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Epílogo

EPÍLOGO

†††

Seis meses depois...

Com passos trêmulos e rápidos, a garota fez uma breve caminhada do táxi que a conduziu até o portão de ferro. Parou em frente a entrada da casa de Vinícius Dantas. Respirou fundo diante a construção onde habitava seu maior desafio daquele dia.

Suas mãos suavam. Tudo o que havia planejado para os próximos instantes caiu em esquecimento devido ao seu nervosismo. Engoliu em seco.

— Vamos lá, Beatriz! — Ela dizia para si mesma. Passou a mão por seus cabelos loiros para tentar se acalmar.

Tomou coragem e tocou a campainha.

Ninguém atendeu.

— Está bem... Vou tentar mais uma vez! — Disse, e assim o fez. Quinze segundos se passaram e nada mudou — Viu? Não tem ninguém em casa. Volto depois! — Um alívio repentino percorreu seu corpo. Sentia-se insegura demais para tomar aquela atitude.

— Já estou indo! — A voz de Vinícius era facilmente reconhecível pela moça, que suspirou. Não sabia como reagiria ao encará-lo novamente — Quem é?

Entrou em pânico. Não queria dizer seu nome assim. Chegou a gaguejar alguma coisa, mas preferiu permanecer em silêncio. Sentiu a presença do rapaz chegando bem perto. Do outro lado do portão. Percebeu que ele a avistou pelo olho mágico.

Abriu a porta com o cenho franzido, lábios estreitos e pálpebras bem abertas.

— Beatriz? — Ele indagou, com uma voz grossa e apressada — O que fazendo aqui?

— Podemos conversar? — Ela perguntou, demonstrando mansidão. Ficou decepcionada com a reação tão negativa dele, mas não desistiria tão fácil assim de seu objetivo.

Ela o fitou dos pés à cabeça. Elevou as sobrancelhas. Surpresa com a sutil mudança em sua aparência, apesar de já tê-lo visto nas redes sociais.

— O que tem a dizer? — Ele questionou, com um tom acusador.

— Por favor, Vinícius — ela respirou fundo. Seu coração pulsou mais forte. Por alguns instantes, pensou em desistir daquilo e sair logo dali, mas não podia. Aquele encontro precisava existir. E para isso, devia deixar seu orgulho de lado e ser mais humilde — Você tem todo o direito de sentir raiva de mim. Mas eu necessito conversar com você.

Ele cerrou os olhos e a encarou por alguns segundos. Apesar de sentir uma profunda antipatia pela garota e por tudo que ela e sua família fizeram, queria ouvir o que a filha do ex-governador tinha a dizer.

— Está bem — Bufou, dando de ombros. Em sua mente, perguntava-se se fez a escolha certa.

— Posso entrar? — Ela pediu. O jovem suspirou. Pensou um pouco e assentiu. Abriu mais a porta e ela logo andou para dentro da casa.

Vinícius a acompanhou.

Educadamente, ela entrou na sala de estar. A televisão estava desligada e tudo parecia bem arrumado e limpo.

Ela analisou bem Vinícius, enquanto este encostava a porta. Não parecia mais o mesmo garoto que conhecera no ano anterior. Ele havia mudado. Com certeza, os acontecimentos daquela viagem o mexeram de forma devastadora.

Abandonou o cabelo longo e bagunçado e o deixou bem curto nas laterais, aumentando o comprimento gradativamente em cima. Não possuía pelo algum no rosto. Seu corpo já não era mais tão magro também. Mantinha uma postura mais séria e mais madura. Vestia uma blusa azul listrada e bermuda jeans.

— Você está diferente — Ela comentou, reparando na fisionomia e comportamento dele.

Ele deu uma risada irônica.

— Tive que mudar depois que entrei para o Exército — explicou, evitando tocar no assunto do assassinato de Alice que também foi responsável por sua mudança, sentando-se no sofá e fazendo um gesto para que ela fizesse o mesmo.

— Oh, é mesmo! Você fez dezenove anos esse ano! — Ela exclamou, exibindo um sorriso, enquanto se sentava — É soldado, né?

— Aluno do Núcleo Preparatório de Oficiais da Reserva — ele a corrigiu, ainda incomodado com a presença da garota que contribuiu, mesmo que indiretamente, para aquele bárbaro crime — Em outras palavras, um curso de formação para oficiais temporários. Eles dão essa oportunidade para quem cursa a faculdade em período noturno. Não é todo mundo que se forma e vira militar da ativa, mas acredito que poderá ser o meu caso — Ele contou, enquanto Beatriz ouvia atentamente, admirada com o novo emprego do ex-colega de classe. Afinal, ela jamais o imaginou nessa profissão.

— Fico feliz por você! — Comentou, sendo sincera — Espero que esteja contente também!

Vinícius ficou desconsertado. Lembrou-se do que acontecera há seis meses. Não conseguia deixar de esquecer os erros que Beatriz havia cometido. Que poderia ter evitado o fim trágico de Alice. Os culpados por aquele crime ficaram marcados em sua mente. Durante muito tempo, sofreu dificuldades para continuar sua vida. Aquele fato só o levou a alimentar ainda mais ódio e amargura por Beatriz e sua família.

Definitivamente, ela não era uma pessoa que merecia a consideração dele. E ele tinha motivos para achar isso.

— O que te traz aqui, Bia? — Ele falou, friamente, em um suspiro.

— Bem... — Ela pensou bastante, antes de falar. Respirou fundo, tomou coragem e encarou o rapaz nos olhos — Quero te pedir perdão.

Aquelas palavras caíram feito pedra no coração de Víni. Ergueu suas sobrancelhas e sua mandíbula deu uma leve caída.

Sempre imaginou Beatriz como uma garota egoísta e desprezível. Aquela atitude foi bem inesperada.

— Perdão? Confesso que estou surpreso em ouvir isso de você — admitiu. Porém, logo veio a sua mente os seus pensamentos que tinha sobre ela, e resolveu dizer. Inclinou seu corpo em direção a Bia, com os cotovelos apoiados nos joelhos, e as mãos juntas — Você já não pagou a sua pena? Quatro meses de detenção, multa e serviço comunitário obrigatório. Isso por alterar a cena do crime e se omitir ao saber que tinha um pai corrupto e estuprador. Parece que mesmo Louise se esforçando, há um sistema muito mais poderoso intercedendo para pessoas ricas como você. Coisa que apenas uma mulher não é capaz de quebrar para fazer justiça.

Beatriz engoliu em seco enquanto ouvia tudo aquilo. Tentava manter o controle das lágrimas que queriam sair, mas elas logo brotaram. Aquilo tocou demais no seu coração. Encolheu os ombros e apertou os lábios, tentando reprimir o seu desejo de chorar. Mas não conseguiu e logo seus olhos lacrimejaram.

O peso de sua consciência parecia crescer cada vez mais durante aquela conversa. Mas era fundamental que ela prosseguisse.

— Por favor, não me culpe por ter saído da prisão. A pena foi paga! — Ela respondeu, de cabeça baixa — Seja ela justa ou não.

— É claro que você não admitiria que é injusto — o rapaz apontou para ela, o canto esquerdo de seu lábio se elevou ligeiramente. Lançou-lhe um olhar de desprezo que jamais fez com ninguém — Seu irmão invadiu uma casa, participou dos estupros da Alice, escondeu muita coisa e ficou com quatro anos de prisão e serviço comunitário! Seu pai tentou me matar, matou minha irmã, escondeu um corpo e roubou milhões. Levou vinte e cinco anos de prisão. Provavelmente sairá antes por "bom comportamento". Miguel e Camila, no entanto, receberam vinte anos. Muito desigual essa situação, não acha?

Beatriz prestava atenção em cada palavra. Dessa vez, encarava Vinícius de cabeça erguida.

Era a sua vez de falar. Cruzou as pernas. Deixou mais uma lágrima cair.

— Reconheço, sim, que não foi justo. E eu sinto muito por isso. De verdade. — Ela entrelaçou os dedos e olhou fixamente para o rapaz — Lamento por tudo o que passou. Meu pai merece, sim, ser punido de forma mais severa!

— Claro que merece! — Ele disse, com as pálpebras bem abertas — Sabe quantas vezes eu fui ao psicólogo para tentar tirar esse trauma da minha mente? Quantas vezes perdi o sono?

— Olha... Devo dizer que a coisa que mais me arrependo nesse mundo foi ter sido tão omissa. Saber das crueldades que ele fazia e não dizer nada. Pelo contrário! Tanta coisa seria diferente se eu... — falhou ao prosseguir com a frase. Não conseguiu deixar escapar mais lágrimas. Perdeu o controle sobre o choro — Como eu era tola! Preocupava-me com coisas tão banais... Eu praticamente me idolatrava! Me distraía com amizades — fez um sinal de aspas com as mãos — tão falsas! Desprezava algumas pessoas como a Taís que... Nossa! Enquanto eu estava morta por dentro! Sinto-me tão mal em lembrar...

— Olha — ele começou, notando a sinceridade nas palavras dela. Suspirou. Por um instante, sentiu-se mal pelas acusações que fazia sobre ela. — Eu também cometi erros. A "Alice" cometeu erros.

— Não julgo mais os erros dos outros, Víni. Tenho erros demais para consertar — Ela respondeu, prontamente. Fez uma pausa e continuou — Nas minhas primeiras semanas de prisão, eu mal dormia. Ficava me martirizando. Culpando-me sempre por todos os meus pecados. Cheguei a querer me ferir. Sabia que tinha uma parcela de culpa em todas as mortes! Até que tive a oportunidade de conhecer a verdade.

— Que verdade? — Ele perguntou, inclinando a cabeça para a direita.

— A verdade é que eu devia me perdoar, primeiramente! — Seu semblante mudou de repente. Um belo sorriso voltou a se formar em seus lábios. Seus olhos azuis brilharam a cada palavra que pronunciava — Eu não preciso me culpar mais, Víni. Já fui perdoada! Tudo isso, agora, não passa de lembranças tristes de atitudes que ficaram para trás. Eu consegui perdoar a mim mesma. Tirei um peso enorme das minhas costas! Sinto-me incrivelmente melhor! Mais feliz! Mais livre — Vinícius quase não piscava. Sabia que ela estava falando com sinceridade. Ela dizia tudo emocionada — Talvez a sua completa felicidade não chegou porque você ainda guarda rancor meu e de tantas outras pessoas. Isso não é bom!

— Olha, Bia... — Ele refletia, nitidamente surpreso com tal declaração, mas ainda magoado com tudo o que foi feito pela família dela. O que ela pedia não era uma tarefa fácil — Eu sinto muito, mas...

— É difícil, eu sei! Pode ser um absurdo para você fazer isso, mas eu te garanto que se você abrir seu coração, irá ter paz. Perdoar é libertador. Em todas as situações. Vai se privar disso por puro orgulho? Quero que sinta o mesmo que eu sinto! Quero que enterre todas essas angústias como eu também fiz! E não, simplesmente, fingir que esqueceu, mas ainda sentir a ferida doer — Ela disse e logo encarou seu ex-colega de classe. Ele parecia relutar ainda para aceitar a ideia — Não precisa fazer isso sozinho também.

— Você se dispõe a me ajudar? — Ele perguntou, e uma lágrima caiu sobre seu rosto.

— Claro! Com certeza. — Ela fez que sim com a cabeça também.

— Você tem razão — Admitiu, e continuou refletindo sobre aquelas palavras — Nunca fui religioso, sabe. Mas acredito que existe um Deus que pode me ajudar a segurar esse fardo. Isso me faz tão mal...

Ela arregalou os olhos. Surpresa com a fala dele. Sentiu-se feliz, finalmente. Havia feito a sua parte.

— Eu também creio! E confio que Ele já nos perdoou e pode curar nossas feridas.

— Vinícius... — Ela disse, tentando conter a emoção. Ficou de pé, e ele imediatamente fez o mesmo — Por favor, perdoe-me por todo o mal que eu fiz você e a sua falecida irmã passar, mesmo que indiretamente. Eu estou muito arrependida.

Vinícius engoliu sua saliva. Respirou fundo e reconheceu o que devia fazer.

— Sim, eu te perdoo — Confessou e ficou um tempo em silêncio. Mas sentiu, em seu coração, que lhe faltava ainda mais uma coisa — Perdoo seu pai, madrasta e seu irmão também.

— Muito obrigada! — Ela agradeceu, exibindo um sorriso verdadeiro que também foi formado pelo garoto. Sentiu uma vontade absurda de demonstrar o afeto que começou a nutrir pelo rapaz. Meio envergonhada, estendeu as mãos e gaguejou — P-posso te... É...

Ele percebeu suas intenções e deu uma leve risada. Puxou-a pelo braço, levemente, entrelaçando seu corpo em um abraço bem apertado. Como Beatriz era mais baixa que ele, enquanto o abraçava, pode sentir o coração do rapaz batendo mais rápido do que o normal, assim como o dela também fazia.

Um belo laço de amizade se formou ali.

— Eu que agradeço! — Ele disse, desfazendo o gesto fraternal devagar.

Com as mãos, ela secou o rosto molhado dele.

— Qualquer coisa, pode contar comigo! — Anunciou, com sua voz doce.

— E eu digo o mesmo!

Ela caminhou de volta para o portão. Já estava pronta para ir embora.

— Até qualquer dia, Víni! — Disse, quando ele abriu a passagem. Vinícius sorriu.

— Até, Bia! — Ele completou, indo fechar a porta e se despedir — Fica com Deus!

— Você também! — Ela disse, quando se lembrou de contar algo — Ah, queria te dizer outra coisa! — Ela avisou, e ele voltou-se novamente para a nova amiga, curioso — Você é muito bom com esse negócio de desvendar crimes. Mas deve ser algo que não queira mais ver por bastante tempo!

— Quem me dera! Resolver crimes é algo cotidiano para alguém do 10º Batalhão de Polícia do Exército.

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