Capítulo V
O cheiro de jasmins inundou o quarto de Safira no instante em que ela mergulhou na banheira. Embora tivesse tomado banho mais cedo, o cansaço das danças daquela manhã ainda pesava em seus músculos. Somente a água morna parecia capaz de devolver-lhe as forças.
— Venha cá, habib — chamou Soraia, segurando uma toalha enquanto aguardava pacientemente que a princesa saísse. — Já chega de banho por hoje.
— Só mais um pouco — murmurou Safira, afundando os ombros na água perfumada, como se pudesse encontrar ali um refúgio.
— Eu sei exatamente o que a senhorita está tentando fazer.
— O que estou tentando fazer? — perguntou a princesa, a voz carregada de falsa inocência.
— Está tentando atrasar-se para o jantar. E atrasar o suficiente para que sua presença sequer seja necessária.
— Ora, Soraia, jamais faria isso! — Safira pousou a mão sobre o peito, fingindo indignação com teatralidade.
A criada sorriu, exibindo os dentes amarelados. Conhecia Safira desde antes de seu nascimento. Fora ela quem embalara seus primeiros choros e enxugara suas primeiras lágrimas. Conhecia cada sorriso, cada expressão — e, acima de tudo, sabia quando a princesa mentia ou tentava escapar das obrigações impostas pelo trono.
Por mais que Soraia compreendesse os fardos de Safira, não podia compactuar com a teimosia da jovem.
— Claro que não faria, minha menina — disse, irônica. — Mas venha, Safira. Ainda preciso vesti-la. E não quero ser castigada por sua causa.
A menção a um castigo surtiu efeito imediato. Os olhos de Safira arregalaram-se de preocupação. Rendida, ela emergiu da água, permitindo que Soraia a envolvesse na toalha felpuda.
— Não quero que você seja castigada por minha culpa. Me desculpe.
— Não se preocupe, habibti — disse Soraia, envolvendo a princesa em um abraço. — Mas veja só! Agora sou eu quem precisará de um banho. Estou completamente molhada.
— Pode ir — respondeu Safira, entre risos tímidos. — Eu começo a me arrumar sozinha.
Soraia hesitou, observando a princesa com uma expressão de desconfiança.
— Não faça nada de errado, por Alá.
Assim que a criada deixou o aposento, Safira secou-se com calma, permitindo que a mente vagasse por pensamentos soltos. Por mais tentadora que fosse a ideia de escapar do palácio, sua curiosidade prevaleceu. O jantar era uma ocasião rara, e ser convocada para estar à mesa com o pai indicava que algo significativo estava prestes a acontecer.
Depois de muito ponderar, escolheu um vestido longo de seda verde. A gola alta e as mangas compridas transmitiam a formalidade esperada, enquanto os bordados dourados no busto, em forma de folhas delicadas, conferiam sofisticação. Decidiu deixar os cabelos loiros soltos, caindo em ondas naturais pelas costas. Nos pés, um par de sapatinhos nude.
Safira nunca fora fã de joias; qualquer metal em contato com sua pele causava irritação. Mesmo assim, optou por brincos pequenos no tom do vestido e um anel adornado com pequenas safiras.
Estava terminando de ajustar o traje quando a porta se abriu abruptamente.
— Está atrasada — declarou sua mãe, entrando no quarto com a postura altiva de sempre.
O corpo de Safira enrijeceu ao ouvir o tom frio da mulher.
— Perdoe-me, mama. Já estou pronta.
— Você vai comigo.
— Mas... e a Soraia...?
— Eu disse que você vai comigo.
O tom era definitivo. Sem mais perguntas, Safira seguiu a mãe, caminhando dois passos atrás dela, como ditava o protocolo.
Enquanto atravessava os corredores do palácio, os olhos da princesa encheram-se de lágrimas. Não gostava da mãe, nem da forma como era tratada — sempre com rigidez e distanciamento. Tudo o que desejava naquele momento era a presença de Soraia. Mas, como em muitas outras vezes, não lhe era permitido escolher.
O palácio dos Al-Amin ostentava uma imponência que desafiava qualquer descrição. As paredes de mármore branco refletiam a luz do fim da tarde, tingindo os corredores de um dourado suave. Tapetes persas, adornados com padrões intricados, cobriam o chão enquanto lustres de cristal pendiam dos tetos altos, lançando reflexos cintilantes por todo o ambiente. Cada canto do lugar parecia contar uma história, como se o próprio palácio fosse testemunha de eras passadas e promessas futuras.
O salão de jantar era o coração pulsante daquela noite. A mesa principal, longa e robusta, comportava vinte lugares cuidadosamente dispostos. Velas altas iluminavam os talheres de prata e os copos de cristal, enquanto toalhas de linho bordadas à mão adornavam cada mesa. Ao centro, arranjos de flores exóticas misturavam cores vibrantes, como o vermelho das papoulas, o dourado das calêndulas e o branco dos lírios. O perfume floral preenchia o ar, misturando-se ao aroma de especiarias que escapava da cozinha, prometendo um banquete digno da realeza.
Músicos posicionados em um canto do salão tocavam uma melodia suave com alaúdes e qanuns, criando um ambiente de serenidade e requinte. O som das cordas se misturava ao leve burburinho dos convidados que já haviam chegado, seus trajes luxuosos refletindo as luzes do salão. Nobres de outros reinos, ministros e mercadores conversavam em tons baixos, trocando olhares curiosos e especulativos. Todos sabiam que aquela noite não era apenas um jantar: era o prenúncio de uma nova aliança.
Quando o criado anunciou a chegada dos anfitriões, o som das conversas cessou. Todos os olhos se voltaram para a entrada principal, onde as portas de madeira maciça esculpida se abriram lentamente.
— Sua Alteza, Sheik Farid Mamun, líder de Kuwait, acompanhado de sua esposa, Princesa Haya Hashid Youseff Mamun, e seus filhos: Príncipe Herdeiro Said Mamun, herdeiro de Kuwait, Príncipe Khalid Mamun, e as Princesas Nubia e Ranya Mamun.
Farid adentrou o salão com a postura de um verdadeiro líder. Alto, de barba bem aparada e olhos que refletiam a sabedoria de décadas, ele exalava autoridade. Ao seu lado, Haya caminhava com a elegância de quem estava habituada a carregar o peso da realeza. Seu vestido de seda dourada parecia se fundir com os raios de luz que passavam pelos lustres, e seus olhos atentos acompanhavam cada detalhe ao redor. As princesas Nubia e Ranya, ambas em trajes que misturavam tons de azul e prata, trocavam olhares discretos, ora entre si, ora com os convidados. Enquanto isso, Khalid caminhava com um sorriso divertido nos lábios, parecendo mais interessado na comida que seria servida do que no protocolo do evento.
Said, por sua vez, era o reflexo da seriedade. Vestido em um traje branco impecável, seus traços fortes e olhos escuros observavam o salão como se buscassem algo além daquelas paredes. Khalid, percebendo a rigidez do irmão, inclinou-se ligeiramente em sua direção e sussurrou:
— Se continuar com essa cara, vão achar que está indo para a guerra, não para o jantar.
Said lançou-lhe um olhar de advertência, mas antes que pudesse responder, a voz do criado ecoou novamente:
— Sua Majestade, Sultana Zúria Al-Amin, acompanhada de sua filha, princesa Safira Al-Amin.
O murmúrio no salão recomeçou, mas de maneira contida, como se os convidados não ousassem interromper completamente o momento. As portas se abriram mais uma vez, e Safira entrou ao lado da Sultana. Sua presença era como um raio de luz em meio à penumbra, e o impacto foi imediato. Vestida em um traje de seda verde que parecia ter sido tingido com a própria essência da natureza, ela caminhava com a graça de uma dançarina, mas seus olhos traíam uma ponta de nervosismo. Os detalhes dourados no vestido destacavam sua pele morena, enquanto os cabelos longos estavam presos em um penteado intrincado, adornado com pequenas joias que brilhavam a cada passo.
Havia uma delicada pintura de henna em suas mãos, que já demonstrava sinais de antiga, e os detalhes intricados subiam por seus pulsos como galhos de uma árvore viva. Seus olhos azuis, que cintilavam como safiras raras, capturavam o olhar de todos no salão, mas foi o de Said que a fez hesitar por um breve instante.
Said, que havia permanecido em silêncio até aquele momento, ergueu os olhos. No instante em que viu Safira, o tempo pareceu parar. Seu coração bateu mais forte, e ele precisou se lembrar de respirar. A lembrança da odalisca de olhos azuis voltou à sua mente como uma tempestade, e ele murmurou, quase inaudível:
— Você... é você o anjo de olhos azuis...
Safira sentiu o peso dos olhares sobre si, mas foi o de Said que a fez tremer por dentro. Ela o reconheceu imediatamente, mas não podia deixar isso transparecer. Seu coração estava inquieto, mas sua postura permanecia firme. Ao chegar perto do Sheik Farid, ela curvou levemente a cabeça em sinal de respeito, enquanto Zúria fazia uma breve introdução.
— É uma honra para mim e minha filha estarmos aqui esta noite — disse Zúria, sua voz carregada de autoridade e doçura.
Os murmúrios cessaram por completo, e o silêncio que se seguiu parecia prenunciar algo maior do que qualquer um ali poderia imaginar.
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