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.9: Ares de Inquietude

Pela primeira vez em meses, o canto dos pássaros pode ser ouvido de várias direções, agora que os animais retornam após o fim de um dos mais rigorosos invernos que a região de Finger já viu nos últimos anos. Embora a temperatura ainda não ultrapasse os 20°; o céu está azul e as nuvens são brancas como papel.

ㅤㅤㅤㅤNo campus da Universidade Webber, pequenos rios de neve e gelo derretidos se formaram nos acostamento das ruas cada vez mais visíveis. A falta de manutenção do local devido ao baixo número de pessoas findou por causar danos severos em algumas construções, como é o caso do ginásio, cuja cobertura desabou devido ao peso da neve. Durante o auge da estação, os sobreviventes se abrigaram dentro do prédio das clínicas, onde levaram consigo todos os suprimentos disponíveis, os racionando de maneira severa, para que durassem. O que deu muito certo, considerando que a comida só começou de fato a ser uma preocupação apenas nas últimas semanas, obrigando Dylan, Blake, Abraham e Lydia a saírem para buscarem mais. Eles também só deixavam o edifício para verificar os veículos que lhes restaram, estacionados sob as tendas perto do muro.

ㅤㅤㅤㅤNesse momento, a situação já é bem diferente, com menos neve nas estradas e florestas; os lugares antes com camadas de até um metro agora não passam de dez centímetros, fora o clima já estar bem mais agradável, proporcionando que os sobreviventes possam enfim sair para avaliar a situação da faculdade.

ㅤㅤㅤㅤButch caminha passando a mão no cabelo ainda ralo, mas já bem visível — assim como sua barba —, acompanhando uma pequena correnteza ao lado da calçada. O satânico infiltrado conseguiu sair apenas algumas vezes durante o inverno para passar as informações que descobria para Jonny e Jenny, que permaneceram baseados no mesmo bairro residencial. Felizmente — para ele — nenhuma das suas saídas chamou a atenção e ele manteve seu disfarce intacto. Olhando para o outro lado da rua, próximos do jardim, ele identifica Millie, Yato e Stella que usam pás para afastar a neve das calçadas. Os três acabaram ficando mais próximos, por serem agora, as únicas crianças do grupo. O satânico olha para Millie e segue seu caminho até o portão.

ㅤㅤㅤㅤ— Sabe, eu ainda acho aquele cara ali meio estranho — diz Yato, fincando a pá num monte de neve e apoia o queixo no cabo. Ele segue Butch com os olhos. — Sei lá, o inverno inteiro e ele mal falava com ninguém.

ㅤㅤㅤㅤ— O Butch? — a voz de Millie baixa uma oitava e ela também o olha. — Ele é meio esquisito mesmo. Falei isso com o Dylan umas semanas atrás e ele só disse pra que eu não comentasse perto dele.

ㅤㅤㅤㅤ— Minha mãe disse isso também, mas acho que ele só é quietinho. — Stella mexe os pés de um lado para o outro na neve.

ㅤㅤㅤㅤ— Bom, só vejo o Blake e o Bíblia conversando com ele com mais frequência. Os outros parecem que só falam o necessário — Yato sussurra, afastando a franja dos olhos.

ㅤㅤㅤㅤ— É como a Stella disse, ele é caladão. Só fala o necessário mesmo — conclui Millie, ouvindo um som de motor ficando cada vez mais alto.

ㅤㅤㅤㅤ— É daqui? — o garoto solta a pá e dá alguns passos para perto da rua, vendo a Chevrolet Silverado vermelha se aproximar, levantando uma nuvem branca logo atrás.

ㅤㅤㅤㅤAs três crianças veem Dylan ao volante da caminhonete, passando direto por eles. Na caçamba do veículo, estão Abraham, Downs e Max, se segurando na lataria enquanto o policial dirige até o portão.

ㅤㅤㅤㅤ— Eles vão sair? — Stella dá alguns passos, abeirando os outros dois.

ㅤㅤㅤㅤ— O Dylan não me disse nada.... Fiquem aqui, vou lá ver. — Millie começa a correr até os muros.

ㅤㅤㅤㅤPróximo do estacionamento, Dylan freia a Silverado e a estaciona perto da lona, mas também de frente para o portão, onde seus ocupantes começam a descer.

ㅤㅤㅤㅤ— Ótimo, a picape aqui tá de boa, vai dar pra ir nela até Dimper — comenta Abraham, guardando um pente da sua M-16 no bolso do sobretudo.

ㅤㅤㅤㅤ— Foi muita sorte a gasolina daquele gerador ainda estar boa — Downs complementa e tira uma caixa de ferramentas da caçamba.

ㅤㅤㅤㅤ— Sorte é a caminhonete ainda funcionar. — Dylan se aproxima deles, pegando a M-4 que o soldado Bíblia lhe entrega. — Pelo menos não vamos andando até lá.

ㅤㅤㅤㅤ— Tem mais alguma lista pra fazerem? Já peguei o que a Aurora quer pra enfermaria e a Lydia me deu a de matérias de higiene pessoal — Max fala apoiando os cotovelos na tampa da caçamba.

ㅤㅤㅤㅤ— A de peças pros veículos, eu tenho na cabeça. Mas se a gente achar carros novos, já vai ser bem melhor. E a Alex também me deu uma de produtos de higiene pra juntar com a sua. — Abraham olha a mulher, segurando a bandoleira do seu fuzil após passá-la pelo ombro.

ㅤㅤㅤㅤ— Você já avisou a ela que sairia hoje, ou temos que esperar isso pra podemos ir? — Dylan dá uma breve risada nasal, olhando seu companheiro.

ㅤㅤㅤㅤ— Dylan! — Millie grita erguendo a mão direita e acena, ainda correndo até eles.

ㅤㅤㅤㅤ— Quem tem que dar explicações aqui não sou eu — Abraham retribui o comentário provocativo sorrindo e aponta com o polegar direito na direção de Millie.

ㅤㅤㅤㅤO policial suspira e coloca a M-4 nas costas, andando devagar na direção de Millie, vendo-a parar de correr e ofegar, se apoiando nos joelhos enquanto o espera.

ㅤㅤㅤㅤ— Vocês... vocês vão sair? — ela questiona, levantando a cabeça.

ㅤㅤㅤㅤ— É, pra Dimper, tá faltando muita coisa aqui e vamos ver se conseguimos repor parte dos estoques — Dylan para na frente da menor, apoiando a destra sobre a Desert Eagle em seu coldre.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu quero ir também, posso? — Millie fica com a coluna reta, mas ainda com a respiração acelerada.

ㅤㅤㅤㅤ— Não dessa vez, não sabemos como estão as coisas lá, agora que a neve tá sumindo.

ㅤㅤㅤㅤ— Quê? Mas eu já fui lá uma vez com vocês — a garota protesta, franzindo a testa em frustração.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu sei, mas naquela vez, tava tudo congelado, inclusive os sangrentos. Vamos só eu, Abraham e Max justamente pra fazer mais uma averiguação.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu ainda posso ajudar. Por favor — Millie implora, juntando as mãos e entrelaçando os dedos.

ㅤㅤㅤㅤ— Olha, vamos fazer o seguinte — Dylan se curva. — Você fica aqui dessa vez e na próxima, quando levarmos mais pessoas, você vem. Tá bem?

ㅤㅤㅤㅤ— Hm... — murmura. Ela não faz questão de esconder sua frustração. — Tá, né? Mas eu vou cobrar isso.

ㅤㅤㅤㅤ— É, eu sei que vai — Dylan completa e fica de pé. — Fala com a Yumi quando acabar de tirar a neve e pede pra ela te treinar com a pistola. Quando eu chegar, fico no lugar dela. — ele bagunça o cabelo da criança com a destra e a vê se afastando.

ㅤㅤㅤㅤ— Humpf, por que você fica fazendo isso? — ela passa as mãos nas mechas. — E tá bem, eu chamo a Yumi.

ㅤㅤㅤㅤ— Ótimo. — Dylan ignora a pergunta e se vira, voltando para onde os demais estão.

ㅤㅤㅤㅤ— Nunca me responde... — Millie sibila só para si e também volta para onde Yato e Stella estão.

ㅤㅤㅤㅤSentado em um dos bancos do campus, Butch observava os dois conversando enquanto fuma um cigarro do maço que achou durante uma das suas saídas da universidade. Seguindo Dylan com os olhos, ele dá uma tragada e começa a pensar em como fazer para deixar a zona segura e ir para a localização dos Ronnie's.

ㅤㅤㅤㅤApós o policial embarcar na Silverado, Downs cuida para abrir o portão da faculdade o suficiente para que o veículo possa sair sem problemas. Quando isso ocorre, o militar também sai e olha ao redor, não vendo nenhuma anormalidade nos arredores e, depois de ver a caminhonete sumir na estrada, retorna para os limites da zona, fechando a entrada novamente.

***

Longe de qualquer movimentação por parte dos infiéis, um grupo de satânicos caminham pelas ruas de Nolbank City, verificando se os estoques de suprimentos que eles guardam na cidade ainda estão bons para consumo ou se não foram atacados por ratos e outras pragas. Do lado de fora de um armazém, os cerca de quinze cultistas têm sua atenção atraída para o Ford Fusion prata repleto de arranhões que reduz a velocidade conforme se aproxima do grupo. Quando o sedã para, a janela do motorista abaixa e Elizabeth olha para o satânico mais próximo:

ㅤㅤㅤㅤ— Milles, o Lúcios me mandou pra ver os infiéis. Eles estão no posto ao fim da rua oitenta e sete? — a loira apoia o cotovelo na porta.

ㅤㅤㅤㅤ— Isso, olhamos eles quando chegamos e tiramos dois corpos que não resistiram a essa última semana e um que tivemos de matar pois ele quase nos atacou quando viu que trazíamos comida — Milles explica enquanto se aproxima do veículo e tira o capuz da cabeça.

ㅤㅤㅤㅤ— Tá, entra aí e vamos. Se verem só uma pessoa, podem fazer motim. — Elizabeth destrava as portas do sedã.

ㅤㅤㅤㅤO satânico avisa aos demais para continuarem com suas tarefas e dá a volta no Fusion, embarcando no banco do passageiro. Elizabeth então acelera o veículo e se encaminha até o posto de combustíveis que lhe foi indicado. Após apenas alguns minutos de travessia, ela enfim avista o estabelecimento da Texaco e estaciona o carro próximo das bombas.

ㅤㅤㅤㅤ— Eles tão na oficina. — Milles aponta para as portas de metal enquanto desembarca e vê Elizabeth fazer o mesmo.

ㅤㅤㅤㅤA loira olha ao redor e pode ver os três cadáveres que ainda estão com sangue fresco escorrendo pelas perfurações em suas cabeças. O líquido se destaca na neve onde eles foram jogados.

ㅤㅤㅤㅤ— Dois que não resistiram e um que tentou atacar vocês, certo? — ela segue até as portas da oficina.

ㅤㅤㅤㅤ— Sim, por comida.

ㅤㅤㅤㅤ— Ok, abre — pede, já parando na frente da porta sanfonada.

ㅤㅤㅤㅤMilles faz o que a mulher pede e se agacha perto do cadeado, o destrancando com a chave. Em seguida, ele toma fôlego e começa a subir a porta cujas dobradiças estão enferrujadas pelo tempo, conseguindo subi-la apenas pouco mais de um metro, mas já sendo possível escutar os sons de agonia que ecoam lá dentro.

ㅤㅤㅤㅤ— Só vai até isso. — ele olha Elizabeth, que se abaixa para passar por baixo da mesma e então pega uma lanterna, iluminando o interior do ambiente que fede a fezes, urina e carne em decomposição.

ㅤㅤㅤㅤ— Credo... — a loira cobre a boca e o nariz com a destra, sentindo seus olhos lacrimejarem enquanto vê, pela luz da lanterna de Milles, dezenas de pessoas amontoadas umas nas outras, sujas com suas próprias excreções, pronunciando palavras inaudíveis.

ㅤㅤㅤㅤOs residentes capturados por Lúcios já estão em cárcere há mais de três meses, sobrevivendo à base de duas refeições por dia, que são basicamente uma porção de pão velho com meia garrafa d'água. Desde que eles foram pegos, das mais de noventa pessoas, apenas sessenta ainda estão conseguindo sobreviver nas condições desumanas em que foram largadas.

ㅤㅤㅤㅤElizabeth nunca havia estado naquele local, pois Lúcios sempre mandava Karl ir averiguar o estado dos prisioneiros. Porém, o ex-militar saiu com um grupo para buscar mantimentos perto de Clerittown e só restou ela para fazer esse serviço, mesmo relutante. E agora, seu estômago se revira tanto com o cheiro, quanto com a visão das pessoas em situação de magreza extrema. Nem mesmo as crianças foram poupadas disso e algumas delas encaram Elizabeth, com os ossos dos seus crânios destacados.

ㅤㅤㅤㅤ— Certo, já terminamos. — ela se vira de uma vez, antes que uma mulher que esticou o braço pudesse chamá-la.

ㅤㅤㅤㅤDo lado de fora, ela passa as mãos nos braços, arrepiada com as cenas e escuta a porta sendo baixada por Milles, que também não está confortável com tudo aquilo.

ㅤㅤㅤㅤ— Olha, eu sei. É bizarro ver essas coisas. Mas se quiser, eu não falo pra ninguém que você tá enojada. — ele joga a chave no ar e a pegando logo em seguida.

ㅤㅤㅤㅤ— Ótimo... não fale mesmo. — Elizabeth se recompõe e respira fundo, tentando esquecer o cheiro podre que impregna em suas narinas. — Vamos, vou te levar de volta ao seu posto e depois informar a Lúcios no convento.

ㅤㅤㅤㅤ— Ok, quanto mais cedo formos, melhor.

Quatro infectados devoram vorazmente o corpo congelado de um cachorro que sucumbiu ao frio intenso e ficou soterrado por meses, até que neve derreteu e deixou seus restos preservados expostos, bem como o cheiro perceptível aos sangrentos próximos, alguns que já não achavam nenhuma presa — viva ou morta — desde antes do inverno. Os reanimados só deixam de prestar atenção na carne do animal quando um som agudo de freio os alerta para o leste, onde a Silverado estaciona.

ㅤㅤㅤㅤQuase que no mesmo instante, a porta do passageiro se abre e Max põe metade do corpo para fora, mirando nos sangrentos com pistola Taurus TH9 equipada com um silenciador. A morena precisa de apenas quatro disparos, um para cada canibal e após o último ser morto, ela desce da caminhonete e fecha a porta, olhando para Abraham, desembarcando logo atrás.

ㅤㅤㅤㅤ— Mandou bem. — ele passa a bandoleira da sua M-16 pelo ombro e empunha a arma.

ㅤㅤㅤㅤ— Foi aqui onde você veio com o Thomas e o Jacob? — pede Dylan, já com sua M-4 nos braços.

ㅤㅤㅤㅤ— É, foi. O Baby Driver que descobriu o lugar, mas a neve tava literalmente cobrindo as portas. É bem aqui. — Abraham começa a guiar os dois.

ㅤㅤㅤㅤO gângster se mantém alerta para qualquer movimentação de infectados, enquanto anda calmamente no meio da rua. Ele se recorda de que aquele mesmo trecho estava com quase dois metros de neve dura da última vez em que andou por ele e agora grande parte do asfalto preto já é visível, bem como as dezenas de carros abandonados próximos das calçadas. Ele umedece os lábios e para na frente de uma construção de um único andar, mas com um outdoor com mais de dois metros de altura, onde é possível ler "Empório 24 horas" e, logo abaixo, "Arrecadação de alimentos para o natal". A fachada do estabelecimento é repleta de janelas, mas o interior é completamente escuro.

ㅤㅤㅤㅤ— A gente usava o outdoor pra se guiar por aqui nas nevascas — comenta Abraham. — Agora que a neve baixou, a gente pode dar uma olhada.

ㅤㅤㅤㅤ— Certo, sabe como é o padrão. Bater primeiro, entrar depois — Dylan relembra, indo até a entrada do estabelecimento e para ao lado da porta, com as costas rentes à parede.

ㅤㅤㅤㅤ— Sim, senhor policial. — Abraham deixa a M-16 solta e puxa um machete da bainha em seu coldre e também se dirige à porta do empório.

ㅤㅤㅤㅤMax fica parada de frente para a porta, mas ainda fora da calçada, segurando a Taurus firme com as duas mãos. Ela observa Abraham bater com o cabo do facão três vezes na porta de vidro, quebrando o silêncio que logo volta ao ambiente. Após repetir o ato mais uma vez, o gângster fica de frente para a porta e, com um único chute, arromba a fechadura e o barulho invade o interior do empório. Do lado de fora, os três podem escutar os grunhidos ficando mais altos.

ㅤㅤㅤㅤ— Merda... sangrentos — Abraham fala com calma e começa a se afastar.

ㅤㅤㅤㅤ— Poupamos munição? — pergunta Max.

ㅤㅤㅤㅤ— Só usa se for necessário. — Dylan deixa seu fuzil preso pela bandoleira e saca uma faca Bowie da sua cintura.

ㅤㅤㅤㅤ— Ok — Max guarda a pistola em seu coldre e pega seu canivete, ejetando a lâmina e vendo a primeira silhueta se aproximar da saída.

ㅤㅤㅤㅤO homem usando um casaco branco sujo com uma bile misteriosa e ressecada emerge da escuridão, erguendo os braços para os três humanos além da porta. Logo atrás dele, são visíveis mais quatro infectados que também parecem ter vomitado. Abraham é o primeiro a avançar, já erguendo o machete e o acertando no meio da cabeça do primeiro homem, fazendo-o cair de joelhos e o chutando. Dylan vem logo atrás e atravessa a lâmina da faca no queixo de uma mulher de cabelos castanhos, a puxando e deixando o cadáver cair. Já Max, segura pelo pescoço um idoso raquítico e perfura sua testa com o canivete, vendo Dylan perfurar acima da orelha direita de um adolescente sem camisa e, finalizando, Abraham enterra a lâmina do facão no pescoço de outro adolescente e decepa sua cabeça.

ㅤㅤㅤㅤ— Parece limpo agora, vamos. — o gângster tira uma lanterna do bolso do seu sobretudo e a liga, iluminando algumas prateleiras reviradas.

ㅤㅤㅤㅤDylan e Max também pegam seus aparelhos e entram no empório, sentindo imediatamente o cheiro azedo da podridão. Pequenas partículas de poeira pairam no ar e o som da madeira rangendo a cada passo deles ecoa na escuridão. Eles se dirigem até o balcão do estabelecimento, onde o odor é mais forte e podem ver, pelos feixes das lanternas, uma grande poça de uma bile marrom, repleta de moscas e larvas que passeiam pela mistura asquerosa.

ㅤㅤㅤㅤ— Mas o que é isso...? — Max sente seu estômago se revirar e respira fundo. — Espera, me dá um-- — ela não consegue controlar a ânsia e se vira para perto de uma prateleira, onde começa a vomitar.

ㅤㅤㅤㅤ— Eles tomaram alvejante. — Dylan dá a volta na ilha de moscas e ilumina uma garrafa branca e vários copos descartáveis.

ㅤㅤㅤㅤ— Dá nem pra imaginar como isso deve ter sido lento e doloroso. — Abraham ilumina Max, que limpa a boca com as costas da canhota.

ㅤㅤㅤㅤ— Como vocês não se enjoam? Credo...

ㅤㅤㅤㅤ— Eu fiz pessoas morrerem de acidentes bem violentos — comenta o de sobretudo.

ㅤㅤㅤㅤ— E eu investigava a maioria desses acidentes — o policial complementa enquanto atravessa o balcão, se encaminhando até uma porta.

ㅤㅤㅤㅤ— Ainda bem que nunca peguei essa parte do trabalho. — Max se recompõe.

ㅤㅤㅤㅤApós abrir a porta e jogar o feixe da lanterna para de dentro da sala, Dylan pode ver várias caixas abertas e outras fechadas, mas também várias embalagens e enlatados.

ㅤㅤㅤㅤ— Achei a comida, venham — diz ele, empurrando a porta e entrando do recinto, tendo uma noção melhor das pilhas de caixas. — É melhor pegar a caminhonete, Abraham. Tem bastante coisa aqui.

ㅤㅤㅤㅤ— Beleza, vão juntando tudo. Vou logo fazer isso.

ㅤㅤㅤㅤAbraham deixa o empório e passa pelos cadáveres dos sangrentos na calçada, fazendo todo o caminho contrário. Porém, conforme ele se aproxima da rua onde Dylan estacionou a Silverado, consegue ouvir algumas vozes e pega sua M-16, seguindo agachado pelo resto do trajeto e parando rente a um Ford Focus cinza, de onde consegue ouvir os desconhecidos com nitidez:

ㅤㅤㅤㅤ— Procura por pegadas, quem tava andando nisso tá perto — diz uma voz masculina.

ㅤㅤㅤㅤ— Os cartuchos dos quatro tiros aqui e quatro corpos ali. — agora é uma mulher que toma a palavra. — Saiu do banco do passageiro, então é mais de uma pessoa.

ㅤㅤㅤㅤ— Devem ter ido por aqui, venham.

ㅤㅤㅤㅤAbraham engole em seco e uma gota de suor desce pela sua testa ao pensar que os curiosos podem ser satânicos. Ele olha para seu fuzil, se certificando de o mesmo estar destravado e respira fundo, agilmente se pondo de pé e mirando a arma na direção dos três estranhos:

ㅤㅤㅤㅤ— Ok, sem gracinhas! — ele encara o casal e o adolescente, todos usando roupas normais e sujas.

ㅤㅤㅤㅤ— Ou! Olha só... parece que um deles apareceu. — o dono da primeira voz que Abraham ouviu, um homem de cabelo grisalho e liso, com uma barba cheia, imediatamente mira uma Thompson na sua direção.

ㅤㅤㅤㅤ— Ok, bonitão, tá três contra um, passa as chaves e a gente atira só nas suas pernas — a mulher de cabelos negros ressecados ordena e mira sua M1-Garand diretamente no peito do homem de sobretudo.

ㅤㅤㅤㅤ— Com essas armas da Segunda Guerra Mundial, é mais fácil os tiros saírem pelas culatras e vocês morrerem — Abraham segura seu fuzil com mais firmeza, vendo o adolescente do grupo também mirar um pequeno revólver.

ㅤㅤㅤㅤ— Vamos ver quem vai morrer então, seu palhaço. — o homem de cabelo grisalho leva a mira da Thompson para próximo do seu rosto, seguido pelo som de três disparos.

— Você gosta mesmo disso? Nada contra, mas eu particularmente evito chá. E você bebe em quase toda refeição — Lydia questiona, mantendo a cabeça apoiada no punho, olhando Aurora assoprar uma pequena xícara.

ㅤㅤㅤㅤ— Chá é como água pra mim, não vivo sem — ela dá um sorriso e toma um gole. — E é a minha segunda paixão. A primeira é Queen. — a médica põe a peça na mesa e exibe a blusa cinza com a estampa do Freddy Mercury e o nome da banda escrita em preto logo em cima.

ㅤㅤㅤㅤ— Lembro que a Aurora escutava as músicas quase todo dia, já que não tinha muitos pacientes — Alex comenta, se aproximando das duas, com um copo de café descartável em mãos e se senta ao lado da loira. — Vocês chegaram, trouxeram os pacientes e levaram embora o sossego dela.

ㅤㅤㅤㅤ— Pelo menos você compensou isso no inverno, não foi? — Lydia nota um pequeno colar no pescoço da médica. — e esse cordão?

ㅤㅤㅤㅤ— Nem me fale... pena que meu rádio pifou de frio. — Aurora leva a destra até o colar e o puxa, exibindo um pequeno pingente de borboleta com pedras azuis nas asas. — Isso foi um presente do meu avô, quando me formei em medicina... ele disse que eu tava pronta pra voar pra onde quisesse. — ela olha o pingente.

ㅤㅤㅤㅤ— É muito bonito. — Lydia observa a borboleta com contornos dourados.

ㅤㅤㅤㅤ— Ei, desculpem interromper vocês, mas o Butch comentou com alguém se sairia? — pede Ashley, parada diante da janela do terceiro andar do prédio das clínicas. — Tão abrindo o portão pra ele.

ㅤㅤㅤㅤ— Ele deve ter pedido pro Downs ou pro Blake agora — Alex responde, se espreguiçando na cadeira, vendo Lydia se levantar e ir para a janela.

ㅤㅤㅤㅤ— Sei lá, esse estilo "lobo solitário" dele é bem esquisito — diz a mulher, massageando os cachos e vendo Thomas fechar o portão após a saída do homem, que saía com uma grande mochila nas costas. Olhando na direção do estacionamento, identifica Yumi acompanhando Millie num treino de tiro ao alvo.

ㅤㅤㅤㅤ— Deve ter saído pra caçar, ou algo do tipo. Os animais estão voltando a andar por aí. — Aurora toma mais do seu chá. — Mas se tem uma coisa que eu adoraria que qualquer um trouxesse, são mais sachês. Só tenho mais dois.

ㅤㅤㅤㅤ— Você falou pro Dylan procurar mais? — Ashley imediatamente vira o rosto, olhando a outra loira por cima do ombro.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu coloquei na lista, mas não mencionei.

ㅤㅤㅤㅤ— Devia ter falado, Áurea. Garanto que ele ia atrás. — ela caminha até a mesa, seguida por Lydia e as duas se sentam no outro lado da mesa da pequena cozinha.

ㅤㅤㅤㅤ— Me perdoa se for invasiva, mas, por que a Ash fala tanto do Dylan perto de você? — Lydia arqueia a sobrancelha e sorri. — Sério... quando a gente tava preso por causa da neve, lembro que ela era direto cochichando sobre.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah, é porq--

ㅤㅤㅤㅤ— Porque a Ashley gosta de brincadeiras que me irritam, é por isso. — Aurora interrompe a outra e olha seu reflexo no pouco que ainda restou do chá.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah, Aurora. Aproveita que tá entre mulheres aqui e diz logo que você tem interesse no Dylan. — Alex dá um leve tapa nas costas da médica. — Tipo, todo mundo aqui já percebeu isso.

ㅤㅤㅤㅤ— Perceberam? — ela olha envergonhada para Alex.

ㅤㅤㅤㅤ— E eu também percebi ele desviando de toda conversa que não fosse um "oi" ou você pedindo algo — Lydia torna a apoiar a cabeça no punho.

ㅤㅤㅤㅤ— Tá... — ela suspira. — Mas não contém pra ninguém, ok? Eu... sim, queria me aproximar do Dylan. Sei lá, o jeito que ele cuida das coisas e se importa com as pessoas. Eu admiro essas qualidades.

ㅤㅤㅤㅤ— Ainda bem que você já conheceu ele assim. O Dylan de antes era bem babaca, mas a Millie parece ter consertado ele — Lydia comenta. — E a Yumi também. Eu era até um pouco enciumada, mas ainda bem que ele parece não ser interessado em relacionamentos-- bom, nesse caso. — ela corrige a postura, após perceber que sua fala pode ter magoado Aurora.

ㅤㅤㅤㅤ— É isso o que me deixa imaginando se eu tô fazendo papel de trouxa ou não. Não sei se ele tá ignorando ou só não entende.

ㅤㅤㅤㅤ— Pelo que o Abraham me contou uma vez, ele deve tá te ignorando — Alex responde sem rodeios, terminando seu café. — Ele me disse que o Dylan sempre foi sozinho.

ㅤㅤㅤㅤ— O que eu faço...? — Aurora se curva na mesa, apoiando os cotovelos no tampo de metal e as mãos bagunçam seu cabelo.

ㅤㅤㅤㅤAshley falaria algo, mas elas logo se voltam para a porta da cozinha, que é aberta por Stella. A pequena está acompanhada de Yato e Mia e assim que vê sua mãe, corre na direção da mesma:

ㅤㅤㅤㅤ— Mamãe!

ㅤㅤㅤㅤ— Oi, meu anjo. — a ruiva se afasta ainda na cadeira e abre os braços, recebendo o abraço da filha. — Você ajudou o Yato e a Millie a tirarem a neve?

ㅤㅤㅤㅤ— Sim, senhora. — Stella sorri, exibindo as janelas onde deveriam estar dois dos seus dentes da frente.

ㅤㅤㅤㅤ— A Yumi tá ajudando a Millie no tiro livre e eu resolvi trazer eles pra cá. — Mia abre seu casaco camuflado. — Atrapalhamos em algo?

ㅤㅤㅤㅤ— Não, a gente só tava conversando sobre o Butch... — responde Lydia. — Ele disse o que ia fazer lá fora?

ㅤㅤㅤㅤ— Só que ia caçar e ver se achava lugares novos por aí. — Yato olha para a mulher enquanto se senta do lado de Ashley.

ㅤㅤㅤㅤ— Você tava certa, afinal. — a loira bagunça o cabelo de Yato com a canhota e sorri pra ele, olhando Aurora logo em seguida. — Voltando ao assunto de hoje de manhã, se eu puder dar uma dica: seja direta. Para de tentar investir em deduções.

ㅤㅤㅤㅤ— Hm... tá bem... — Aurora se levanta da cadeira e pega sua xícara, a levando até a pia.

ㅤㅤㅤㅤ— O assunto era mesmo sobre o Butch? — Mia ri fraco, olhando Ashley.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah, não. Isso é coisa minha e dela — Ash responde e sorri.

ㅤㅤㅤㅤ— Bom, mais tarde, a gente vai ter que limpar a neve lá dos fundos da faculdade. Thomas, Downs e Blake estão na vigia, Dylan, Max, Abraham e Butch lá fora. Sobrou pra gente — a militar explica, puxa uma cadeira e se senta. — Vou chamar a Yumi também. Como as crianças já fizeram, podem ficar ajudando com as pás.

ㅤㅤㅤㅤ— Pelo menos vai dar pra se esticar. — Lydia começa a alongar seus braços.

Pequenas pedras batem no assoalho do Ford Fusion, enquanto o veículo trafega a constantes sessenta quilômetros por hora sobre a estrada de terra. Atenta na estrada, Elizabeth bate seu indicador no volante, impaciente com o som irritante dos detritos. A loira esfrega a destra no rosto suado e suspira, tentando esquecer a visão dos prisioneiros que Lúcios fez. Uma enxurrada de dúvidas paira em sua mente, pois ela não tem a menor noção do que será daquelas pessoas. Se elas ainda não morreram, significa que terão um propósito para o líder da seita.

ㅤㅤㅤㅤElizabeth só torna a prestar 100% da sua atenção à estrada quando consegue identificar as torres da igreja de Lúcios. Reduzindo a velocidade aos poucos, ela cruza o portão do convento que já estava aberto e, durante as manobras para estacionar, não pode deixar de notar o caminhão militar cercado por satânicos usando branco e ajudando a tirar os suprimentos. Na entrada da caçamba, Karl é o primeiro a distribuir as caixas, bastante alegre.

ㅤㅤㅤㅤ— Bora lá, pessoal, quero todas essas coisas na dispensa em meia hora! — o ex-militar gargalha, orgulhoso.

ㅤㅤㅤㅤApós desembarcar do Fusion, a loira ajeita o sobretudo cinza no corpo e caminha na direção das escadas, mas para assim que vê Jenny descendo, com uma mochila nas costas e uma crossbow presa pela bandoleira sobre seu ombro direito.

ㅤㅤㅤㅤ— Jenny? Você não devia estar com seu irmão? — ela espera a mulher chegar.

ㅤㅤㅤㅤ— Já é a oitava pessoa que me pergunta isso, merda... — a punk suspira, indignada, parando na frente de Elizabeth.— Vim pegar mais suprimentos e matar a saudade da minha cama. Já tô naquele inferno de casa há meses.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah, sim. Alguma novidade sobre os infiéis?

ㅤㅤㅤㅤ— Butch ficou de ir nos ver hoje. Vou saber se ele apareceu quando voltar pra lá.

ㅤㅤㅤㅤ— Entendi. Você... quer carona? Só preciso falar pro Lúcios sobre as novas baixas no número de prisioneiros.

ㅤㅤㅤㅤ— Pô, seria uma mão na roda. Seu carro é o cinza riscado, né? — Jenny ajusta a bandoleira da crossbow.

ㅤㅤㅤㅤ— Aham, me espera lá. Já venho — a loira responde, apontando para o automóvel e começa a subir as escadas.

ㅤㅤㅤㅤElizabeth cruza todo o prédio administrativo sem olhar e nem falar com nenhum dos outros satânicos. Quando chega na ala dos dormitórios, a loira olha para cima, vendo que o local onde antes estavam pendurados os cadáveres de Jasper e as três freiras agora está vazio, pois com a chegada da primavera, os corpos descongelaram e, além do garoto ter enfim reanimado como um sangrento, urubus começaram a se alimentar dos corpos expostos, que foram cremados fora do convento.

ㅤㅤㅤㅤSaindo do edifício de alojamentos, ela caminha até a igreja de Lúcios, arqueando a sobrancelha ao ver uma das grandes portas sendo abertas e uma mulher de pele morena sair amarrando suas mechas cacheadas, mantendo o sobretudo dobrado em seu ombro. Logo atrás, o líder dos satânicos surge usando apenas uma calça azul escura, exibindo o corpo esbelto e de músculos desenhados, brilhando pelo suor.

ㅤㅤㅤㅤ— Elizabeth, enfim retornou. — o homem apoia o antebraço na porta, fitando a loira. — Qual a situação dos prisioneiros?

ㅤㅤㅤㅤ— Mais três morreram, dois de causas naturais e o último, segundo relatos, tentou atacar um dos nossos por comida durante a distribuição — ela mantém os olhos apenas no rosto do mais velho, parada no primeiro degrau.

ㅤㅤㅤㅤ— Esses infiéis... agem como animais fora de controle. — Lúcios murmura, soltando o ar pelo nariz e desviando o olhar para o piso, depois o retornando para sua seguidora. — E o estado dos sobreviventes?

ㅤㅤㅤㅤ— Bom, não sei como o Karl os descreve, mas eles estão péssimos. Magros, fracos... acho que vivendo apenas por força de vontade.

ㅤㅤㅤㅤ— Pois que aguentem assim até amanhã.

ㅤㅤㅤㅤ— O que vai ter amanhã?

ㅤㅤㅤㅤ— Jenny está aqui há algumas horas e me informou que Butch irá ao ponto de encontro hoje. Já cuidei de explicar para ela, exatamente, o que seu irmão deverá fazer. — logo um sorriso se forma no rosto dele.

ㅤㅤㅤㅤ— Entendo... vou deixar ela de volta no residencial. Aproveito e pergunto do que se trata, se não se importar. — sua feição continua séria.

ㅤㅤㅤㅤ— Não, faça isso. Quero que meus filhos de confiança saibam o que faremos em breve.

ㅤㅤㅤㅤ— Certo então. Com sua licença. — após o cumprimentar com a cabeça, ela se vira e segue de encontro a Jenny, ouvindo a porta da igreja se fechar.

***

Sobre o asfalto, o homem que portava a Thompson se afoga com o próprio sangue que sai não apenas da sua boca, como também das três perfurações em seu tórax, feitas pelo rápido gatilho de Abraham, que ainda teve tempo de se esconder atrás do Ford Focus abandonado antes que a dupla de estranhos que espionava a caminhonete pudesse atingi-lo com seus tiros.

ㅤㅤㅤㅤ— Dá a volta, moleque, anda! — vocifera a mulher, atirando outra vez no capô cinza do veículo onde seu alvo se esconde.

ㅤㅤㅤㅤParecendo estar desatento, o rapaz de boné corre até a calçada e se agacha para ir até a caminhonete. A dona da M1 então avança para o outro lado da rua, atirando novamente no capô do compacto, ao ver que Abraham tentava se levantar e, já na calçada, ela se mantém atrás de uma cabine telefônica, tendo o veículo na sua mira.

ㅤㅤㅤㅤAssim que chega na esquina da rua, o garoto sente seu boné ser arrancado pelo vento, mas antes que pudesse fazer qualquer outro movimento, ele petrifica ao escutar outra voz feminina:

ㅤㅤㅤㅤ— Parado aí! — Max mira com a Taurus contra o menor, que imediatamente larga sua arma.

ㅤㅤㅤㅤ— Não atira, por favor! — ele ergue as mãos, em desespero, vendo um terceiro indivíduo chegar logo atrás.

ㅤㅤㅤㅤ— A vaca enfim apareceu — a desconhecida murmura, sai da cobertura da cabine e mira a M1-Garand na direção da morena, já apertando o gatilho.

ㅤㅤㅤㅤ— Max!! — Dylan percebe o ataque iminente da outra mulher e, quase imediatamente, agarra Max e se joga no chão com a mesma, tirando da linha do tiro.

ㅤㅤㅤㅤ— Filho da--

ㅤㅤㅤㅤAproveitando a desatenção da sua oponente, Abraham conseguiu tê-la na mira para disparar mais três vezes com sua M-16 e todos os projéteis atingem o rosto da mulher, que fica estraçalhado quando seu corpo cai no concreto duro da calçada.

ㅤㅤㅤㅤ— Agora é sua vez, pirralho. Deita no chão! — o gângster sai da sua cobertura já com a mira cravada no jovem.

ㅤㅤㅤㅤ— Por favor, não atira, eles me obrigaram a fazer isso — o menor implora, se ajoelhando antes de se deitar sobre o asfalto.

ㅤㅤㅤㅤ— Se acalma, Abraham. — Dylan olha seu companheiro enquanto ajuda Max a levantar.

ㅤㅤㅤㅤ— É, ele parece estar é assustado com tudo — completa a morena, limpando a neve das suas roupas.

ㅤㅤㅤㅤ— Ele tem que estar mesmo. — Abraham para ao lado do garoto. — Agora desembucha, quem mais tá por aí?

ㅤㅤㅤㅤ— Ninguém, ninguém, eu juro. Aquele cara, o Conrad, me ajudou na floresta faz uns dias. Ele e a Jéssica eram um casal e eu só tava andando com eles pra não ter que ficar sozinho.

ㅤㅤㅤㅤ— Tá, escutem, os tiros vão atrair os sangrentos pra cá e nós temos que pegar suprimentos ainda. Amarra ele na caçamba e vamos agilizar o nosso serviço — Max fala e dá um passo adiante, olhando Abraham.

ㅤㅤㅤㅤ— Tá falando pra gente levar ele? — o gângster arqueia a sobrancelha.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu não sou que nem eles, só fi--

ㅤㅤㅤㅤ— Cala a boca! — Abraham corta a fala do jovem.

ㅤㅤㅤㅤ— Quer matar ele aqui? Deixá-lo sozinho? Esqueceu o que a Millie disse sobre não sermos monstros? E olha que o Jacob fez muito mais coisa ruim pra ela.

ㅤㅤㅤㅤO silêncio rouba a cena de todos. Abraham fita Max, refletindo sobre o que a mesma disse, mas antes que pudesse dizer algo, Dylan se aproxima:

ㅤㅤㅤㅤ— Ela tem razão... amordaça e cobre a cabeça dele, depois decidimos o que fazer. — ele tira um par de algemas do seu coldre. — Nossa prioridade aqui é outra.

Depois de uma caminhada tranquila e um saldo de oito sangrentos mortos no caminho, Butch enfim chega no condomínio onde vem fazendo regulares visitas para atualizar os irmãos Ronnie da situação em que os sobreviventes da universidade se encontram. Notando o lugar mais silencioso do que o normal, ele saca o revólver Smith&Welson do coldre e fica atento enquanto segue até a residência de paredes brancas e porta vermelha, que é onde os irmãos se alojaram e bate três vezes na madeira:

ㅤㅤㅤㅤ— Jonny? Jenny? Sou eu, o Butch.

ㅤㅤㅤㅤEle pode ouvir o som de latas caindo de no chão e, instantes depois, o da fechadura sendo destrancada. Jonny abre a porta e dá passagem para ele.

ㅤㅤㅤㅤ— Entra aí, minha irmã foi pro convento pegar suprimentos e ver se o Lúcios tem novas ordens — o punk explica rindo fraco e passa a mão no rosto, voltando até o sofá onde estava deitado. — "Minha irmã foi pro convento"... essa foi boa.

ㅤㅤㅤㅤ— E faz tempo que ela saiu? — Butch tira a mochila das costas e seu casaco, o dobrando sobre o braço.

ㅤㅤㅤㅤ— Umas horas, deve tá voltando. E aí, como tão as coisas com os infiéis? — Jonny passa a mão na regata branca, limpando migalhas de biscoitos e se senta no sofá da sala, cruzando as pernas sobre a mesa de centro.

ㅤㅤㅤㅤ— Dylan, Max e Abraham saíram pra buscarem suprimentos em Dimper. As coisas nas dispensa tão sérias — Butch diz e se senta em uma poltrona.

ㅤㅤㅤㅤ— Pô, aqui também. Já olhamos todas essas casas atrás de comida. Espero que a idiota da Jenny traga algo bom — o rapaz afasta algumas revistas pornográficas de cima da mesa de centro e pega um maço de cigarros. — Vai um? Ela ainda pode demorar.

ㅤㅤㅤㅤ— Passa pra cá.

ㅤㅤㅤㅤConforme os cigarros são tragados, nenhum dos dois homens percebe o tempo passar durante as conversas sobre mulheres, esportes de antes do apocalipse e até mesmo sobre política. O cheiro do tabaco acaba por impregnar toda a sala de estar e os dois só se dão conta disso quando escutam o som de freios do lado de fora da residência. Jonny rapidamente se levanta, cuspindo no chão e anunciando a chegada da sua irmã, vendo-a descer do Ford Fusion de Elizabeth. Butch se desfaz do cigarro e também fica em pé, esperando pela porta da frente ser aberta.

ㅤㅤㅤㅤ— Puta-- caralho, vocês fumaram quantos caminhões de cigarro? — Jenny tosse e imediatamente leva a destra à boca, saindo da casa. — Puta que pariu.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah, nem tá tão ruim assim — Jonny argumenta, dá de ombros e também vai para fora, seguido por Butch. — E aí, Elizabeth. Que surpresa você por aqui.

ㅤㅤㅤㅤ— Dei uma carona pra Jenny e também vim pra saber sobre o plano. Inclusive, me incluí nele. Só vou falar com o Lúcios quando voltar — a loira explica e fica de braços cruzados.

ㅤㅤㅤㅤ— Plano? Lúcios disse algo? — Butch caminha até próximo dela.

ㅤㅤㅤㅤ— Sim, os primeiros passos contra os infiéis serão dados. A Jenny vai te explicar melhor, assim que ela se recuperar. — ela olha a outra mulher, que cospe na grama.

ㅤㅤㅤㅤ— É... nossa, sinto como se tivesse terra nos meus pulmões... porra — a punk suspira e se recompõe.

ㅤㅤㅤㅤ— Para de drama, fresca. Conta do plano aí logo. — Jonny apoia as mãos na cintura, impaciente.

***

Uma fileira de seis amigáveis bonecos de neve derrete devagar sob o sol ainda frio, formando uma poça d'água no asfalto. Em seus rostos, os olhos e bocas foram desenhados com dedos, alguns fazendo caretas tortas e que, provavelmente, não seriam reconhecidas por ninguém. Todavia, eles cumprem o seu papel, que é servir de alvo para Millie. A garota mantém a coluna ereta e as duas mãos segurando a pequena Beretta M70 com um silenciador. Assim que crava a mira no primeiro boneco, ela aperta o gatilho, vendo a cabeça do mesmo desaparecer quase que no mesmo instante e repete o ato nos próximos dois.

ㅤㅤㅤㅤ— Essa aqui é muito leve, mal sinto o coice. — ela abaixa a arma e a observa.

ㅤㅤㅤㅤ— Bom, o Dylan me disse que você devia começar com uma do seu tamanho. Das que ficaram aqui, essa é a menor. — diz Yumi, encostada em um poste atrás da garota, com as mãos nos bolsos da calça jeans.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu tava acostumada com o revólver que ele me deu, mesmo não tendo atirado muito com ele... Pena que os satânicos pegaram. — ela observa a asiática por sobre o ombro. — Não tinham nenhum igual no arsenal daqui?

ㅤㅤㅤㅤ— Não que eu tenha visto. Procurei logo pela menor.

ㅤㅤㅤㅤ— Tá, então deixa eu acabar logo esse pente e aí a gente procura. Quero começar a pegar armas mais difíceis logo.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu te ajudo a procurar, mas sobre usar armas maiores, melhor ser com o Dylan. Ele até me falou algumas coisas antes, mas não me dou bem ainda — Yumi olha a garota se virar e voltar ao treino.

ㅤㅤㅤㅤApós mais alguns instantes se concentrando, Millie aperta o gatilho da pistola, acertando a cabeça do quarto boneco. Ela sorri orgulhosa e leva a mira até o próximo alvo, agora o acertando abaixo da última bola, o desmontando por inteiro, fazendo seu sorriso sumir e ela adotar uma postura mais séria, findando por dar um disparo certeiro em seu último alvo.

ㅤㅤㅤㅤ— Realmente, desse jeito, você vai poder usar outras armas daqui uns dias. — a asiática caminha até Millie, que ejetou o pente da Beretta e se virar para ela.

ㅤㅤㅤㅤ— Aham. Vamos no arsenal agora?

ㅤㅤㅤㅤ— Vamos, aí a gente volta e faz mais bonecos de neve pra você matar.

ㅤㅤㅤㅤAs duas seguem até a saída do estacionamento, mas param de andar assim que escutam Jacob pedir para que o portão seja aberto, ação que é feita por Blake. Dentro de alguns instantes, a Chevrolet Silverado adentra nos limites da zona segura e segue para o prédio das clínicas.

ㅤㅤㅤㅤ— Eles trouxeram bastante coisa na caçamba, você viu? — Millie olha para Yumi e começa a correr para fora do estacionamento.

ㅤㅤㅤㅤ— Não apenas isso... — a asiática segue o veículo com os olhos, vendo além das caixas presas com cordas, uma pessoa com a cabeça coberta por um saco de pano e que parece estar amarrada.

ㅤㅤㅤㅤDylan para a caminhonete na entrada do edifício Abraham é o primeiro a desembarcar pela porta traseira, já se encaminhando à caçamba, se apoiando no pneu para subir e alcançar o garoto amarrado.

ㅤㅤㅤㅤ— Pra onde eu levo ele? — indaga o gângster.

ㅤㅤㅤㅤ— Tranca no subsolo; na sala das caldeiras. — Dylan fecha a porta do veículo no mesmo instante em que Max desce.

ㅤㅤㅤㅤ— Beleza, depois eu venho pra ajudar a tirar as coisas e ver o que fazemos com ele. — Abraham guia o jovem e o tira da caçamba. — Vem, garoto — e o leva para dentro do edifício.

ㅤㅤㅤㅤ— E o que vamos fazer com ele? — Max termina de amarrar seu cabelo e para ao lado do policial.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu não sei, ele não nos disse muitas coisas ainda.

ㅤㅤㅤㅤ— Dylan!! — Millie eleva a voz enquanto corre até a caminhonete. Yumi vem mais atrás, andando apressada.

ㅤㅤㅤㅤ— Vou logo tirando as coisas mais leves. — a morena caminha até a caçamba e sobe na mesma igual Abraham fez.

ㅤㅤㅤㅤ— Ei, quem era aquele cara? — a jovem para na frente de dele, respirando forte.

ㅤㅤㅤㅤ— Uns problemas que tivemos em Dimper, o trouxemos por falta de opção, mas vamos ver no que isso vai dar — Dylan responde e começa a desatar alguns dos nós que prendem as caixas de suprimentos.

ㅤㅤㅤㅤ— satânicos? — ela o olha preocupada.

ㅤㅤㅤㅤ— Aparentemente não, mas não sabemos com certeza. Eles usavam aqueles casacos grandes, mas talvez parem com a primavera chegando.

ㅤㅤㅤㅤ— Entendi... Tomara que seja só um desconhecido — Millie abre o zíper do seu moletom. — Mas tirando isso, até que vocês foram bem. Oi, Max. Desculpa não ter falado antes.

ㅤㅤㅤㅤ— Tudo bem, Millie. — Max sorri para a menina. — E sim, a gente conseguiu bastante coisa.

ㅤㅤㅤㅤ— Aí, o Butch saiu pra caçar. Achei que devia saber logo. — Yumi finalmente chega nos demais, parando próxima a Dylan.

ㅤㅤㅤㅤ— Ok, ele só vem fazendo isso ultimamente. Que pelo menos traga algo maior do que coelhos dessa vez. — ele termina de soltar as cordas. — Podem ajudar aqui? Pra irmos mais rápido.

As horas passaram mais rápido depois que os sobreviventes voltaram a se encontrar todos na Universidade Webber, até Butch, que retornou da sua "caçada", conseguindo trazer um filhote de cervo que abateu durante seu regresso e, assim como os demais, foi informado sobre a presença do jovem até então, desconhecido. Após os residentes terminarem de organizar os suprimentos, Dylan chamou Abraham, Yumi, Blake e Max para irem até a sala das caldeiras interrogar o jovem, movimento este que foi visto e anotado mentalmente por Butch, que não deixa de pensar no discurso que Jenny deu para explicar o seu papel nos planos de Lúcios.

ㅤㅤㅤㅤAlém de interrogá-lo, o quinteto também levou um pouco de comida para seu prisioneiro, a fim de tentar convencê-lo de que eles não pretendem lhe fazer nenhum mal — de imediato.

ㅤㅤㅤㅤ— Ok, seu nome é Oliver, certo? Agora pode nos falar exatamente de onde veio e como conheceu os outros dois? — pergunta Dylan, apoiando em uma caixa vermelha onde é guardada uma mangueira de incêndio. A luz do recinto vem de lanternas que eles trouxeram e colocaram em locais estratégicos.

ㅤㅤㅤㅤ— Olha, senhor, eu disse que tava com eles pra não ficar sozinho, isso porquê meu grupo perdeu muita gente no inverno. Alguns morreram, outros falaram que iam embora e outros nem falaram — o jovem explica e limpa a boca usando a manga da sua jaqueta de couro preta.

ㅤㅤㅤㅤ— E você foi o único que restou? — pede Abraham, de braços cruzados, mas com sua M-16 nas costas.

ㅤㅤㅤㅤ— Na verdade, eu fui um dos que nem falaram que iam embora. Mas eu me arrependi e voltei pra onde era o acampamento. — Oliver abaixa a cabeça. — Os que restaram haviam desmontando as tendas e ido embora.

ㅤㅤㅤㅤ— E como conheceu o Conrad e a Jéssica? — Max está sentada sobre uma caixa de metal, ao lado de Yumi.

ㅤㅤㅤㅤ— Na floresta. Eles me salvaram de um três mordedores e mesmo sendo meio cuzões, ainda eram companhia.

ㅤㅤㅤㅤ— Você sabe algo sobre um grupo que anda por aí vestido de branco e falando sobre seguir um tal de Lúcios? — Blake exibe sua M-4 nos braços.

ㅤㅤㅤㅤ— Não, senhor. Eu não sou dessa área, vim de New Greenfield — diz Oliver, fitando o militar.

ㅤㅤㅤㅤ— Tá bem longe de casa... — comenta Dylan, se virando e indo em direção à porta, chamando os demais. — Fica aí.

ㅤㅤㅤㅤ— Sim, senhor.

ㅤㅤㅤㅤDo lado de fora da sala, o quinteto ainda se afasta mais alguns metros e quando estão a uma distância boa, começam a debater sobre o destino de Oliver enquanto são iluminados pela lanterna de Yumi:

ㅤㅤㅤㅤ— Olha, eu acho que o depoimento dele é válido. Nem todo mundo que tá lá fora é satânico — declara a asiática, se encostando na parede.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu tenho minhas dúvidas sobre ele ser ou não de boa índole, mas eu senti umas verdades naquele discurso — comenta Abraham. — A gente pode ficar de olho nele aqui.

ㅤㅤㅤㅤ— Deixamos ele num lugar longe de onde dormimos e todo mundo tranca as portas por um tempo. Ele não tem armas e nem sabe onde conseguir uma aqui. — Blake se encosta na parede, próximo de um extintor.

ㅤㅤㅤㅤ— É bom deixar ciente que nós não confiamos nele plenamente — Dylan acrescenta e mantém a destra sobre a Desert Eagle. — E que ele vai ter que ajudar com as coisas aqui.

ㅤㅤㅤㅤ— Ele interagindo, já vai dar pra conhecer e analisar ele melhor. Eu posso explicar as coisas daqui. — completa Max.

ㅤㅤㅤㅤ— Unânime então? — Abraham olha os demais. — Beleza, eu vou avisar o resto do pessoal sobre trancar as portas. O resto é com vocês. — e se vira, seguindo para as escadas, mas sendo seguido pelos demais.

ㅤㅤㅤㅤYumi dá sua lanterna para o homem e entra novamente na sala com os outros. O gângster, por sua vez, segue rumo às escadas que levam ao piso térreo, iluminando o caminho adiante, não percebendo de modo algum, a presença de mais um indivíduo nos corredores frios. Quando ele enfim chega nos degraus, a luz da lanterna some conforme ele sobe e alguns instantes após tudo ficar um breu, Butch acende o isqueiro que pegou de Jonny e o usa para de guiar pelos corredores.

Com o cair da noite, os sobreviventes — agora com a companhia de Oliver — se reuniram para jantar e depois começaram a se dividir para irem aos dormitórios ou, como é o caso de Dylan, ir para os muros fazer o primeiro turno da vigia que será dividida com Thomas depois das duas da manhã. O período noturno traz consigo o frio que não é sentido durante o dia e o policial vê sua respiração virar fumaça enquanto caminha pelo adarve, segurando sua M-4 com as mãos enluvadas. Olhando constantemente para a floresta escura do outro lado da estrada, Dylan tem sua atenção fisgada pelo som de passos vindos por entre as árvores e para de andar, procurando a origem do barulho, forçando sua vista.

ㅤㅤㅤㅤApós mais alguns instantes, ele consegue ouvir grunhidos agudos ficando cada vez mais altos e, emergindo da floresta, sai uma sangrenta cambaleante e com o cabelo cheio de neve, se apressando e rosnando assim que percebe o humano acima do muro. Dylan, por sua vez, leva a mira do fuzil ao olho direito e quando enquadra a cabeça da infectada, aperta o gatilho uma única vez, escutando o barulho do disparo ser abafado pelo silenciador, seguido pelo da cabeça da mulher ser perfurada e o sangue jorrar no asfalto antes do cadáver cair.

ㅤㅤㅤㅤLevemente aliviado por se tratar de um reanimado, o policial nem desconfia que, da mesma floresta, há uma fatídica pessoa lhe observando por um binóculo de visão noturna. E esse homem de topete sorri consigo mesmo.

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