01: Aquele em que Monica está desempregada
Tão desnecessário dizer, sou insignificante,
Mas estarei tropeçando, aos poucos aprendendo que a vida é legal
Repita comigo: não é melhor estar seguro do que arrependido
– Take On Me, a-Ha.
Era surreal pensar que por um momento formamos um casal. Loucos, apaixonados e acima de tudo, felizes. O que prometeu ser eterno, durou só dois anos. Mas de qualquer maneira, se eternizou em minhas lembranças. Antes do nosso relacionamento, uma louca atrás de alguém para se completar e depois, mais vazia como nunca. Por um longo tempo ainda pensarei que encontrei a pessoa perfeita pra mim, mas que a amei e a deixei ir embora por um motivo que nem mais lembro. Por que eu e Joshua não estamos mais juntos?
Um som ecoou na minha mente, o telefone tocou e imediatamente atendi.
— Pois não? — a voz soou melancólica demais para mim, engoli seco na tentativa de consertar isto.
— Rachel, venha a minha sala imediatamente.— pude sentir a acidez da personalidade de Joanna através do telefone.
Reuni catálogos, cartas e e demais documentos junto ao peito, com o salto quase desgrudando dos meus pés, caminhei em direção a sua sala. Com a porta semi aberta, dei uma leve batidinha e coloquei no meu rosto minha melhor feição amigável.
— Olá, Joanna. — completei com um sorriso.
Com um gesto, me convidou para entrar. Estava ocupada prendendo uma mecha do seu cabelo que escapava do seu penteado elegante e simples. Sua mesa estava de canto à canto abarrotada de papéis, infinitos papéis. Sua gaveta, desmembrada do resto da mesa, descansando logo atrás da sua cadeira executiva.
— Me diga que tudo aquilo que te pedi está pronto. — manteve contato visual por pouco tempo e seus olhos caçavam algo em específico pela sua desordem.
— Faixa de lucro revisada, verifiquei a lista de produtos do novo lote três vezes, redigitei o contrato que havia me pedido, revoguei as peças reprovadas na avaliação de cliente e enviei os novos pedidos para nosso fornecedor. Tudo pronto como a senhora me pediu. — arfei orgulhosa do meu empenho. Nem parece que tudo pela minha cabeça anda uma loucura.
— E a ata da reunião? — não expressou surpresa com o meu trabalho, um pouco arrogante como sempre.
— Aqui está. — peguei o primeiro documento dos meus braços e a entreguei.
— Excelente! — sorriu seco — Bom trabalho, Rachel Green. Não sei o que eu seria de mim sem você nesse departamento.
— Oh, só estou fazendo meu trabalho. — tentei ser modesta — Onde deixo tudo isso?
— Pode deixar na mesa.
Cacei um espaço vazio na mesa, empurrei algumas revistas e pousei todos os documentos. Eram importantes, espero que ela não os percam nessa baderna.
— Me ligaram cinco minutos atrás me convocando para uma reunião de urgência. Precisaram contornar um problema que eu pensei que havia sido resolvido na reunião de hoje cedo, mas parece que esse empresa é feita de pilares de incompetentes! — explodiu de leve seu estresse e não me assustei, já havia me acostumado com os frequentes chiliques de Joanna Sparks.
Encostei a porta, pois eu saberia o que estava por vir e seria bom que eu poupasse meus colegas de trabalho.
— Rachel, não dá tempo de procurar mais nada, aquelas reuniões são infernais de longa. — Joanna se levantou, apanhou os documentos que eu trouxe e alinhou desajeitadamente seu blazer. — Eu tenho em torno de uns cinquenta cartões de chefs de cozinha que estão por algum lugar nesse escritório. O chef do buffet do meu casamento desmarcou de última hora porque precisou viajar. Liguei para alguns daqui de Nova Iorque e parece que ninguém aceita um serviço em cima da data. Por favor, Rachel você é a salvação do meu casamento.
Eu disse à Monica que algo apareceria.
— Problema resolvido, conheço a melhor chef de toda Manhattan e ela estará disponível para o seu casamento!
— Oh, Rachel, eu te amo! — Joanna me abraçou de imediato.
Meus miolos fritavam por horas em frente aquele monitor, digitando sem parar, por horas e horas. Nem me lembro qual foi o último momento que estiquei as minhas pernas dando um passeio pelo escritório para conversar um pouco. Tenho quase a certeza de que se eu sair agora, meus dedos vão digitar nesses teclados fora do resto do meu corpo, como em um desenho animado.
Respirei um pouco e parei meus movimentos automáticos. Análise Estatística e Reconfiguração de Dados é o trabalho mais chato do mundo. Espero que um dia as máquinas possam fazer isso por si mesmas, pois ser humano nenhum deve ser submetido à uma tortura como essa. Conferi a movimentação do corredor a esticar meu pescoço para fora do meu cubículo. Excelente, nenhum sinal de vida humana, apenas alienada.
Fechei a aba de processamento e cliquei no ícone secreto que eu mantinha escondido dos demais dessa empresa. A interface pixelizada do jogo começou em preto e vermelho e senti meu cérebro me pedir em casamento depois desse descanso. Minha empolgação crescia cada vez mais, olhei no relógio e eu ainda teria duas horas de diversão.
— Deus abençoe Duke Nukem 3D! — murmurei olhando ao teto branco.
Meus dedos antes que pareciam exaustos se energizaram novamente quando dei início ao jogo. Pronto para destruir a raça alienígena que invade o planeta terra com as armas mais pesadas e poderosas do mundo e com muitas piadas de cunho duvidoso. Não era meu jogo favorito, mas me servia para me tirar de situações desesperadoras do meu trabalho como essa.
Minha intuição me alertou como um radar e resolvi dar uma conferida para ver se alguém estava por perto. Do leste, vinha meu chefe Doug, verificando de cubículo em cubículo. Desculpe, Capitão Nukem, mas não vai ser agora que salvaremos o mundo. Tentei ser o mais rápido possível para voltar para meu trabalho, mas o jogo havia deixado o processamento do computador com um processamento de uma calculadora. O vulto do meu chefe se aproximava mais e só havia dado tempo de fechar o jogo.
— Bing! — me surpreendeu com um tapa desconfortável no meu ombro.
— Doug! — me levantei e simulei um soquinho em seu braço com o meu melhor sorriso postiço.
Me dei o luxo de verificar suas vestes de hoje dos pés a cabeça, e por Deus, eu juro que me localizo no dia da semana pela roupa que meu chefe usa. Nas segundas ele usa suéter e calças moletom, nas terças terno, nas quartas regatas, nas quintas ternos e nas sextas polo. Meu chefe é nada profissional, vive na política de que o homem tem que vestir e se sentir como não usasse nada, já que veio ao mundo nu. A política da empresa de ternos só se aplica à ele nas terças e nas quintas, quando recebemos relações internacionais no nosso escritório, passar uma boa imagem pra quem é de fora parece ser mais importante pra ele do que a própria ética.
Logo hoje é sexta-feira. Dia da camiseta polo, da bermuda esportiva de cor esbanjadora e dos caros calçados da Nike que mudam de modelo toda semana. Logo cedo ele joga umas duas horinhas de tênis e acha que é higiênico utilizar a mesma vestimenta pelo resto do dia. Um grande incômodo para os alheios, já que nosso chefe não costuma usar cueca quando traja as confortáveis bermudas, que na maioria das vezes, parecem mais transparentes que o normal dependendo da localização do sol.
— Confirme pra mim que o cara mais responsável e engraçado desta empresa, que é você, irá ao meu casamento neste domingo.— disse com uma felicidade de quem havia cheirado 20 fileiras de cocaína de uma vez.
Como flashes, tentei me lembrar da noite em que peguei a minha correspondência e encontrei o convite do seu casamento. Me lembro de estar exausto, de comer algumas Pringles e de fato, confirmar minha presença no seu convite. Logo depois eu entrei em coma e acordei atrasado para o trabalho no dia seguinte.
— Estarei lá com toda certeza e pronto para dançar com a sua noiva!— forjei uma empolgação natural.
— Não sei se deixarei ela dançar contigo, ela é uma leoa, tenho medo de perdê-la deixando perto de você! — brincou e demorei um pouco pra rir. Mas também quando comecei, caprichei na exagerada. Ele parecia fazer o mesmo, mas ele já era extravagante daquele jeito mesmo.
— Então Doug, como está se sentindo ao estar finalmente encontrando o amor da sua vida? — comecei com um papo furado para puxar saco.
— Não estou criando expectativas, afinal, esse é minha sétima ilusão de amor da minha vida. Sete casamentos, você tem noção de como minha vida é superficial demais? Espero que dessa vez dê certo, ou irei empobrecer pagando pensão para filhos que nunca realmente criei.— deu de ombros, como se casamento não fosse algo nada de mais. — Enfim, continue seu trabalho, Bing! Ou terei que demitir você! — fingiu um perfil carrasco e logo caiu na gargalhada. Ri junto, como sempre faço, mesmo sem encontrar graça nisso. — Te vejo no domingo!
Seguiu pelo corredor, animado, sumindo do meu campo de visão.
Me sentei, reflexivo e incomodado. Como ele conseguiu se casar sete vezes? Sempre pensei que se fosse pra eu casar com uma mulher seria a mulher da minha vida. Será que Doug se enganou seis vezes sobre isso ou será que ele nunca amou alguém de verdade? Bom, não me surpreendo que alguma mulher o tenha largado por ser uma pessoa dono de uma personalidade forte demais, mas nem o insuportável do Doug deveria ficar sem amor.
O tempo passa e com calma aguardo que a pessoa certa suceda em minha vida. Se eu corresse desesperadamente atrás de alguém, seria incrédulo demais com o destino ou com toda essa baboseira de que as coisas acontecem porque tem que acontecer...
Depois de enxergar a harmonia da organização, descansei meu corpo desajeitado no sofá. Eu estava esperando por isso e o prazer do descanso é ainda maior quando vejo tudo limpo e organizado por mim. Tudo espanado, brilhando, livre de qualquer pó,mancha ou sujeirinha visível ao olho nu.
Oh, céus, como eu queria estar trabalhando agora.
Eu deveria ter calado a minha boca quando demandei por algumas mudanças na cozinha para o novo chefe, apesar de eu estar no meu direito de trabalhar em um ambiente favorável. Consigo sobreviver com um armário meio descolado ou com um piso escorregadio, mas sem um emprego não.
Sou uma nova iorquina desempregada há dois meses e não sei onde nós estaríamos se Rachel não estivesse na Bloomingdale's. Ela precisou cortar alguns gastos com suas roupas para que nos mantivéssemos esses últimos dois meses e conhecendo Rachel do jeito que ela é imagino como pra ela deve ser uma tortura, assim como pra mim é uma tortura estar sem emprego. Durante a semana, verifico os classificados — páginas enormes de letras miúdas —, ando por alguma parte inexplorada dessa cidade em busca de uma vaga em alguma cozinha em aberto, e nada. É como se essa cidade não me quisesse mais aqui, estivesse me empurrando para os braços dos meus pais, o que não seria nada legal já que seu filho bem sucedido alcançou a vida que queria. Tudo isso está sendo um tormento pra mim, um espiral que desce para o desalento completo. Manhattan está se tornando pequeno demais pra mim nesse momento...
Escuto o barulho da porta seguido com um estrondo ensurdecedor. Um Rachel triunfante e alegre se projeta na minha frente, com um sorriso de rasgar o rosto.
— Encontrou botas com sessenta por cento de desconto? — debochei enquanto permaneci deitada.
— É muito triste saber que você só enxerga o meu eu materialista, mas não é isso — fez uma pausa dramática e eu aguardei pelo melhor.— Consegui um serviço pra você neste domingo! No casamento da minha chefe!
Uma empolgação inexplicável surgiu dos meus sentimentos mais sombrios e saltei para abraçá-la sem esforços.
— Rachel, eu te amo! — disse contra seu abraço e ela me afastou para visualizar o meu rosto.
— Tudo bem, onde estão as câmeras? Essa é a segunda vez que dizem isso pra mim, algo está muito suspeito por aqui.— mentiu uma indignação que só ela conseguia fazer.
— Deixa de besteira, você é a melhor amiga do mundo! E se quiser eu exponho isso em um outdoor no meio da cidade, eu não me importo, você merece, você é incrível! — falei sem parar.
— Se bem que eu iria gostar dessa ideia! — riu e largou sua bolsa no sofá.
Apanhei logo e tratei de colocar em seu quarto, enquanto ela foi buscar uma água na geladeira. Um longo silêncio se implantou pelo apartamento, meus pensamentos satisfeitos eu guardava só pra mim, enquanto Rachel estaria ocupando sua mente com algo que já era de se esperar. Voltei para a sala, já aguardando sua investida.
— Mon?— sua voz incerta me chamou.
— Ele não ligou, Rachel. Sinto muito. — me sentei novamente no sofá, pronta para lhe consolar.
— Tudo bem, eu... não sei mais o quê é eu estou esperando. — sorriu para me confortar e assenti.
Posso não entender completamente sua situação, mas já passei por uma época em que todos os caras que eu já saí, fiquei paranoica esperando por uma ligação. Mas aprendi que todos os caras só pensam naquilo e que é de extrema importância que eu ame a mim mesma.
Ela se sentou ao meu lado no sofá enquanto bebia da sua garrafa, com o olhar fixo em um canto, com um rosto indecifrável. Rachel era incrível, e azar do Joshua que havia escolher não ter vivido ao lado dela. Me virei e peguei uma caixa de lenços que eu havia separado para ela em momentos de choradeira como a que estaria por vir e coloquei na mesa de centro.
— Não, Mon. Acho que não preciso mais disso. — recusou.
— Chore o quanto precisar, o importante é que lá na frente que você dê risada de tudo isso. Chorar faz bem. — pousei um beijo no topo da sua testa.
— Joshua era o meu cavaleiro encantado e apesar de termos se separado a menos de dois meses, ainda espero que ele volte. Mas se ele não voltou, significa que ele está muito bem sem mim, certo? — me questionou com os olhos tristes. Eu não sei o que responder.
— Acredito que não seja bem assim Você não ligou pra ele e isso não quer dizer que você não sente a falta dele...
— Você tem razão. Acho que vou ligar pra ele.— se esticou determinada, apanhando o telefone e consegui impedi-lá à tempo.
— Pelo amor de Deus, não faça uma besteira dessa. Tenha amor próprio, você sabe o quão vergonhoso ligar para um ex-namorado pode ser. — implorei com o telefone na mão.
— Quase ex-noivo.— me corrigiu cabisbaixo.
— Rachel você não precisa remoer o passado, não seja severa assim com você mesma. — a abracei sem hesitar.
—Tudo bem, você tem razão. — ela respirou fundo e secou algumas lágrimas insistentes que chegaram, mas que já iam embora.
— Você vai tomar um banho, a gente vai jantar e depois disso você vai me ajudar com algumas coisas do buffet. Tudo bem?
— Tudo bem.— sorriu aparentemente mais tranquila.
Esse final de semana será bem turbulento.
Olá amores! Alguns avisos rápidos!
Quando o banner de cozinha aparecer na história quer dizer que um tempo passou diante a narrativa. Pensei em colocar horários, mas trabalhar com horários acaba sendo um pouco confuso, mas irei indicar períodos e horas dentro da narrativa dos personagens sempre que for possível.
E o segundo aviso, é pra quem não utiliza Spotify, eu vou procurar outra alternativa para criar a playlist em outras plataformas e no fim da história, vou fazer um capítulo com todas as músicas da playlist. Sugestões são bem-vindas!
Digam se estão gostando da história, ficarei muito feliz em saber a opinião de vocês!
Já estou providenciando o próximo capítulo, então a previsão é que não demore muito!
Obrigada por estarem lendo Sabores de Manhattan!
Até a próxima! <3
XxMia
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