Capítulo 4
Hoje é segunda, dia de capítulo novo! ;)
Capítulo 4
Na sexta-feira pela manhã, eu acordei bem cedo. Não por querer, mais por hábito. Podia estar tudo diferente, eu podia estar sem rumo, mas o meu relógio biológico se mantinha. Resolvi tomar um pouco de água com bolachas e então caminhar na praia. Como eu fiz no dia anterior, na quinta-feira. Só que dessa vez iria para o outro lado.
Sempre fui uma pessoa bastante ativa, de fazer exercício físico, inicialmente por sugestão (hoje eu penso que talvez fosse mais uma imposição) do Jonatas, mas depois porque eu gostava. Comecei com musculação, depois passei a fazer aulas de aeróbica também. E eu me sentia bem, fazendo atividades físicas. Então resolvi aproveitar o dia que ainda nascia para, dessa vez, correr na praia. Apesar de eu estar acostumada a correr de tênis, podia tentar com pés descansos. De qualquer forma correr ou caminhar seria legal.
Coloquei o mesmo biquíni preto com um dos vestidos que eu comprei por cima, os chinelos, e assim sai. Passei o protetor solar e coloquei os óculos de sol também. Se estivesse como no dia anterior, faria muito calor. Eu não era de ficar queimada e me bronzeava com facilidade; mesmo assim, quis me proteger.
A praia estava vazia naquele horário, a temperatura agradável, e eu pude caminhar bastante e até correr um pouco. Fui de uma ponta a outra, e só fiz o caminho de volta ao meu deparar com um morro que era composto por um misto de pedra e de vegetação. Havia uma trilha que levava lá para cima e, provavelmente, até o outro lado, para outra praia. Mas eu não queria demorar tanto. Já havia caminhado por quase uma hora, e tinha o mesmo caminho de volta.
Eu estava decidida a ligar para a editora e ver como ficaria a minha situação profissional ainda pela manhã. Para isso, tinha que voltar, pois tinha deixado meu celular no quartinho. Desligado. Só que, dessa vez, conectado na tomada para ter bateria no meu retorno.
É, eu tinha decidido ser corajosa, e não ia protelar mais isso.
No meu caminho durante a ida, eu tinha prestado atenção ao mar. Às ondas que estouravam e chegavam na beira já com pouca força. À espuma branca que o estouro fazia, respingando gotas para cima. Na cor bonita da água. Tinha me concentrado também na sensação da areia sobre os meus pés.
Meu foco estava todo na praia, e tinha até mesmo juntado umas conchas que eu achei bonita. Mas agora, ao voltar, eu comecei a olhar para a outra direção.
Além das dunas de areias havia algumas casas. Eu estava afastada do centro da cidade, das lojas, da movimentação, mas algo naquele lugar, naquelas casas, me chamou atenção. Parecia tranquilo. Exatamente o tipo de tranquilidade que eu buscava.
Talvez, quem sabe, eu encontrasse por ali algo disponível para alugar. Eu não tinha muito dinheiro, mas sabia que eu não iria aguentar muito tempo naquele quartinho minúsculo. E eu precisava desesperadamente de um banho decente. Com um chuveiro quente sobre a minha cabeça e não com uma bacia sob os meus pés.
Saí da beira da praia, voltei a calçar os chinelos, mas não coloquei o vestido em um primeiro momento, e comecei a andar entre as casas. Eram casas de moradores, não de veraneio, eu logo percebi. Porque eram afastadas da zona de entretenimento, em um lugar mais tranquilo e mais simples. Algumas pessoas acordavam e abriam as janelas. Uma padaria exalava um cheiro bom de pão recém feito, o que chamou atenção do meu estômago, mas não o suficiente para que eu parasse. Até porque eu não havia trazido dinheiro.
Caminhei até a rua principal, que era calçada com pedras retangulares cinza e com um pouco de terra marrom entre elas. E então coloquei o vestido, porque ali as pessoas estavam vestidas e eu não desejava chamar atenção. Perguntei para um senhor de idade, que aguardava em uma parada de ônibus, se havia algo para alugar, ou alguma casa vazia, disponível por ali. E ele me indicou o caminho da única casa vazia da qual se lembrava, mas que ela não estava disponível para ser alugada, segundo ele. Mesmo assim, eu segui a indicação.
Havia algo naquela cidade, uma sensação estranha que ela me trazia. Era como se eu sentisse alguma conexão com ela. E eu tinha vontade de caminhar mais, de conhecer mais. E então cheguei em frente à casa indicada, e a sensação de que eu pertencia àquele lugar aumentou. Era esquisito, mas era bom ao mesmo tempo.
A sensação de que eu pertencia a algum lugar, quando parecia que nada mais me restava, era um alento. Mesmo que não fizesse nenhum sentido.
A casa era branca, de dois andares, com uma varanda na frente que estava vazia. E eu conseguia imaginar com clareza dois bancos compridos ali, um verde e um branco. E eu conseguia me imaginar sentada neles, tomando um chá e vendo o por do sol. E isso que eu nunca fui muito fã de chá.
Não resisti. Mesmo que eu soubesse que estava invadindo uma propriedade alheia, eu caminhei e subi os degraus que levavam até a sacada para espiar pela janela de vidro. Lençóis brancos estavam esticados em cima de todos os móveis, mas a casa estava limpa demais para uma casa onde não morava ninguém. Ela podia estar vazia, mas não abandonada. E se estivesse disponível para aluguel, o que não estava, seria um lugar grande demais para mim, e de um valor que, certamente, eu não poderia bancar.
Sabia que deveria sair dali, mas não consegui. Precisei rodear a casa, espiando pelas janelas em busca de algo que me levasse aos donos. Algum objeto pessoal. Algo que desse sentido àquela conexão que eu sentia. Mas não encontrei nada. Só mais lençóis. Pude ver de longe a cozinha, ela parecia bem antiga. Como se a casa tivesse passado por reformas ao longo dos anos, mas os objetos, como o fogão e a geladeira, que eram brancos e de modelos ultrapassados, tivessem permanecido os mesmo.
Eu só... não queria sair daí. Mas sabia que eu precisava. Tinha que dar uns telefonemas. Falar com a Bruna e com a minha chefe, a mãe da Bruna. Isso não seria nada fácil. Afinal, eu tinha sumido por quase três dias e nesse tempo o meu celular estava desligado.
Eu só precisava de um tempo. Para pensar e colocar a minha cabeça no lugar. Sabia que eu não queria voltar, mas ainda não sabia para onde eu iria, e aonde eu queria ir. Aquela casa seria um ótimo lugar para eu ficar, se ela estivesse disponível e eu pudesse pagar por ela. O que eu não poderia. Mas, mesmo assim, isso não me impedia de ficar curiosa sobre os possíveis donos. E de sonhar em morar ali.
De quem era a casa? Quem a mantinha tão limpa, apesar dela estar nitidamente vazia?
De qualquer forma, era melhor pensar nisso, na casa, do que pensar no meu retorno, mesmo que por telefonema, à vida real. Eu teria que ligar para o meu trabalho. E teria que dar um jeito de pegar as minhas coisas, de preferência sem falar com o Jonatas. Não que eu fosse medrosa, mas eu não estava nem um pouco a fim de falar com o meu ex. A raiva ainda era grande demais para isso.
Eu não gostava de sentir raiva, pois sempre fui uma pessoa calma. A raiva para mim era estranha, quase uma desconhecida. Até mesmo quando a minha mãe morreu, eu não senti raiva. Um pouco de culpa talvez. Quando o meu pai morreu, eu senti medo. Mas o meu ex... esse me deixou com raiva.
Quando voltei ao quartinho, após mais de duas horas de uma caminhada gostosa, que terminou comigo na água do mar com água na altura dos joelhos, eu me sentia renovada. Hoje o mar estava mais calmo, numa temperatura agradável, e havia mais gente na praia, inclusive dois salva-vidas que já estavam a postos em sua guarita vermelha. Agora era seguro, então eu podia tomar um banho completo, e até mergulhar, algo que eu nunca fiz e que prometi que faria. Só que eu, admito, tive medo.
Eu não queria ter medo. Mas eu tinha. Era inevitável. E considerando que a minha irmã morreram afogadas, embora não no mar, meu medo era compreensível. Achei que para progredir eu precisava vencer o medo. Só que precisava também fazer uma coisa de cada vez. E, primeiro, eu iria telefonar para a Bruna. Que foi o que eu fiz, antes de trocar de roupa, ainda de biquíni e com areia nas pernas. Pelo menos, eu não precisava tirar toda a areia na pia, já que a tia da Iris havia me permitido usar um chuveiro que havia nos fundos da casa, ao ar livre, instalado para esse fim.
- Alô! Oi, Bruna. – eu disse assim que a minha amiga atendeu e falou "Alô".
Conheci a Bruna logo no primeiro dia da faculdade de letras e nos demos bem de cara. Quando decidi que seguiria pelo caminho de "revisora profissional", que trabalhar com livros era o que eu queria, ela me conseguiu um estágio na editora da mãe dela. O que facilitou bastante, pois era uma área muito concorrida.
Começamos a trabalhar juntas, a Bruna e eu, em um estágio não remunerado. Assim eu me tornei conhecida e querida entre os funcionários, fui aprendendo as coisas, e logo consegui um estágio remunerado. Minha função, entre outras, era a de encontrar promessas, livros não descobertos, autores não conhecidos. Tinha que ler muito livro ruim também. Aliás, eles eram a maioria. Mas eu não me importava, até porque sempre fui bastante eclética e não tinha um estilo preferido.
Eu era curiosa e gostava de tudo o que aguçava a minha imaginação. Talvez, por isso, eu não parasse de pensar na "casa" e em qual seria a história dos moradores dela. Sempre pensei em escrever um livro também, mas nunca tive inspiração ou coragem. Talvez escrever sobre aquela casa fosse um começo. Agora que eu não tinha mais o Jonatas, eu tinha tempo. Só precisava, talvez, pegar o meu computador.
E há alguns meses eu comecei a trabalhar com revisora da editora. Eu queria seguir fazendo isso, trabalhar à distância como revisora, mesmo que fosse um trabalho meio "freelancer" e sem carteira assinada.
- Ane? É você? – a minha amiga perguntou.
- Sim, sou eu.
- Ai, graças a Deus! Você sumiu! Minha mãe ficou louca com o teu sumiço, tem aquele livro que você está trabalhando e que ela precisa! Sei que o prazo é até a semana que vem, mas a escritora está ansiosa. É o primeiro livro dela com a nossa editora, e ela queria dar uma olhada na parte da revisão que você já fez.
- É, eu sei. Para isso eu voltei para a casa na quarta-feira, no meio da tarde, para mandar o que eu tinha feito por e-mail. Estava no meu computador de casa.
- E daí você sumiu.
- É.
- Sabia que o Jonatas já ligou aqui para a editora um montão de vezes? Ele parecia bem nervoso quando eu atendi. Para ele, eu disse que eu não sabia de você. Já para a minha mãe, eu falei que você teve um problema de família para resolver. Ela não sabe que você não tem família.
- Obrigada.
- Mas eu prometi a ela que você manda o livro antes do fim de semana, e hoje já é sexta. Aliás, o que aconteceu? Estava preocupada!
- Eu voltei para casa no meio da tarde naquele dia e peguei o Jonatas com outra. – eu entrava no quartinho agora, e me sentei na cama.
Era a primeira vez que eu falava sobre aquilo. E falar me deixou com uma espécie de dor de barriga e com as pernas um pouco bambas.
- Jura? Ele estava com outra? – ela se surpreendeu. Para quem via de fora, acho que a gente parecia um casal perfeito, o Jonatas e eu. A gente não brigava nunca. Mas acho que era porque eu acabava acatando sempre as decisões dele. Eu me acostumei a ser assim. Com meu pai e com ele.
É, talvez a idiota fosse eu. E talvez eu até merecesse um chifre no meio da testa por ter sido tão idiota. Mas isso não fazia com que eu o aceitasse.
- Estava. Com uma vizinha da gente. No meio da tarde... Sabe o que é pior? Ele nunca deixou de trabalhar para ficar comigo no meio da tarde!
- Puxa, Ane... – ela era uma boa amiga e parecia mesmo triste por mim - Eu sei como o Jonatas era viciado em trabalho... Você vivia reclamando disso... E o que você fez, quando pegou os dois na cama?
- Nada.
- Nada?
- Não. A música estava alta, e eles não me viram chegando. Cheguei bem na hora H, logo fui embora, mas não consigo esquecer o que o que eu vi.
- Nem vou perguntar o que você viu...
- É melhor.
Porque só de lembrar aquilo me magoava, e falar em voz alta pareceria pior. Ela estava de quatro na nossa cama, e ele por trás. Só não sei enfiando em qual das partes... E eu não queria pensar nisso, em qual das partes, embora eu pensasse. E, ao mesmo tempo em que me dava nojo, a visão e a lembrança dela, me causava dor.
- E daí eu fiquei atordoada, amiga. Nem me lembrei de pegar meu computador, nem de mandar o livro, eu simplesmente saí em silêncio e comecei a caminhar sem rumo. Acabei indo parar na rodoviária e algo me fez escolher essa cidade. Ela se chama Nova Itapeva, é bastante longe, e fica no litoral de Santa Catarina. Não era o primeiro ônibus. Aliás, esperei mais de uma hora por ele. Mas sinto que não foi uma escolha aleatória, sabe? Algo me fez vir para cá. Só não sei o que...
- O destino! – ela, apesar de tudo, ficou empolgada. A Bruna sempre foi mais crédula do que eu. Ela acreditava em destino, mitologia, sinais divinos e até em horóscopo.
- É... eu não sei. Mas prefiro acreditar que sim.
- E o Jonatas?
- Não quero falar com ele agora.
- Por isso ele está desesperado, não sabe que você viu. Ele pode dar parte do teu sumiço na delegacia, amiga. Já pensou? Pode achar que você foi assassinada, ou sequestrada.
- Não. Sei que ele não acha isso. Eu deixei o meu guarda-chuva, que ele me fez levar porque a previsão era de chuva, só que não choveu, na porta de casa. Ele sabe que eu estive lá.
- Humm... Talvez isso justifique ainda mais o desespero dele.
- E eu não ligo. Sabe? Ele que vá a merda.
- A merda? Sério? Acho que nunca te vi falando um palavrão antes.
- Eu sei. Mas estou me sentido livre. E falar merda é realmente libertador.
E apesar disso, da merda em que a minha vida tinha virado, a minha amiga riu. Pude ouvir a risada dela do outro lado da linha e aquilo me deixou com saudades. Eu adorava aquele som, era familiar, e eu sentia falta do familiar agora. Mas não o suficiente para voltar.
- Bru, preciso que você me faça um favor. Um grande favor.
- Claro, amiga. – o tom de voz dela mudou, e ela parecia preocupada.
- Preciso que você vá até a minha casa, que fale com o Jonatas, e que pegue algumas coisas para me mandar. Vou te enviar uma lista pelo celular assim que desligar. Preciso de roupas, do meu computador, e de alguns objetos pessoais. Mas não pode, de jeito nenhum, dizer para ele onde eu estou. Não quero falar com ele. Mas vou deixar meu celular ligado a partir de agora para falar com você.
- Mas não pretende atender as ligações dele.
- Não.
- E você vai ficar ai?
- Não sei. Não tenho nada ainda definido, mas, por enquanto, não quero voltar. E tem uma casa... Não sei explicar, mas sinto uma ligação com a casa. Queria saber mais sobre ela, e talvez até escrever a história dela.
- Sério? Que legal! Você sempre quis escrever um livro! Talvez seja uma ótima distração. E exatamente o que você precisa. Talvez seja até o seu destino. O livro poderia se chamar "A casa do destino". E eu adoraria ler.
- Tá. – eu respondi, achando graça. Às vezes eu esquecia que ela podia ser até mais empolgada com livros do que eu. – Se eu for escrever, prometo que você vai ser a primeira a ler.
- E se você não descobrir a história da casa, podia inventar uma. Acho que inventar é ainda mais legal.
- Porque você acha que a vida pode ser cruel e que nada pode ser mais bonito do que a realidade no papel. – eu brinquei e sorri. - Pelo menos, a realidade dos livros água com açúcar que você ama
- Sim, exatamente. Gosto de livros fofos, porque são fofos, e a realidade nem sempre é. E outra coisa... Acho que você deveria falar com a minha mãe. Talvez ela te deixe continuar com as revisões. Ela está bastante satisfeita com o teu trabalho. Sempre diz que encontrar bons revisores é difícil.
- É, eu pretendo ligar para ela agora.
- Tá. Eu te ligo depois que eu for para a tua casa. Mas acho que só consigo fazer isso quando sair do trabalho, à noite.
- Tá, não tenho pressa. Mas talvez a tua mãe tenha. Então, de repente, você possa acessar o meu computador e mandar o artigo para ela ainda hoje quando for lá em casa. Para garantir. – passei as informações para Bruna, o nome do artigo e em que pasta ele estava.
- É, vou ver se faço isso. E o que eu falo com o Jonatas?
- Pode falar que eu o vi com a vizinha, se quiser. Que eu fui embora e que não pretendo mais voltar.
- Puxa... – ela falou. Eu sabia que essa seria uma tarefa difícil para ela. A Bruna era muito bozinha e detestava magoar as pessoas. É, eu também costumava ser assim. – Tá. Acho que consigo dizer isso, se ele me perguntar. E assim que eu sair de lá, te ligo.
- Tá. Obrigada, Bruna. Muito obrigada mesmo!
- Somos amiga, Ane. E estou aqui para o que você precisar. Te ligo à noite.
- Certo. – então me dei conta de uma coisa - Só que talvez eu possa não atender. Vou trabalhar em uma pizzaria, e meu horário é até tarde. Comecei há dois dias, a cidade estava vazia, mas hoje não para de chegar gente. Então acho que vou trabalhar até tarde e talvez não possa atender.
- Sério? Então você pretende mesmo não voltar, se até já arranjou um trabalho... Sei que vou soar egoísta, mas se você não voltar, vou sentir sua falta.
- Também vou sentir a sua.
- É... Olha, acho que eu vou ao cinema com o Otávio de noite, então se você não atender, posso te ligar mais tarde? Mas tipo muito tarde?
- Claro. Não vou dormir cedo. Depois do trabalho vou sair.
- Sair para onde?
- Para um barzinho, acho que tem música ao vivo. A Iris, ela trabalha comigo na pizzaria, me convidou para ir com ela. Parece que hoje é a noite do microfone aberto, onde o público pode cantar, e ela está empolgada para cantar.
- Você vai sair de noite? Para um bar? E solteira? – ela agora parecia ainda mais surpresa do que quando eu contei que peguei o Jonatas com outra. O que fazia um pouco de sentido, porque eu sempre fui caseira e nunca fui do tipo que ia à baladas. Mas não queria ser mais como eu era.
- Sim. E ela disse que ia me emprestar uma roupa legal, já que eu não trouxe nada, para que eu fique bonita e pegue um gato na noite. – eu quase ri. Falar aquilo em voz alta era realmente engraçado.
- Você pretende... pegar um gato... na noite? – a Bruna estava, por incrível que pareça, ainda mais surpresa.
- Claro que não! – eu comecei a rir. – Mas não vou dispensar uma roupa bonita e a chance de ver a Iris em um palco cantando.
- Acha que ela canta mal?
- Não faço ideia. Mas, de qualquer jeito, acho que vai ser divertido.
- Fico feliz por você, Ane. Apesar de tudo, você parece bem.
- Porque eu estou. Por incrível que pareça, não estou me sentindo triste, estou me sentindo livre. Isso é muito estranho? Ou você acha que faz sentido?
- É, acho que faz. O Jonatas podia ser muito...
- Muito o quê?
- Estou pensando na palavra certa... E ainda não defini. Depois que eu falar com ele hoje eu descubro. Então de noite eu te ligo, tá? Agora preciso desligar, tenho mil coisas para fazer por aqui.
- Sim, e eu vou ligar para a tua mãe agora.
- Boa sorte!
- Obrigada. Vou precisar! – e eu acabei achando graça. Afinal, às vezes, era melhor rir do que chorar.
É, eu teria coragem. Mas daria um passo de cada vez.
Deu tudo certo. Depois de conversar vários minutos com a mãe da Bruna, a minha chefe, e explicar bem a situação até a parte de eu ter pegado o meu ex com outra, ela me permitiu continuar trabalhando à distância. Não gostava de contar da minha vida para os outros, mas a mãe da Bruna, nos últimos anos, foi o mais próximo que eu tive de uma mãe. E Acho que eu precisava de um pouco de solidariedade feminina também.
Para continuar trabalhando, eu precisaria do meu computador e de uma internet sem fio. A internet sem fio eu conseguiria pegando o wi-hi da pizzaria, que ficava grudada no mini quarto. Embora não tivesse uma mesa no quarto, ou mesmo um espaço para ela, eu sabia que daria um jeito. Tinha que dar. Já o computador, eu torcia para que a Bru conseguir me mandar.
Tal como eu imaginei, a Bru me ligou à noite quando eu estava trabalhando, e eu não pude atender. Ela me deixou uma mensagem dizendo que iria ao cinema, e que sairia perto da meia-noite, quando me ligaria.
Nessa hora eu já estava no bar, com uma saia preta um pouco mais curta do que a que única que eu trouxe e usando uma regata branca, emprestadas da Iris, que me deixavam sexy. Era estranho usar uma roupa sexy, atrair o olhar dos caras e estar solteira ao fazer isso. Mas, ao mesmo tempo, era bom. Mesmo eu não pretendendo pegar nenhum gato.
Falando em gato... o policial estava lá. Não no bar ou interagindo com os amigos, mas trabalhando e fazendo a ronda. E de farda. Eu tentava desviar meus olhos dele e não babar, mas era quase impossível. Porque ele de farda ficava quase tão delícia quanto correndo na beira da praia.
A Iris tinha cantando e até que ela cantava bem. A minha nova amiga insistiu que eu cantasse também, só que eu não quis. De jeito nenhum. Eu tinha cantado poucas vezes na vida na frente de outras pessoas, como da minha família, e seria incapaz de subir em um palco e fazer isso diante de um público.
Ela disse que ninguém ali ligava se a pessoa era boa ou não, era só mesmo pela curtição. E que muitos estavam bêbados demais para reparar na qualidade sonora. Mesmo assim, eu não quis. Porque eu, ao contrário da minha nova amiga, não bebia. Então não me sentia sem noção como ela depois de três garrafas de cerveja.
E depois, quando eu finalmente consegui falar com a Bru, soube que as coisas não foram nada bem com o Jonatas. O que me levou a telefonar para ele. E isso me deixou tão puta da cara, tão fora de mim, que eu tive a coragem de fazer coisas que normalmente não faria. Como cantar na frente de um monte de gente e dar um mergulho no mar, o meu primeiro, no meio da madrugada.
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