Capítulo 01
Camila Cabello
Eu estava eufórica, como se mil mariposas batessem dentro do meu peito, sei que não deveria estar tão nervosa, eu só veria mais uma vez meu melhor amigo, Austin, como todos os outros anos.
Só que desta vez, era diferente. Ele seria apresentado como meu noivo.
Era estranho, consigo me lembrar daquele dia em que estava chovendo e ele insistiu que brincássemos no jardim e escorregou e seu rosto de príncipe ficou cheio de terra e lama, tínhamos dez anos e nenhuma ideia na cabeça. Desde então somos amigos desde sempre.
Não era ruim pensar em me casar com meu melhor amigo, eu até ficava feliz por isso. Austin era a pessoa mais querida que eu conhecia, principalmente para um homem. Ele me respeita e isso é muito nos dias de hoje.
Mulheres não têm credibilidade nenhuma, ainda mais quando são princesas e herdeiras do trono do reino mais importante e almejado de todos os outros. Vêrmenia é o principal país, a maior potência mundial, seguida por Estátira, país de origem de Austin. Por isso, uma aliança foi a melhor decisão que encontraram para manter a paz entre os dois países, tendo como garantia a minha aceitação como rainha do meu próprio país, que tenho como direito de nascimento.
É humilhante, precisar me casar com um homem para ser aceita.
Detesto o fato de não me casar por amor, por alguém por quem eu não estou apaixonada, apesar de ser meu melhor amigo, não é nenhuma história de amor com um final feliz como nos contos de fadas. Os casamentos de hoje em dia estão mais para um contrato com um final trágico dos contos de William Shakespeare.
- Vossa Alteza, todos estão te esperando. Está pronta? - A minha dama de companhia entra no meu quarto após bater duas vezes na porta de madeira do meu quarto.
- Preciso de mais cinco minutos. - Digo ainda olhando no espelho da penteadeira do meu quarto. Meu cabelo estava em seu devido lugar, meus olhos estavam maquiados na medida certa, destacando o castanho escuro da minha íris, e o batom vermelho vibrava nos meus olhos. O vestido dourado, cintilava e brilhava com as poucas luzes ligadas do meu quarto. Eu estava perfeita e pronta, fisicamente. Mas, minha cabeça estava uma bagunça, uma zona que não sabia como colocar no lugar e o barulho era alto, tanto da minha cabeça como das pessoas no cômodo debaixo.
- Tudo bem, quando estiver pronta o soldado Mendes estará à sua espera para te acompanhar. - Ela diz e eu assinto.
Mas não demora muito até que eu tome coragem de enfrentar todos os olhares julgadores, prontos para apontarem o menor dos meus erros, dos conselheiros dos meus pais. Os brilhantes gênios que inventaram toda essa ideia de casamento arranjado porque não aceitavam que o herdeiro do trono de Vêrmenia, na verdade era uma herdeira, mulher e que tinha uma língua afiada.
Eu me recuso a me curvar diante de um homem. Deixo que esse trabalho seja feito por eles.
- Estou pronta. - Digo de dentro do quarto para a porta que logo se abre, revelando um rosto masculino desconhecido. Me lembro de todos os meus soldados, de cada escolta e a maioria de seus nomes. Mas este, eu nunca havia visto pelo palácio, e eu reconheceria um rosto como aquele em qualquer lugar. - Você deve ser o soldado Mendes.
-Vossa Alteza, me chame de Shawn, se preferir. - Ele diz após se curvar diante de mim ainda com um semblante sério no rosto. E eu assinto, era mais fácil.
- Então, Shawn, nunca havia te visto por aqui. - Digo segurando seu braço direito que estava inclinado para mim.
- Sou novo por aqui, fui recrutado recentemente. Parece que conseguiram me tirar do meu esconderijo. - Ele comenta. Sinto uma pontada de amargura na sua voz. Como se não quisesse estar ali.
Não o julgo. Se eu pudesse também me esconderia. Mas fugir do recrutamento para o exército era mais fácil do que para ser a próxima rainha de Vêrmenia. Não tive muitas escolhas.
Não reclamo da minha família ou do meu povo. Eu daria minha vida por eles. Tudo que reclamo é do cenário em que me encontro. ''Mulheres não nasceram para liderar'', eles dizem.
A maioria dos soldados do palácio gostam do emprego que têm, muitos agradecem aos deuses por estarem no palácio e não em um campo de batalha, outros como o soldado Mendes, detestam a vida que têm, talvez por terem planejado uma vida diferente, por estarem longe da família ou simplesmente porque não é o que nasceu para fazer. Agora, me pergunto, qual seria o motivo de Shawn Mendes detestar a vida como soldado no palácio.
- Às vezes, apenas não temos escolha. - Digo e ele permanece em silêncio, ele mal me toca ou olha para mim. Enquanto descemos as escadas seus olhos ficam vidrados em uma janela ou até nos próprios pés. É quando percebo que ele não quer manter uma conversa, apenas quer acabar logo com aquilo, tanto quanto eu. Está apenas fazendo seu trabalho. Já conheci soldados mais carismáticos ou educados.
E é quando encontro os olhos do meu melhor amigo e, aparentemente, noivo me esperando no final da escada. Pronto para ser apresentado oficialmente como meu futuro marido e rei consorte. Que homem sortudo.
- Está linda, Camz. - Ele diz quando me aproximo após agradecer Shawn com um pequeno eleve sorriso. Austin se curva e segura minha mão deixando um beijo ali.
- Obrigada. Você não está nada mal para um príncipe. - Brinco com ele que sorri. Ele envolve meu braço esquerdo no seu direito e nós andamos até o centro da sala cheia de convidados. Príncipes, princesas, reis e rainhas de todos os outros reinos, além de conselheiros e nossos pais. Minha mãe tinha um sorriso iluminado no rosto e meu pai permanecia sério como sempre. - Está pronto?
- Para você, sempre.
- Com vocês, Austin Carter Mahone e Karla Camila Cabello Estrabao, futuros rei e rainha du Vermênia e Estátira. - Uma voz pronuncia de algum lugar do salão. Minhas mãos estavam frias e meu corpo poderia desmoronar a cada minuto. Quando senti o olhar dos velhos conselheiros do meu pai, senti que caia, ou estava prestes a desmaiar no meio da sala.
Uma música clássica começa a tocar, a famosa primeira dança do casal de noivos. Sentia como se estivesse prestes a me atar com Austin, como se estivéssemos na cerimônia do nosso casamento.
Ele sorria para mim a todo momento, quando sua mão esquerda envolveu minha cintura, com tanta delicadeza, com sutileza, como se a qualquer momento eu pudesse quebrar, e sua mão direito envolveu a minha. Senti que estava segura e que podia confiar completamente no meu melhor amigo, como nunca antes confiei. Ele faria as coisas da forma correta, não me envergonharia.
A dança aconteceu de forma natural, como quando tínhamos doze anos e íamos para as aulas de dança juntos, ele sempre era meu parceiro e nunca reclamava quando eu tropeçava em seus pés.
- Você sempre foi melhor que eu nessas coisas. - Digo e ele me olha confuso. - Dançar.
- Eu tinha a melhor parceira de dança, que me ensinava o que eu não devia fazer. - Ele zomba e eu faço uma careta. Ele ri. - Você não era tão ruim, sempre foi melhor em cantar e tocar piano do que eu.
Eu me lembrava disso. Austin odiava cantar e faltava todas as aulas de piano que tínhamos. Não era a parte favorita dele em ser um príncipe, ele sempre me perguntava, o que mudaria nas nossas vidas se soubéssemos ou não cantar ou tocar piano. Eu também não sabia o porquê de obrigações como esta. Se sempre estaríamos atrás de mesas assinando papeis ou servindo de boas imagens para nossos países, apenas fantoches nas mãos de pessoas maiores.
Sinto olhos pesados sobre as minhas costas e Austin parece perceber, ele permanece com a mão firme na minha cintura e abre um leve sorriso reconfortante, como se estivesse dissesse que aquela tortura para mim já estava quase acabando. Mal sabe ele que, esse noivado e casamento só são passos mais próximos para a tortura de verdade. Sem contar que, terei que conceber um filho de Austin e sempre ser submissa a ele e às suas vontades. Sei que Austin nunca me obrigará à nada, mas o resto do mundo irá. Eu sei.
- Uma moeda de prata pelos seus pensamentos? - Ele pergunta me olhando com curiosidade quando a música acaba e ambos nos reverenciamos.
- Imagino no que irá acontecer daqui para frente. - Digo sem muito ânimo ao pegar uma taça de champanhe em uma bandeja de um dos empregados.
- Como assim? Iremos nos casar, oras. - Ele diz com um sorriso no rosto. - Será o maior casamento da história e você será minha esposa. Minha linda e perfeita esposa.
- Sim, Austin. Eu sei. - Digo e tomo um pouco do champanhe da taça. - Mas, você sabe que eu não...
Sou interrompida por três homens rabugentos que se aproximam de nós dois. Seus sorrisos nojentos e convencidos me enojam.
- Aqui está o mais novo casal. - O primeiro homem de barba diz e Austin segura minha cintura me puxando para perto. - É tão bom ver duas pessoas tão apaixonadas juntas e prestes a se casarem, não acha? - Ele pergunta para o homem ao seu lado.
- Sim, fico feliz que dois reinos tão poderosos irão se casar e se tornar um só. Ficamos felizes que os dois países se tornaram amigos para todo o sempre. - Ele diz. Sendo mais evidente sobre seus interesses do que seu colega de barba.
O terceiro homem está calado, analisando cada ação que Austin e eu tomamos. Ele nota minha expressão fechada e o sorriso de Austin. Nota também que Austin segura com mais delicadeza a taça, que ele havia pegado da minha mão antes dos homens se aproximarem, em sua mão do que minha cintura. Então o terceiro anuncia, finalmente:
- Estamos felizes pela felicidade de vocês. Esperamos que a aliança e vocês sejam muito felizes para a eternidade. - Ele diz, ainda com o semblante fechado. - Vamos, senhores, deixemos os apaixonados em paz.
Assim, os três homens se afastam, assim como eu também me afasto de Austin.
- Camila, se você quer que as pessoas acreditem que isso é mais do que uma amizade de anos, precisa ser mais convincente. Já tentou sorrir? - Ele aponta e sua atitude me irrita.
- Preste atenção, Austin. Sei que somos amigos e sempre te amei, como amigo. Mas isso, jamais irá passar disso, uma amizade. E você sabe disso. Dessa forma, te alerto que eu ainda serei dona do meu próprio nariz e você, jamais, irá impor suas vontades sobre mim, entendeu? - Digo e ele se retrai. - Espero que não estraguemos essa amizade linda que temos com essa ideia de casamento. Uma união que você sabe muito bem que eu não aprovo. - Dito isso me afasto procurando outra taça de champanhe.
E é quando noto que precisarei de algo mais forte. Whisky!
Saio do salão principal e me esgueiro até a sala ao lado, um dos escritórios do meu pai. Assim que abro a porta, encontro o que eu tanto procurava, abro o vidro e sinto o cheiro forte de álcool contra meu nariz. Era o que eu precisava.
Enquanto me sirvo reparo que a porta atrás de mim se abre. Me viro e encontro os olhos escuros do soldado Mendes.
- O que está fazendo aqui? Não te dei autorização para entrar. - Digo voltando minha atenção para o whisky e o copo na minha mão, assim me servindo.
- Não deveria estar na sua festa de noivado? - Shawn pergunta se aproximando e eu me viro mais uma vez bebendo o líquido do meu copo. Sinto a queimação descer pela minha garganta e meus nervos se acalmarem aos poucos.
- Você chama aquela tortura de festa? Eu preferiria uma festa de coroação, a minha, de preferência. - Digo e Shawn se mantêm calado e parado diante de mim. - De qualquer forma, você não deveria estar em uma sala escura e sozinho comigo, soldado Mendes, sabe as consequências que isso traria a você, certo?
- Sim, eu sei. Principalmente por seu noivo estar na sala ao lado. - Ele diz com um sorriso convencido. O primeiro sorriso que vi dele, um sorriso genuíno que me fez sentir algo diferente dentro de mim. Sua aproximação de repente causa arrepios na minha pele e, não sei se estou curiosa para saber até onde isso pode ir.
- Ele não é meu noivo. - Digo me virando e me servindo de um pouco mais de uma bebida forte, sei que ainda estava sóbria demais. Assim que me sirvo, bebo mais um pouco e sinto o corpo de Shawn um pouco perto demais do meu.
- Não deveria estar bebendo tanto. Uma princesa não deve...
- E o que você sabe sobre princesas, hm? - O interrompo falando um pouco mais alto do que deveria.
- Eu não sei nada sobre princesas, mas, sei muito sobre você, vossa alteza. - Ele diz e então escuto um barulho vindo da porta, Mendes se afasta e consigo finalmente respirar.
- Karla, querida. É você? - Era a voz do meu pai do lado de fora da sala. Lógico, como sou sortuda.
- Se esconda, agora. - Digo para Shawn que me olha confuso, mas, obedece. - Sim, papai. Sou eu.
- Querida, não devia estar aqui. Por que não está aproveitando a festa? - Meu pai me pergunta quando abre a porta e se aproxima.
- Não podemos apenas cancelar a festa, o noivado, o casamento e toda essa história tosca de aliança? - Pergunto emburrada me sentando no sofá que havia do outro lado do cômodo. - Eu não quero me casar com Austin.
- Mas, ele é um ótimo rapaz e vocês se conhecem desde que eram crianças. Agradeça, pois, encontraram um rapaz de boa família e que te ama. - Meu pai diz se sentando ao meu lado e segurando minha mão esquerda.
- Não diga isso, sabemos que ele não me ama e que eu não o amo, não assim. E tudo o que tivemos e criamos por anos, irá acabar. Tudo por causa dessa ideia absurda. - Digo afastando minha mão das dele. - O senhor sabe que lutei para ter meu lugar na mesa do parlamento. Também sabe o que tive que fazer para ter o respeito do meu povo. E tudo isso será jogado fora, apenas por me casar com ele, um homem que eu não amo e que também não me ama. Não diga que tive sorte, quando você se casou com quem quis.
- Não tente nos comparar querida.
- Claro que não comparo, até porque, você era o rei e um homem. Eu sou apenas uma princesa e mulher. Mesmo com todo o meu esforço ainda não tenho respeito e não sou vista como uma rainha para os seus conselheiros. Então, o que há para comparar? - Ironizo e vejo a decepção no rosto de meu pai.
- Sua mãe e eu enfrentamos muitas coisas e pessoas, inclusive seus avós, para permanecermos juntos. Sua mãe não era uma nobre quando a conheci, mas era a mulher mais doce e gentil que eu já havia conhecido em toda a minha vida. Não diminua os meus esforços para ter quem eu amava ao meu lado. Assim como também, não diminua a importância de Austin na sua vida, pois sei, que ele te ama e quer seu bem. - Meu pai diz com o tom de voz alto. - Minha querida, só estamos tentando fazer o melhor para você.
- Não entende que o melhor para mim é governar meu país sozinha? - Digo me levantando do sofá e indo até a mesa do meu pai, onde encontro Shawn escondido debaixo da mesa, tão encolhido quanto seus ombros e pernas o permitiam.
- Você não sabe o que está por vir. Há uma guerra se aproximando e Vêrmenia é o que eles querem. Tudo isso que estamos fazendo é para o seu, o meu e o bem do povo. Já pensou quantas famílias, incluindo crianças morreriam? Sendo que a resposta para nossos problemas esteve debaixo dos nossos narizes o tempo inteiro. Você, Karla, é a chave para nos manter de pé. - Ele diz enquanto se levanta do sofá em que antes eu estava. - E esse casamento é a porta para nos proteger. - Ele finaliza indo em direção a maçaneta da porta da sala. - Se recomponha e volte para a festa, seu noivo está a sua procura. - E assim ele se foi.
Não consigo me conter ao pegar o jarro de onde estavam algumas rosas e jogá-lo contra a parede ao lado da porta. Eu estava furiosa, estava sendo controlada e usada pelo meu próprio pai.
- Acho que você...
- Calado! - Digo e a voz de Shawn se fecha, mas não por livre e espontânea vontade. Quando ele tenta falar novamente sua voz não funciona. Como se eu tivesse a roubado. - O que houve com você? - Ele não consegue responder. - Diga!
- Como você fez isso? - Ele pergunta assustado, seus olhos espantados e cheios de terror, mas, de alguma forma, curioso.
- Eu sinto muito, eu não sei o que aconteceu. - Digo e corro para fora da sala.
Como eu calei um homem daquela forma?
Aquilo não era possível, eu estava com raiva e precisava de silêncio, mas não ao ponto de conseguir roubar a voz de alguém.
O que está acontecendo comigo?
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