Capítulo Vinte e Um
O endereço que Calum me passou me levou até um bar que eu não havia notado antes, mesmo já tendo passado por aquela rua algumas vezes, talvez por ser o típico lugar para jovens new chic.
O espaço tinha um ar moderno com uma pegada meio hippie, com bolinhas de luzes espalhadas, o símbolo do movimento paz e amor no fundo do palco e frases nas paredes que eu não parei para ler. Não me surpreendeu muito, eu já esperava algo como aquilo ao ver a playlist que haviam passado para Calum.
Parei na entrada, sentindo que havia virado o centro das atenções com meu jeans rasgado, botas, blusa do Pink Floyd e case nas costas. As poucas pessoas que já rondavam o local usavam mais a linha do moderno sofisticado. Varri o lugar com o olhar rapidamente, procurando por alguém que estaria tão deslocada ali quanto eu, mas não a achei, me sentindo decepcionado. Evans teria desistido de ver o irmão tocar? Mas ela era metade da minha razão de estar ali!
- Você é o guitarrista?
Me virei de lado para ver um cara baixinho, com traços orientais.
- Acho que sou.
- Estão esperando você. Siga o bar e vire à esquerda, próximo aos banheiros. - o cara falou apressado, depois desapareceu rapidamente.
Segui as instruções e achei a porta com o nome "camarim" nela. Ao entrar, percebi que mais parecia um armário, de tão apertado que era. Mas talvez o lugar não parecesse tão claustrofóbico sem todas aquelas pessoas ali dentro. Eu vi Calum no canto, afinando seu baixo, um cara no meio de um aquecimento vocal bem estranho, outros dois jogando cartas em uma mesinha desmontável e um belo traseiro no ar.
Evans estava com as mesmas roupas de quando havia saído do Comic's. Por sorte eu havia conseguido tomar banho e me trocar antes de ir para ali. Ela parecia separar uma quantidade interminável de fios no chão, mas claramente não fazia a menor ideia do que estava fazendo. Me agachei ao seu lado e falei baixinho:
- Eu não sabia que eles contratavam gente pelo requisito traseiro. Me pergunto como fui contratado.
Ela me lançou um olhar.
- Ah, você chegou.
- A alegria da banda.
- Eu claramente não faço parte da banda e sua felicidade. - resmungou, sentando no chão. Ela encheu as bochechas de ar, depois soltou aos poucos. - Eu desisto.
Dei uma olhada nos fios bagunçados. Evans havia misturado tudo.
- O que você está fazendo? - ela perguntou, quando me viu mexendo ali.
- Estou separando. Esse aqui é um cabo longo, esse aqui é de um amplificador e esse é para pedais.
A garota fez uma careta.
- Para mim são todos iguais.
- Mas não são.
Ela me observou separar tudo em silencio, levou só alguns minutos.
- Pronto, agora sim. - falei.
- Obrigada. - soltou, então levantou. - Ei, Cal, acabei aqui. Posso ir lá para fora ou ainda vai precisar de mim?
- Eu posso precisar de algumas coisinhas. - um dos caras das cartas falou, fazendo o outro rir. Eu quis ir até lá, mas Calum foi mais rápido, lhe dando um tapa na cabeça. Depois ele finalmente me notou ali. Desceu da mesa onde estava sentado, com as costas apoiadas no espelho, e veio até mim.
- Já estava meio preocupado, pensei que não viria. - falou, sorrindo.
- Eu falei que vinha.
- Não vou duvidar da próxima vez.
Ele fala como se eu já fosse um membro oficial da banda.
- Ei, pessoal, esse aqui é o Luke. - Calum apontou e disse o nome e a função de cada um depois. Joshua, Nath e Chase. - Certo, agora vamos ver você tocar. Por favor, seja bom, não temos tempo para encontrar outro guitarrista.
- Tudo bem.
Coloquei a case no chão e peguei minha guitarra. Chase me passou a cadeira dele e eu sentei, testando a afinação. Precisaria melhorar antes de subir no palco, mas para um teste rápido serviria. Lembrei de uma das músicas da playlist que Calum havia mostrado e a toquei. No refrão, acabei me empolgando e passei a cantar também.
- Cara, você é bom. - Cal parecia a ponto de chorar de empolgação. - Com você, eles vão contratar a gente! - de repente, ele pareceu lembrar de algo e sua animação evaporou. Trocou um olhar com a irmã e colocou as mãos nos bolsos. - A gente fala sobre isso depois. Você foi muito bem, e sua voz é... wow.
- Valeu. - brinquei um pouco com as cordas, disfarçando meu leve embaraço. Eu não estava acostumado com aquele tipo de elogio.
- Você poderia cantar uma das músicas, o que acha?
- As músicas já estão ensaiadas, do que você está falando, Cal? Chase é o vocalista. - Nath falou, jogando as cartas que embaralhava na mesa.
Calum se virou para o cara do aquecimento vocal estranho.
- E aí, Chase, quer dividir o vocal com o Luke? Assim você dá uma descansada.
- Eu acho que o Nath tem razão, já ensaiamos o show de hoje. Talvez no próximo. - ele me lançou um olhar e deu de ombros.
- Sem problema, cara. - falei. Eu nunca havia cantado em público antes.
Calum ergueu as mãos.
- Se preferem assim. Vamos repassar um pouco?
Todo mundo se moveu. Calum voltou para o seu baixo, Nath pegou um violão e Chase foi tomar um pouco de água antes de começar a cantar. Joshua apenas sentou, já que sua bateria estava montada no palco. Eu vi Evans escapar pela porta sem chamar a atenção de ninguém além de mim.
- Ei, Luke, pronto? - Cal falou, me fazendo virar para eles.
- Pronto, claro.
Passamos a playlist duas vezes, eu acreditava ter ela na cabeça, mesmo assim Chase insistiu que eu ficasse com a ordem das músicas no meu celular, só para garantir. Estava um pouco nervoso, era a primeira vez que tocaria para mais do que algumas pessoas. Queria andar por ali, mas o espaço era limitado, então continuei sentado, tocando alguns acordes e olhando para a porta, esperando que Evans voltasse.
O cara baixinho apareceu depois de algum tempo, liberando o palco para nós. Pegamos os cabos e deixamos o camarim.
Subi os três degraus que levavam ao palco sentindo o tal frio na barriga que tanto ouvi falar, aquilo misturado com animação e expectativa me deixaram alerta de uma forma diferente, fiquei mais consciente das coisas ao meu redor. Fui para minha marcação, pluguei a guitarra e me virei para o público. Era difícil enxergar com as luzes na cara, mas eu podia dizer que o lugar estava cheio. A música gravada ainda tocava, enquanto ficávamos prontos, havia gente dançando. Tentei encontrar Evans, mas não consegui.
Sentei no banco alto que haviam deixado ali, coloquei o celular entre as pernas e conferi mais uma vez as músicas. Estava ficando cada vez mais nervoso. Olhei para os caras, desejando que eles se apressassem. Meu pescoço estava suado. Peguei um prendedor e fiz um coque. Pensei em tirar a jaqueta, mas em todas as vezes em que me imaginei subindo em um palco pela primeira vez, eu estava de jaqueta, então resolvi manter.
Todos estavam posicionados. Calum fez um sinal para que a música parasse. Chase deu algumas batidinhas no microfone com o dedo, chamando a atenção. Ele cumprimentou, falou nossos nomes, apresentou a banda como Powerfull Blokes, me fazendo perceber que não sabia como eles se chamavam até aquele momento, e então começamos a tocar.
No começo, eu sentia a tensão no meu corpo, esperando que algum erro acontecesse, mas na metade da segunda música percebi que aquilo não iria acontecer. No fim, foi como tocar no sofá da casa de Ashton, só que melhor. Foi uma experiência boa, que me fez sentir aceso, mas tampouco foi grande coisa.
Antes de descer do palco, aproveitei para procurar por Evans mais uma vez. Quando estava descendo, me livrando dos focos de luz, consegui encontrá-la no bar. Ela não olhava na nossa direção, estava ocupada conversando com um cara.
- Não quer deixar o palco, Luke? - Calum brincou, empurrando para que eu me movesse. Desci o último degrau e entreguei minha guitarra para ele.
- Você pode guardar ela pra mim? - perguntei, os olhos ainda no bar.
- Você não vem? Sempre fazemos uma reunião depois do show.
- Eu vou em um minuto.
Atravessei o espaço, recebendo alguns tapinhas e sorrisos das pessoas ao redor. Evans me viu quando eu estava a alguns metros, seu sorriso morreu.
- E aí, gostou da minha performance? - perguntei, parando ao seu lado.
- Vocês foram muito bem. Parabéns. - Evans sorriu sem mostrar os dentes, claramente me mandando embora.
Lancei um olhar para o cara na banqueta ao lado. Ele negro, tinha olhos pequenos e cabelo raspado, como de militares.
- Luke, esse é o Anthony. Ele não parece aquele médico de Grey's Anatomy? O dr. Jason Myers? - Evans falou, toda sorrisinhos.
- Eu não assisto novelas. - falei, encarando o cara.
- É um seriado. - ela esclareceu.
- E aí, ótimo show. - o cara falou.
Concordei com um aceno de cabeça e me virei para Evans.
- Vamos fazer uma reunião no camarim.
- Eu não faço parte da banda.
- Alguém precisa recolher os cabos.
Ela me olhou irritada.
- Só vai embora, ok?
Hesitei por um momento antes de virar as costas e sair. Fui para o camarim para pegar minha guitarra e dar o fora, mas Calum me deu um abraço e manteve o braço ao meu redor, enquanto tagarelava com os outros. Aguentei os longos minutos de comemoração, até que eles resolveram tomar alguma coisa e fui rebocado por Calum.
Evans e seu amigo continuavam no mesmo lugar, conversando. Ele a fazia rir o tempo todo. Então você gosta de palhaços, garota?
- Não vai pedir nada, Luke? Eu pago essa rodada. - Nath parecia ter superado sua aversão por mim, era aquilo ou ainda estava sob o êxtase pós-show.
- Agora não, mas valeu. - recusei.
Assisti Evans levantar e a segui com o olhar, até a perder entre as pessoas. Cortei caminho pela pista de dança e a vi desaparecer pelo lado do palco.
Quando entrei no camarim, ela estava mexendo em sua bolsa. Tentei me aproximar em silêncio, mas me viu pelo reflexo.
- Estamos comemorando na outra ponta do bar. - falei, apoiando o ombro na parede.
- Aproveitem. - ela estava espalhando alguma maquiagem na bancada.
- Não vai ficar com a gente?
- O momento é de vocês. - Evans começou a usar tudo aquilo no rosto. Eu bufei.
- Seu amigo vai cansar de esperar.
- Ele não vai a lugar algum, pode apostar.
Me aproximei, até estar bem ao seu lado. A olhei pelo espelho.
- Aquele cara é mais velho do que eu.
- E daí?
- Você tem dezessete.
- Outra vez: E daí?
- Não devia estar com ele.
- Eu estive com você.
Eu a encarei por todo um minuto, querendo agarrar seus ombros e fazê-la me olhar de volta.
- Eu não gosto disso. - falei por fim.
Evans me ignorou. Guardou tudo de volta na bolsa e se olhou no reflexo.
- Eu devia ter passado em casa.
Analisei seu jeans, blusa-ombro-de-fora e tênis. Evans mexeu na blusa, alternando o ombro a mostra. Pegou a barra da blusa e tentou dar um nó.
- Péssimo detalhe. - falei, vendo sua barriga de fora.
- Por que você ainda está aqui, Luke?
- Não gostei daquele cara.
- Ele não está interessado em você também.
- Nem em você. O interesse dele é só um.
- Ao que parece eu vou cometer o mesmo erro duas vezes. - ela cuspiu aquilo bem na minha cara, seus olhos queimavam de raiva.
Porra, você é sexy, garota.
Eu me movi, deixando-a entre a bancada e eu. Evans se virou, para ficar de frente para mim. Nos encaramos por alguns segundos. A raiva dela oscilava. A ergui pela cintura e a sentei na bancada, como havia feito outro dia no Comic's, ela permitiu que eu me aproximasse. Eu podia ver a irritação ceder lugar para o desejo em seu rosto. Os olhos dela caiam dos meus olhos para a minha boca. Eu não a toquei, mantive minhas mãos coladas na bancada, o olhar preso ao dela. A tensão estalava nos míseros centímetros entre nós, eu sentia o meu corpo ser puxado para o dela, como magnetismo, mas resisti.
- Vai ficar aí parado, estúpido? - ela perguntou, baixinho.
- A minha língua não tem livre acesso para sua boca. - lembrei.
Evans levou a mão até a parte de trás da minha cabeça, puxou o elástico, desmanchando meu coque e agarrou o cabelo da nuca pela raiz.
- Considere isso como uma permissão especial.
Ela puxou minha boca para a sua e me beijou, forte. O primeiro contato foi como receber uma descarga de adrenalina, eu senti até na ponta dos dedos. Minhas mãos puxaram seu corpo para mais perto e ela apertou minha cintura com as pernas.
- Você tomou alguma coisa? - perguntei, pois havia sentido o gosto em sua boca.
- Talvez.
- Aquele cara comprou...
Ela calou minha boca com outro beijo, me fazendo esquecer o que estava pensando. Usando minha permissão especial, explorei sua boca com a língua e a senti corresponder. Foi um beijo meio desesperado no início, mas quando percebemos que o outro não iria fugir, se tornou mais lento e prazeroso. Segurei seu joelho e deslizei a mão até em cima, xingando aquele jeans. Eu queria sentir sua pele. Refiz o movimento, com ambas as mãos e apertei suas coxas. Evans segurou e moveu meu rosto, liderando os movimentos de nossas língua. Passei um braço por sua cintura e espalmei a outra mão em suas costas. Desejei encontrar uma forma de deixá-la ali para sempre.
Precisei quebrar o beijo para puxar ar. Evans levou os lábios para o meu queixo e o mordeu levemente. Aquilo me deixou duro.
- Eu menti. - falei, fazendo círculos com os polegares em sua barriga a mostra. - Eu adorei esse detalhe.
Evans empurrou minha jaqueta pelos braços e em seguida puxou minha camisa para cima. Suas mãos passearam por meu peito e ombros. Nos beijamos outra vez, enquanto ela criava caminhos com as unhas pelas minhas costas, lentamente. Eu gemi em sua boca. Continuou a me estimular com a língua e com as unhas. Ela estava ousada, provocante como nunca antes. Meu sangue pulsava, fazendo minha pele vibrar contra a sua. A mão dela deslizou até a frente do meu jeans e eu quase implorei que ela se livrasse dele, estava a ponto de fazer isso, quando ela se afastou. Empurrou meus ombros e pulou para o chão.
- O que foi? - perguntei, minha respiração estava descontrolada.
Evans apanhou minhas roupas do chão e as jogou para mim.
- Meu amigo está me esperando. - falou, calmamente.
- O quê?
Ela se olhou no espelho, ajeitando o cabelo e o batom borrado. Segurei seu ombro e a virei.
- Do que você está falando? A gente...
- A gente nada, Luke. Foi bom. Fim.
- Você tá de sacanagem?
- Pensei que você gostava do estilo touch and go.
- Então isso foi algum tipo de vingança? - soltei uma risada descrente.
- Eu também tive o que queria naquela noite, Luke, não se engane. Você foi um imbecil fugindo no dia seguinte, mas tampouco partiu meu coração ou algo do tipo. Não foi grande coisa, desça do pônei, garoto.
- Não foi grande coisa? E aquele soco?
- Você mereceu aquilo.
- Então está tudo bem entre a gente?
- Digamos que sim.
- Ótimo.
- Ótimo.
Nos olhamos por um segundo.
- A gente pode continuar agora? - perguntei.
Ela riu e balançou a cabeça.
- Não, não vai rolar.
Evans começou a ir para a porta.
- Vai voltar para o seu novo amigo?
- Ele deve estar se perguntando onde estou.
- Foda-se ele.
Ela não respondeu. Passou pela porta sem gastar mais um olhar em minha direção.
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