Capítulo Vinte e Nove
Eu estava olhando para o despertador quando as 6:59 se transformaram em 7:00. Eu já estava completamente vestida e calçada, esperando que o horário se tornasse adequado para eu ir para a cozinha, fingindo que não havia escapado as seis da manhã para levar um cachorro para o meu namorado.
Tia Becky estava mexendo alguns ovos quando entrei, meu estômago roncou com o cheiro da comida. Dei a volta na mesa e a abracei pelas costas.
- Ei, bom dia.
- Bom dia, tia. – o abraço continuou.
- Temos uma coala aqui?
Eu ri e a soltei. Tia Becky fez carinho no meu braço.
- Por favor, eu sei que é o ultimo dia, mas vamos apenas seguir a rotina, ok? Vamos deixar as despedidas para o aeroporto. – ela pediu.
- Tem razão, fazer isso o dia todo vai nos matar. – concordei.
- Você pode passar geleia nas torradas do Max?
- Claro. – abri o potinho da geleia de uva e comecei a espalhar com uma faca.
- Como foi a sua noite? Não vi você chegando ontem.
Acabei derrubando a geleia da faca, sujando a mesa.
- Foi bem legal. – limpei a garganta, minha voz soava falsa. – Luke me levou para jantar em um lugar bem fino.
- Em qual dos dois restaurantes finos de San Mateo?
- Na verdade, foi fora. O lugar se chamava Tesse.
Ela passou os ovos para um prato.
- Espero que tenha se divertido.
- Sim, bastante.
- O que ele te deu de presente?
- O jantar.
- Imagino que Luke tenha gastado todas as economias dele com esse jantar. Quero dizer, quanto ele deve ganhar entregando comida?
Por sorte Calum entrou na cozinha, carregando Max no colo. Usei a distração para não responder.
- Bom dia. – Calum colocou Max em uma cadeira, deu um beijo na bochecha de nossa tia e pegou a torrada que estava na minha mão.
- Bom dia, meninos. – tia Becky colocou as mãos na cintura e sorriu enquanto nos olhava por um segundo. – Depois desses meses, sinto que posso cozinhar para um batalhão. Vocês comem como trasgos.
Max gargalhou, enquanto mastigava uma torrada. Tia Becky foi até lá para beijar seu cabelo.
- Eu levo o Max para a escola hoje. – Calum falou. – Assim você pode terminar suas malas.
- E eu pego ele na volta. – emendei.
Becky balançou a cabeça.
- Tudo bem, acho que é uma boa ideia.
- Boo, a gente pode ir ao parque outra vez? – Max perguntou, como sempre alheio a conversa ao seu redor.
- Claro que sim, mas precisamos nos organizar, ok?
- Eu estou organizado, veja. – ele abriu os braços e olhou para a própria roupa. Todos rimos.
- Eu quis dizer planejar.
- Eu não sei o que planejar significa. – ele fez uma careta confusa.
- Calum vai explicar para você no caminho da escola, ok? Agora, coma um pouco de ovos, está gostoso. – coloquei uma garfada na boca, para provar minhas palavras.
- Cal, pare bem em frente a escola para ele descer, tudo bem? – tia Becky falou.
- Tudo bem.
- E fique olhando até ele entrar.
- Eu vou.
- E Jay, na volta, fique perto da segunda árvore da direita. É onde eu fico esperando, ele vai te encontrar lá.
- Segunda árvore, anotado.
- Segunda árvore da direita. Se ele não te ver lá, pode se assustar.
- Eu não sou um bebê! Eu não vou chorar! – Max reclamou.
- Eu vou estar lá, tia, não se preocupe.
Servi um pouco de suco de laranja em meu copo e dei um gole. Meu celular tocou enquanto eu engolia. Me estiquei até onde o havia deixado, junto com as coisas da escola e o peguei. Era Luke.
- Por que eu tenho um bicho mordendo minhas botas?
Eu sorri ao atender o celular. Peguei minhas coisas e fui para a sala.
- Ela não é uma gracinha?
- Ela acabou de fazer xixi no meu chão.
- Petunia ainda é bebê.
- Bebê? Mas ela é enorme!
Reprimi uma risada. Estava ligeiramente aliviada. Sabia que havia a possibilidade dele pirar ao ver um cachorro em sua porta, mas Luke parecia apenas curioso, talvez um pouco confuso.
- Use jornal. – falei.
- Você quer que eu leia as notícias pra ela?
Daquela vez o riso precisou sair.
- Para secar o xixi. – expliquei.
- E de onde eu vou tirar jornal?
- Na portaria do seu prédio deve ter.
- Aliás, como você entrou com ela? Aqui é proibido cachorro.
- Eu a cobri com um cobertor do Max e carreguei no colo como um bebê.
- E o porteiro caiu? É esse cara que está guardando a minha casa?
Afastei o celular da orelha para ver a hora.
- Preciso ir, Luke, vou me atrasar para a escola.
- Espere, o que eu faço com ela?
- Cuide dela. Alimente, brinque, essas coisas.
- Como uma criança?
- exatamente.
- Eu nunca cuidei de uma criança!
- Não é tão difícil. – na verdade era sim, mas eu não iria dizer aquilo para ele.
- Preciso ir.
- Não, de jeito nenhum, o que... Ei! Ei! Na minha guitarra não!
Ouvi Luke correr e soltei outra risada.
- Tchau, Luke.
Desliguei e fiquei olhando para o celular, o sorriso morrendo. Era tão fácil esquecer tudo o que ele havia me confessado quando estava falando com ele. Mas nada daquilo era bobagem, me manteve acordada toda a noite.
Dentro do carro, eu não tive tempo para processar tudo o que ele havia me dito. Foi como se o chão tivesse desaparecido debaixo dos meus pés. Meu namorado trabalhava para um cara mafioso. Como se reage ao descobrir isso? Eu havia ficado anestesiada. Não consegui falar quase nada para ele, apenas sai do carro e fui embora.
Mas eu já havia pensando em todos os pontos que achava serem importantes. Já tinha meu discurso armado e havia começado deixando Petunia em seu prédio. Luke não via as opções que tinha, eu precisava mostrar para ele.
- Me conte tu-do. – Will exigiu ao colocar sua bandeja ao lado da minha e sentar.
- Tudo o quê? – perguntei, enchendo a boca para ganhar tempo. Eu sabia o que ele queria, já havia pensando no que iria contar para ele.
- Tudo. Sobre o jantar, sobre o depois do jantar, sobre porque você me tirou da cama as seis da manhã para ir até o abrigo onde minha mãe é voluntária e roubar um cachorro.
Terminei de mastigar e dei um gole na minha água. Mantive os olhos na comida enquanto falava.
- O jantar foi fantástico. Ele me levou para Watsonville.
- Como era o lugar?
- Bastante elegante.
- Aposto que vocês estavam muito James Bond e Tatiana Romanova.
- Eu nem sou loira.
- Isso não importa. E sobre o depois? Vocês foram para o apartamento dele? – Will soltou um gritinho, enquanto sorria.
Eu havia decidido chegar o mais perto da verdade quanto possível. Eu odiava mentir para Will, mas mesmo sendo o meu melhor amigo, ou por isso mesmo, eu não iria colocá-lo no meio de tudo aquilo.
- Não houve um depois. Nós meio que brigamos.
- O quê? Brigaram?
Balancei a cabeça.
- E por quê?
- Luke não se acha... bom para mim.
- Ai meu Deus! – ele gritou.
- Will. – implorei. Os alunos das mesas ao redor estavam nos olhando.
- Ele é tipo o Edward Cullen! “Eu não sou bom para você, Julia”. Isso é tão... – desmoronou na cadeira, com um suspiro. – E o que você respondeu?
- O problema dele é com a imagem que as pessoas vêem. Eu disse que ele não precisava ser aquilo. – havia me chutado por dentro por não ter dito que ele não precisava mudar. Dane-se o que os outros pensam. – Mas ele não se convenceu. Pediu para ficar sozinho.
- Ele está no meio de uma crise existencial? Deus não permita que ele mude aquele ar de cafajeste gostoso.
- É aí que entra a Petunia. Eu escrevi isso aqui pra ele. – peguei meu celular e mostrei o rascunho da carta. Will deu uma olhada.
- Arrasou, garota. – ele riu. – Espero que ele não tenha abandonado a pobre Petunia na rua, preciso devolver ela.
- Eu vou pegar depois de deixar a tia Becky no aeroporto. Ela vai ficar bem, não se preocupe. – eu sabia que Ashton tinha um cachorro. Luke deveria ter alguma experiência.
Will deu uma mordida na sua maçã e lançou um olhar por cima do ombro.
- Ben faltou outra vez. – comentou.
Ouvir o nome do Ben me desestabilizou por um segundo. Olhei para a mesa do pessoal da natação.
- Ben está no outro horário de almoço. – lembrei a ele.
- Eu sei. Mas ele tem faltado as aulas de Química. Ele só aparece na hora do treino. Eu vejo, já que fico depois da aula para as reuniões do conselho.
Devolvi meu bagel para a bandeja, a fome evaporando completamente. Eu havia esquecido do Ben, mesmo sabendo que ele estava passando por algo.
- Você sabe de alguma coisa?
- Há uma fofoca de que ele está tendo acompanhamento psicológico.
- Oh.
De repente minha visão ficou nublada.
- Eu sou tão... Eu devia ter ligado pra ele ou, não sei, ido até a sua casa.
- Mas você tem ideia do que está por trás disso? Ele falou algo quando ainda estavam juntos?
Limpei as lágrimas que já estavam rolando, lembrando do que Ben havia me falado.
- É algo com os pais dele. – segredei. – Por favor, não fale sobre isso com ninguém.
- Eu não sou fofoqueiro.
- Eu sei. É o sr. Leicester, parece que está tendo um caso. – achei melhor não contar que era com a mãe da Olivia. Will poderia deixar aquilo escapar em um momento de raiva.
- Aquele velho safado!
- Eu sei.
O sinal tocou, fazendo o barulho ao nosso redor aumentar.
- Não se culpe, Jay, você também está com um monte de problemas. – ele fez um carinho no meu braço. – Até a aula de Álgebra.
- Te vejo lá.
Will pegou sua bandeja e foi embora. Continuei sentada por um minuto, pensando em qual seria a melhor forma de entrar em contato com meu ex-namorado.
Depois da aula, peguei um ônibus até a escola do Max, então outro até em casa, para deixá-lo com a sra. Keith, e outro mais para ir para o Comics. Já sentia minhas pernas pesadas enquanto me trocava, e o meu turno ainda nem havia começado.
Limpei algumas mesas, servi outras e quando finalmente tive um respiro, fui até Maggie no caixa, ela parecia irritada.
- Aquele velho energúmeno. Se acha que esse lugar vai funcionar sem mim, está muito enganado!
- Algum problema, Maggie?
- Você não soube? Phil está pensando em tirar o caixa do restaurante. Vai colocar os garçons para levar as contas até as mesas.
- Quer dizer que ele vai demitir você?!
- É o que parece! Eu trabalho aqui desde a época em que meninas como você eram bebês de peito!
- Sinto muito, Maggie. Se eu puder ajudar...
- Você acha que essa decisão repetina tem a ver com o sonho que eu tive?
- Que sonho?
- Sonhei que Phil e eu estávamos em uma sauna e não haviam toalhas.
Foi preciso um esforço sobrehumano para não fazer uma careta.
- E você contou isso para ele?
- Contei. E talvez eu tenha mexido no meu decote enquanto falava.
Balancei a cabeça.
- Hum, realmente não sei o que dizer. – admiti.
Ela deu de ombros.
- Luke está fazendo entregas? – perguntei, pois ele ainda não havia aparecido.
- Ele não trouxe aquele lindo traseiro para o trabalho hoje.
Luke não havia ido trabalhar?
- Tem certeza?
- Acredite, garota, eu sempre percebo a entrada daquele homem. É como se a temperatura do lugar subisse.
- Você sabe que estamos juntos, não é?
- Eu também sei que Phil é casado. – ela me deu um tapa nas costas que me fez tropeçar para a frente e caiu na gargalhada. Me afastei dela e de sua mão gigante.
Durante o resto do dia eu vigiei a entrada, esperando que Luke aparecesse, mas ele não deu sinal de vida. Precisei esperar pela minha pausa para ir ao banheiro e ligar para ele.
- Hey, tudo bem? – falei, quando ele atendeu.
- Tudo muito bem. E você?
- Por que não veio trabalhar?
Luke estava vendo TV, eu podia ouvir o som no fundo.
- Não estava a fim.
- Phil vai demitir você.
- Nah, Phil se entende muito bem com as minhas notas.
Dinheiro fácil, ele havia dito.
- Então vai ficar aí o dia todo sozinho?
- Não estou sozinho.
- Graças a Deus, Petunia está viva!
- Ela está tirando um cochilo agora.
- Bom, agora que já sei que você está bem, preciso voltar.
- Te vejo em... uma hora.
- Tudo bem.
- Julia, eu...
- Você?
- Eu vou esperar no estacionamento.
Parei por um segundo antes de responder.
- Ok. Te vejo lá.
Uma hora e meia mais tarde voltei para o banheiro, troquei de roupa, soltei o cabelo e corri para o carro.
- Rápido, o avião dela sai em meia hora! – gritei ao pular para dentro do carro.
Luke começou a se mover imediatamente.
- Por que se atrasou? – ele perguntou, acelerando para passar pelo sinal antes que fechasse.
- Uma família de franceses apareceu e eu precisei servir de intérprete até o último minuto.
- Que merda, justo hoje?
- Pois é.
- Qual aeroporto?
- São Francisco.
- Em dez minutos estamos lá. Vai dar tempo.
Balancei a cabeça e apertei o banco com ambas as mãos. Então percebi algo.
- Você não devolveu o carro.
- Devolvi, mas aluguei de novo, depois de pensar. Resolvi ficar com ele por um tempinho.
- Por quê? Surgiu uma nova... entrega?
Luke me lançou um olhar.
- Não. E eu não vou falar desse assunto com você. Você queria saber, eu te contei, mas vai ficar fora disso.
- Ainda vamos conversar.
- Não, não vamos. Não sobre isso. Esqueça.
A expressão dele estava definida. Vamos ver isso.
Luke desviou de carros, furou um sinal e estacionou em uma vaga que não parecia grande o bastante para um jeep.
Corremos para o terminal certo, desviando de pessoas e bagagens.
- Ali! – Luke apontou.
Eu consegui ver o topo da cabeça do meu irmão. Luke segurou minha mão e foi abrindo espaço, até que não havia nada entre minha família e eu.
- Você chegou! – tia Becky parecia aliviada. Abriu os braços para mim e eu fui direto para dentro deles.
- Desculpe o atraso. – falei, ofegante.
Ela me apertou com força, depois se afastou para segurar meu rosto.
- Tome conta deles, tá? – pediu, seus lindos olhos marejados.
- Eu vou. – prometi, fungando.
Ela se virou para Luke.
- E você tome conta dela.
- Não se preocupe. – ele passou um braço pelos meus ombros e me abraçou de lado.
Ouvimos a última chamada para o embarque. Tia Becky deu mais um abraço nos meninos e na gente, incluindo Luke.
- Eu amo vocês.
- Nós também te amamos. – Calum falou e Max deu um tchauzinho.
- Venha nos visitar! – gritei.
Ela se virou para nos dar uma última olhada e embarcou.
- Quando a tia vai voltar? – Max perguntou enquanto saíamos do aeroporto. Ele estava entre Calum e eu, segurando nossas mãos. Luke estava ao meu lado.
- Vamos ser só nós três, agora. Não vai ser legal? – perguntei, tentando animá-lo.
- Mas quando a tia vai voltar?
Troquei um olhar com Calum. Ele respondeu.
- A tia Becky estava apenas... passando um tipo de férias com a gente. Ela voltou pra casa.
Demos mais alguns passos, até Max voltar a falar.
- E quando ela vai tirar férias com a gente de novo, Boo?
- Eu não sei. – fiz um carinho em sua bochecha.
- Vai ser logo?
- Não, mas o tempo vai passar bem rápido, você vai ver.
Ele balançou a cabeça.
- Quem vai ler as histórias de dormir?
- Calum. E eu, às vezes.
- E quem vai guardar minhas meias? Só a tia Becky sabe os pares.
Max não usava meias iguais, ele montava seus próprios pares
- Eu acho que essa é uma tarefa que você pode ficar responsável. Todos vamos ter que ajudar agora. Acha que consegue? – perguntei, olhando para ele.
Max pensou por meio minuto.
- Acho que sim. Eu conheço os pares.
- Então, combinado.
- Boo?
- Sim?
- Preciso fazer xixi.
Todos paramos. Estávamos quase no carro, no fim do estacionamento.
- Consegue segurar até em casa? – Calum perguntou.
Max balançou a cabeça, negando.
- Vamos ter que voltar lá para dentro. – conclui, olhando toda a distância.
- Deixe que eu resolvo. – Luke estendeu a mão. Max o olhou meio desconfiado, ainda não o considerava um amigo, mas acabou pegando. Luke começou a levá-lo para uma vaga livre entre duas ocupadas.
- Ele não vai... – comecei a falar.
- Ele vai. – Calum riu.
Luke posicionou meu irmão de frente para o murinho na altura dos joelhos de Max e apontou.
- Luke! – chamei, olhando ao redor. – Você vai ser preso!
Calum ainda ria.
- Eles estão entre uma van e um jeep, ninguém vai ver eles ali.
- Faça alguma coisa!
- Ok. – Calum deu de ombros e foi até eles.
- Só pode ser brincadeira. – soltei ao ver Calum adotar a mesma pose dos outros dois: pernas separadas, calça um pouco abaixada, e ombros relaxados. Os maiores acertaram os arbustos mais na frente, mas Max mirou no murinho. Os três estavam rindo.
Cruzei os bracos e esperei, vigiando os lados. Algumas pessoas passavam, mas todas com muita pressa para repararem em dois caras e uma criança mijando.
- Vamos lá, vocês não beberam tanta água! – reclamei.
Eles acomodaram as calças, Calum ajudou Max e finalmente voltaram para perto de mim.
- Tudo resolvido. – Luke falou, com um sorriso imenso.
- Só vamos embora daqui.
Enquanto íamos para o carro, Luke e Calum começaram uma conversa animada sobre os melhores lugares onde já haviam repetido aquilo. Primeiro chegamos ao jeep.
- Eu preciso pegar algo no apartamento do Luke. – falei para Calum. – Leva o Max e põe ele na cama, ok?
Calum nos lançou um olhar.
- Tudo bem, claro. Só não demore, Jay, amanhã tem escola.
- Sim senhor, novo cacique.
Ele riu e levou Max.
Luke e eu entramos no carro e ele começou a dirigir.
- Não acredito que você ensinou o meu irmãozinho a fazer xixi em lugares públicos.
- Um garoto não é um garoto até mijar em um lugar público.
Revirei os olhos.
Eu estava tão cansada que encostei a cabeça no vidro e meio que cochilei. Quando abri os olhos já estávamos entrando na garagem do prédio dele.
Subimos até o apartamento em silêncio. Luke abriu a porta e fomos recebidos por Petunia, que arfava e balançava o rabo minúsculo como um marcapasso acelerado.
- Ei, menina! Você sentiu a minha falta? – Luke se agachou para fazer carinho no corpo roliço da cachorra. – Eu sei que sentiu! Vem aqui! Quem é a menina mais linda? Quem é? – ele sentou no chão e Petunia entrou em êxtase, lambendo o rosto de Luke.
Eu fiquei ali parada, assistindo a cena. Parecia que o Bob Marley iria entrar a qualquer momento em um monociclo, tocando ukulele.
- Ela definitivamente ama você. – falei, quando a surpresa passou um pouco.
- É bom amar mesmo. Quem coçou sua barriguinha o dia todo, hum? Quem?
Aquele era o meu namorado? Luke Hemmings? O da jaqueta de couro e motocicleta?
- Então por isso você não foi trabalhar.
- Eu tentei, mas sempre que fechava a porta, ela choramingava. Precisei dar um sapato para ela mordiscar quando saí para te buscar.
- Pare de beijar o meu namorado, garota. – falei, me ajoelhando para fazer carinho também. Ganhei algumas lambidas.
- Não seja ciumenta, Julia, tem bastante de mim para as duas, eu sou alto.
Eu ri.
- Por via das dúvidas, é melhor eu levar ela para longe de você. – levantei e fui pegar o cobertor sobre o sofá.
- O que você está fazendo? – Luke perguntou, me olhando confuso.
- Preciso devolver ela para o canil amanhã de manhã.
- Para o canil?
- É, de onde eu peguei emprestado.
Luke afastou Petunia que ainda lambia seu rosto.
- Como assim emprestado?
- A mãe do Will é voluntária em um canil. Pegamos Petunia para que eu pudesse escrever aquilo para você.
- E?
- E que agora preciso devolver.
Luke levantou e pegou a cachorra no colo. Ele fez carinho em sua cabeça.
- Mas eu pensei... Pensei que você tinha me dado.
Ergui as sobrancelhas.
- Por que eu te daria um cachorro? Você mora em um apartamento, passa o dia fora e se alimenta de comida congelada e cereal.
- Mas eu cuidei bem dela.
Eu tentei me aproximar, mas ele deu um passo para trás, virando quase de costas para mim. Coloquei as mãos na cintura.
- Eu não sabia que você iria se encarinhar com ela.
- Como não? Veja como ela é fofa. E agora você quer tirar ela de mim.
- Luke, Petunia pertence ao canil.
- E não é lá que os cães ficam até encontrar um dono? Petunia me encontrou.
- Está falando sério? Vai ficar com ela?
- O que você diz, menina? Quer ser minha parceira de crimes?
Petunia latiu e lambeu o queixo dele.
- Eu acho que isso é um “Claro que sim, você vai ser o melhor pai do mundo”. – Luke concluiu.
- Que latido extenso. – falei. – Você sabe que um dia o pessoal do prédio vai descobrir que ela está aqui. E esse dia vai ser amanhã, no máximo mais um dia.
- Eu me mudo. – ele deu de ombros.
Procurei mais algum argumento na minha cabeça, mas não achei nenhum.
- Você tem certeza? Não é justo fazer ela gostar de você e depois devolvê-la.
- Eu não vou fazer isso.
Ergui as mãos, me rendendo.
- Tudo bem, ela é sua, então.
Luke sorriu como uma criança gigante.
- É sério?
- Vou falar com a mãe do Will.
Ele acabou com o espaço entre nós para me abraçar.
- Estamos esmagando a Petunia. – falei, rindo. A cachorra estava espremida entre nós dois. – Hora de fazer um regime, garota.
- Ei, ela não é gorda! Ela só... é fácil de se ver.
Precisei rir. Estava descobrindo uma nova versão de Luke Hemmings.
Vou lutar para arrumar e acertar as coisas. Eu não posso mudar o mundo, mas talvez eu possa mudar a sua mente.
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