5. O coração Bravo se abala
No dia seguinte pela manhã os três saíram para Oriente Mágico, o principal parque da cidade. Era uma área com muitas árvores, brinquedos e grama sempre verde, como se a primavera ali fosse eterna. Havia mesas e assentos de madeira por todos os lados e muitos canteiros de diversas espécies de flores coloridas e aromáticas. O charme ímpar ficava por conta dos caminhos de pedras. No centro do parque, situava-se um lago muito grande onde as pessoas passeavam usando pedalinhos coloridos em formato de patos. Bebedouros com água fresca e limpa, banheiros sempre limpos e dois guardas sempre sentados no mesmo banco eram detalhes importantes que completavam a constância encantada do lugar. Muitas crianças corriam felizes e soltas, e pais felizes observavam os filhos.
O trio escolheu a sombra de um frondoso pé de jatobá, debaixo do qual estenderam um lençol. Haviam decidido naquela mesma manhã que fariam um piquenique. Depois de tal decisão foram até casa de Lilith pegar a cesta e o lençol e à casa de Alberto para abastecer a cesta com comida. Alberto aproveitou para pegar o violão.
Além de todos os talentos que tinha, Alberto cantava e tocava muito bem desde os doze anos de idade. Naquela epoca, conseguiu um trabalho durante as férias escolares e com o dinheiro que recebeu, comprou o violão. Era praticamente seu filho tamanho o cuidado que tinha com o objeto. No presente todos contavam vinte e cinco anos, mas o violão estava como novo. Cantaram vários clássicos de rock e música popular brasileira. Muitas crianças se aproximaram curiosas e acabaram na roda fazendo coro para as canções conhecidas. A energia daquele momento era magnífica. Quando terminaram, uma das crianças que tinha uma bola convidou as outras a jogar.
Cassius e Alberto foram brincar com elas. Algumas adoraram o cabelo do ruivo e quiseram fazer penteado nele, por isso o homem se sentou deixando que fizessem tranças e coques desajeitados enquanto ele ria e fazia careta. Alguns meninos encontraram penas coloridas para colocar no penteado. Alberto fingia que não tinha habilidade com a bola e deixou as crianças ganharem dele.
Lilith observava e fotografava tudo ainda sentada debaixo do pé de jatobá. Vestida com uma de suas camisetas de praxe, a estampa era da banda Shaman, bermuda de sarja e sapatilha. O complemento ficava pelos óculos modelo aviador. Estava distraída observando os rapazes e não viu a companhia a seu lado.
— Qual deles você namora? – Lilith se assustou e se levantou. Era apenas um rapaz sentado, com óculos parecidos com os dela própria, cabelo liso e comprido, barba por fazer e camiseta da banda Judas Priest.
— Nenhum. São meus irmãos. – Ela disse retornando a sua posição inicial. Ele tirou os óculos revelando a ascendência nipônica e então estendeu a mão em um cumprimento típico.
— Prazer, sou Jonathan, mas pode me chamar de John. – Ela apertou a mão dele do brasileiro de apelido estrangeiro.
— Sou Lilith, mas pode me chamar de Lilith mesmo. – Disse em um tom seco, mesmo assim ele riu.
— Então senhorita Lilith, que nome diferente, quem escolheu? – Era mais que evidente que ele queria conversar, mas ela não gostava de pessoas que invadiam seu espaço pessoal.
— Não faço ideia, sou órfã. – Respondeu sem dar mais abertura.
— Bom, e seus irmãos? Pensei que... – Ela cortou a frase dele.
— Pensou errado.
— Perdão Lilith, fiz algo que desagradou você, mas não quero aborrecê-la. – Dizia ao mesmo tempo em que se levantava e começava se retirar. Quando Lilith o viu sair, sentiu um impulso que a fez reagir sem pensar.
— Espera John! – Ela não sabia o motivo, mas não o deixou partir. Sentiu um pouco de medo de não ter outra oportunidade. Ele se virou perplexo sem saber o que fazer. Depois de expulsar ela o chamava. – Não vá, me desculpe. Sou cautelosa em relação a minha vida pessoal, não reajo bem a intromissões. É automático.
— Tudo bem. – Ele se sentou novamente ao lado dela. – Podemos conversar acerca do assunto que você escolher.
— Me conte sobre você, ancestrais japoneses? – Ela disse para desviar a atenção dele.
— Sim. Meu nome é Jonathan Kira, meus bisavós vieram do Japão há muito tempo. Eram pessoas bastante tradicionais, então só permitiam que os filhos se casassem com japoneses ou descendentes diretos. Meus avós se conheceram no bairro onde residem, você sabe que aqui na cidade tem um bairro chamado Hinata? – Ela assentiu. – Lá é onde os japoneses imigrantes e seus descendentes vivem. Eles deram esse nome porque é um local bastante ensolarado. Antes era só mato. – A voz dele era grave e tranquila. – Meus avós tinham os mesmos preconceitos contra ocidentais, mas então aconteceu algo que cedo ou tarde aconteceria: a filha deles se apaixonou por um ocidental. Era meu pai. Ele era negro. Meus avós a proibiram de namorá-lo, daí ela fugiu. Colocaram a polícia no caso, acharam minha mãe uma semana depois e a levaram a força de volta para meus avós. Meu pai morreu naquele dia em consequência de uma bala "perdida", mas como você pode perceber, minha mãe estava grávida. Depois de eu nascer meus avós me suportaram porque pareço eles. – Ele sorriu.
— Que história. Nunca fui naquele bairro. – Ponderou Lilith. Estava interessada no novo conhecido. Nem percebeu quando Cassius e Alberto chegaram.
Os amigos lançavam olhares significativos que a fariam corar.
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