04: Aquele com o Ressuscitador
Você diz que está indo embora no trem das 7:30
E está indo para Hollywood
Garota, você já veio com essa desculpa tantas vezes
É como se se sentir mal parecesse bom, yeah
— Crazy, Aerosmith
Minha relação com a música sempre foi extremamente emocional, e tinha suas variações ao decorrer do meu humor, assim como a culinária. Quando me sinto empoderada, Aretha Franklin; quando me sinto empolgada, Michael Jackson; mas hoje em si, durante minha corrida matinal, Aerosmith tomou conta dos meus fones de ouvido, e nem eu mesma sabia o que estava sentindo, mas sua música me transmitia coragem e calma, e era tudo o que eu mais precisava no momento.
Passei pelas pessoas que andavam pela calçada com cautela para não esbarrar em ninguém, atravessei a faixa, e quase atropelei um pobre cachorro. Minha mente tão desatenta não me permitia distinguir bem a guitarra da bateria na música Crazy que eu escutava no então momento. Eu não sabia bem o que era essa estranheza que alojava meu corpo, eu só não me sentia dentro de mim mesma. Então tentei pensar em outras coisas aleatórias, das quais mudem o rumo de pensamento.
Penso principalmente em ontem, em como todo o buffet que preparei havia sido incrível apesar de extremamente trabalhoso, e que eu desejo muito que outras oportunidades como essas apareçam, que mesmo não sustentando todas as dívidas do mês, quebra um galho e tanto. Por um momento durante o buffet, pensei se Rachel estava se divertindo com Chandler, e tomei nota para questioná-la depois.
À três quarteirões de distância do meu apartamento, uma agitação incomum, um grande movimento de pessoas, viaturas e um cheiro forte de fumaça. Algo perigoso havia acontecido.
Adentrei o apartamento roxo sem toda o entusiasmo que eu tinha no começo da minha corrida matinal, a Juliet's, a pizzaria da redondeza havia pegado fogo nessa noite. Tive o prazer de trabalhar temporariamente no lugar, e conhecer a afetuosa família ítalo-americana antes mesmo de trabalhar na lanchonete de Wall Street. Eles haviam construído a loja com toda a economia da família, e há pouco tempo conseguiram mandar a filha mais velha para a UCLA com o dinheiro que economizaram por anos. Me revira o estômago só de pensar na agonia que a família deve estar passando.
— M-monica? — escutei a voz insegura de Rachel hesitar, vindo dentro do seu quarto.
— Sim? — disse enquanto abri a geladeira.
Escutei ela murmurar um "Graças à Deus" e mais outras palavras inaudíveis para nossa distância. A porta do seu quarto estava entreaberta, da mesma maneira que estava quando cheguei ontem à noite. Pude ouvir um barulho de algo pesado cair, e Rachel praguejar.
— Está tudo bem, querida? — perguntei antes de bebericar meu tônico de maracujá.
— Mais ou menos. Acho que bebi bastante ontem. — mais grunhidos insatisfeitos.
— Preparo o ressuscitador?
— Você leu a minha mente.
O Ressuscitador era uma bebida maluca que inventamos no primeiro ano que estávamos morando juntas, depois de termos vivido um ano amoroso bem desastroso, contabilizando um número considerável de relacionamentos sem sucesso. O Ressuscitador era uma bebida composta por água de coco, abacaxi, gengibre e cebola roxa. Tentamos fazer sem a cebola já que ela arruinava todo o sabor dos outros ingredientes, mas o efeito era ineficaz, então adicionamos ela novamente. Desde então a bebida sempre funcionou muito bem para ressacas, e se tornou nossa receita registrada.
Enquanto eu selecionava os ingredientes, Rachel saiu do seu quarto de pijama, com o cabelo loiro bagunçado, com uma feição confusa enquanto lia um pedaço de papel. Parou em frente a poltrona, sem dizer nada.
— Você me trouxe pra casa ontem à noite? — me examinou seriamente, com uma expressão incalculada de cisma.
— Não, eu fiquei até um pouco mais tarde no Central Park arrumando a cozinha e o salão. Achei que você tinha vindo para casa logo cedo. — alternei meu olhar para ela enquanto descascava a cebola.
— Oh, céus. — sentou-se na mesa de centro claramente pasma. — Estou me lembrando. Esse cara, Chandler, me trouxe até aqui.
Olhei para ela por um instante, enquanto a mesma fitava o papelzinho. Mais uma vez Rachel estava ligada ao Chandler, só que dessa vez me questiono se ela realmente foi acompanhada com ele para o evento.
— Meu Deus, Monica. Confiei um um completo estranho para me trazer para me casa! — continuou surpresa, mas isso não me impressionou nem um pouco pois já havia acontecido isso com ela outra vez, da qual nem a mesma se recorda.
— Por sorte ele não te sequestrou, agradeça por isso. — caçoei da cara de Rachel e ela simplesmente ignorou minhas palavras. Continuava amarrada aos seus pensamentos, enquanto analisava o papel amarelo.
— Me lembro de eu ter dado em cima dele, e ele apenas rejeitou. Monica ele tirou a maquiagem do meu rosto e segurou meu cabelo enquanto eu vomitava. Ele fez exatamente tudo o que você faz por mim. — seu olhar afetuoso era incomum, e ao ler o papel novamente, abraçou o mesmo contra o peito. — Oh, que moço gentil! E eu nem mesmo o conheço.
Eu havia trocado palavras com Chandler por um breve período de tempo, e ele realmente demonstrou ser uma pessoa gentil. E era impressionante ver que um homem respeitaria o espaço de uma mulher embriagada, coisa que poucos homens fariam.
Rachel parecia flutuar até mim com um sorriso bobo no rosto, botou a cabeça no meu ombro e me abraçou pela cintura.
— Acho que você deveria ligar para ele. — seus olhos sorriam juntamente com seus lábios, Rachel estava carregada de tendenciosidade, a qual eu já conhecia muito bem.
— Eu? Por que você não liga para ele? — ri com a intenção de me esquivar da estranheza do assunto, não vou me jogar pro primeiro cara que foi legal com a Rachel. Eu venho evitando qualquer homem potencialmente interessante porque estou na melhor fase da minha vida, onde eu aprecio muito bem a minha própria presença, e eu adoraria ficar mais um tempo assim.
— Eu não sei, agradecer por mim eu acho. — Rachel me olhava fixamente com um sorriso, enquanto prendia o bilhete com um ímã na geladeira. — Eu preciso urgentemente de um banho frio, ainda me sinto um pouco tonta.
Rachel sumiu da minha visão, me deixando ali com meus pensamentos inquietantes sobre o rapaz. Chandler já gostava da minha comida antes mesmo de me conhecer como ele mesmo comentou, e repenso sobre o que eu sei sobre sua pessoa. Um ser humano de boa índole, acho que vou ligar ao menos para dar satisfação e agradecer por ter cuidado de Rachel, é o mínimo que eu poderia fazer.
Deixei os ingredientes na tábua de madeira e enxuguei as mãos no pano de prato mais próximo. Apanhei o papel da geladeira e disquei o numero, torcendo para que seja o número certo.
Um chiado comum na linha, os bipes indicando a espera.
— Telefone do Chandler Bing, quem gostaria? — uma voz feminina e lascívia atendeu.
— Olá, o Chandler Bing está? — perguntei, ainda me questionando se aquilo era uma boa ideia.
— Quem gostaria de saber? — a mulher do outro lado da linha permaneceu restrita.
— Monica. Geller. — quase esqueci meu sobrenome.
— Só um momento, Monica. — a moça fez uma pausa breve e afastou o telefone do rosto, eu ainda escutava tudo. — Chandler, uma tal de Monica Geller quer falar com você. — vociferou a mulher, sua voz com certa distância do telefone.
Permaneci na linha, já era tarde demais para voltar atrás. Era possível escutar a agitação do possível escritório, vozes pararelas e telefones tocando incansavelmente. Logo em seguida, escutei os passos desajeitados de alguém correndo pelo carpete e logo depois, um forte estrondo contra o chão. Escutei o telefone sacudir na mão de alguém e aí sim escutei a voz dele.
— Monica? — sua voz vacilava, carregando um murmúrio de dor.
— Chandler, está tudo bem? — questionei, deduzindo que ele havia se machucado de uma queda.
— Eu estava, fazendo flexões no escritório durante minha pausa, eu sempre faço isso. — comentou ofegante, rindo de nervoso. Que mentira descarada.
— Oh, certo. — fingi acreditar entre leve risadas. — Estou ligando para agradecer pelo o que você fez pela Rachel ontem. Você foi um cavaleiro, obrigada por traze-la em segurança.
— Imagina, é o mínimo que eu poderia fazer pela sua amiga. Rachel realmente precisava de ajuda, tive medo em deixá-la sozinha. —sua voz se estabilizou juntamente com sua respiração.
— Bem... Quem era a garota do telefone? — questionei involuntariamente, e quando percebi na porcaria que eu havia dito, já era tarde demais.
— Susan, uma secretária daqui do escritório. Por que a pergunta? — sua voz brincalhona esquentou meu rosto.
— Por nada, ela parece ser uma mulher bonita. Acho que já escutei sua voz em algum lugar.
— Então você consegue saber sobre a pessoa só pela voz? — debochou, ainda brincalhão.
— Meio que sim. Pela sua voz, você é o idiota que mentiu sobre as flexões no escritório para encobrir a queda feia que levou. — comentei rindo, e escutei ele fazer o mesmo do outro lado da linha.
— Okay, eu sou só um pouquinho atrapalhado quando estou falando com mulheres bonitas.
— Então eu estava certa sobre a Susan ser uma mulher bonita? — arquei a sobrancelha mesmo sabendo que ele não poderia ver, brincando obviamente.
—Não estou falando da Susan, quer dizer, ahm... — tropeçou em suas palavras, mas acho que entendi o que ele tentou dizer. — Deixa pra lá, isso não funcionou muito bem.
— Pela sua voz, você parece um bobo. — zombei da sua falha tentativa, escutei ele rir sem graça.
— Certo, já entendi. — sua risada era melodiosa. Escutei um burburinho pelo telefone e Chandler responder alguém. — Eu vou ter que desligar, podemos conversar daqui a pouco?
— Claro.— respondi sem indecisões.
— Até mais, Monica.
— Até.
Desliguei o telefone e olhei o mesmo, pensando em quão rápido foi a despedida. Pousei o telefone na mesa de canto e continuei olhando para o mesmo, acho que ele não voltaria a ligar tão cedo. Voltei para a cozinha e notei o som do chuveiro ligado vindo do banheiro, já fazia um tempo que Rachel estava no chuveiro, espero que ela não tenha escutado a conversa. Continuei o que eu estava fazendo, divagando sobre nosso diálogo, pensando o quão estúpida eu aparentei após o breve agradecimento. Acabei de conhecê-lo e nada me importa sobre sua vida, isso foi ridículo. E a história sobre saber sobre alguém só por escutar sua voz? Pura baboseira. Torço para outra chance de uma conversa mais normal, apenas para contornar a estranheza desse infortúnio.
O telefone tocou logo em seguida e eu corri pra atender, esperando pela segunda conversa, a qual Chandler se referiu há minutos atrás.
- Me diga que você não caiu novamente pelo caminho pra atender essa ligação. - ri de leve, esperando seu sim.
- Monica? - era outra voz, uma voz que eu reconhecia.
-Ah, oi, Joshua! - revirei os olhos, que vergonha! - A Rachel está no banho.
-Eu não liguei pra falar com a Rachel. - gelei. - Você pode vir ao restaurante? Tenho que mostrar algo.
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