.
- Saíram para comer. Aquele bando de aborrescentes... - respondeu, rude. Louise se manteve indiferente. - Olha ali! Conseguiram encharcar minha planta de drink! - Ele exclamou, apontando para o vegetal.
Vinícius conseguiu se controlar para não demonstrar sua antipatia por ele, mas em sua mente, seu desejo era esmagar o crânio de seu governador. Cerrou o punho e pressionou. Tentando imaginar que era o pescoço dele.
Sem demorar, saíram da casa e chamaram os outros policiais que terminavam o trabalho na cena do crime. Edson entrou em seu carro e levou os outros três consigo. Um deles era Daniel, um rapaz branco, jovem, de cabelos castanhos. O outro, era magro, alto e negro, chamava-se Ulisses. A última policial, no entanto, era uma morena de pele bronzeada, Paula. Louise entrou no seu com Vinícius no banco do carona.
Ela ligou o carro e se preparou para partir.
- Ei, Detetive! Espera! - Gritou uma voz feminina de dentro da casa. Louise atendeu ao pedido e se virou para ver o que se tratava.
Uma jovem de pele branca, cabelos castanhos e longos, amarrados em um rabo de cavalo, vestindo uma camisa amarela e um short jeans curto.
Camila Barbosa saiu correndo do casarão e foi até o carro.
- Vocês vão almoçar? - Perguntou ela.
- Sim, iremos. Você é a amiga de Vinícius e nos ajudou entregando aquele cartão, né? Quer nos acompanhar? A gente aproveita e te interroga - A detetive disse, esboçando um sorriso simpático.
- Obrigada! Sinceramente, se não oferecesse, eu mesma ia pedir - Ela falou, e em seguida, deu uma leve risada.
Imediatamente, Vinícius abriu a porta traseira para ela, que entrou no veículo.
- Onde vão comer? - Ela perguntou.
- Em um restaurante que vou sempre. Especializado em frutos do mar. Gostam? - Todos assentiram - Não fica muito longe daqui.
- Ficou mais alguém além dos Drummond na casa? - O garoto questionou, meio desconfortável com a presença de sua ex-namorada no carro.
- Não! Eles quiseram ir embora. Bem compreensível, até. Esse clima de morte e desconfiança é perturbador!
Louise dirigia na frente, enquanto Edson, com os outros, seguia-a. Dez minutos depois, já estavam no estabelecimento. Eles saíram e pediram seus pratos.
- Diga-me, Camila, há algo de especial que pretende contar sobre o caso? - Indagou-a, Louise.
- Bem, na verdade, acho que sim - ela respondeu. Suspirou. Estava nitidamente nervosa - Acho que tinha algo muito errado com a própria Alice!
Louise e Vinícius se entreolharam, como se estivessem pensando a mesma coisa.
- Por que acha isso, Camila? - Vinícius perguntou, curioso.
- Lembra quando a conheci pela primeira vez? Lembra que eu disse que ela não me parecia estranha? De fato, não era! Veja isso. - Ela falou e sacou, de seu bolso, uma foto.
A imagem era de uma Alice mais jovem, com cabelos naturalmente loiros, alta, magra e com olhos verdes, assim como nasceu. Tinha cerca de dezesseis anos. Na legenda, estava o texto "Jovem do Colégio Fernando Dias consegue 3º lugar na Olimpíada Brasileira de Matemática".
- A Alice que conhecemos é essa aqui. Essa é uma reportagem do colégio dela no Ensino Médio. Não sei o porquê, mas eu encontrei isso e me lembrei dela. Pesquisei um pouco e vi: ela cortou o cabelo, pintou e botou lente de contato castanha. Tudo artificialmente! Muito estranho, não? Quem coloca lente de contato castanha tendo olhos verdes? Acho muito estranho ela ser sua irmã, Víni. Pensei, até, em uma...
- Usurpadora? Boa sua dedução, Camila... - Louise a aplaudiu, admirada - Mas como você descobriu isso?
- Ela não resiste a uma pesquisa um pouco mais aprofundada na internet, detetive. Não a uma realizada por alguém que tem um bom conhecimento de cibernética e redes como eu. Creio que, se procurar um pouco mais, dá para sabermos mais sobre a vítima!
- Sabe de mais alguma coisa?
- Pra falar a verdade, não - disse, comprimindo os lábios.
- Sendo assim... - Começou ela - Conte-me sobre a noite de ontem. O que viu Alice fazendo e o que você fez?
- Certo. Nesse ponto, acho que não poderei ser tão útil. Mas não me lembro de ter visto Alice bebendo coisa alguma. Ela chegou a dançar com uns garotos e Beatriz... - disse ela, tentando se lembrar. Nesse momento, o prato dos sete chegou. Mas ela continuou a falar - Quanto aos meus passos, bebi uma quantidade considerável de drinks e refrigerante. Mas foi o suficiente para não responder mais por mim. Fui ver os fogos, fui para a outra festa, fiquei com algumas pessoas, e depois voltei para casa, como todo mundo.
Louise e Vinícius ouviam sem interromper, prestando atenção em cada detalhe.
- Notou algo estranho nela? Ou em alguém?
- Sim. Cheguei a ficar com Renan Nascimento. Ele nem me deu atenção. Ficava olhando furioso para Alice e Beatriz, enquanto dançavam. Sabe como é, ele ainda é louco pela Bia! E é bem ciumento. Mas nunca se preocupou muito com isso porque, vocês entendem, ela nunca deu bola para menino nenhum. Só para as meninas.
Eles assentiram.
- Bem, vamos ver então. Realmente, ela é uma usurpadora! Achamos que ela quer mesmo é planejar algo para derrubar Rodrigo e sua família. Sendo assim, acho que podemos atualizar a lista de pessoas que poderiam querer matar Alice - falou Vinícius, refletindo sobre isso - Rodrigo, Emily, Christian e Beatriz. Caso eles tiverem descoberto algo sobre seus planos. Renan por ciúmes. Fernando, Tomas e Caio por raiva... Acho que só, né?
- Faz todo o sentido ela fingir ser outra pessoa para querer desmascarar Rodrigo! Ele fez mal a tanta gente... Mas será que é só isso de gente? Isabela, Calista e Sabrina são parentes de aliados dele. Se o plano de Alice contra ele fosse descoberto, todos iriam pro ralo junto! Alice devia ser uma testemunha perigosa dos crimes da família Drummond! Mas como todos sabem... Os mortos não falam - Considerou Camila, após ficar um tempo em silêncio, pensando.
- Devemos considerar todas as possibilidades em casos como esse - advertiu Louise - Tudo indica que ela foi morta no quarto de Beatriz. Todos estavam bêbados. Poderia acontecer, também, de alguém querer matar a filha do governador, mas ter se enganado e matado Alice.
- Alguém faria isso? - Questionava-se Vinícius.
- Sim. Já vi casos como esse também, Víni. O cara estava bêbado e foi à casa do melhor amigo mata-lo depois que descobriu que o mesmo estava tendo um caso com sua mulher. No entanto, confundiu e matou o pai dele. Uma história trágica. Mas enfim, devemos lembrar que precisamos suspeitar mais dos homens! Inclusive, não me esqueci quando você disse do cara que veio importunar a Alice outro dia.
- Por que suspeitar dos homens? - Perguntava Camila.
- Foi encontrado sêmen na genitália de Alice, e isso, de forma alguma, deve ser esquecido - respondeu a detetive - Apesar de que uma mente feminina meticulosa poderia até mesmo coletar o material com um parceiro seu e colocado lá. Eu acho isso pouco provável, mas devemos considerar tudo por enquanto!
- É. Realmente precisamos considerar todas as possibilidades. Ainda está no início da investigação, vamos ter certeza das coisas mais para frente! - Falou o rapaz.
- E vocês podem fazer um exame de DNA para descobrir de onde veio esse esperma? - Perguntou a jovem.
- Infelizmente, não. Nossa máquina está com defeito. Mas não se preocupem. As peças do quebra-cabeça vão aparecendo pouco a pouco. Caberá a mim juntá-las de forma coesa, e descobriremos o que aconteceu com Alice!
Eles ficaram em silêncio por um momento, para comer.
- Vocês acham que ela teve um cúmplice? - Camila perguntou.
- Não podemos descartar essa hipótese. Creio que descobriremos isso em breve - ela respondeu e se virou para um de seus agentes, que estava ao seu lado - E vocês? Pegaram tudo que pode ser utilizado como prova?
- Sim - foi Daniel que respondeu - Não analisamos tudo ainda. Mas está tudo guardado. O lixo, a bolsa da vítima e o celular dela. Notamos um fato interessante no quarto de Beatriz. Uma cadeira. Usada normalmente para mexer no computador, daquelas chiques, acolchoadas e de rodinhas. Parecia bem nova. Mas, estava sem uma das rodas. Encontramos ela no canto do quarto. Bastante ensanguentada.
- Então podemos concluir que, pelo menos, uma das pancadas foi da cadeira. Certo? - Vinícius indagou.
- Podemos sim - Edson, o biomédico especializado na autópsia, disse - Ela levou quatro pancadas. Isso é fato. Uma das primeiras foi com a cadeira, três provavelmente foram com o pé de cabra, e teve a queda, também.
- Perfeito! - Exclamou a detetive.
- Ainda me pergunto como alguém ia querer matar alguém com uma cadeira - comentou o rapaz.
- Alguém que se estressou e pegou o primeiro objeto na sua frente. De qualquer forma, não foi isso que a matou, e sim as batidas com o pé de cabra e a queda. Ela caiu bem de cabeça. A cadeira pode tê-la feito desmaiar apenas - A detetive explicou.
- Então, ela pode ter caído da janela já desacordada. Certo? - Camila perguntou.
- Sim, mas pode ser que não. Verei tudo isso na autópsia e entregarei para vocês.
- Muito bom, Edson! - Elogiou a mulher - Mesmo sem muitos recursos, precisaremos descobrir tudo.
- Louise, e agora? O que vai fazer? - O jovem, curioso, perguntou.
- Agora, voltaremos para a casa. Quero entrevistar a família Drummond primeiro. Depois, os alunos, o estagiário e a professora. E o cara que falou com ela no outro dia.
- Alguma coisa me diz que Miguel está envolvido com o caso! - Camila sugeriu. - Viram a reação dele quando soube da morte de Alice? A menos que ele goste muito dela, aquilo foi forçado demais!
Quando perceberam, todos já haviam acabado de almoçar. Levantaram-se e voltaram para o carro.
- Também tentarei buscar informações, Louise! - Avisou seu ex-aluno.
- Eu agradeceria - ela disse, e deu uma risada - Mas me mantenha informada sobre tudo.
"Eu também vou ajudar" Camila pensava, ciente de que ainda não confiavam plenamente nela para incluí-la na investigação "e já até sei por onde começar..."
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