Chào các bạn! Vì nhiều lý do từ nay Truyen2U chính thức đổi tên là Truyen247.Pro. Mong các bạn tiếp tục ủng hộ truy cập tên miền mới này nhé! Mãi yêu... ♥

.1:

O sol se tornou um implacável inimigo assim que a primavera alcançou o seu auge. Altas temperaturas castigam as terras que embora estejam verdejantes, se transformaram em grandes cemitérios à céu aberto, seja para cadáveres ambulantes que perecem por não terem achado sua principal fonte de comida, ou para a comida em si, que por sua vez, também morre — de fato — pela fome. Nesse cenário agressivo, água e comida se tornaram o principal recurso a ser procurado, ainda mais para um grupo grande e que faz uma viagem grande. E infelizmente, para eles, as coisas não caminham para bons rumos.

ㅤㅤㅤㅤTendo que racionar os poucos suprimentos que restam, o grupo que partiu de Daywake já se vê dividido entre aqueles que querem parar em qualquer lugar e torná-lo um lar, contra os que querem seguir viagem. Naturalmente, Cameron quer a todo custo chegar ao Porto de Myev. Já a outra parte, liderada por Abraham, quer parar na cidade mais próxima e se instalar por lá. Entretanto, há um único empecilho nisso tudo: a próxima parada do grupo trata-se de Denverport. A capital que fora arrasada por um bombardeio incendiário nos primeiros dias do apocalipse sangrento.

ㅤㅤㅤㅤDylan é um dos poucos que se declararam neutros, embora tenha assumido mais uma postura de líder nos últimos dias — o que vem lhe trazendo muito estresse. Entretanto, ele conseguiu um raro momento de paz, às margens de um riacho. Agachado sobre a terra fofa, ele enche as garrafas e cantis do grupo. Debaixo da copa de uma árvore e aproveitando a brisa, o antigo policial da cidade grande escuta o canto de alguns pássaros, mas isso não o faz deixar de ficar alerta com qualquer movimentação indesejada.

ㅤㅤㅤㅤEnquanto espera, ele observa seu reflexo na água. A barba maior, os cabelos novamente chegando aos olhos, as marcas de expressão que o tempo e as noites mal dormidas estão deixando em seu rosto; essas coisas o fazem suspirar ao pensar em tudo o que já passou com o grupo e no que ainda os espera. Mas, pelo menos naquele momento, ele pode fingir que nada daquilo existe.

ㅤㅤㅤㅤQuando a última garrafa é cheia, ele se levanta e resmunga por causa do desconforto em sua perna direita após todo o tempo em que seu peso permaneceu sobre ela. Soltando o ar pela boca, ele aproxima o gargalo da garrafa da sua boca, mas antes que o mesmo encostasse, sua atenção é atraída para bolhas que surgem do fundo do riacho. Estranhando o acontecimento, ele logo é tomado por decepção quando um braço decomposto e inchado emerge para superfície. Dylan olha para todas as garrafas que já havia enchido e depois para a que está na sua mão, a soltando.

— Tá certo, a gente conseguiu achar umas coisas por aqui. Deve dar pra uns três, quatro dias, se tivermos sorte. — Abraham olha os arredores do estacionamento repleto de papéis velhos, caixas amassadas e restos mortais de animais e pessoas já fossilizados pelo sol. — Nos encontramos no A no fim do dia. Câmbio final. — ele desliga o walkie-talkie e suspira, olhando os dois engradados com enlatados, caixas de cereal e frascos de conservas. Nenhum deles aparenta ser novo, mas estão todos dentro da validade, que é o realmente importante nesse caso.

ㅤㅤㅤㅤMais ao fundo, ao lado de uma SUV cuja a frente está colada à traseira de um Honda Civic, Jason tenta sugar as últimas gotas de gasolina que estão dentro do tanque. O ex-policial de Clerittown leva a mangueira até à boca e inicia a sucção, parando assim que vê o líquido âmbar saindo do tanque e então mira em um galão laranja aos seus pés.

ㅤㅤㅤㅤ— Aí! Achei gasosa! — ele comemora enquanto olha na direção de Abraham, mas logo sua alegria some quando o som do combustível caindo dentro do galão cessa. — Caralho...

ㅤㅤㅤㅤ— Não comemora antes da hora... essas coisas acontecem. — Abraham empilha os engradados e se dirige até o companheiro. — Conseguiu quanto? Pelo menos meio-litro?

ㅤㅤㅤㅤ— Porra nenhuma. — Jason se levanta e tira a mangueira da SUV. — Deve ter nem metade disso aí que você disse. Espero que os outros tenham tido mais sorte.

ㅤㅤㅤㅤ— Bom, agora é só esperar o Dylan com a água e-- — antes que chegasse nos veículos, ele escuta a vegetação atrás dos alambrados do estacionamento se mexendo e vira o corpo rapidamente, colocando os suprimentos no chão. Jason já se posicionou ao seu lado, sacando a M1911 do coldre e mirando nos arbustos.

ㅤㅤㅤㅤAmbos abaixam suas armas assim que identificam Dylan surgindo em meio ao verde e se dirigindo até a abertura nas cercas que usou anteriormente, quando disse que iria atrás de água no riacho que haviam encontrado no mapa. Entretanto, a dupla rapidamente nota que ele está de mãos abanando, sendo que quando saiu, levava consigo várias garrafas e cantis.

ㅤㅤㅤㅤ— Quê que houve? Você não tinha ido atrás de água? — indaga Jason, com o cenho franzido.

ㅤㅤㅤㅤ— Quando enchi a última, um sangrento saiu do riacho. Por pouco eu não bebi... vai saber o que no que poderia ter dado. — ele suspira e tira sua mochila das costas, alongando os ombros.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah puta que pariu! — Jason dá um soco no ar e se vira, esfregando a palma esquerda no cabelo.

ㅤㅤㅤㅤ— Deus cagou no nosso jantar de novo, pelo visto. — Abraham baixa a cabeça.

ㅤㅤㅤㅤ— Não ia dar nem pra aproveitar as garrafas. Com certeza estavam contaminadas e ferver a água não é uma opção. — Dylan olha para os engradados. — Pelo menos aqui não foi tão ruim.

ㅤㅤㅤㅤ— Mas ainda tá longe de ser bom. — encarando o amigo, o gângster se agacha e pega uma das caixas de plástico. — Pega a outra, vamos voltar.

ㅤㅤㅤㅤ— E, de novo, torcer pros outros terem tido mais sorte. — visivelmente chateado, Jason recolhe o galão e o trio deixa o estacionamento.

***

Atravessando uma faixa de pedestres como se fosse uma pessoa normal, um solitário sangrento grunhe olhando para baixo e deixando a bile escura da sua boca rodeada de sangue pingar sobre os trapos que um dia foram suas roupas. Pedaços de carne estão presos em seus dentes e, na mão esquerda, ele segura o que parece ser a cabeça de um animal tão mutilada, que não é possível para Amy Foster identificar a espécie. A jovem de cabelos castanhos apenas segue mantendo a respiração presa e dispara a flecha em seu arco, vendo-a viajar rapidamente e atingir o morto-vivo acima do olho esquerdo. A criatura solta sua caça e desaba sobre o asfalto, antes que pudesse chegar à calçada.

ㅤㅤㅤㅤ— Belo tiro. — encostada na lataria do Wolksvagem Jetta cinza onde Amy subiu no teto, Ashley fica de braços cruzados, montando vigia com a mais nova, em um bairro que nós tempos pré-praga, era composto por moradores de alto padrão, dadas as estruturas das casas rodeadas por jardins.

ㅤㅤㅤㅤ— Obrigada. — Amy salta do automóvel e caminha até o cadáver, para pegar sua flecha novamente. — Acha que eles vão demorar muito? — a jovem pisa no crânio do errante e puxa o virote.

ㅤㅤㅤㅤ— Espero que não. Por enquanto, tá tudo tranquilo, mas não sabemos quando as coisas podem ficar complicadas aqui... a gente não vê mais muitas pessoas vivas há um tempo, e acho que os mortos também não. — Ashley para um pouco e começa a divagar. — É como se eles soubessem de longe que tem pessoas por perto e começassem a vir aos montes.

ㅤㅤㅤㅤ— Por isso que não quero que eles demorem muito... — Amy retorna até a loira, guardando a flecha na aljava em suas costas e passando o arco sobre o ombro.

ㅤㅤㅤㅤ— É... — a mulher umedece os lábios. — Aí, posso te fazer uma pergunta? — e olha para a mais nova.

ㅤㅤㅤㅤ— Claro. — Amy se mantém atenta, olhando em várias direções do bairro residencial.

ㅤㅤㅤㅤ— O Dylan conversa com você sobre como ele tá?

ㅤㅤㅤㅤ— Como assim? — ela se volta para Ashley, franzindo o cenho.

ㅤㅤㅤㅤ— Sobre a Aurora — acrescenta. — Ela virou a minha melhor amiga depois que a Max morreu e eu sabia que os dois se gostavam. Bom... quem não sabia, né? — ela olha para a jovem. — Me preocupa como ele possa estar, pois ele não é de falar muito... E eu me preocupo também porque... sei lá, ele parece mais fechado e sério desde que deixamos Daywake. E isso já faz semanas...

ㅤㅤㅤㅤ— Eu percebi isso e ele realmente não fala nada sobre. — Amy comprime os lábios e solta o ar pela boca. — O Dylan tem um jeito próprio de lidar com as coisas. Ele não comenta. Diz que se lembrar o faz pensar em coisas que poderia ter feito, mas que agora não servem de nada.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah, entendo... — a loira desvia o olhar, pensativa.

ㅤㅤㅤㅤ— Mas se quer uma resposta mais direta, eu acho que ele tá bem, apesar dessa postura. Deve ter superado o luto... ou só tá sabendo esconder ele muito bem.

ㅤㅤㅤㅤ— Espero que ele tenha superado. Ele é muito importante pra esse grupo.

ㅤㅤㅤㅤ— Mesmo não admitindo, ele sabe disso. — a caçula Foster torna a observar os arredores. — É só ele continuar fazendo as coisas certas.

ㅤㅤㅤㅤ— Claro. — Ashley começa a pensar em um novo assunto para passar o tempo, mas logo é alarmada pelo som de disparos não muito distantes de onde elas estão.

ㅤㅤㅤㅤ— Merda — diz Amy. — Deve ser a Lydia e os outros! — a moça começa a correr pela calçada, tirando o arco do corpo. Ela escuta Ashley pedindo-a para esperar, mas não atende e olha por cima do ombro, vendo a loira também se pondo a correr.

ㅤㅤㅤㅤAsh rapidamente alcança a irmã de Dylan e as duas se movimentam o mais rápido que podem, desviando de sacos de lixo e alguns carros abandonados já desde que o apocalipse se iniciou. As duas adentram em um beco entre duas casas, mas cessam o avanço assim que veem o aglomerado de sangrentos logo atrás de Lydia, atirando com uma Vector.

ㅤㅤㅤㅤ— Mas que porra! — pragueja Amy, erguendo seu arco e disparando a flecha, que passa entre Millie e Cameron, atingindo o meio da testa de uma mulher de cabelos acinzentados devido à sujeira.

ㅤㅤㅤㅤ— Voltem pro furgão, depressa! — ordena Thomas, se juntando às garotas. — Lydia, vambora!! — o homem ergue a Beryl nos braços e dispara contra as pernas dos primeiros infectados, os fazendo caírem e se tornando obstáculos para os que estão logo atrás.

ㅤㅤㅤㅤMillie chega onde eles estão logo depois de Cameron e olha para trás, esperando Lydia. Enquanto isso, Amy se volta para o caminho que fez com Ash e pode ver que mais andarilhos estão surgindo de dentro das casas e de seus jardins.

ㅤㅤㅤㅤ— Eles tão saindo do nada! — a moça troca seu arco pela CZ-75 que Yumi lhe emprestou. Ela se põe a correr com o grupo assim que Lydia se junta a eles.

ㅤㅤㅤㅤ— Todos esses tavam juntos num quintal — explica Thomas, com o fuzil nos braços. — Cameron abriu a portão rápido demais e fomos notados.

ㅤㅤㅤㅤ— Cuidado!

ㅤㅤㅤㅤA voz do próprio Cameron os alerta e a equipe imediatamente cessa a fuga, vendo que estão de frente para outra massa de canibais nos mais variados estados de decomposição, mas todos famintos pela carne humana fresca.

ㅤㅤㅤㅤ— Filhos da mãe...! Atirem! — Thomas é o primeiro a abrir fogo contra as criaturas, agora mirando em suas cabeças. Com tiros cadenciados, ele consegue abater cinco deles sem maiores problemas.

ㅤㅤㅤㅤLydia o ajuda a lidar com os da frente, trocando o modo de disparo da Vector para tiro único e mantendo o máximo da calma para não desperdiçar nenhum dos escassos cartuchos de munição que eles dispõem. Cameron e Ashley, com suas pistolas, cuidam dos mortos que emergiram de uma pequena floresta que envolve uma aconchegante praça que fora muito usada pelos moradores do bairro, mas agora está abarrotada de restos mortais que perderam o interesse dos errantes para o grupo de sobreviventes. Já Millie e Amy cuidam da retaguarda e a garota se sai muito bem com a Python em mãos, eliminando com tiros certeiros três sangrentos.

ㅤㅤㅤㅤ— À esquerda! — a menina avisa para Amy e vê a moça de imediato, girar o corpo onde lhe foi apontado e apertar o gatilho, dando cabo do canibal que, em vida, provavelmente era um membro de cúpula política, dado ao fato dele estar usando uma faixa com as cores da bandeira americana — ou não passava de alguém fantasiado.

ㅤㅤㅤㅤ— Eles tão aparecendo mais rápido do que a gente tá conseguindo matar!! — Cameron exclama bastante alarmado e assustado com a situação em que eles estão.

ㅤㅤㅤㅤ— Relaxa, a gente vai dar um jeito! — Lydia troca o cartucho da submetralhadora expressando confiança, mas no fundo, ela está com bastante medo também.

ㅤㅤㅤㅤ— Só queria a porra do furgão aqui. — Thomas avança contra uma sangrenta sem a mandíbula e sob um grito de alarde por parte de Ashley, afunda a coronha da Beryl em seu rosto, arrancando-lhe seu único olho.

ㅤㅤㅤㅤEles estão ficando sem opções a medida em que o número de errantes sedentos aumenta. Amy se pergunta o tempo inteiro de onde tantos deles saíram em tão pouco tempo, ainda não tendo se acostumado com essa peculiaridade que os sangrentos têm de se multiplicarem do nada. Entretanto, seus pensamentos são interrompidos por um som de disparo vindo de bem perto de onde eles estão e se vira para um alambrado coberto por trepadeiras, que separa um terreno mais elevado do bairro. Mas ela e nem nenhum dos outros têm tempo para comemorarem o fato de estarem sendo salvos por rostos conhecidos. Os problemas ainda não terminaram.

ㅤㅤㅤㅤ— Pai!! — Millie é a primeira a avançar até o alambrado, no momento em que vê Dylan, Abraham e Jason disparando nos sangrentos, abrindo um caminho para eles.

ㅤㅤㅤㅤAshley e Lydia vão logo em seguida, disparando os tiros que ainda restam em suas armas, tendo Thomas, Cameron e Amy fechando a fila.

ㅤㅤㅤㅤ— Me dá sua mão!! — de cima do alambrado de pouco mais de dois metros, Jason estende a destra para Millie e se surpreende com o salto que a menina dá, escalando as grades e segurando sua mão com força. Ele rapidamente ajuda a menina a pular a armação de ferro.

ㅤㅤㅤㅤ— Ashley! — Dylan chama a mulher e ela também escala a estrutura, não tão habilmente quanto Millie, mas consegue segurar firme o pulso dele e ser salva pelo mesmo.

ㅤㅤㅤㅤThomas, Cameron e Lydia sobem por conta própria e atravessam a grade, pousando do outro lado e vendo as caixas com suprimentos que os três cuidaram de manter por perto.

ㅤㅤㅤㅤ— Vem, Amy! Vamos! — Dylan sobe novamente na grade e estica o braço, segurando a manga da blusa da irmã antes que ela pudesse até mesmo o olhar. A caçula Foster ainda consegue sentir alguns dedos podres roçarem em seus tornozelos antes que seu irmão a puxe para o lado seguro das cercas.

ㅤㅤㅤㅤ— Caralho... essa foi por pouco. — Jason arfa e observa os canibais se amontoarem nas grades.

ㅤㅤㅤㅤ— Tá todo mundo bem? — Abraham olha para os demais, guardando sua Taurus no coldre.

ㅤㅤㅤㅤ— Só com a adrenalina a mil... — Ashley apoia as mãos nos joelhos, ofegante.

ㅤㅤㅤㅤ— Então vamos aproveitar e voltar pro furgão. Antes que o peso deles derrube as grades. — Dylan ajuda Amy a levantar e caminha até os engradados. Thomas também ajuda a carregar os suprimentos e logo todos se afastam do alambrado que começa a balançar com a massa morta que o empurra.

O trajeto que se seguiu mostrou-se bem mais tranquilo em comparação com as adversidades que eles enfrentaram minutos atrás, mas isso não significa em momento algum que os sobreviventes estão em segurança. Apenas alguns momentos após se reunirem, eles já se viram sendo perseguidos por uma nova horda de canibais, mas que estão mais afastados e, por hora, não representam nenhum perigo. Entretanto, Dylan e Abraham se recusam a diminuir o ritmo, ainda mais agora que os suprimentos foram divididos entre as mochilas.

ㅤㅤㅤㅤ— É sinistro ter tantos deles nos seguindo. — Thomas olha as filas de canibais por cima do ombro. Ele está carregando os engradados vazios.

ㅤㅤㅤㅤ— Parecem tietes. — Jason ri anasalado e olha o colega. — Imagina só? Somos uma banda de rock mundialmente famosa e eles são nossos fãs. Nos seguindo pra cima e pra baixo.

ㅤㅤㅤㅤ— Você viaja na maionese, ein? — Lydia o encara de soslaio. A bandoleira da Vector está atravessada em seu torso e a mulher apoia as mãos na arma.

ㅤㅤㅤㅤ— Você se acostuma. — Amy caminha olhando sempre para a frente. O arco já com uma flecha está pronto em suas mãos.

ㅤㅤㅤㅤ— A pequena Foster também vivia revirando os olhos. E hoje ela sempre ri, né não, Amy? — Jason mantém seu bom-humor, se atentando às costas da mulher.

ㅤㅤㅤㅤ— Foco. — Dylan enfim se pronuncia. — Ainda não estamos em hora de fazer piadas. — ele ajeita a AUG nos braços e avista o estacionamento de uma pequena clínica onde eles deixaram a Ford E-350.

ㅤㅤㅤㅤ— Sempre cortando o meu barato... — Jason finge chateação.

ㅤㅤㅤㅤ— Cala a boca, Jason — Millie fala o encarando por cima do ombro. — Pelo menos por agora, só fala se for algo útil.

ㅤㅤㅤㅤO tom de Millie chama a atenção de todos, principalmente de Amy e Dylan, que assim como os demais, ficam em silêncio. Os grunhidos ainda distantes dos sangrentos são o único som — além dos passos dos sobreviventes — audíveis.

ㅤㅤㅤㅤ— Foi mal, Mini-Foster, mas tenta levar na esportiva, só tô descontraindo.

ㅤㅤㅤㅤ— Para de me chamar assim, porra. Não tem ninguém achando graça! — a mais nova começa a se exaltar e vira-se para Jason, mas Dylan a segura pelo braço, fazendo-a parar de avançar na direção do outro policial.

ㅤㅤㅤㅤTodos cessam seu avanço.

ㅤㅤㅤㅤ— Não. — ele permanece sério mesmo sendo fuzilado pelo olhar de raiva da filha.

ㅤㅤㅤㅤ— Ei, ou! — Abraham os interrompe. — Cacete, temos um monte de mortos nos seguindo e mais outro monte se juntando ali na frente. — ele aponta com o cano da M-16 para o estacionamento, onde um novo grupo de andarilhos começa a se reunir. — Deixem pra se bater depois!

ㅤㅤㅤㅤ— Não vamos ter paz nem por um minuto aqui? — Cameron baixa os ombros, claramente indignado com tudo aquilo.

ㅤㅤㅤㅤ— Paz hoje em dia só é privilégio só dos mortos. — Abraham agora corre até o estacionamento, sendo seguido pelos demais.

ㅤㅤㅤㅤ— A gente vai conversar depois — avisa Dylan para Millie, que o ignora e puxa seu braço, se soltando dele.

ㅤㅤㅤㅤA equipe se apressa enquanto a massa reanimada começa a ganhar mais tamanho. Os sangrentos saem de qualquer passagem por onde seus corpos putrefatos possam atravessar e alguns chegam até mesmo a empurrar inconscientemente os seus semelhantes. O clima quente contribui para que o cheiro nas ruas fique cada vez mais insuportável, mas os sobreviventes precisam ignorar esse fato e seguir em frente.

ㅤㅤㅤㅤDylan toma à frente dos demais e agarra o alambrado das cercas, no lugar onde Abraham havia aberto uma passagem com um corta-vergalhão e a abre, dando passagem aos demais.

ㅤㅤㅤㅤ— Vai, vai, vai!! — seu tom de voz cresce à cada ordem e rapidamente, Thomas, Cameron, Ashley e Abraham entram no perímetro.

ㅤㅤㅤㅤ— Amy, direita! — antes de passar, Ashley alerta a moça, que de imediato ergue o arco e dispara mais uma flecha contra um sangrento trajado com um terno esfarrapado. A ponta afiada atravessa entre seus olhos e joga a cabeça do canibal para trás, mas seu corpo cai para a frente, quebrando a flecha.

ㅤㅤㅤㅤ— Porra. — Amy lamenta pela flecha perdida, mas logo se reúne aos outros que já entraram, rumando até onde a E-350 foi deixada.

ㅤㅤㅤㅤAbraham e Cameron são os primeiros a alcançarem o furgão cinza e enquanto o gângster avança à porta do motorista, o mais jovem abre as duas localizadas na parte de trás e joga a sua mochila dentro junto com sua arma, se assustando quando, à sua esquerda, três sangrentos com uniformes azul-marinho idênticos surgem por uma saída de emergência localizada bem próxima e avançam rapidamente até o furgão.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah cacete!! — sem nada para se defender ele segura o primeiro sangrento pelo traje hospitalar e se sai bem, mantendo o equilíbrio, além das suas roupas impedirem que as unhas da criatura o firam. Entretanto, ele pode sentir o hálito asqueroso da criatura invadir suas narinas e quase o desnortear, mas os sons de dois disparos o mantém lúcido.

ㅤㅤㅤㅤEle é salvo quando Millie — que conseguiu se adiantar muito mais que os outros — agarra o enfermeiro pelo ombro e salta, cravando a lâmina do seu canivete no topo da sua cabeça, o matando. Os três quase caem, mas a adolescente se livra do cadáver e Cameron consegue o jogar.

ㅤㅤㅤㅤ— Porra... Muito obrigado. — ele olha para Millie, com o coração acelerado.

ㅤㅤㅤㅤ— Fica mais atento — a menina diz apenas isso e embarca no furgão, que já foi ligado por Abraham.

ㅤㅤㅤㅤThomas embarca no banco do passageiro enquanto Lydia, Ashley, Jason e Dylan sobem na traseira e de lá, podem ver de que alguma forma, os sangrentos conseguiram acesso ao pátio do estacionamento e, agora em um número muito maior do que antes, caminham com seus passos trôpegos até a E-350, mas Abraham engata a primeira marcha e faz o furgão cantar pneus, em uma clara mensagem de que eles nunca serão alcançados pelos comedores de carne.

***

Não há nenhuma nuvem no céu que sirva de sombra na superfície escaldante, obrigando os sobreviventes a improvisarem como podem. Felizmente, há alguns dias, eles conseguiram um achado que se mostrou valioso nessa época quente: uma tenda simples, mas que faz uma sombra convidativa para que Yumi e Sarah possam ficar com o mínimo de conforto, sentadas em coolers vazios enquanto esperam pelo retorno do seu pessoal.

ㅤㅤㅤㅤ— O Kelly tá demorando demais. — a militar apoia o queixo sobre a coronha da Scar-L, olhando mais à frente, onde Downs, Mia e Alex estão vasculhando um acidente que envolveu três veículos.

ㅤㅤㅤㅤOs sobreviventes que ficaram esperando, pararam e montaram a “base” em um anel viário que leva a três caminhos distintos, sendo que um deles leva para as montanhas de Spring Valley, a rota mais rápida que eles podem seguir. Pelos rádios, Mia já havia reportado a Dylan sobre o lugar e os dois combinaram de traçar a rota quando estiverem reunidos. Há pouco, a militar trocou novas conversas com ele, sendo informada de que eles estão retornando.

ㅤㅤㅤㅤ— Preocupada que tenha acontecido algo com ele? — indaga Yumi, sentada com as costas na lataria da Chevrolet Epxress e com as pernas cruzadas sobre dois engradados vazios empilhados. — Acho difícil alguém derrubar ele.

ㅤㅤㅤㅤ— E é... — Sarah faz uma pausa. — Dependendo da pessoa. — suspira. — O que me preocupa é aquela Elizabeth. Não vou com a cara dela por--

ㅤㅤㅤㅤ— Porque ela implica com o Jason. — Yumi sorri. — todo mundo sabe.

ㅤㅤㅤㅤ— É... e ela se engraça pro Kelly. Não duvido que ela tente fazer a cabeça dele ou algo do tipo.

ㅤㅤㅤㅤ— E você se preocupa que ele deixe uma amizade de... sei lá, quase um ano, por um namoro de um mês? — a asiática arqueia a sobrancelha, olhando a outra mulher de soslaio.

ㅤㅤㅤㅤ— Não, o Kelly não é disso... só não gosto da Elizabeth mesmo.

ㅤㅤㅤㅤ— Então, pô. Não se preocupa com isso. E se o Kelly realmente preferir um rabo de saia, quem vai sair perdendo é ele mesmo.

ㅤㅤㅤㅤ— Você tem razão. Nem sei por que me preocupo tanto com isso. — Sarah fecha os olhos e leva a destra à têmpora, massageando a região. — Esse calor deve tá cozinhando os meus neurônios.

ㅤㅤㅤㅤ— Os de todo mundo... — Yumi passa a mão em seu pescoço e depois na calça, enxugando o suor. — Stella, cadê os leques que você prometeu?

ㅤㅤㅤㅤSentada sobre um cobertor no assoalho do furgão, Stella dobra folhas de papel várias vezes na horizontal, fazendo pequenos leques para que os sobreviventes possam se refrescar de alguma forma. Embora o interior do veículo esteja mais quente do que do lado de fora, a pequena de cabelos escarlates amarrados acima da cabeça parece não se importar e continua focada em seu serviço.

ㅤㅤㅤㅤ— Tô quase acabando, tia Yumi. — a voz da criança é alta o bastante para que as duas escutem. A pequena termina de abrir os papéis e dobra uma ponta, terminando seus leques. Sorrindo, ela se levanta já com os dez em mãos e salta para fora do furgão, indo para onde estão as duas mulheres. — Aqui.

ㅤㅤㅤㅤ— Ain, eu tava quase derretendo aqui, Stella. — Sarah se levanta e vai até a criança, que escolhe o leque vermelho para ela. — Muito obrigada.

ㅤㅤㅤㅤ— De nada. — com um largo sorriso, ela separa um de cor azul e entrega para Yumi. — Vou dar um pra minha mamãe e os outros.

ㅤㅤㅤㅤ— Tá bem, só-- — Yumi é interrompida quando o som de motor ao longe chega aos seus ouvidos, fazendo-a se levantar rapidamente.

ㅤㅤㅤㅤ— São eles? — Sarah cata a Scar-L e põe a canhota gentilmente no ombro de Stella, levando a pequena para trás de si.

ㅤㅤㅤㅤRetornando dos veículos acidentados, Downs alerta Alex e Mia sobre o som e os três se apressam para chegar na tenda já com suas armas em mãos. Todos permanecem atentos e com os dedos nos gatilhos. Felizmente, parte da tensão logo é afastada quando eles avistam a E-350 surgindo em uma curva. Ela estaciona próximo do terceiro veículo do grupo: uma caminhonete Toyota Tundra modelo 2010, com cabine simples e uma grande caçamba que guarda as barracas desmontadas e boa parte dos equipamentos que eles têm. Os ocupantes do furgão começam e descer e Stella solta os leques, correndo na direção de Abraham:

ㅤㅤㅤㅤ— Papai! — a pequena ri e a regata que nela mais parece um vestido esvoaça com o vento. Ela salta quando está bem próxima de Abraham, que havia se curvado para receber o abraço da filha.

ㅤㅤㅤㅤ— Oi, meu anjo. — o homem sente os braços dela apertarem em volta do seu pescoço. — Você cuidou bem do nosso fort?

ㅤㅤㅤㅤ— Aham, eu fiz leques pra gente.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah, sério? Não sabe como eu tô morrendo de vontade de me abanar.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu abano você, papai. — ainda sorrindo, ela o abraça novamente.

ㅤㅤㅤㅤAbraham caminham com Angel no colo, indo na direção de Alex. Os sobreviventes que chegaram começam a se espalhar e são recebidos pelos demais. Lydia mal tem tempo para se esticar e já é agarrada por Yumi, retribuindo o abraço e lhe correspondendo também com um beijo. Jason e Sarah também fazem o mesmo, com a militar logo comentando sobre a ausência de Kelly. Todos escutam também.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah, amor. Relaxa. O Kelly tá tran… — Jason iria completar a frase, mas se lembrou de Stella, que está o olhando. — Eh... — ele sorri, nervoso. — Vocês sabem. — e põe as mãos na cintura, dando de ombros. — Curtindo a vida.

ㅤㅤㅤㅤ— Contanto que eles voltem antes que alguém precise procurá-los, eles podem fazer o que quiser — diz Abraham, colocando Stella no chão. — Conseguimos alguns suprimentos, mas a água já era.

ㅤㅤㅤㅤA notícia dada por Abraham o faz virar o centro da atenção de vários olhares preocupados. Amy e os outros que estavam na incursão e foram resgatados por ele, Dylan e Jason, sequer faziam ideia disso e por causa de toda a Adrenalina, não notaram a falta das garrafas e cantis no furgão.

ㅤㅤㅤㅤ— Quê? O que aconteceu? — Yumi o encara, surpresa.

ㅤㅤㅤㅤ— Tinha um morto na água — explica Dylan, tirando o cabelo grudado na testa suada. — O filho da mãe só levantou depois que eu tinha enchido tudo.

ㅤㅤㅤㅤ— E você não podia ter derramado a água e trazido as garrafas? — indaga Lydia.

ㅤㅤㅤㅤ— Isso não ia adiantar. — Cameron se pronuncia, surgindo atrás de Dylan. — Mesmo que lavássemos, elas ainda poderiam conter o vírus.

ㅤㅤㅤㅤ— E se fervêssemos? — indaga Downs.

ㅤㅤㅤㅤ— Seria perca de tempo por algo que não temos certeza de que ia funcionar. E mesmo assim, quem aqui iria ser o voluntário pra beber a água?

ㅤㅤㅤㅤTodos são obrigados a concordar com o argumento do jovem. De fato, as únicas coisas que eles têm certeza absoluta é de que não podem deixar nenhum tipo de fluido ou detrito dos sangrentos seja ingerido, e que eles estão sem uma gota de água para beberem. Um breve momento de silêncio entre o grupo pensante é rapidamente quebrado quando a vegetação à direita é empurrada. Sarah e Downs erguem suas armas, mas logo as abaixam assim que veem o braço musculoso de Kelly emergir do verde.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah, já estão todos aqui... — o gigante os observa, parecendo nervoso e envergonhado com tantos olhares. Logo atrás dele, surge Elizabeth, trajando uma blusa social amassada e sem mangas, com três botões abertos para arejar o corpo suado. — Conseguiram algo?

ㅤㅤㅤㅤO silêncio novamente recai sobre o grupo, agora sendo quebrado por Jason, com um sorriso no rosto:

ㅤㅤㅤㅤ— Nada que supere o que você conseguiu, camarada. — ele rapidamente desfaz o seu sorriso ao ser fuzilado pelo olhar de Elizabeth, que está com o rosto vermelho de raiva e vergonha. — Mas se estiverem cansados, só quero avisar que não temos água. — Sarah também olha seu parceiro com indignação e Dylan, Abraham, Lydia e Mia baixam a cabeça, sentindo uma enorme vergonha alheia.

***

Após um tempo dedicado a organizarem suas provisões, os sobreviventes se dividiram entre os veículos e o comboio segue viagem há quase duas horas pelas montanhas de Spring Valley, não conseguindo velocidades maiores do que 20 quilômetros por hora, por causa das subidas, descidas e curvas fechadas. Apesar da lentidão, esse é um dos raros momentos desde que deixaram Daywake, que a estrada está livre de veículos acidentados ou massas de sangrentos famintos. Se comunicando por walkie-talkies, Dylan, Abraham e Kelly trocam informações aos volantes e quando passam por uma placa indicando alguns povoados próximos e, entre eles, está o que dá nome à região. É nessa próxima parada, que o grupo tentará novamente decidir o que fazer. Abraham e Dylan seguem despreocupados, mas seus comunicadores começam a transmitir uma voz que os fazem respirar fundo.

ㅤㅤㅤㅤ— Se tem alguém me ouvindo, eu me chamo Jason Blaze... estamos no dia trezentos e alguma coisa do apocalipse e sobrevivendo. Têm sido dias mais difíceis ultimamente, mas eu e meus camaradas estamos seguindo em frente, dia após dia... — deitado no assoalho da E-350, com a cabeça sobre uma almofada velha e com as pernas para cima, rentes à lateral, Jason segura o walkie-talkie sobre o peito. Junto dele, estão Amy, Elizabeth, Mia, Ashley e Thomas, que ficam em silêncio.

ㅤㅤㅤㅤ— Cara... eu já te expliquei que esses rádios só se comunicam entre eles — Abraham fala um pouco alto, para que sua voz seja captada pelo aparelho deixado sobre o painel. — Você só tá gastando as pilhas e nossa paciência assim. — ele olha para o lado, onde Alex está sentada com Stella adormecida em seus braços, dentro da Express.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu disse pra ele! — declara Kelly, alto o bastante para que os outros dois escutem e Sarah, que estava ao seu lado, desperta do cochilo leve que estava tirando. — Mas esse puto pegou o rádio.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu poderia fazer ele nunca mais nem tocar nessa droga, mas vocês não deixam. — Elizabeth fuzila o acobreado com o olhar e Jason engole em seco.

ㅤㅤㅤㅤ— Nem pensa em tocar num fio de cabelo dele... — Sarah a repreende com voz de sono.

ㅤㅤㅤㅤ— Tá bom, tá bom. Eu paro... mas amanhã vai ter de novo. — Jason sorri, se sentando corretamente. — Tô quebrando o gelo, gente. Aliás, ô Dylan, quando a gente vai parar de novo?

ㅤㅤㅤㅤ— Só mais uns minutos — diz o policial, com o braço esquerdo apoiado no encosto da porta da Tundra. — Agora desliga isso e só usa de novo se for necessário.

ㅤㅤㅤㅤ— Ok, câmbio final.

ㅤㅤㅤㅤ— O Jason é muito irritante... — comenta Millie, após um curto som de estática encerrar a transmissão. — Parece que nunca para de falar... não sei como o pessoal do furgão já não jogou ele pra fora. — ela afasta o cabelo sujo para trás das orelhas.

ㅤㅤㅤㅤ— É só o jeito dele de levar as coisas.

ㅤㅤㅤㅤ— Mas isso irrita. — a menor se acomoda no banco e massageia as têmporas.

ㅤㅤㅤㅤ— O que tá acontecendo com você? — Dylan a olha pelo canto do olho. — Do nada começou a se aborrecer por pouca coisa.

ㅤㅤㅤㅤ— Sei lá… vai ver é a falta de comida descente. — ela suspira, cruzando os braços. — Ou o fato de que todos os MP3 da tia Amy descarregaram.
ㅤㅤㅤㅤ— Vamos achar comida--

ㅤㅤㅤㅤ— Para de ficar repetindo isso! — a menor o encara. — Eu sei que vocês tão o tempo inteiro tentando achar comida. Deixa esses discursos pro Abraham fazer com a Stella, tá bom? Eu entendo o que tá acontecendo, não preciso que me conte fantasias!

ㅤㅤㅤㅤ— Abaixa esse tom. — Dylan a encara e a menina imediatamente baixa a cabeça, se acomodando melhor no banco.

ㅤㅤㅤㅤ— Foi mal... — Millie respira fundo e levanta a cabeça. — Eu só… sei lá o que tá acontecendo comigo. Do nada eu tô puta e depois começo a achar bonito um pássaro cantando. Acho que tô ficando maluca.

ㅤㅤㅤㅤDylan fica em silêncio digerindo as informações que sua filha adotiva deu. Uma conclusão vem à sua mente e o preocupa de certa forma, mas no geral, pode ser algo bem-vindo para o crescimento da menina.

ㅤㅤㅤㅤ— Pai? — a voz dela o tira do transe.

ㅤㅤㅤㅤ— Hm? — ele nota o semblante de preocupação da garota.

ㅤㅤㅤㅤ— Você ouviu o que eu disse?

ㅤㅤㅤㅤ— Sim, sim... escuta, quando a gente parar, conversamos melhor sobre isso, tá bem? Aí posso prestar mais atenção.

ㅤㅤㅤㅤ— Ok...

A viagem segue sendo bastante tranquila e quando Dylan realiza mais uma curva fechada — quase como se estivesse fazendo um retorno —, ele pode ver um grande arco feito de pedras, com letras em metal prateado escrevendo “Spring Valley”. Outrora grande ponto turístico daquela região nos anos 90, devido a seus belos pontos de observação de toda a planície que separa as montanhas de Denverport, já vinha passando por uma má fase desde antes do apocalipse — e a praga veio apenas para fechar com o último prego, o caixão daquele lugar.

ㅤㅤㅤㅤRepassando para os demais, Dylan reduz a velocidade da caminhonete e a para na frente de uma pequena loja de presentes que está com a vidraça espalhada na calçada e todo o seu estoque foi saqueado. Tirando a chave da ignição, ele e Millie descem e olham ao redor. A altitude favorece para que eles tenham uma temperatura mais agradável, embora o sol ainda se faça presente entre algumas nuvens.

ㅤㅤㅤㅤ— Vasculhar primeiro, né? — indaga Abraham, se aproximando da caminhonete já armado com um pé-de-cabra e seu fuzil nas costas.

ㅤㅤㅤㅤ— O padrão — responde Dylan, olhando os demais. — Esse lugar não é tão grande, vai dar pra olhar boa parte em pouco tempo. Façam no mínimo duplas e se virem qualquer coisa estranha, gritem. Não atirem a menos que seja necessário.

ㅤㅤㅤㅤ— Já tá claro que não estamos sozinhos aqui — Mia fala e aponta para a frente com a ponta do seu facão, fazendo Dylan se virar e ver alguns sangrentos se levantando da vegetação onde estavam imperceptíveis à vista do grupo, ou saindo das edificações.

ㅤㅤㅤㅤO policial suspira, mas não é nada com o que eles já não estejam acostumados. Aparentemente, o número de canibais não é tão grande assim.

ㅤㅤㅤㅤ— A gente dá cabo enquanto vasculha. Assim poupamos tempo. — Elizabeth toma à dianteira, já caminhando com uma faca em cada mão, sendo seguida por Cameron, Lydia e Kelly.

ㅤㅤㅤㅤDa maneira que a loira acobreada fala, eles fazem. Logo o grupo se divide em pequenas equipes e se espalham pelos becos de Spring Valley. Todo o povoado possui uma arquitetura de época, como se tivesse parado nos anos 90, sendo esse um dos motivos pela sua ruína; a falta de modernização. Após os andarilhos da rua que corta o povoado serem mortos, Cameron se afastou um pouco e começou a olhar as casas, entrando em uma que lhe chamou a atenção. O rapaz está em uma busca incessante por pilhas para o seu rádio, afim de entrar em contato com o misterioso Jed, do qual ele pouco falou aos sobreviventes. Infelizmente, tudo o que ele encontrou foi comida velha e algumas roupas e outros tecidos mofados. Parece que aquele lugar não recebia pessoas conscientes há meses. Ao sair do local, ele se depara com Elizabeth parada na calçada, o encarando.

ㅤㅤㅤㅤ— O que foi? — o rapaz sai e é iluminado pelo sol, que destaca seu cabelo seco e seu corpo magro, embora não seja algo que o defina como raquítico.

ㅤㅤㅤㅤ— Não ouviu o que o Dylan disse? No mínimo duplas.

ㅤㅤㅤㅤ— Ah. É que não achei que logo você fosse querer ficar comigo. — ele caminha pela sombra, com uma pequena faca na mão direita.

ㅤㅤㅤㅤ— Tenho meus motivos não falar ou gostar de alguns aqui. E eu estar aqui não quer dizer que eu goste de você. — Elizabeth o acompanha também armada com sua faca.

ㅤㅤㅤㅤ— Então por que tá aqui?

ㅤㅤㅤㅤ— Todo mundo gostou da ideia desse Lazarus, mas ainda não me desce a ideia de que em um lugar assim, uma única pessoa fale exclusivamente com você.

ㅤㅤㅤㅤ— Antes lhe descia a ideia de que os mortos voltariam a andar? — Cameron vira o rosto para ela. — Sem ser no sentido bíblico?

ㅤㅤㅤㅤ— Corta esse papo, garoto. — Elizabeth se põe na frente dele, parando de andar. — Eu vou ser bem direta: não confio em você e nem acredito plenamente nessa ideia de Lazarus.

ㅤㅤㅤㅤ— Olha… você não precisa acreditar plenamente. — Cameron engole em seco e sente seu corpo suar de nervosismo, apesar de Elizabeth não demonstrar nenhuma intenção ruim. — O Jed fala comigo desde que fugi daqueles carniceiros… já fazem quatro dias que não conversamos e ele deve tá preocupado. Mas eu juro que o Lazarus é real. Que motivos eu teria pra levar vocês até o outro lado do Estado pra uma armadilha?

ㅤㅤㅤㅤ— É o que tô fazendo. — ela dá um passo adiante e vê o jovem recuar. — Essas pessoas tinham todos os motivos pra não me aceitarem. Alguns errados? Sim, mas ainda assim, sou grata por estar aqui. É por isso que se você tiver mentindo pra gente… — ela ergue sua faca.

ㅤㅤㅤㅤCameron imediatamente puxa o ar quando a vê girar a arma na destra, a segurando pela ponta da lâmina e dá um pequeno grito quando Elizabeth a arremessa, se curvando e protegendo a cabeça com as mãos. Seu coração disparado começa a se acalmar quando ele ouve o som de um corpo caindo e, devagar, se vira e fica diante do cadáver que Elizabeth matou, com a faca presa em sua testa. Ainda bastante nervoso, ele vira o rosto devagar para a ruiva, que o fuzila com um olhar sereno — como se o que ela acabou de fazer não fosse nada.

ㅤㅤㅤㅤ— E além do mais, eu já vi pessoas fazerem coisas sem motivo nenhum. Enfim, você tá avisado. — diz, por fim, indo buscar sua faca.

Dylan e Abraham andam tranquilamente por um beco mais largo, deixando pelo caminho os cadáveres enegrecidos dos sangrentos que vão matando. Olhando as portas das casas e pequenos comércios todas abertas, eles não precisam fazer muito barulho para que os reanimados apareçam e sejam rapidamente despachados. Enquanto o gângster se locomove mais, indo na direção dos monstros e os golpeando com o pé-de-cabra antes que os mesmos notem, Dylan anda mais devagar, esperando que eles venham e então muda de postura apenas para os atacar com seu machete. Abraham nota isso e quando chega em uma pequena quadra de basquete a céu aberto, ele mata mais dois canibais e se vira, esperando pelo amigo:

ㅤㅤㅤㅤ— Aí… como é que você tá? — um pouco ofegante, ele respira pela boca enquanto observa Dylan.

ㅤㅤㅤㅤ— Tenho que ficar bem na medida do possível, né? Assim como cada um.

ㅤㅤㅤㅤ— Olha, cara. Eu sei pelo que você tá passando. Mas vai por mim, uma hora isso vai... diminuir. Infelizmente não dá pra esquecer ou superar igual um divórcio ou término. Você só… — Abraham baixa a cabeça e dá de ombros. — Aprende a lidar.

ㅤㅤㅤㅤ— Olha, Abraham... eu sei que você só quer ajudar, mas cara, eu só tô ouvindo isso nas últimas cinco semanas... sério. Eu tô lidando, tá bom? Mas é chato ficarem o tempo inteiro me lembrando disso.

ㅤㅤㅤㅤAbraham fica em silêncio. Ele conhece Dylan bem o bastante pra saber que ele tem seu jeito próprio pra tudo, até pro luto. Gostaria sim de ajudar seu amigo, mas por não saber como, também não vai lhe atrapalhar tentando descobrir.

ㅤㅤㅤㅤ— O lugar parece promissor. — ele muda de assunto, olhando ao redor. Para além da quadra de basquete e além dos telhados simples das edificações. A maior possui pelo menos quatro andares. — Com uma limpeza, deve servir.

ㅤㅤㅤㅤDylan suspira. Depois de ter que falar sobre Aurora, seu segundo assunto na lista dos que não gosta é sobre as conversas de parar ou continuar rumo ao Lazarus.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu sei que você quer parar com essa viagem, mas não acha que um lugar sem muros é arriscado? — ele esfrega o olho direito, sentindo uma agradável brisa soprando em seu rosto.

ㅤㅤㅤㅤ— Muros chamam a atenção, cara... por mais não tenha proteção contra os sangrentos, pelo menos o risco de pessoas encherem o saco deve ser menor.

ㅤㅤㅤㅤ— “Deve”… isso que é o seu risco. — Dylan olha o amigo.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu sei que você quer manter esse grupo unido, mas pensa comigo, Foster. — Abraham apoia o pé-de-cabra no ombro. — Isso tá desgastando a gente. Você me vê puto com o Jason, mas não é por ele ser irritante. Todo mundo tá estressado, cansado e faminto. Isso vai acabar gerando conflito.

ㅤㅤㅤㅤ— Eu quero sim manter essas pessoas juntas, mas em um lugar onde valha a pena. — Dylan se afasta um pouco, olhando os corpos espalhados. — Pode ser em Myev, pode ser em qualquer lugar... o importante é que dê pra gente viver com o mínimo de... — ele faz uma pausa, lembranças rodeiam sua mente.

ㅤㅤㅤㅤ— Um lugar onde a gente não precise dormir com um olho fechado e o outro aberto.

ㅤㅤㅤㅤ— Isso. Mesmo com a Millie e a Amy votando pra gente ir nessa viagem, eu só concordei mesmo porque acho que é algo que... que a Aurora gostaria… um lugar pra gente. — Dylan se curva, fincando a ponta do seu facão na cabeça de um sangrento que se arrastava com apenas metade do corpo. O policial se mantém agachado, com a cabeça baixa.

ㅤㅤㅤㅤ— Dylan... eu não quero se desrespeitoso e nem nada nesse conselho. É que eu tenho até que muita experiência própria nisso. — Abraham o olha com pesar. Ele sabe que Dylan ainda pensa muito em Aurora e não superou completamente a sua perda. — Se você se planejar com quem tá morto, vai acabar fazendo merda. Pensa na Amy, na Millie e em quem mais você gosta nesse grupo. Faz as coisas pra essas pessoas.

ㅤㅤㅤㅤDylan permanece em silêncio. Por um momento, ele relembra da última cena que tem de Aurora em sua mente e suspira, afastando os pensamentos e se pondo de pé. Abraham aguarda por uma resposta, mas estranha o amigo estar olhando em outras direções.

ㅤㅤㅤㅤ— Acho que já é seguro... depois a gente conversa sobre... essas coisas. — ele se vira para Abraham, o vendo parecer um pouco surpreso, mas ao mesmo tempo, aliviado. — Vamos primeiro achar o que comer. Pela sua lógica, todo mundo de barriga cheia vai pensar melhor.

ㅤㅤㅤㅤAbraham respira fundo e solta o ar pela boca. Ele está preocupado com Dylan, já que este parece sempre fugir dos assuntos que envolvam Aurora, Ny e os acontecimentos de Daywake. Mas ao mesmo tempo, é bom ver que seu amigo parece estar começando a pensar que nem ele. O gângster ensaia uma resposta, mas é interrompido por um grito que faz tanto o seu sangue, quanto o de Dylan, gelarem.

ㅤㅤㅤㅤ— Porra...!! — o policial se põe a correr no instante em que o primeiro tiro é disparado. Abraham vai logo atrás, já guardando o pé-de-cabra e preparando sua M-16 enquanto novos disparos são dados entre gritos estridentes.

Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro