Capítulo Quinze
POV - LUKE
A primeira coisa que senti ao acordar foi a humidade. Todo o meu corpo estava coberto de suor, a pele grudava no lençol. Girei, sentindo o tecido desgrudar, e ficando de barriga para cima.
O que há reservado para esse maldito dia? O jeep estava na oficina, mas Ashton iria buscar. Por isso as motos eram melhores, os carros viviam dando defeitos. Talvez quanto maior a coisa, maior a merda dentro dela. Mas eu não sou tão grande e toda a merda do inferno está dentro de mim. Ashton iria aparecer mais tarde e havia o pôquer a noite. O pôquer era sempre a salvação das noites. Agora há ela, Evans. Então lembrei que era sábado e ela havia comentado que trocaria novamente sua folga, tinha um compromisso.
Nunca imaginei que ter um trabalho normal seria tão... aceitável. Comecei a trabalhar para Rivers assim que tirei a carteira de motorista, ainda muito moleque, fazendo entregas fáceis e pequenas. Nunca havia entregado jornal, passeado com cachorro ou lavado carros na adolescência. Adorava o que fazia, a sensação de carregar algo proibido, a adrenalina nas veias... Até mesmo na última entrega, depois que o medo do cacete passou, foi incrível contar para Ashton o que havia acontecido. Nunca me cansaria de falar sobre aquilo, o quanto cheguei perto de estar fodido e como consegui me safar.
Trabalhar no restaurante não era nada como aquilo, era monótono e cansativo, mas havia Evans. A garota andava se aproveitando como se eu fosse um subalterno, deixando quase todo o serviço para mim. Eu não reclamava, ela sempre ficava por perto, apontando o que eu estava fazendo de errado, então eu conseguia fazer novas perguntas sobre ela.
Eu não entendia porquê aquela garota era tão interessante. Toda sua vida foi passada naquela cidadezinha, nada de grandes viagens, nada de festas malucas onde todo mundo acabava pelado na piscina, nada de fugas da polícia ou baseados na sala do diretor da escola. Evans me contou sobre a única vez que foi para a Disney, falou sobre seus irmãos, seus pais e a tia que cuidava deles. Contou que desejava cursar pediatria e que gostaria de conhecer a França, já havia até aprendido o idioma. Era tudo tão banal e comum, mas eu me pegava fazendo perguntas e rindo sobre a história de um menino de cinco anos que foi para a escola com o pijama por baixo da roupa escondido. Aliás, aquele era o tema favorito dela, seu irmão menor. Acho que seu nome era Max.
No fim, não me arrependi de ter aceitado o trabalho. Além do dinheiro extra, ainda havia Evans desfilando com aquelas fantasias de heroínas. Eu poderia beijar o cara que teve aquela ideia. Ok, ela ainda era muito nova e não tinha tanto o que mostrar, mas eu estava me acostumando com seu corpo.
Saí da cama e deixei o quarto. Com o pagamento de Rivers consegui alugar um lugar bem maior para ficar, não suportava mais aquela gaiola de ratos. Ashton estava impaciente para ir embora, não parava de reclamar da falta de sua bateria e se recusou a gastar seu dinheiro com outro quarto, mas vivia entocado no meu.
Quando passei para o espaço sala-cozinha tive que desviar de todas as latas amassadas espalhadas por ali. Abri a geladeira, fazendo mais latinhas de alumínio baterem umas nas outras. Pensei em pegar uma, mas acabei levando a mão para a caixa de suco de laranja. Tomei um gole direto da caixa, coloquei pão na torradeira e fui recolher o lixo no chão. Já havia recolhido tudo quando notei a garota do prédio ao lado me olhando desde sua janela, através da minha. Que imagem eu era, um metro e noventa e três usando apenas uma cueca da Nike recolhendo latas em sua sala. Ergui uma mão e acenei. A garota abriu um sorriso e acenou de volta. Pensei que, se fosse Evans ali, ao ser descoberta me espionando de cueca, teria ficado vermelha como Marte. Soltei uma leve risada, imaginando seu embaraço. Oh, Evans, apenas você para fazer um adicto do mau humor matinal rir como um idiota.
POV - JULIA
Quando soube que eu ainda não tinha uma fantasia para a festa da escola, Will jurou que teve taquicardia. Ele estava planejando a sua há semanas (iria de Mulher-Gato), mas eu realmente não tive tempo, entre a escola e o trabalho eu mal conseguia tomar um banho descente. Will me arrastou para a loja de fantasias assim que ela abriu.
- Do que o Ben vai se fantasiar? - ele quis saber, empurrando as fantasias no mostrador.
- Ele estava entre Deadpool e Assaltante de La Casa de Papel.
- Convença ele a ir de assaltante.
- Por quê?
- Mas fácil de tirar.
- Will! - eu ri.
- O macacão tem um zíper na frente, é prático. Ele poderia ir de Rio e você de Tóquio.
Eu também estava olhando as opções. Parei para ver uma em particular, Will notou.
- Por favor, não me diga que está pensando em ir de Frida Kahlo.
- Qual o problema com Frida? Ela foi uma mulher incrível.
- Eu sei, ótima fantasia significativa para a festa, mas nada boa para o pós-festa.
- Pós-festa?
- É. Você vai se livrar da roupa, mas e a maquiagem? Imagine o quanto Ben vai ter que se concentrar para não ocorrer um cessar-fogo sempre que ele olhar para a sua monocelha?
- Primeiro: Credo, Will. Segundo: Essa não é uma fantasia de Frida, acho que é de Carmen Miranda.
- Quem?
- Uma cantora brasileira, minha avó a escutava.
- Oh! Veja! - ele correu até outro mostrador, puxando um vestido com estampa de onça.
- O que seria isso? - perguntei, me perguntando se o resto da fantasia estava guardado.
- Acho que é de Mulher das Cavernas. Olha, tem um ossinho para colocar no cabelo.
- Devolve isso.
- Você é tão sem graça. - reclamou. Um segundo depois, seus olhos se arregalaram. - Aquilo é uma presidiária sexy? - ele correu de novo.
Olhei a fantasia listrada.
- O que você acha?
- Não sei bem, não é ruim, mas...
- Mas você vai com o Ben, não com o Luke. - ele completou.
- O que você quer dizer?
Will me lançou um olhar de você-sabe-do-que-estou-falando. Peguei a fantasia de sua mão e a devolvi para o cabide.
- O que tem o Luke?
- Ele é... misterioso.
- E daí?
- Daí que pessoas misteriosas escondem esqueletos no armário.
- Luke não tem nenhum esqueleto no armário, ele só é assim para atrair mulheres. - bufei.
- Bom, funciona. - Will se abanou. - Mas por trás daquele sorriso de cafajeste há algo mais, tenho certeza.
- Tipo... ?
Ele olhou ao redor e chegou mais perto.
- Eu acho que Luke está metido com algo... ilegal.
Esperei que Will fizesse alguma piada, mas ele estava sério.
- Como assim?
- Qual é, Jay. O cara é todo evasivo quando o assunto é o seu trabalho.
- E daí? Ele disse que entrega coisas para o chefe.
- Tá, mas que coisas?
- Sei lá, coisas!
- E aquele papo de "O meu trabalho não é para o seu irmão"?
- Ele disse que era por causa das viagens.
- Meu sensor de Gosto e Perigoso apitou assim que eu o vi pela primeira vez.
- Você precisa parar de ler fanfics, Will, sério.
Continuamos procurando pela fantasia, mas não conseguia tirar o que ele havia dito da cabeça. Será que Luke pode estar envolvido com algo... errado? Ele adorava aqueles jogos, era evasivo sobre sua vida particular, trabalhava pouco e, segundo ele, ganhava muito, eu tinha quase certeza que o que fumava era cigarros, mas eu não era a melhor pessoa para diferenciar essas coisas, e se não fosse? Ok, aquilo não significava que ele era um assassino de aluguel ou que vendia órgãos. Ou significava? Balancei a cabeça, horrorizada em pensar aquilo. Will e sua mente fértil...
Depois de conferir toda a loja, liguei para Ben. Ele escolheu ir de Clyde, mas me recusei a ser Bonnie, então comprei o macacão vermelho da série. Will não me deixou pegar a máscara do Da Vinci, disse que se eu não usasse seria mais fácil para beijar. Aquilo me deu mais vontade de levar a máscara. Beijar Ben ultimamente me fazia sentir como uma falsa descarada. Eu não estava mais apaixonada, já havia decretado aquilo, só ainda não havia encontrado o jeito de contar para ele.
POV - LUKE
Depois de comer, tomar banho e me trocar, dirigi até a casa dos Leicester. O velho havia me mandado uma mensagem, pedindo que eu o encontrasse em algum momento. Havia ignorado aquilo, até que recebi outra, e outra e outra. Uma das regras mais importantes do Rivers era trocar o número do telefone ao fim de cada serviço. Nada de rastros. Ashton já havia trocado o seu, eu consegui um novo, mas estava mantendo o antigo em segredo por um tempo. Ben tinha aquele número, Evans havia ligado uma vez, ela poderia ligar de novo. Eu precisava dar um jeito de ela aceitar o novo sem passá-lo para o garoto, ou os Leicester nunca parariam de chutar o meu saco.
A casa voltou a ser o de antes. Nada de flores, nada de segurança extra, nada de garçons e nada de convidados esnobes. Era novamente só a construção pálida e quieta. Seriam necessárias umas quantas pessoas gritando lá dentro para que se ouvisse algum barulho. O pensamento me fez perguntar como seria dar uma festa ali.
Grande Joe apenas me olhou de longe daquela vez, ou desistiu de pegar no meu pé ou o velho já o deixou avisado que eu viria. Não toquei a campainha, entrei sem cerimônia, o que assustou Jose que passava com uma bandeja, ela quase derrubou tudo.
- Oh, você de novo. - ela alisou o uniforme e passou a mão no cabelo.
- Eu de novo.
- Está procurando seu pai? Ou Ben?
Travei o maxilar com a palavra "pai", mas tentei sorrir.
- Um deles dois, sim, mas que bom que encontrei você.
A mulher quase hiperventilou, não parecia receber elogios com muita frequência, era pior que Evans. Evans. Será que ela está aqui?
- Aí está você, Luke. - virei para o corredor e encontrei o velho, parado meio para fora de uma sala. - Podemos conversar?
- Claro, claro.
- Ótimo. Quer alguma coisa? Jose pode trazer.
- Não, muito obrigado, Jose. - lancei um sorriso para ela.
- Estou à disposição. - ela me olhou nos olhos e sorriu, ficando vermelha.
O velho tossiu, me fazendo olhar para ele. Abriu ainda mais a porta e desapareceu lá dentro. Respirei fundo e fui até lá.
Aquele era o escritório. O sr. Leicester estava sentado na poltrona de couro confortável, um livro pesado sobre a mesa. Ele apontou para os assentos do outro lado da mesa. Continuei de pé.
- Então, como vai, Luke? - falou, tirando os óculos. Percebi que não eram os mesmos que usava normalmente, aqueles eram para leitura. Talvez também tivesse um par para jogar golfe e outro para explorar as ilhas ocultas da sra. Leicester. Rico estúpido.
- Eu estava ocupado. - falei de uma vez, permitindo que toda a arrogância saísse com a voz.
- Sinto muito, mas gostaria de lhe pedir um favor. - aquele tom tão letárgico fazia meus músculos ficarem tensos. Ainda não conseguia entender como minha mãe havia transado com aquele cara.
- Do que precisa? Sei arrombar casas e carros, sou bom em jogos viciosos e conheço um cara que consegue o que eu pedir, até órgãos.
O velho abriu os olhos surpreso, então balançou a cabeça para espantar aquilo.
- Não acredito que você anda fazendo esse tipo de coisa. - segurei o riso. - Mas o que preciso é bastante simples. Preciso que você receba algumas pessoas aqui em casa.
Ergui uma sobrancelha. Ele estava pedindo que eu servisse de mordomo?
- Receber pessoas não está na lista de minhas escassas qualidades, infelizmente.
- Eles irão chegar às oito, eu estarei em casa às oito e meia. Você só precisa fazê-los entrar e conversar por alguns minutos.
Soltei uma risada, imaginando a mim cercado de filhos da puta esnobes, comentando sobre a bolsa de valores e suas últimas férias no exterior. O velho pareceu ler meus pensamentos.
- Escute, Luke, apenas seja gentil e responda o que perguntarem.
- Ah, claro, não preciso mencionar que sou seu bastardo, entendi. - soltei, sabendo que aquela palavra o incomodava mais que qualquer outra, e segui sem deixá-lo responder. - E sua mulher?
- Margareth está fora da cidade, por motivos pessoais.
Espero que alguém tenha morrido. Espero que ela morra também.
- Deveria mandar algum de seus empregados. Com o salário que ganham devem até se vestirem de Village People e dançarem para seus convidados.
- Essa gente é importante, precisam ser recebidos por alguém da família.
Eu ri novamente, sentindo a raiva borbulhar. Eu queria bater a cabeça dele naquela mesa lustrosa e perguntar de que família ele estava falando.
- Pois deveria estar falando com Ben.
- Ben tem um evento na escola.
- Que desmarque.
- Impossível, ele se comprometeu com o diretor. Vai ser um dos alunos que ajudam a controlar tudo.
"Atrapalha-fodas" era como chamavam na minha escola. Ben daria um perfeito.
Passei os olhos pela sala. Era um típico gabinete de mansão, cheia de estantes apinhadas de livros, móveis de madeira pesada, carpete cobrindo o chão nunca pisado e cortinas finas cobrindo as janelas. Tudo ali cheirava a rios de dinheiro.
- Posso ficar com o peso de papel? - perguntei.
O velho me olhou um tanto confuso, seus olhos caíram no peso em forma de O Pensador.
- Você quer o peso de papel?
- Gosto do ar pensante que ele tem. - aquele cara parecia estar na melhor cagada de todas, aquela era a verdade.
O velho Leicester pegou a coisa e me passou.
- Você vai gostar, comprei na Alemanha, ele é... um bom peso de papel.
- Eu vou esperar por aí. - falei, já caminhando até a porta. O velho se apressou em levantar.
- Luke, só mais uma coisa. - ele afrouxou a gravata e limpou a garganta. - Você pode dizer que é meu filho. Meu filho de um relacionamento passado.
Meus dedos apertaram o peso de papel. Nada de usar a palavra bastardo. Aquelas eram as entrelinhas. Acenei com a cabeça e saí, fechando a porta com força. Fiquei lá parado examinando o peso de papel feio e imaginando o que eu poderia fazer. Talvez eu queimasse a porra da casa quando eles saíssem. Talvez eu só voltasse lá e mandasse ele se foder com o peso de papel. Que filho da puta.
Ainda estava tentando decidir o que fazer quando vi pelo canto do olho Ben. O garoto estava em frente ao espelho de corpo inteiro, examinando o terno que usava minunciosamente. Parecia dos anos 20, 30 ou 50. Eu não sabia.
- Vai para a ópera, irmãozinho? - perguntei me aproximando.
Ben lançou um breve olhar para mim, logo passando a examinar os sapatos lustrosos.
- Tenho um evento no colégio.
- Ah, mesmo? E nesse evento vai ter harpa e violino?
- É uma festa a fantasia.
- E a sua fantasia é de...
- Clyde.
- Clyde?
- É. - ele mostrou o chapéu. - Tentei convencer Jay a ir de Bonnie, mas ela não gosta deles dois.
- Claro que não, eles são assassinos.
- Eles fazem parte da Cultura Pop.
Evans nunca se vestiria de Bonnie, ele devia saber daquilo.
- Me disseram que você vai ser o atrapalha-fodas da noite.
- O o quê?
- O policial, o vigia, o homem da Lei.
- Ah. É, o diretor pediu, eu não podia dizer que não.
Ele iria passar grande parte as festa patrulhando, aquilo o manteria longe de Evans. Meu humor melhorou um pouco.
- Vê se deixa seus amigos se divertirem um pouco. - falei, passando por ele.
Do lado de fora, a lua tentava brilhando por trás das nuvens agrupadas. Talvez se chover os amigos do velho não apareçam. Caminhei até a calçada, onde a discreta lata de lixo ficava. Abri a lata e joguei o peso de papel lá dentro.
POV - JULIA
A festa não estava tão legal assim. Era no ginásio da escola, haviam professores e monitores rondando por ali, ninguém estava realmente a vontade. Mas a maioria dançava e alguns arriscavam alguma privacidade debaixo da arquibancada. Ben estava fingindo não ver.
Mesmo não estando mais apaixonada, mesmo não aprovando o personagem que ele escolheu, eu não conseguia parar de olhar para ele. Ben Leicester ficava muito bem de terno.
Will estava dançando desde o segundo em que chegamos. Havíamos vindo todos juntos, Ben, Will, Michael e seu par, uma garota chamada Tina, e eu. Eu havia acompanhado Ben em suas rondas, mas decidi ficar pra trás daquela vez. Michael e Tina estavam me fazendo compainha.
Olhei o lugar mais uma vez. Quem havia cuidado da decoração fez um bom trabalho baixando as luzes para que não fosse possível ver as vigas no teto, não exagerando no papel crepom e até rasparam os chicletes do chão.
- Esses saltos estão me matando. - Tina reclamou pela décima terceira vez. Eu estava contando.
Olhei para sua fantasia de Tsunade, era de algum anime japonês.
- Por sorte a minha fantasia é com botas.
Tina lançou um olhar para minhas botas de combate e torceu o nariz. Revirei os olhos. Gostei da minha fantasia de Tóquio, era fácil de colocar, não exigia maquiagem complicada e o mais importante: foi bem barata. O único ponto negativo era o calor que fazia dentro dela. O clima estava abafado.
- Ei, olhem lá! A Moana agarrando a Arlequina! - Michael gritou, apontando e rindo.
Olhei para o lado da pista de dança e vi as duas meninas se beijando. Os alunos ao redor gritavam e batiam palmas.
- A Disney não aprova! - Michael caiu na gargalhada com a própria piada. Tina e eu trocamos um olhar.
Ben voltou, trazendo duas 7 up. Alguém da organização havia tido a ideia de colocar bebidas à venda e doar o dinheiro arrecadado.
- Está se divertindo? - ele perguntou, me passando uma latinha.
- Uhum. - respondi, dando um gole. Não havia percebido que estava com tanta sede. - Obrigada.
- Ei, Ben, você podia falar com alguém da organização e fazer com que me deixem tocar alguma coisa. - Michael estava vestido de Tartaruga Ninja. Seria engraçado vê-lo no palco improvisado, tocando um de seus rocks favoritos.
- E por que eles iam me ouvir?
- Você é tipo um monitor da festa.
- E daí?
- Vamos, Ben, por favor cara! Eu até trouxe minha guitarra. - era verdade, Michael a estava carregando a festa toda. Tina parecia meio decepcionada, já que Michael mantinha as mãos mais na case que nela.
- Você conseguiu comprar. - falei, olhando a case.
- Sim! Precisei apanhar muita merda de cachorro, mas aqui está! Quer dar uma olhada? - o garoto sorria como se aquele fosse seu presente de Natal.
Tinha revirou os olhos e cruzou os braços.
- Claro. - falei.
Michael abriu a case e tirou de lá uma guitarra preta com duas letras X brancas.
- Uau, Michael, ela é demais!
- Ela seria ainda mais legal em cima daquele palco.
Todos nos viramos para olhar Ben. Ele se rendeu.
- Ok, tudo bem, vou ver o que posso fazer.
- Valeu, cara! - Michael deu um abraço em Ben, ele estava quase pulando de emoção.
- Volto já, Jay. - Ben beijou minha testa e desapareceu entre as pessoas.
Tina e eu ficamos ali sem saber muito bem o que fazer. Eu terminei meu refrigerante, joguei a latinha fora e observei a pista de dança.
- Que grande noite. - Tina resmungou. - Não acredito que aceitei vir com ele.
Ela lançou um olhar acusador para Michael, que estava tentando afinar sua guitarra, mesmo com todo o barulho, ele havia esquecido totalmente de seu par.
- O Michael é legal. - falei. - Ele só quer tocar. - dei de ombros.
- Eu sei, já ouvi ele tocar, ele fica tão gostoso. Mas ele deveria querer me tocar. - ela até fez um beicinho.
- Vocês vão para alguma pós-festa?
- Espero que sim. Mas vou fazer ele deixar aquela coisa em casa primeiro. E você e Ben?
- Ainda não sei. Ele está prestes a competir, talvez queira descansar. Eu vou trabalhar amanhã, então também não posso ficar até muito tarde por aí.
Ficamos em silêncio depois disso mais uma vez. Descartei Tina Wexler como uma possível amizade, não parecíamos girar na mesma órbita. Por sorte Will apareceu após alguns minutos.
- Jay, você não imagina o quanto dá pra sentir usando isso aqui. Eu me sinto quase nu entre todos esses corpos! - ele ainda estava dançando enquanto falava comigo.
- Fico feliz que você esteja aproveitando.
- Eu gostaria que aquele Hulk se aproveitasse de mim! Ou o Peter Pan, sempre quis ser a Wendy. Ben abandonou você de novo? É melhor ele ter cuidado, aquele Wolverine ali está te devorando com os olhos.
Lancei um olhar para o lado e vi que realmente alguém me olhava. Não consegui reconhecer o garoto.
- Ele é quente. Como você consegue? Mesmo usando esse macacão horrendo? - Tina se meteu na conversa.
Will a olhou dos pés a cabeça. Ele também desaprovava a fantasia dela, mas não falou nada.
- Lá vem o Ben. - falei.
Michael também o viu.
- E aí? Vou poder tocar?
- Uma música, então escolha bem.
- Você tá falando sério?!
- Tô, cara. - Ben riu.
- Valeu, valeu, valeu, valeu! - Michael o abraçou, agora sim, pulando. - O que eu toco? Shock me? Purple Haze? Stairway to Haven?
- Não sei, mas decida rápido, você vai tocar no intervalo da banda, em alguns minutos.
- Ok, ok. Tudo bem. Eu consigo.
Michael foi se preparar perto do palco e Ben o acompanhou, junto com Tina. Will e eu fomos comprar uma bebida pra ele e, ainda estávamos na fila quando Michael subiu no palco. Ele acabou escolhendo a música do Led Zeppelin e estava arrasando.
- Quando se tem os contatos certos, você consegue tudo o que quer. - uma voz enjoada falou bem no meu ouvido.
Me virei e encontrei Olivia, usando uma fantasia de coelhinha sexy.
- Oi, Olivia. - falei, voltando a atenção para Michael. Era impressionante como os dedos dele se moviam. A guitarra gritava.
- Onde está seu ticket consigo-o-que-quero, Julia?
Ah, você não foi embora. Eu a ignorei.
- Não acredito que o Ben seja tão idiota. Como ele não percebe que está rodeado de aproveitadores?
Will, que estava na minha frente, esticou o pescoço para olhá-la.
- Por que você não vai passar gonorréia para alguém, Olivia? - ele perguntou.
- Por que você não vai pesquisar quanto vai te custar ter o pinto cortado, Will? Talvez o Ben pague também.
Eu precisei segurar Will no lugar.
- Não vale a pena, você só vai ter problemas. - falei.
Michael estava no solo. Todo mundo vibrava junto, saltando e gritando. A festa havia se transformado em um show. Pegamos nossas bebidas e, enquanto Will pagava, abri a minha e dei um gole. Olivia esbarrou em mim, me fazendo derramar Coca em meu macacão.
- Opa, desculpe. Não se preocupe, a lavanderia dos Leicester é ótima.
- Por que você não nos deixa em paz, Olivia? Não fizemos nada para você. - falei, sentindo minha pele ficar grudenta onde o refrigerante caiu.
- Eu não sei o que Ben vê em você. Talvez você só seja a obra de caridade dele, a menina que perdeu os pais, ele vai cansar em algum momento. Que pena que quando isso acontecer seus pais não vão reviver.
Eu nem cheguei a pensar, eu apenas fiz. Minha mão jogou toda a Coca bem na cara de Olivia. Ela abriu a boca em um perfeito O.
- Vadia. - ela grunhiu.
- A vadia aqui é você! - gritei, puxando aquelas orelhinhas de coelho ridículas de sua cabeça. Estavam presas com grampos, Olivia reclamou de dor. Ela tentou pular para cima de mim, mas Ben chegou nesse momento e a segurou, então eu pulei em cima dela.
- Qual o problema de vocês?! - Ben gritava sobre a guitarra de Michael. Ele segurava Olivia com um braço e me empurrava com o outro. Alguém acabou me puxando pra trás, nem me virei para olhar quem.
- Ela jogou refrigerante em mim! Minha fantasia!
- O que você fez, Olivia? - Ben tinha o braço ao redor da cintura dela.
- Sua namorada não é uma santa, ok? Ela arrancou meu cabelo!
- Julia?
Eu estava chorando. Sempre chorava quando discutia. Pena que seus pais não vão reviver.
- Ben, eu...
- Por que você a machucou? - ele está bravo. Bravo comigo.
- Melhor perguntar o que a Demônio Loira aí fez! - Will gritou.
Ben soltou Olivia, pegou meu braço e me arrastou até o lado de fora do ginásio.
- Você não devia ter feito aquilo. - ele falou, ainda irritado.
- Estou cansada daquela garota. Todo mundo está.
- Mas todo mundo não tentou afogar ela com Coca-Cola.
- Tenho certeza que todo mundo adoraria fazer isso.
Ben respirou fundo, então me olhou.
- É sério, Julia, não volte a fazer algo assim. Apenas a ignore.
- Você nem sabe o que ela falou! Ela...
- Não importa. Não vale a pena. Se alguém contar para o diretor, se ela for suspensa...
- Se ela for suspensa?
- Olivia já tem outras suspensões. Ela pode ser expulsa.
- Seria um baita golpe de sorte.
- Jay...
- Ninguém quer ela aqui. Ela é uma pessoa horrível, Ben.
- Ela é minha prima, é minha família, você vai ter que se acostumar...
- Eu não tenho que fazer nada!
Ben passou as mãos no cabelo, nunca o vi lutar tanto para se controlar.
- Estou falando sério, Julia, aquilo não pode se repetir.
- Ela só precisa ficar longe de mim.
- Prometa que não vai mexer com ela.
- Eu não acredito que você está transformando ela em vítima.
Eu o olhava como se fosse a primeira vez. Aquele não era o meu Ben.
- Só prometa, Jay.
- Não.
- Por favor, por favor.
- Por que isso é tão importante pra você?
Pena que seus pais não vão reviver.
- Já falei, ela é família. Você não pode provocar ela.
- É ela quem provoca todo mundo.
- Todo mundo não importa! - ele gritou, alto. Dei um passo para trás. - Porra, Jay. Estar perto de mim é correr o risco de topar com ela, na escola, no clube, na minha casa. Se você não pode prometer que vai se comportar, então...
- Então o quê?
Ben fechou as mãos em punhos e as pressionou contra os olhos.
- Então o quê?
- Eu vou levar você pra casa. - ele falou baixinho, tentando tocar meu ombro. Eu o afastei.
- Então o quê, Ben?
- Nada! Então, nada!
- Então eu não posso estar perto de você? É isso?
- Não... - Aquele não foi completamente um sim.
- É melhor eu começar agora mesmo, não acha? - dei outro passo para trás.
- Jay...
Virei as costas e comecei a me afastar. Ouvi Ben me chamar e começar a me seguir. Quando olhei para trás Will estava ali, no caminho, empurrando ele para trás. Continuei andando, até virar o corredor, depois corri.
POV - LUKE
Quando Ben e o velho saíram, a primeira coisa que fiz foi dispensar os empregados. Dos oito, cinco praticamente correram agradecidos pela folga, mas os seguranças hesitaram por algum tempo, no fim, dois desapareceram também, ficando apenas Grande Joe. Ele tentou ligar para o velho, mas ele não atendeu.
Assaltei a cozinha, comi até sentir que iria vomitar, usei o videogame do garoto, a hidromassagem dos velhos e em seguida liguei para Ashton.
- Cara, eu tô no Paraíso. - falei, escolhendo, entre os perfumes caros do velho qual eu usaria. Achei sua coleção de relógios, mas decidi não pegar nenhum, talvez fosse ir longe demais.
- Eu já estava me perguntando se a sra. Leicester havia enforcado você com um lenço da Gucci.
Eu ri. Ela tinha mesmo lenços da Gucci.
- Eu preciso que você faça uma coisa.
Uma hora mais tarde, eu estava sentado nas costas de um dos sofás brancos da sala, com meus sapatos nas almofadas, uma garrafa de cerveja nas mãos e pensando que talvez eu gostasse de ser rico. Talvez.
- De onde você tirou tanta gente em tão pouco tempo? - perguntei a Ashton, quando ele apareceu ao meu lado. Tinha marcas de batom no pescoço e um sorriso enorme na cara. Seu braço estava na cintura de uma loira-morango gostosa. Muito gostosa.
- Eu tenho meus contatos! - ele gritou.
Aposto que ele havia parado em algum lugar cheio e gritou o endereço da Casa Leicester seguido pelas palavras cerveja e festa. A multidão que lotava todos os cômodos térreos da casa era formada desde filhos da classe média-alta até punks. Ninguém me parecia levemente familiar.
- Você me prometeu uma performance particular. - a loira-morango falou, sua mão estava explorando a pele desde o pescoço dele até os botões abertos de sua camisa.
- Essa é uma promessa que eu pretendo cumprir, Jess.
- É Denise.
- Denise é muito longo para tatuar no meu coração.
- Você tem um coração pequeno, hum? - a garota estava praticamente montada nele. Ashton mostrou seu pulso esquerdo, onde tinha um coração tatuado. - Oh, que seja Jess por uma noite.
Ashton puxou o rosto dela para o seu. Mesmo com a pouca luz eu conseguia ver as línguas brigando.
- Arranjem um quarto! - reclamei, chutando uma almofada neles.
- A gente pode usar até a cama do cachorro. Você viu o tamanho daquilo? - ele perguntou para mim.
Balancei a cabeça. Ashton devia estar muito bêbado. A garota o arrastou dali.
- Você tem uma bela casa. - comentou uma voz junto ao meu ouvido. Virei a cabeça para encontrar uma loira cacheada, com olhos estreitos.
- Essa não é minha casa. - respondi, oferecendo a minha cerveja para ela. A garota colou os lábios pintados no gargalo e deu um gole. Fez aquilo de um jeito muito sensual.
- Então, você a invadiu?
- Não seria nós? Você também está aqui, não está?
Ela sorriu.
- Em um segundo posso não estar.
- Minha filosofia de vida é aproveitar o momento. - falei tentando pegar a garrafa de sua mão, mas ela a puxou para longe, sorriu outra vez, com o olhar quente provocando o meu, e deu outro gole.
- Você deveria ser mais rápido.
- Ou você mais lenta, já que é loira.
A garota riu com vontade, fazendo surgir uma covinha inocente em sua bochecha. Não, Evans tinha uma covinha inocente, aquela ali é infernal. O que ela estaria fazendo naquele momento? Provavelmente se agarrando com Ben. O pensamento me deixou desconfortável.
- Olá, continua por aqui? - a loira estalou os dedos em frente aos meus olhos.
- Em um segundo posso não estar. - citei suas palavras, arrancando outro sorriso travesso. Ela ficou em pé, puxando o vestido para baixo - Vou dar uma volta.
- Essa cerveja é minha.
- Ela vai estar comigo, se quiser de volta, venha pegar. - e ela deu dois passos para trás, ainda me olhando.
- E onde vocês vão se esconder?
- Em algum lugar lá em cima, ao ar livre. - deu outro passo e virou-se. Enquanto se afastava, estudei aquele vestido preto que deixava as costas nuas, tão parecido com um outro que eu só tive o prazer de ver uma vez. Ao perceber para onde meus pensamentos estavam me levando, ou melhor, para quem, grunhi. Saia da merda da minha cabeça, menina!
A campainha tocou e eu me arrastei em sua direção, imaginando quantas pessoas ainda caberiam na casa. Ao abrir a porta, me perguntei porque três velhos estavam parados ali.
- O sr. Leicester... - começou a falar o velho do meio, mas parou, chocado, ao ver um casal bater na parede ao lado, se agarrando como se não houvesse amanhã. As mãos do cara estavam por baixo da blusa da garota.
- O sr. Leicester não está. Querem deixar recado? - perguntei, ignorando o casal.
- Mas o que está acontecendo aqui? - o velho da esquerda perguntou, rubro como um tomate.
- Uma festa. Se os cavalheiros desejarem, podem fazer parte. As garotas adoram homens mais velhos.
Os dois que haviam falado antes me olharam como se eu tivesse oferecido a eles bebês chineses contrabandeados, mas notei que o terceiro considerava o convite, enquanto assistia o casal ao lado se apalpar mutuamente. Aquilo me fez rir.
- E quem é você, rapazinho? - o primeiro exigiu saber, apontando um dedo torno pra mim.
- Sou o resultado de uma foda entre o sr. Leicester e uma australiana. E sou quem está prestes a repetir a história, bem, talvez não com uma australiana, sequer sei como se chama, e também não pretendo gerar um bastardo, mas... - dei um passo para trás e fechei a porta.
Procurei pela loira, mas era quase impossível distinguir alguém daquela massa. Lembrei das palavras dela e corri para as escadas, me perguntando como ela sabia que a casa possuía uma varanda, já que estava nos fundos e não era visível da rua. Talvez ela já tivesse estudado a casa antes, poderia fazer parte de uma banda de assaltantes. Por mim, ela poderia levar até as cuecas do velho, desde que tirasse a minha primeiro.
O segundo andar estava vazio. Enquanto cruzava o corredor, senti o piso vibrar por causa da música lá embaixo. A música alta me deixa tonta, Evans disse uma vez. Eu estava deitado no chão do restaurante, raspando os chicletes debaixo das mesas. Ela afastou o cabelo que caía em minha cara, sentada ao meu lado. Oh, garota, eu conheço tantas formas de te deixar tonta.
Entrei no quarto principal e logo notei a porta de correr aberta. Atravessei o cômodo e a vi. Ela estava inclinada na varanda, sua pose insinuando uma simples observação do ambiente abaixo, mas que deixava seu corpo atrativo, e ela sabia daquilo.
- Comecei a pensar que o lento é você. - ela falou me lançando um olhar por sobre o ombro, logo voltando a atenção para as nuvens pesadas no céu.
Aproximei-me, apoiando meu corpo nas suas costas e passando os braços por seus ombros. Ela estava fria por causa do ar livre, mas eu tinha ótimas ideia de como fazê-la suar. Quase rir ao pensar em levar aquela estranha para a cama do velho. Tive o pressentimento que aquilo me daria uma grande satisfação. Aquela cama não via uma ação há tempos, eu poderia apostar.
- Onde está minha cerveja? - perguntei, apertando-a contra mim. Minhas mãos exploravam seus braços dos pulsos aos ombros.
- Eu a bebi. Mas pode procurar por ela, se quiser.
Afastei nossos corpos por um segundo, para poder virá-la de frente para mim, colando-os novamente em seguida. Sem mais delongas, levei minha boca para a sua, abrindo caminho com a língua.
- Acho que estou sentindo o gosto. - falei, logo puxando a cabeça para a frente novamente. Empurrei meu corpo contra o dela, deixando-a presa entre mim e o parapeito da varanda. Senti cada curva contra minha pele. Seus dedos afastaram meu cabelo, e eu estremeci ao lembrar daquele gesto feito por outras mãos.
E então, ela invadiu minha mente como um tsunami. O corpo que eu abraçava febrilmente era o dela, aquele cabelo se transformou em amarronzado, os olhos seguramente eram dúbios, nunca se decidindo entre o verde e o chocolate. Uma barra de chocolate no jardim. Ah, Evans, por que você tem que ser tão... E esse vestido, inferno! Esse vestido me faz ter pensamentos que você não aprovaria. A ponta dos meus dedos tocaram o fim das coxas dela e subiram para massagear sua bunda, sem nunca quebrar o beijo. Meu jeans parecia querer explodir.
Menina, por que não olha pra mim? Você nunca me vê realmente. Eu nunca desejei tanto um olhar antes de conhecer o seu... Eu preciso que você olhe para mim! Puxei o rosto dela para longe, bruscamente. A necessidade de ser observado por ela era tão angustiante quanto a de apertá-la contra mim. E ela me olhou, sobressaltada, mas aqueles olhos não eram marrons esmaltados de verde, eram azuis e tão frios quanto os meus. Quase me assustei ao perceber que aquela não era Evans. É claro que não, cacete, Evans estava em algum lugar usando uma fantasia sexy que divertiria muito o meu irmãozinho.
O pensamento esquentou-me de uma maneira diferente. Travei o maxilar e fechei os olhos. Na escuridão da minha mente, vi os dois, enroscados, quase como um só. Ben perdendo aquela irritante timidez enquanto apertava a bonita pele exposta, logo criando coragem para passar para a pele escondida também. E Evans? A menininha de vestidos rodados havia desaparecido. Ali ela era uma mulher, que colocava a cabeça para trás e resmungava prazerosa, querendo ser tocada. Inferno! Inferno! Inferno!
- Você está me machucando!
Abri os olhos para ver a loira se contorcendo. Afrouxei meus dedos para soltá-la e notei as marcas em seus braços.
- O que deu em você? Não precisa ser tão forte!
As imagens continuaram vindo, uma atrás da outra, flutuando diante de meus olhos abertos. Será que eles... Provavelmente depois da festa. Que horas eram? Ben a traria para sua casa? A veia na minha testa vibrava. Eu ainda podia ver eles dois em minha cabeça, chegando ao final juntos, eu podia ouvir.
Sem saber como, eu estava me movendo. Mal notei as escadas. O jeep estava parado logo em frente a casa, mas a moto seria mais rápida. Pesquei as chaves do bolso, pulei sobre ela e a liguei.
POV - JULIA
Will me encontrou no banheiro feminino do segundo andar. Eu estava patética, chorando em uma das cabines. Por sorte não havia outra garota ali para reclamar da invasão dele.
Eu queria contar como Ben havia sido um completo idiota, ficando do lado de Olivia e todo aquele papo de "fique longe dela", mas ao mesmo tempo não queria falar. Qual era o problema dele? Ele sabia o quão detestável a prima era. Ele me conhecia. Will ficou ali até que eu me acalmei, acabamos sentados no chão nojento. Não nos importamos.
- Foi muito ruim? Só cheguei no final. - ele perguntou, baixinho. Era o mesmo tom que ele usou para falar comigo na semana que seguiu a morte dos meus pais. Pena que eles não vão reviver. As lágrimas voltaram.
- Acho que a gente terminou.
- Acha?
- Não sei se foi ele ou eu.
- Oh, Jay...
- Eu sei que estava procurando o momento para terminar, eu sei que íamos nos separar, mas eu não queria que tivesse sido assim.
Ele me abraçou, foi um pouco desconfortável com o couro da sua fantasia grudando em meu rosto.
- Will, será que você pode me deixar sozinha?
Ele se afastou para me estudar.
- Tem certeza? A gente pode ir pra casa.
- Não quero chegar em casa assim. Preciso de um tempo.
Ele concordou com um aceno e ficou em pé.
- Eu vou esperar lá fora.
- Não, volte para a festa, eu te mando uma mensagem.
- Se eu voltar para lá vou limpar o chão com a fuça daquela biscate.
Eu quase ri do seu xingamento. Quase.
- Vá se divertir, Will, sério. Eu já vou descer.
Ele me deu mais um abraço e saiu.
Levei um minuto para me levantar e ir até as pias. Meu reflexo estava horrível, nariz vermelho, olhos inchados. Eu sabia que deveria ter pegado aquela máscara. Ainda estava me encarando pelo espelho quando duas meninas entraram no banheiro, rindo. Saí dali rapidamente. Parei no corredor vazio. Coloquei a mão no bolso onde pensei que estava meu celular, mas não senti nada. Verifiquei os outros e o resultado foi o mesmo. Droga, não acredito que ficou no carro do Ben. Eu não estava pronta para voltar até o ginásio e procurar Will, correndo o risco de encontrar Olívia. Subi um andar, olhei para as salas de aula quietas e entrei em uma. Estava tão escuro ali que não me arrisquei a ir muito longe, fechei a porta e sentei ao lado dela. Puxei meus joelhos para cima e escondi meu rosto nos braços.
Pena que seus pais não vão reviver. Como ela conseguia ser tão má? Quem diria uma coisa daquelas? Era horrível.
Ouvi a porta ser aberta ao meu lado. Fiquei quieta, esperando que não me notassem ali. Talvez Will havia cansado de esperar e estava me procurando.
Senti quando ele sentou ao meu lado, seus dedos tocaram a parte da minha bochecha exposta.
- Evans. - aquela voz me fez erguer a cabeça rapidamente. Por meio segundo pensei que meus ouvidos estavam me pregando uma peça, mas meus olhos não me enganavam, eles estavam adaptados o suficiente para verem Luke ali. Quando a surpresa passou, veio a pergunta óbvia:
- O que você está fazendo aqui?
POV - LUKE
Quando estacionei em frente a escola, um trovão me fez olhar pra cima por um segundo. O vento estava forte, jogando folhas secas e papéis em mim enquanto caminhava em direção ao prédio. Agora sentia-me estranhamente calmo. Estava perto, eu só precisava encontrar os dois e dar um jeito de interromper a noite.
Aquele tipo de festa geralmente acontecia no ginásio, não foi difícil encontrar o lugar, apenas segui o barulho da música e os gritos de animação. Virei mais um corredor e encontrei as portas abertas. A festa que acontecia ali era tão diferente da que rolava na casa do velho. Ali não havia álcool nem baseados, as músicas passavam pela censura e os convidados fantasiados cheiravam a leite e fraldas. Parei junto à entrada e passei os olhos pelo lugar. A grande massa se espremia na pista de dança. Alguns grupinhos estavam de lado, tomando refrigerante e flertando. Por favor, que eu não os encontre debaixo das arquibancadas. O velho não gostaria se eu quebrasse seu filhinho em dois.
Abri caminho até as arquibancadas, empurrando um Frankenstein, um smurf e um Hulk com short mais para tanga. Cheguei aos degraus e comecei a espiar entre eles. O lugar escuro e apertado estava mais que bem utilizado, vários casais aproveitavam o espaço, mas não vi nenhum Clyde. Qual seria a fantasia de Evans? Eu devia ter perguntado.
Alguém puxou minha jaqueta, me fazendo virar. Era uma Mulher-Gato que definitivamente não era uma mulher.
- Eu não sabia que você viria! De quê está fantasiado? De mister cafajeste? De sexy e selvagem? Christian Grey? - era Will, claro. Estava ridículo com aquela máscara de gato.
- Não vim para a festa. - falei, me recusando a olhar sua fantasia da cintura para baixo. Era apertada demais.
- Está procurando seu irmão?
- Estou procurando a Evans, e tenho a sensação que ela está com ele.
- Hum, acho que sua intuição está com defeito. Isso é couro de verdade? - quis saber, pegando em minha jaqueta novamente. Afastei sua mão.
- Eles não estão juntos? - a ideia de Ben longe de Evans me aliviou.
- Houve uma briga no paraíso. A serpente Olivia Eloy criou intriga.
- E onde ela está?
- Quem? Olivia?
- Evans. - grunhi, afastando suas mãos outra vez, com mais rudeza.
- Ai! Não seja bruto! Eu sei onde está Evans, mas por essa maldade vai ter me dar sua jaqueta pela informação.
- Você só pode estar brincando.
- Estou fazendo isso por ela. Jay precisa de um consolo. Você é um consolo vezes dez. A jaqueta é a recompensa por minha boa ação.
- Consolo? Eles brigaram sério? - aquilo estava cada vez melhor.
- Vai ter que perguntar pra ela.
Tirei a jaqueta reprimindo a vontade de fazer aquela fantasia estúpida dele entrar em lugares inapropriados. Ele a pegou e levou direto para o nariz.
- Nossa, você cheira a testosterona.
Merda, eu adorava essa jaqueta, agora não vou conseguir usar de novo.
- Onde ela está? - perguntei, me controlando.
- Eu a deixei no banheiro, ainda deve estar lá.
- Deve estar?
- É só procurar.
Agarrei seu pescoço e o puxei para frente, era para intimidar, mas ao notar que ele estava gostando o soltei rapidamente.
- Você disse que sabia onde ela estava.
- Opa, desculpe por meio que enganar você. Mas, se serve de consolo, você fica mais quente só de camisa. - então, ele rodou nos tornozelos e escapou.
Deixei o ginásio me perguntando onde diabos ela poderia estar. Entrei e saí de corredores, testando todas as portas, mas estavam trancadas. Entrei em ambos os banheiros, só para encontrá-los vazios. Subi para o segundo andar e girei maçanetas atrás de maçanetas. Ouvi passos em algum lugar, seguidos de risadas. Dobrei uma esquina a tempo de ver um casal entrar em um armário de limpeza. A garota era uma Alice ruiva. Tentei a primeira porta à direita e vi que estava destrancada. Era uma sala de aula. Entrei e vasculhei o lugar dando em nada. Todo o corredor estava destrancado e igualmente vazio. Comecei a me irritar, sentindo a ansiedade tomar conta. Meu punho encontrou algumas paredes e portas. O próximo corredor começava com um laboratório. Coloquei a cabeça para dentro e automaticamente acreditei que estava vazio, mas ao olhar para o lado a vi.
Evans estava escondida no canto por trás da porta. Seus joelhos estavam para cima, os braços dobrados sobre eles e a cabeça ali no meio.
Sentei ao lado dela e afastei uma mecha de seu rosto.
- Evans. - chamei.
Sua cabeça ergueu com um salto e virou para mim.
- O que está fazendo aqui? - perguntou, surpresa.
- Estou procurando você. E o que você faz detrás de uma porta?
Evans virou o rosto e baixou o olhar.
- Eu queria ficar sozinha.
- O que o garoto fez? - aquilo me intrigava. A verdade é que eu não conseguia imaginar Ben fazendo algo tão errado. Ele era sempre politicamente correto. Irritante.
- Não é da sua conta. - foi sua resposta.
- O que não é para o meu bico geralmente me atrai. - Você é um exemplo disso, garota? Diga-me.
- Isso se chama ser fofoqueiro. - resmungou. Ela levou meio minuto em silêncio, antes de decidir falar. - Foi o Ben. E a Olivia.
- Todos contra Evans?
Aquilo a fez me lançar um olhar bravo. Ela odiava quando eu zombava dela, e eu adorava a cara que ela mostrava, parecia um filhote de coelho tentando ser ameaçador.
- Foi realmente ruim, ok? - continuou, com a raiva crescendo visivelmente. - Primeiro, Olivia insinuando que eu estava com Ben por interesse, eu ignorei isso, claro, mas então ela falou algo... algo realmente ruim.
- O que ela falou?
Evans esticou as pernas em sua frente. Meus olhos estavam adaptados o suficiente para decifrar sua fantasia.
- Não importa, Luke.
- Importa sim. Me conte.
Ela balançou a cabeça, negando.
- Não quero repetir aquilo.
- Tudo bem. E o que aconteceu depois?
- Joguei refrigerante na cara dela. Ela tentou me bater.
- Espero que você tenha arrancado um olho dela. - falei, tentando não rir ao imaginá-la brigando.
- Não, Ben entrou no meio. Eu quase arranco um olho dele.
- Meu irmãozinho quase fica cego para salvar a honra de sua amada? Aposto que o velho vai mandar fazer uma estátua em sua homenagem e colocar no jardim.
- Ben pulou para defender ela. - a voz de Evans tremia de raiva. - Ele ficou do lado daquela... anta depilada. Disse que eu não devia provocá-la.
Fiquei surpreso e confuso. Mas, talvez, Ben tenha feito aquilo para impedir que Evans ficasse encrencada, mas eu não iria compartilhar minha hipótese. Não seria a ponte que uniria os dois, pelo contrário, seria quem destruiria tal ponte.
- Já parou para pensar que os dois podem estar tendo um caso? - perguntei.
- Quê? Não, quero dizer, eles são primos.
- Eu tenho uma prima anta depilada?
- Não, a mãe do Ben é prima da mãe da Olivia. - ela esclareceu e, logo em seguida, sorriu ao perceber que eu havia usado seu xingamento infantil.
Aquele leve franzir de lábios me esquentou, não como as garotas geralmente esquentavam, aquele ardor era diferente, menos centralizado e mais abalador.
- Então, tudo isso começou com ciúmes de primos ou o quê?
Evans deu de ombros.
- Eu sei lá. Olivia sempre foi assim, com todo mundo. Uma vez, quando estávamos na sétima série ela ficou me provocando por duas semanas. Era tão idiota, ficava me chamando de - ela parou abruptamente e me olhou.
- De? - encorajei para que continuasse.
- Não é da sua conta.
Revirei os olhos.
- Vamos, Evans, cospe logo. Acredite, seu amigo purpurina está mais que disposto a me dar informações.
- Droga, Will. Ok, ela ficou me chamando de Virgem Maria. Que ridículo, a gente tinha doze anos. - ela brincava com o zíper do seu macacão. - Eu serei o alvo preferido dela agora.
- Encontrei lá embaixo garotas que provavelmente nunca foram tocadas nem com um pau, por nenhum tipo de pau, talvez Olivia prefira infernizar elas.
- Não seja depravado! - ela me deu um tapa no ombro, mas riu.
Fiquei de pé e ofereci a mão.
- Vamos.
- Para onde? - quis saber, pegando minha mão, eu a puxei para cima.
- Eu posso te levar pra casa. Ou para qualquer outro lugar. - brinquei.
Evans me olhou por um minuto, estava séria.
- Me leve para jogar sinuca.
POV - JULIA
Luke e eu saímos do laboratório e descemos para o primeiro andar. Haviam alguns alunos pelos corredores, todos me olharam, alguns sussurraram, me dando a certeza que todo mundo já sabia sobre a briga. Tentei não ficar vermelha e apertei o passo. Não falamos nada até chegarmos ao estacionamento e eu dar de cara com a moto laranja e mortalmente perigosa dele.
- Oh. - soltei. Pensei que ele estaria com o jeep.
- Lembra da Evans? - Luke perguntou, jogando o capacete para mim. Continuei paralisada. Eu nunca havia andado naquele tipo de transporte assustador. Parecia tão vulnerável, e se um caminhão batesse na gente?
- O que está esperando? - ele já estava sobre ela. Parecia tão confortável ali quanto em um sofá.
- Hum, eu não, não vou subir nesse negócio.
Um clarão cortou o ar, iluminando tudo por um segundo como se fosse dia, então o trovão rugiu, me fazendo tremer. A pressão do ar aumentou e eu lancei um olhar para cima. Tudo o que eu preciso para tornar esse dia melhor é uma tempestade.
- Se demorar muito vamos tomar um banho a noventa quilômetros por hora. - Luke comentou, também olhando o céu.
- Noventa? - quase engasguei.
Ele deu algumas palmadinhas no assento atrás de si. Resolvi montar. Não queria voltar para dentro, não queria ir para casa. Luke era minha única opção. Quando minhas pernas apertaram sua cintura e senti toda a proximidade de nossos corpos, fiquei um pouco desconfortável e um tanto... Controle-se, Jay! Escondi a vermelhidão do meu rosto com o capacete.
- Evans, você me deixou... contente. - Luke falou, em tom pensativo.
- Como?
- Porque você me escolheu. - suas palavras fizeram cosquinhas em minha barriga. - Segure-se firme.
- Onde?
- Nas alças, estão bem ao seu lado, ou em mim. - ele abriu seu sorriso cafajeste. - Eu voto na segunda opção.
Encontrei as alças e segurei firme.
- E o seu capacete? - perguntei olhando para sua cabeça desprotegida.
- Só tenho esse aí. Não costumo dividir minha moto.
- Mas é muito perigoso.
- Está preocupada comigo, Evans?
- Não quero que parta a cabeça em uma árvore.
- Você deveria estar preocupada com a polícia.
O pensamento me deixou nervosa. Estávamos contra a Lei?! Antes que eu pudesse pular para a calçada, Luke ligou a moto e saiu em disparada, deixando minha coragem e minha sensibilidade para trás.
POV - LUKE
Porque você me escolheu. Eu devia me sentir um idiota falando aquilo, mas só conseguia sentir uma sensação de pequena vitória. Ela poderia ter voltado para o Ben, decidido ficar com Will ou chamado um táxi, mas ela veio comigo. Nem sabia que estava competindo com eles, mas o que importava era que eu havia ganhado.
POV - JULIA
Luke dirigia como um lunático. Parecia ter total confiança em sua moto, como se fosse uma extensão de seu próprio corpo. Deslizava por espaços que eu jurava não serem suficientemente largos para uma bicicleta, ainda menos para uma motocicleta. Meus braços doíam pela força que eu segurava as alças, mas perderia os dois antes de soltá-las. Me arrependi de estar ali com dois minutos em movimento. Iríamos morrer. Bom, Luke não, ele sabia o que estava fazendo. E eu? Eu seria jogada para a morte.
Outro trovão rugiu sobre nossas cabeças. Eu podia sentir o pânico chegando. Ao piscar, me vi em um antigo carro, com meus pais. De repente, Luke estava entre meus braços, eu o abraçava pela cintura e teria enterrado meu rosto em suas costas, mas o capacete me impedia. Pense em outra coisa, Jay, controle seus pensamentos, leve-os para um lugar seguro. A voz do dr. Kendrick, meu psicólogo por um ano, soaram claras em minha cabeça. O rosto de Max apareceu, meu irmãozinho deveria estar debaixo de suas cobertas, quentinho. Amanhã eu o levaria para passear, estava devendo um sorvete a ele. Eu escolheria de chocolate ou baunilha. Enquanto divagava, senti as gotas da chuva me molharem, mas as ignorei. Precisava esquecer da tempestade, precisava permanecer com Max...
POV - LUKE
Pensei que Evans levaria cinco minutos para desistir das alças e passaria a me segurar pela cintura, mas ela aguentou firme. Eu lançava olhares pelo retrovisor, conseguia ver sua postura rígida. Tentei me concentrar no caminho, mas me peguei desejando seu toque. Vamos, menina, você não é tão corajosa. Acelerei mais, deslizando entre os carros frenéticos, inclinando a moto nas curvas, mas ela seguiu agarrada às alças. Estava prestes a desistir quando outro clarão cortou o céu. O trovão veio furioso, vibrando o ar ao nosso redor. Imediatamente os braços de Evans apertaram minha cintura, tão forte que chegou a doer. Sorri para mim mesmo, como se fosse Natal.
Não ousei diminuir a velocidade para que ela não se afastasse. Meus olhos estavam pregados na rua à frente, mas minha mente vagava. Eu sentia seus braços ao meu redor, fiquei imaginando como seria suas mãos em mim, explorando... Quase não senti as primeiras gotas. A chuva em si caiu de uma forma tão repentina que me pegou de surpresa. Em um segundo eu estava no controle e no seguinte a água batia em meu rosto, me impedindo de enxergar. Passei o braço nos olhos, me livrando da água, mas logo estava cego novamente. Com a velocidade cada vez mais baixa, os carros passaram a buzinar enquanto desviavam da gente. A moto passou por cima de alguma coisa, nos fazendo pular. Seguimos por alguns metros, até que percebi que a chuva não era nosso único problema. Levei a moto até uma calçada e parei.
- O que houve? - Evans perguntou, descendo da moto antes de mim.
Ignorei sua pergunta e me agachei perto do pneu traseiro. Como eu desconfiava, está furado.
- Ei, Luke, o que aconteceu?
Fiquei de pé e olhei para ela. Evans estava ensopada, o macacão pesado e escorrendo água. Ao menos sua cabeça estava protegida pelo capacete, eu não tinha aquela sorte.
- O pneu está furado. Eu não conseguia enxergar com toda essa água na cara.
- Então, troque o pneu! - ela estava impaciente, tentando se encolher da chuva. Levou um minuto para perceber minha expressão. - O quê? Não me diga que não tem um outro pneu.
- Evans, isso é uma moto, não uma caminhonete. Onde eu esconderia um pneu? - precisei gritar, pois a chuva aumentou.
- O que fazemos agora?
- Não estamos perto da sua casa, não é?
Ela olhou ao redor.
- Nem sei onde estamos!
Eu havia pegado um caminho mais longo que levava ao Frizzie's, tentando aumentar meu tempo com ela.
Evans deixou o capacete sobre a moto e me lançou um olhar zangado, como se eu tivesse a culpa pela chuva e pelo pneu. Assisti sua raiva crescer e crescer, esperando uma explosão mas, antes, quem rugiu foi um trovão, seguido de outro. Evans fechou os olhos e apertou os ouvidos com as mãos. Ela tem medo dos trovões, percebi. Menos de um minuto depois, outro estrondo nos fez vibrar. A menina caminhou para trás, ainda com os olhos apertados até suas costas encontrarem uma parede, e ela deslizou, até estar agachada.
Eu a encarei confuso e surpreso. Já havia tentando assustá-la de inúmeras formas e ela não se rendia. Mas ali estava ela, amedrontada por um pouco de barulho. Era um medo tão ridículo, tão infantil, que eu teria rido, mas não ri, porque era Evans ali.
- Evans? - chamei, me agachando ao seu lado. A pressão no ar estremeceu novamente e a menina rangeu os dentes, apertando tanto as orelhas que pude ver as unhas ferirem a pele. - Ei, Evans! - tentei puxar suas mãos, e ela gritou. - Pare com isso! Vamos, precisamos ir! - comecei a chacoalhá-la pelos ombros. Ela parecia estar chorando, mas era difícil reparar em lágrimas quando uma chuva daquelas caia. Outro trovão soou, e outro. A cada barulho ensurdecedor, ela se encolhia mais, apertando os olhos e as orelhas. Era como se estivesse tentando sumir.
A preocupação me atacou como um soco. Estava meio atordoado, sem saber o que fazer. Não havia ninguém na rua e os carros passavam apressados. Estávamos sozinhos. Ela tinha apenas a mim. E eu não sabia o que fazer.
Toquei novamente em suas mãos. Daquela vez não usei força, tentei afastá-las gentilmente e ela cedeu um pouco. Colei minha boca em sua orelha.
- Julia, você está me ouvindo? Precisamos ir, você vai acabar com uma pneumonia. - esperei, mas ela continuou tremendo. Vamos Zeus, guarde seus trovões por um tempo. - Vamos encontrar uma oficina, sim? - senti ela concordar com um aceno. - Isso, garota esperta, agora levante. - fiquei em pé e a puxei para cima. Evans soltou as orelhas e me procurou com o olhar. Estava encharcada, mas seus olhos seguiam quentes. - Vamos dar o fora daqui. - passei o capacete para que ela o carregasse. Tirei a moto do apoio e comecei a empurrar.
POV - JULIA
Às vezes seu medo será camuflado pela raiva, o que é bom, pois a raiva é mais fácil de lidar.
O dr. Kendrick estava certo, a irritação cresceu em mim como uma chama recebendo combustível. Quando eu soube do pneu da moto, quis bater em Luke, queria gritar que me tirasse dali, e estava pronta pra fazer isso, mas um trovão rugiu. Apertei minhas orelhas com força, tentando abafar o barulho ensurdecedor. Fechei os olhos e a imagem surgiu novamente. Eu estava olhando para Max, em sua cadeirinha. A chuva estava abafada pelo som ligado, mas os trovões faziam o carro vibrar. Alguém falou alguma coisa, alguém gritou, as luzes me cegaram e eu me senti girar e girar e girar....
- Evans? Ei, Evans! - mãos frias tocaram as minhas e gritei. Era o homem? Ele estava me puxando do carro. Ele era real? - Pare com isso! Vamos, precisamos ir! - os trovões explodiam, uma e outra vez. Pensei que estava gritando, mas minha garganta estava muda. Olhei para Calum, ele estava imóvel, sua cabeça caída para o lado. Sangue.
Uma de minhas mãos foi afastada sem que eu percebesse e lábios tocaram minha orelha.
- Julia, você está me ouvindo? Precisamos ir, você vai acabar com uma pneumonia. - Este é Luke, não o homem que me tirou do carro. Eu estava encarando o céu, mas não lembrava de sair do carro. Ou lembrava? - Vamos encontrar uma oficina, sim? - Queria que o barulho da sirene parasse, Max estava dormindo na cadeirinha, iam acordar ele. Quem desligou o rádio? - Isso, garota esperta, agora levante. - a voz dele era fácil de seguir. Eu me agarrei a ela.
Quando abri os olhos estava de pé. Minhas orelhas ardiam e eu tremia. Encontrei Luke com o olhar e relaxei minimamente. Ele parecia preocupado. Falou alguma coisa, mas não entendi, minha cabeça ainda zumbia. Ele estava me oferecendo o capacete, tentei me lembrar de tê-lo tirado da cabeça mas não consegui.
Começamos a andar, a cada passo meu corpo se apertada mais, esperando outro trovão, mas nenhum apareceu. Até a chuva perdeu a força. Minha mente foi clareando gradativamente, e eu estava bem lúcida quando li a placa do local onde paramos. Motel Flor de Lótus.
- Você só pode estar brincando. - soltei, com a voz fraca. Luke riu.
- Vamos apenas descobrir onde há uma oficina, relaxe, Evans.
Ele estava totalmente despreocupado, como se frequentasse aquele tipo de lugar todos os dias. Eu, por outro lado, estava mortificada. Escondi meu rosto com o capuz e o segui.
Lá dentro estava quente, o que foi maravilhoso de sentir. Apenas percebi as paredes vermelhas e os estofados baratos antes de me deparar com um casal enroscados em um deles. Desviei o olhar constrangida. Por que eles não pediam um quarto?
- Deixa eu adivinhar, outro casamento a fantasia. Vieram direto de Las Vegas? - o grandalhão que estava atrás do balcão perguntou, nos estudando com um sorriso de quem sabe das coisas.
Aquele cara pensava que estávamos casados? E que procurávamos um quarto para ter uma Lua de mel?
- Não viemos de Las Vegas e não estamos casados. Eu estava em uma festa e ele... Eu não sei onde ele estava. Eu não viria a um lugar como esse em minha lua de mel, nem nunca. Quero dizer, eu não viria, a não ser pelo motivo que me fez vir hoje, que não é ele nem nada que envolva ele, nem coisas que eu queira fazer com ele, nem com mais ninguém. Eu só não...
Luke tampou minha boca com a mão.
- Sabe onde podemos encontrar uma oficina? Minha moto está lá fora.
- Aqui perto fica o Rato, mas a essa hora está fechado, com certeza, e qualquer outro lugar também, são onze e meia.
Afastei sua mão.
- Preciso ligar para casa, já deveria estar lá. - procurei por meu celular, pensando na bronca que levaria de tia Becky, mas claro que ele não estava ali. - Droga, Luke preciso do seu celular.
- Desculpe, mas deixei em casa.
Ou talvez tenha perdido no pôquer.
- Posso usar o telefone? - perguntei para o balconista.
- A chuva nos deixou sem linha.
Encarei o grandão de boca aberta. Ele não podia estar falando sério. Luke passou por mim para entregar uma nota para o cara.
- O que você acha que está fazendo? - quis saber.
- Alugando um quarto.
- Mas você não pode!
- Por que não?
- Porque... não! - o que ele estava pensando? Que eu ficaria com ele ali?
- Você pode ficar aqui se quiser, eu vou para um quarto quente. - deu de ombros, despreocupado.
De jeito nenhum eu dividiria um quarto com ele. Sua carteira aberta me deu uma ideia. Puxei outra nota e coloquei sobre o balcão.
- Eu também vou querer um, de preferência em um andar diferente do dele. - falei.
- Sinto muito, mas estamos lotados. Aqueles ali ficaram com o último. - o homem apontou para o casal no estofado. A mulher lambia o dedo do cara. Luke indo até eles distraiu minha vontade de vomitar.
- Com licença. - ele falou. - Que tal vinte dólares para desistirem do quarto?
O casal o olhou.
- Acho que não, garoto. - foi o homem que respondeu, sorrindo para a mulher.
- Tudo bem, trinta.
- Cinquenta. - a mulher acariciava o peito do cara. Eu podia ver os tufos de pelos escapando por seu colarinho.
- Quarenta. - Luke pegou as notas e mostrou para eles. - Nem um George Washington a mais.
O casal trocou um olhar, então a mulher pegou as notas.
Luke voltou todo satisfeito. O balconista lhe entregou a chave.
- Você pode ficar com o quarto, eu espero aqui. - falei, resignada.
- Vamos, Evans, não estou alugando um quarto para atacar sua virtude. Vamos subir, nos secar e esperar que as linhas voltem. Então, eu ligo para um amigo vir nos pegar.
Não era um plano ruim. Estranho e constrangedor, mas não ruim. A chuva parecia estar no fim, quanto tempo levaria? Meia hora? Eu poderia sentar e esperar na recepção, mas o casal começou a fazer sons estranhos enquanto se beijavam, então me apressei em procurar as escadas.
POV - LUKE
O quarto era uma espelunca, mas não era o pior lugar que aluguei, nem de longe. Trazia uma cama não tão grande, duas mesinhas com abajures parafusados na parede, um tapete desgastado e uma porta que levava ao banheiro.
- Estou surpresa. É tudo tão... comum.
Abri um sorriso provocador.
- O que esperava, Evans? Papel de parede do Kama Sutra, brinquedos eróticos e pornô em uma tela plana? - perguntei erguendo as sobrancelhas. Ela corou lindamente.
- Eu só... ah, esqueça!
Ficamos em silêncio ali, enquanto a chuva voltava a ganhar força do lado de fora. Nossas roupas molhadas pingavam no chão, criando poças. Em todos aqueles minutos eu não tirei os olhos dela. Seus traços de menina estavam cansados, e havia algo mais. Ela está triste por causa do imbecil do Ben, pensei, sentindo uma pontada de raiva. Da próxima vez que eu cruzar com o garoto irei chutar seu saco.
Evans colocou os olhos em mim, de uma forma que parecia esperar algum tipo de piada, mas eu sinceramente não conseguia pensar em nada para dizer. Por que eu a havia levado até ali? Meu celular estava em meu bolso, eu poderia ligar para Ashton nos pegar com o jeep. Oh, Evans, você realmente deveria ficar longe de mim.
- Quem vai tomar banho primeiro? - perguntei, espantando meus pensamentos. - Ou você prefere fazer um dois por um?
- Não vou tomar banho aqui. - Evans falou, fazendo uma careta. É claro, ela deveria estar pensando em todos os casais que treparam naquele chuveiro. Soltei uma risada.
- Prefere uma pneumonia?
- Eu estou bem assim. - ela tentou parecer dura, mas um tremor a traiu.
- Você sabe que esses lugares são visitados pela vigilância, não sabe? Basicamente, são lugares limpos. - a garota seguiu impassível, aquilo me irritou. - Não seja teimosa, Evans, vai ficar doente.
- Obrigada pela preocupação, Lucas, mas pode ir em frente com o banho.
Eu precisei rir. Ela devia achar que Luke era apelido. Lucas era o gato gordo da minha mãe.
- Direi isso a ele. - decidi brincar, já que de outra forma ela não entraria debaixo da água quente.
- Agora você fala em terceira pessoa? Ou está fugindo do banho também?
- Lucas adora banhos, principalmente de piscina.
- Nadar não é o mesmo que tomar banho.
- Para ser banho precisamos estar nus? Lucas faz isso também, mas aprecia um par de mãos para esfregá-lo. - olhei abertamente para suas mãos, imaginando-as no meu corpo. Ela cruzou os braços.
- Lucas deveria ser mais independente.
- Ah, ele é. Consegue tomar banho sozinho. Ele deita confortavelmente e começa a lamber cada parte do corpo. Quando há visitas, ele educadamente divide sua língua. - reprimi com muita força uma risada quando Evans fez uma careta. - Está convidada para brincar com ele, quando quiser.
- Pare com isso!
- Parar com o quê?
- Com isso!
- Não me diga que tem medo de gatos?
- Gatos?
- Eu estava falando do Lucas, o gato da minha mãe. - a cara dela era uma das coisas mais engraçadas que vi na vida. - No que estava pensando, Evans? Você não estava me imaginando nu e coberto de saliva, estava?
- Não!
- Mas você está corando.
- E você tem o mesmo nome que o seu gato!
- Eu não me chamo Lucas.
Seu corpo tremeu outra vez e eu uni as sobrancelhas em desgosto.
- Não se chama?
- Você terá direito a fazer perguntas se tomar banho.
Evans avaliou a proposta, enquanto tremia de frio. Reparei que seus lábios estavam mudando de cor. Inferno, garota, eu mesmo vou colocá-la debaixo daquele chuveiro!
- Tudo bem. - ela falou, fazendo-me paralisar. Por um minuto acreditei que ela havia concordado com que eu a levasse para o chuveiro, mas cedo demais a realidade me atingiu. - Mas você vai primeiro.
POV - JULIA
Luke entrou no banheiro sem protestar, meio minuto depois me passou seu jeans molhado para que eu colocasse para secar na saída de ar quente. Apoiei minhas costas em uma das paredes e tentei com muita força não pensar em Luke Hemmings pelado do outro lado daquela fina porta, mas confesso que deslizei algumas vezes. Luke era arrogante, debochado e pouco sério, mas algo me atraía nele, eu tinha que admitir. Ele era tão alto, do tipo que você fica com dor no pescoço enquanto conversa com ele, mas não desajeitado, ele tinha total controle sobre seu corpo, e que corpo. Deus, ele é tão gostoso.
Eu ainda estava com aquelas imagens na cabeça quando ele saiu do banheiro, com uma toalha em volta da cintura e nada mais. Encarei-o por um segundo antes de desviar o olhar.
- Você precisa ficar pelado? - perguntei.
- Eu não estou pelado.
Bom, eu não iria discutir sua nudez. Tentei passar para o banheiro mas o engraçadinho me parou.
- Não vai levar a toalha? - ele perguntou, fazendo menção de tirá-la.
Eu o olhei de frente, com as sobrancelhas erguidas. Luke riu e me deixou passar.
O banheiro era tão minimalista quanto o quarto. O vaso parecia limpo, a pia também, mesmo mostrando sinais de velhice. Liguei o chuveiro para abafar meus barulhos. Quando tentei trancar a porta, percebi que não havia chave. Cobri o buraco da fechadura com papel higiênico. Vasculhei cada centímetro do lugar até ter certeza que não haviam câmeras escondidas. Uma parte de meu cérebro gritava que eu era uma louca obsessiva, mas a outra parte mandou-a calar a boca. Quando me dei por satisfeita, tirei a roupa e entrei no chuveiro, me espremendo para não tocar nas paredes.
A água quente em meu corpo frio foi uma das melhores sensações que já havia sentido, terminou de apagar as memórias do acidente. Me peguei outra vez pensando em Luke ali dentro. A água baixando por sua pele pálida. Não comece a hiperventilar. Quanto tempo ficaríamos ali? E se o telefone não voltasse? Will me cobriria com a tia Becky?
Desliguei o chuveiro e encontrei toalhas limpas dobradas. Usei uma para enrolar meu cabelo e outra para secar o corpo. Lancei um olhar para meu macacão ensopado e outro para a blusa de Luke deixada casualmente no box. O ar quente a havia secado um pouco. Estiquei o braço e a peguei, sem pensar muito a levei até o nariz e cheirei. Maravilhoso.
POV - LUKE
Evans abriu a porta do banheiro e apareceu com seu macacão. Senti a decepção na minha cara, ela havia rejeitado minha blusa. Seu cabelo estava molhado e embaraçado, os pés descalços e um rosto vermelho, por causa da água quente. Aquela era uma das situações em que eu faria piada para envergonhá-la, mas meu cérebro havia virado gosma. Apenas era capaz de olhá-la de cima a baixo. Inferno, menina, você não deveria ser tão linda.
- Tem espaço aqui para mais um. - falei, depois de desfazer a cara de idiota. Estava deitado na cama, usando meu jeans úmido.
- Eu prefiro ficar bem aqui. - ela respondeu um tanto baixo, voltando para a parede.
Eu deveria deixá-la em seu canto, ou ser cavalheiro uma vez na vida e ceder a cama para que ela descansasse. Mas a questão não era o cavalheirismo, eu a queria ao meu lado.
- Vai ficar aí em pé?
- Vou.
- Qual o problema? Eu não tenho sarna.
- A cama é o problema. Sabe quantas pessoas... se agarraram aí? É nojento.
- Vou lhe contar algo, Evans, as pessoas são criativas. Claro que o lugar mais óbvio é a cama, mas muitas vezes as coisas acontecem no tapete, no chuveiro... na parede onde você está agora. - ri quando ela pulou dali. - Acredite, se há algo que é lavado frequentemente são os lençóis.
Evans cruzou o cômodo e sentou na cama, do jeito de quem está cedendo mas tenta manter a dignidade. Ela brincou com os próprios dedos e eu a observei. Queria puxar assunto, mas estava muito difícil se concentrar com a situação. Tudo o que eu conseguia pensar era em prender o corpo dela debaixo do meu e beijá-la. Forte.
Sentei, ficando de frente para ela. Seus cílios estavam molhados, pesquei uma das gotinhas com o dedo. Evans me olhava de um jeito esquisito, meio confuso, como se tudo tivesse fugido de sua mente. Me inclinei um pouco para frente, testando sua reação, ela não se moveu. Me aproximei devagar, esperando que ela se afastasse a qualquer momento. Levei meus lábios até seu pescoço e a beijei, bem onde sua pulsação pulava. Ela estremeceu. Tracei com a ponta do nariz um caminho por sua bochecha, sentindo seu cheiro agradável. Abri os olhos e a encarei por um minuto. Queria grunhir para me fazer tirar os olhos dos dela, mas não conseguia. Aqueles olhos me tinham hipnotizado. Um pouco de marrom, um pouco de verde e de volta para o marrom... Aquilo me desarmava completamente. Aquele par de olhos havia me enfeitiçado? Eu os imaginava a todo momento, sonhava com eles e desejava que me olhassem, da forma que bem ali olhavam. Aquilo já se tornava um vício.
- Luke. - Evans chamou, a voz baixa. Meus olhos caíram para sua boca pequena, com o resto de alguma maquiagem boba. Meu corpo reagiu imediatamente. Inferno, eu ainda nem a toquei!
- Hm? - perguntei ainda encarando sua boca, desejando que ela falasse, pois assistir seus lábios se moverem era incrivelmente excitante.
- Eu... - começou, me presenteando com um vislumbre de sua língua. Minha barriga se contorceu de desejo.
- Eu quero você. - falei, ouvindo a ponta de desespero na minha voz. Foda-se, é verdade.
- Quer?
- Esse tempo todo. - coloquei dois dedos em seu queixo, erguendo um pouco, depois afastei a mão.
- Você disse, no Império, que não estava flertando comigo.
- Você ainda não percebeu, Evans? Eu sou um filho da puta mentiroso. - meus dedos subiram até seu ombro, então desceram outra vez. Eu estava com os olhos fechados, apreciando a sensação. - Agora, você tem duas opções: ou fica ou foge. Se quando eu abrir os olhos essa sua boca ainda estiver aqui...
Não terminei a frase. Evans chocou sua boca contra a minha, tão rápido que minha cabeça foi empurrada para trás. Ela se moveu, em frenesi, para sentar sobre minhas pernas.
De início, Evans pareceu desajeitada, mas durou um segundo, então seus lábios passaram a moldar os meus. Aumentei a pressão, sentindo um doce desespero. Suas mãos estavam em meu pescoço, me puxando para mais perto com força. Lambi aquele batom estúpido, me livrando dele, pois queria sentir o gosto dela. Usando a mão em seu cabelo, movi sua cabeça, deixando-a no lugar ideal para que eu pudesse explorar sua boca com a língua. Ela permitiu, quase não hesitando antes de usar a sua também. Minhas pernas fraquejavam, meu estômago dava solavancos e todo meu corpo formigava. O que ela estava fazendo comigo? Eu deveria me sentir o maior dos estúpidos, bebendo algum tipo de veneno com fervor. Minha língua alcançou um ponto que a fez gemer em minha boca. Agarrei sua cintura e a apertei contra mim.
Nos separamos para respirar, os dois arfando. Voltei a explorar seu pescoço, com mais liberdade, beijando sua pele que esquentava sob o meu toque. Evans também estava mais solta, deslizou suas mãos para minhas costas e as moveu por ali, quando rocei levemente os dentes em seu ombro, ela me apertou contra seu corpo. Invadi outra vez sua boca, tentando capturá-lo na minha. Eu a beijava quase com rudeza, não havia como ir devagar, eram semanas de desejo acumulado. Evans se mexeu em meu colo. Eu guiei sua cintura para o melhor encaixe na minha, querendo que ela sentisse como havia me deixado.
As mãos dela foram das minhas costas para meu cabelo, puxando de leve. A forma como Evans me beijava me fez ter certeza que eu não fui o único fantasiando com aquele momento. Passei as mãos por suas costas, tocando, apertando, sentindo, enquanto as dela buscaram um espaço entre nossos troncos para baixar o zíper do macacão. Parei de beijá-la, nossas testas grudadas, a respiração de um no rosto do outro. Eu tinha medo de perguntar, mas precisava.
- Tem certeza?
Ela fez que sim com a cabeça, não havia dúvida em seus olhos.
Não vou perguntar de novo.
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