A intrometida
— E lá vem ela, a musa da passarela, cantando e encantando corações!— ironizou Jules Quinn quando Carmen se aproximou tendo finalmente conseguido se livrar de um garoto que estava obstinado em chamá-la para dar uma volta. A Zabinni encarou a amiga com a cara amarrada e ajeitou sua saia, irritadiça.
— Esses garotos não somem nunca!?— ela reclamou, só queria chegar logo no Salão Principal, jantar e ir dormir, a folga não parece chegar nunca!
— Pelo jeito que a senhorita trata todos os que vem falar com você, devo dizer que minha teoria fora comprovada: os homens adoram ser pisoteados.
Carmen revira os olhos com força.
— É lamentável! Uma pena que pela forma que alguns me abordam não tenha como eu não ser grossa. Parece até que eles pedem por isso.— ela puxa os cabelos negros por cima do ombro e respira fundo.
— É um porre ser tão linda, né?— Jules suspira dramaticamente e caminha como se tivesse um grande peso sobre os ombros. Carmen sorri e balança a cabeça.
Mal as garotas chegam às portas do Salão Principal, logo elas se abrem exibindo um trio de rapazes carregando grandes porções de carne, aparentemente bem mais do que eles aguentariam comer sozinhos. Carmen franze a testa se permitindo ser tirada do caminho pela sua colega de quarto. Peter Pettigrew e Sirius Black passam pelas duas sem se importar enquanto James Potter levanta os ombros e exclama algo indistinguível porém animado com a boca cheia de batata cozida. Seus olhos brilham para Carmen, mas Sirius ladra para que ele se apresse e o Potter não se demora demais ali, correndo para seguir o amigo.
— Eles não são mesmo uma figura?— Jules pergunta retoricamente e ri balançando a cabeça. Ela entra no Salão, mas ao notar que sua amiga ficou parada no corredor acompanhando os Marotos com o olhar interessado, deu meia volta.— Ei, você não vem?
Carmen se sentiu estranha, como se algo grande estivesse acontecendo e ela soubesse o que era, mas estava incapaz de nomear. E esse instinto tem a ver com esses garotos.
— Espere um momentinho aí.— ela disse e foi atrás dos rapazes, deixando sua colega de quarto confusa para trás.
Jules até pensou em ir atrás de Carmen, mas aí seu estômago roncou e ela balançou a cabeça.
— Doidinha.— murmurou e foi jantar.
Carmen tomava cuidado de manter os passos bem silenciosos e em uma distância segura enquanto seguia o trio suspeito pelos corredores. Não eram horas para os alunos se aventurarem fora do castelo e ao ver que os rapazes se dirigindo para o saguão, Carmen só conseguia ficar mais intrigada.
James, por ser o último da fileira, olhou para todos dos lados antes de fechar a porta atrás de si, mas apenas um segundo depois, Carmen atravessava o saguão saindo na noite escura sem saber exatamente para que lado seguir. Era imprudente, mas ela estava cega por um forte instinto e a impulsividade bem que é um ponto forte para a casa para a qual ela fora selecionada.
Carmen saiu levemente abaixada e com as costas coladas nas paredes, via os três rapazes correndo em uma reta e sabia que se um deles olhasse para trás ela seria pega no pulo.
Mas não foi o que eles fizeram, pelo contrario, eles a guiaram direto para o Salgueiro Lutador. Carmen se escondeu atrás de uma pilastra, a noite sendo iluminada apenas pela intensa luz da lua cheia. Seus olhos castanhos miraram o céu por um segundo, mas quando ela voltou a encarar os rapazes, notou que faltava uma cabeça loira e, quase que milagrosamente, o Salgueiro Lutador parou de se mover. Nunca ela havia imaginado que ele poderia simplesmente parar de se mexer. Isso não é normal, legal? Talvez.
Os Marotos se enfiaram em algum buraco entre as raízes do Salgueiro e Carmen avançou até a metade do caminho, finalmente relutando se deveria se meter no que quer que estivesse acontecendo ou se devia se aproximar do Salgueiro para levar uma surra que a jogaria longe. Respirando fundo e sentindo a brisa fria a abraçando, entrando por cada fresta de suas vestes, ela tomou a pior decisão possível.
Carmen puxou a varinha de seu bolso e se aproximou do Salgueiro com uma postura de quem está pronto para a luta, encontrando um enorme buraco entre as raízes ela se enfiou nele depois de acender a varinha, murmurando lummos.
O Salgueiro voltou a se mover assim que ela passou, como se estivesse apenas esperando por ela.
A passagem sempre foi um tanto sufocante, mas James sacudiu a cabeça e respirou aliviado quando finalmente alcançaram a Casa dos Gritos no fim daquele túnel de raízes e terra. A Casa dos Gritos é uma casa isolada na colina do vilarejo de Hogsmead, abandonada e supostamente assombrada. Os gritos de seu amigo rapidamente chegaram até seus ouvidos e os rapazes, pelo menos os que seguiam em sua forma humana, se arrepiaram. Eles nunca se acostumariam com esses gritos torturados de Remus Lupin, James e Sirius trocaram olhares tensos e o ratinho ao seus pés subiu no pé de Sirius, pegando um apoio para chegarem no andar de cima mais rápido. O barulho de correntes ficava mais alto assim como os gemidos sofridos do seu melhor amigo que tentava resistir à sua transformação. James Potter abriu a porta empurrando-a com o pé e eles entraram no quarto acabado, colocando as porções de carne que roubaram descaradamente do Salão Principal na cama. Remus Lupin se encolheu no chão e contra a parede, se ele já não estava péssimo esta manhã, sob a luz pálida da lua cheia que era a única coisa iluminando o quarto, ele parecia morto.
Sirius se aproximou de Remus e se abaixou ao seu lado, colocando os cabelos negros para trás da orelha e tocando as costas tensas do ofegante licantropo.
— Sai.— Remus rosnou.
— Está tudo bem, vai ficar tudo bem.— ele passou a mão nas costas do amigo e, aos poucos, passou para sua forma animaga. Eles ainda não aprenderam totalmente a lidar com as transformações de Remus, mas descobriram uma forma de não deixar seu amigo sozinho nas piores horas. Transformando-se em animais clandestinamente, os Marotos perceberam que Remus ficava mais tranquilo, ao menos seu lado lobisomem não era agressivo com eles em suas respectivas formas.
Peter Pettigrew tornava-se um ratinho magricela e pequeno e gostava de ficar na cama, empanturrando-se e tentando cobrir seus ouvidos sensíveis quando Remus gemia alto por causa da tortura que passava.
Sirius Black tornava-se um cachorro grande e negro, muito imponente, geralmente aquele tipo de animal visto como um presságio da morte na cultura da clarividência.
James Potter, por incrível que pareça, tornava-se um cervo, um do tipo esbelto e adorável. Ele estava prestes a se transformar quando o ranger do piso do lado de fora atraiu sua atenção e no momento que ele olhou para a porta entreaberta, uma luz foi apagada. Ele franziu a testa se perguntando se tinha visto coisas.
Os gritos estranhos se tornaram mais intensos e horripilantes, arranhando seus tímpanos conforme Carmen se aproximava da porta lentamente. A respiração ofegante e as mãos trêmulas, ela espiou o que não devia e encontrou uma besta enorme tomando o lugar de um garoto que ela sabia quem era. As vestes dele foram rasgadas e ele foi ganhando tamanho, fazendo com que o coração de Carmen acelerasse e as correntes nos braços de Remus ficassem mais apertadas ainda. Quando o animal arranhou furiosamente o assoalho espantando o cachorro de perto de si, Carmen arfou quando foi agarrada por trás e quase deu uma cotovelada em James, mas ele a segurou com força e cobriu sua boca, apertando-a firmemente por trás, sem nenhuma gentileza.
— Shh!— ele sibilou contra os cabelos dela, arrancando da garota um arrepio involuntário. Ela não podia enxergar nada, como ele falou, nem teria como ela justificar que havia reconhecido sua voz, mas ela soube que era James. O abraço dele era quente e talvez fosse o medo que ela estava sentindo, mas além dos arrepios, seu coração ficou muito acelerado, batendo cada vez mais forte. Ele tem cheiro de bolo.
Sentindo a respiração descompassada da garota contra sua mão, ele só a tirou de sua boca quando se convenceu que ela não faria nenhuma bobagem. As pernas de Carmen não estavam funcionando e ela se viu na necessidade de se apoiar em James, querendo se esconder e ser protegida quando um silêncio absoluto de dentro do quarto foi dominado pelo inconfundível barulho do farejar de um cachorro. Mas de um cachorro muito grande, pois sua respiração era profunda e alta.
O casal no corredor ficou imóvel, os corações batendo forte, as palmas das mãos suando, Carmen agarrou o braço de James e o forçou a recuar um passo, obrigando-o a bater as costas na parede da velha casa para que nem a ponta de seus sapatos ficasse na fresta iluminada pelo luar.
O lobisomem dentro do quarto respirou fundo, as correntes se arrastaram no assoalho e ele se aproximou daquele monte de carne que os rapazes trouxeram exatamente para entretê-lo. Quando o barulho de sua mastigação tomou conta da casa, James puxou Carmen consigo já que a garota nem se sentia capaz de correr, tremendo-se de cima a baixo. Ele quase a carregou, segurando sua cintura firmemente enquanto ela se recusava a diminuir o aperto em seu braço.
Eles deixaram a casa pelos fundos, expondo-se na apagada e fria Hogsmead.
James estava preocupado, é claro, tudo poderia ter dado muito errado se ela ao menos tivesse exagerado no perfume depois do banho, mas acima de tudo ele ficou muito zangado.
— Mas o que é que você está fazendo aqui?!— ele censurou em um sussurro baixo continuando a guiar a garota para longe da casa.
— E-eu... eu sabia.... Remus é um lobisomem!— ela olhava para o chão, tentando se adaptar com o choque, nunca tinha chegado tão perto de um lobisomem, fora uma experiencia e tanto mesmo que tenha mais ouvido do que visto. James se afasta da garota abruptamente, a deixando cambalear por não estar andando totalmente por conta própria ainda. Os dois param um de frente para o outro. A lua cheia brilhava tão intensamente que agora os dois podiam se ver com clareza, do lado de fora.
— Se você contar para alguém, eu juro por Deus...— ele começa, uma postura totalmente agressiva e protetora, Carmen fez careta e sacudiu a cabeça.
— Não vou contar para ninguém, Potter!— ela o interrompe, ofendida— Eu respeito os segredos dos outros!
— Não pareceu respeitar quando se meteu onde não foi chamada!— ele retruca, rudemente. Carmen engole a própria língua, ela gostaria muito de poder rebater, mas tem noção de que está errada.
— Não foi minha intenção!
— Não tem como você ter aparecido aqui sem querer!
— Não aumente o tom comigo!
— Eu aumento se eu quiser! Nada disso é da sua conta!
— Eu sei, eu só...— ela não tem argumentos, tem certeza que vai parecer ridícula se admitir que só estava seguindo seus instintos até os rapazes. A verdade é que ela invadiu a privacidade deles, deveria ter dado meia volta no Salgueiro. Sem querer pedir desculpas para James, ela abaixou a cabeça e o garoto tirou os óculos para esfregar o rosto, irritadiço e preocupado com o que isso pode desencadear para Remus. O segredo de seu melhor amigo é algo muitíssimo importante para James; ele faz qualquer coisa para proteger seus amigos.
Embora ele não a tenha chamado momento algum, James não pode evitar de se sentir culpado. Ela estar ali tinha que ser culpa sua. O moreno colocou as mãos nos quadris e respirou fundo, examinando a garota pela primeira vez de um jeito além da atração que sente por ela. Como ele poderia confiar nela?
Ele a encarou e ela se abraçou, um tanto abalada. Os nervos do Potter baixaram um pouco.
— Você está bem?— ele pergunta, bufando.
— Estou.— ela responde com o mesmo jeitinho.
— Você precisa voltar para o castelo.
Como? Eis a questão. Carmen Zabinni olhou ao redor, estava estampado na sua cara que ela está completamente perdida. James morde o lábio com força e encara a Casa dos Gritos pensando se os seus amigos poderiam cuidar de Remus sem ele só até que ele devolvesse essa garota intrometida de volta para seu lugar.
— Eu te levo.— ele balança a cabeça, porque apesar de tudo ele não pode deixá-la ali.
— Aposto que não me quér de volta na casa.— ela resmunga e ele sorri com o sotaque dela escapando mais uma vez.
— Não, não quero.— ele concorda e a garota cruza os braços— Mas há outro caminho. Só me segue.
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