Capítulo 16
Fico parada sem saber o que fazer, para onde ir, se devo fechar a porta e correr como se minha vida dependesse disso... minhas dúvidas são dissolvidas quando a mulher faz um movimento com os dedos pedindo que entre.
-Não vai me dizer quem é, Léo? -Ela pergunta novamente e Léo me olha com o cenho franzido.
-Ela é... uma amiga do colégio mamãe. -Diz e me confundo mais ainda. Como assim colégio? Temos mais de vinte anos já.
-Oh! Que ótimo, venha meu anjo, sente-se. -Convida e eu me sento em uma cadeira ao lado da sua cama sem dizer nada. Nenhuma palavra passa pela minha cabeça nesse momento. Estou tão confundida como uma criança em um desfile da Sapucaí. -Como você se chama? -Pergunta e eu saio do transe.
-Maria Clara, muito prazer, dona...
-Constanza. E o prazer é todo meu! Você é muito linda, sabia?
Fico vermelha com o elogio e Léo solta uma risadinha carinhosa para a mãe.
-Ela é mesmo, mas não mais linda que a senhora... -Beija a sua mão e agora quem cora é sua mãe.
-Tenho que concordar, a senhora é muito bonita mesmo... -E era verdade, a mãe de Léo, a pesar de ser já de idade, tinha um rosto angelical e lindos olhos verdes. Deduzo que os olhos de Léo sejam iguais aos do seu pai.
-Oh querida, obrigada. -Agradece e começamos a conversar sobre um monte de coisas e ela me conta histórias de Léo quando era criança me fazendo chorar de rir. Ele era uma peste. Bom ainda é, mas agora é diferente.
Depois de muita conversa, ela diz que quer cantar, que se sente feliz.
Ela se senta e Léo pega o violão e começa a tocar novamente a melodia e ela canta uma música em italiano, tão linda que me dá vontade de chorar.
-Isso foi lindo dona Constanza... fiquei emocionada. -Digo sinceramente e ela me diz para chamá-la apenas de Connie, que era o seu apelido desde jovem.
-Leopoldo, quando seu pai virá visitar? Sinto saudades... -Nesse momento percebo que Léo me olha estranho, como se estivesse... triste. Ele desvia o olhar rapidamente e faz um carinho na bochecha da mãe antes de responder.
-Ele virá logo, logo, mamãe... já sabe, tem que tomar todos os remédios e fazer os exercícios, Okay? -Repreende e ela balança a cabeça como se fosse uma criancinha prometendo algo que sabemos que nunca vai cumprir.
Nesse momento, me levanto para sair, sinto que o clima ficou mais íntimo e não quero atrapalhar a visita de Léo, mas uma mão enrugada me segura me impedindo de me mover.
-Aonde pensa que vai, mocinha? -Connie pergunta travessa e eu dou um sorriso cumplice.
-Tenho que ir Connie, já está ficando tarde, e tenho que fazer umas tarefas para o colégio. -Decido perguntar depois o porquê dessa mentira, deve haver algum motivo para isso, não quero que ela se estresse com algo tão insignificante.
-Oh, fique mais um pouquinho... -Pede e eu me sento na cadeira, sua carinha me convence e acabo cedendo. -O Jhonatan, pai do Léo, quer que ele seja médico, ele já está até estudando, não é mesmo? -Cutuca o garoto orgulhosa, e Léo baixa a vista, novamente com a tristeza no seu olhar.
-Sim mamãe, vou ser o melhor médico da cidade. -Sua voz suave me pega de surpresa e sinto borboletas no meu estômago. Quem é essa pessoa e o que fizeram com o Léo mal-humorado que conheço?
-Ele insiste com essa coisa de banda, ele realmente é muito bom, o dom é de família, eu cantava quando era mais jovem, sabia? -Começa a contar, mas Léo a interrompe na mesma hora.
-Bom mamãe, preciso levar a Clara pra casa, senão os pais dela vão ficar preocupados, toma todos os remédios, e não os esconda debaixo da cama que Joana já está avisada sobre isso. -Connie me olha travessa e não resisto a soltar uma risadinha, ela é muito fofa.
-Você vê Clarinha, eu crio o meu filho a vida inteira, para ele virar um fofoqueiro! -Dá um tapinha no braço do garoto e ele a olha com repreensão, mas dois segundos depois estamos todos rindo.
Me despeço primeiro para dar um pouco de privacidade aos dois e Connie mais uma vez segura o meu braço.
-Você vai voltar amanhã Clarinha? Gostei muito de te conhecer... -Sinto meus olhos se encherem de lágrimas ao ver a sua expressão animada, começo a responder que virei todos os dias que puder visitá-la, mas Léo nem me deixa dizer um "a" sequer.
-A Clara está muito ocupada mamãe, semana de provas na escola e essas coisas... -Ele me olha praticamente suplicando para que concorde com a sua história.
Solto um suspiro e assinto.
-Eu adoraria vir Connie, mas é verdade, tenho muitas provas e não sei se posso, mas quando tiver um tempinho, venho te visitar sem falta! - Não resisto ao ver o seu olhar triste no começo e fico feliz quando ela solta um sorrisinho, Léo por sua vez me olha bravo. -Bom, vou indo, te espero lá no carro Léo. -Dou um abraço nela e caminho lentamente para fora do quarto, fechando a porta ao sair.
-Ela é muito linda meu filho, vocês deveriam ser namorados... -Escuto antes de que a porta esteja completamente fechada e balanço a cabeça enquanto Connie consegue arrancar mais um sorriso de mim. Não consigo escutar a resposta de Léo, pois bem na hora, uma enfermeira passa e me apresso a sair dali, vai que ela pensa que estou bisbilhotando.
Com o volume no máximo, escuto Scorpions com o fone de ouvido enquanto espero que Léo volte. Já faz mais de vinte minutos que entrei nesse carro e ele ainda está lá dentro.
Fecho os olhos enquanto o coro de The Game of Life começa a tocar e imito os acordes de bateria e de guitarra, até que sinto uma presença do meu lado e abro os olhos rapidamente, o coração batendo a mil.
-Droga Léo, você me assustou! -Pauso a música e guardo o celular e fone de ouvidos na minha mochilinha.
Ele não diz nada, coloca as mãos no volante e olha fixamente para um ponto invisível na sua frente. Não entendo o que está acontecendo e não quero forçá-lo a dizer nada que não me corresponda, então aguardo também em silêncio por alguns minutos.
-Ela tem Alzheimer. -Diz de repente e viro o rosto na sua direção. Meu coração se acelera com essa informação e sinto um aperto no peito.
- Léo você não precisa...
-Descobrimos a alguns anos atrás, -Ele continua sem nem prestar atenção em mim. -Ela começou a esquecer algumas coisas, aqui e ali, no começo achamos que era normal, todos esquecemos algumas coisas as vezes não é mesmo? Mas depois tudo foi se agravando e tinha vezes que ela não conseguia dizer algumas coisas simples, ou ia até a cidade e esquecia o que tinha ido fazer. -Conforme ele vai contando, meu coração vai batendo cada vez mais rápido. Tentei impedir que continuasse, mas depois percebi que ele precisa disso, precisa contar essa história e ele me escolheu para isso, ainda que de maneira inesperada. -Comecei a me preocupar e a levei no médico, eles detectaram a fase inicial na época. Dois meses depois, papai faleceu. -Meu peito aperta como se tivesse recebido um soco bem ali. -Ela se lembra de muitas coisas de anos antes, ainda pensa que ele está vivo e que virá visitá-la qualquer dia desses. Ainda pensa que eu estou no colégio e que vou ser um médico famoso... -Uma risada triste escapa e ele balança a cabeça resignado. -No começo eu dizia a ela que época estamos, que papai faleceu e outras coisas, mas ela entrava em desespero, como se estivesse recebendo a notícia pela primeira vez, então decidi não a fazer sofrer mais, sabe. Sempre digo que ele vai visitar ela, mas no outro dia ela nem lembra disso...
Ele esfrega o rosto com as duas mãos e depois encosta a cabeça no volante. Sua respiração está rápida como a minha e sei que ele só está se tranquilizando antes de continuar. Posso sentir que há muito mais pela frente.
-Às vezes ela acorda no meio da noite muito alterada porque não sabe aonde está e não conhece ninguém, então me ligam para que eu venha acalmá-la, foi isso que aconteceu hoje. Eu canto a sua música preferida e ela vai se tranquilizando aos poucos.
Quando viajo, deixo um vídeo para o pessoal mostrar caso ela tenha esses ataques, mas quando é muito grave, venho a acalmo e volto para a turnê. Muitas vezes precisam sedá-la até que eu chegue... eu não queria que ela ficasse tão longe de mim, mas ela precisa de cuidados as vinte e quatro horas do dia, e eu trabalho tanto para poder pagar esse lugar... as vezes me sinto a pior pessoa do mundo por ter coragem de deixá-la aqui enquanto viajo para o mundo todo...
-Você não é uma pessoa ruim, Léo. Muito pelo contrário, é alguém que ama tanto a sua mãe que se sacrifica para que ela esteja bem. -Coloco minha mão no seu rosto e recebo um olhar cheio de significados em troca.
-Eu sei, é que... me desculpa ter metido você nessa confusão. Eu nunca trouxe ninguém aqui... a rotina dela é bem detalhada, provavelmente amanhã ela não vai lembrar dessa visita. -Essa frase acaba me incomodando por mais que eu saiba que é verdade. Eu gostei da Connie, ela é uma pessoa doce e linda. Eu adoraria visitá-la novamente.
-Tudo bem, não tem problema. Sua mãe é muito linda e tem um sotaque arrastado, pelo que ela cantou, percebi que é italiana? -Afirmo e pergunto ao mesmo tempo, é a hora de mudar de assunto.
-Sim...meu pai praticamente a sequestrou da Itália em uma das suas viagens, segundo eles, foi amor à primeira vista. -Um sorriso nostálgico brota dos seus lábios carnudos ao lembrar do pai. -Ele era como eu, olhos castanhos, alto e porte atlético, e ela era linda. Os cabelos castanhos e olhos cinza eram belos, mas sua personalidade foi a que o encantou.
Eles se conheceram em um bar, ela sempre foi a rebelde da família e para contrariar aos pais, cantava lá todas as noites.
Sempre foram aventureiros e antes que descobrir que estava grávida, mamãe saltou de paraquedas, quando ela pisou o chão, vomitou tanto que ficaram preocupados, fizeram um exame no outro dia descobriam a causa do mal-estar, eu.
-Você, incomodando antes mesmo de nascer! -Brinco e ele dá um tapa na minha coxa de brincadeira e eu solto uma risada de porquinho, que vergonha!
Ficamos novamente em silêncio, cada um no seu próprio mundo. Penso em tudo que ele passou, do amor que recebeu dos pais, do sofrimento de descobrir a doença da mãe e logo de perder o pai. Entendo um pouco dessa sua personalidade reservada. Ele não tem tempo a perder com coisas bobas como uma música por uma aposta. Ele tem muitas preocupações para lidar. Quem sabe fazer essa música seja uma distração para ele, uma forma de fugir dessa sua realidade.
De repente, uma ideia me vem à cabeça.
-Vem, quero te levar a um lugar que conheço. -Giro a chave e o carro ganha vida.
-Não faça isso sua doida. -Reclama mas coloca o carro em marcha mesmo assim.
Passamos novamente pelo portão de ferro e ele se despede do guarda com um aceno. Entramos na rodovia e vou indicando para ele o caminho para o lugar aonde quero chegar.
Depois de quase dez minutos, duas entradas erradas e um quase atropelamento, finalmente chegamos.
Desço do carro antes mesmo dele ser desligado e Léo grita que sou louca e que se me machucar não será culpa dele. Mostro a língua e me viro correndo até a borda. Segundos depois, dois braços me enlaçam pela cintura e sou levantada do chão entre risadas.
-Está maluca? Você poderia ter se machucado! E para onde está correndo? -Pergunta quase gritando.
-Preciso chegar... -Me solto e corro até o muro de pedra que separa o lugar seguro do enorme penhasco. Léo novamente me alcança, mas dessa vez não diz nada, apenas observa a vista da cidade aos nossos pés. -É lindo, não é? -Pergunto olhando para a infinidade de luzes amarelas e brancas das casas abaixo. Uma pintura viva que nos mostra como somos seres únicos nesse universo.
-Sim... -Coloca o braço sobre o meu ombro e me puxa para perto de si. Sinto um frio percorrer a minha barriga e acabo tremendo, mesmo estando me sentindo quente. -Aqui... pega. -Tira o moletom e me entrega. O visto apenas para sentir o seu cheiro e o seu calor. Voltamos a nos abraçar e passamos quase vinte minutos assim, apenas apreciando a vista em silêncio.
-Então... Leopoldo hein? -Minha curiosidade está simplesmente me sufocando. Quero saber qual a origem desse nome.
-Era o nome do meu pai. Leopoldo Moura Castellani. Ele adquiriu o sobrenome da minha mãe depois que se casaram, muitos zombavam dele por isso, mas ele sempre disse " eu sou dela e ela é minha e quero me certificar de que todos tenham conhecimento disso." -Caramba, o pai dele era simplesmente perfeito.
-Então você é Leopoldo Castellani Moura? -Assinalo o óbvio e ele aquiesce. -Mas por que só usa o sobrenome do pai?
-Por que não quero ninguém fuçando na minha vida e descobrindo sobre minha mãe e aonde ela se encontra. Você sabe até onde podem chegar para obter uma informação.
-Infelizmente, sei e muito. Ninguém sabe aonde moro realmente. Todos pensam que é na casa que estamos agora, mas você já sabe aonde é né? -Cutuco sua costela com o cotovelo e ele ri.
Nos calamos novamente com um suspiro e depois de outros minutos, me solto do seu abraço e vou até o carro. Me deito no capô e observo o céu completamente estrelado. Segundos depois, Léo se deita do meu lado e outra vez, observamos a beleza da natureza. Em algum ponto, sinto sua mão sobre a minha e um segundo depois, seus dedos se embrenham nos meus e estamos de mãos dadas. Sinto novamente esse frio na barriga e é como se o mundo parasse nesse exato momento. Não ouso desviar o olhar do céu, porque sei que se o fizer, vou ver algo que não quero. Não por que eu não queira estar com Léo, pelo contrário, porque não quero me iludir.
Quando já não consigo mais suportar essa situação, me levanto e me encosto no capô, dessa vez com os pés no chão. Esfrego as mãos no rosto e percebo que peguei essa mania de Léo. Respiro fundo e expiro bem devagar para tentar acalmar o meu coração que bate desenfreado.
-Tudo bem? -A voz rouca no pé da minha orelha me arranca arrepios. Ele está perto. Muito perto.
-S-sim. Estou bem... -Ofego e ele se aproxima ainda mais de mim. Me controlo o máximo possível para não me afastar.
-Clara, me desculpa, mas preciso te beijar agora. -Antes mesmo que eu possa responder, ele cola sua boca na minha e sinto o sabor dos seus lábios enquanto sua língua invade a minha boca. Nosso beijo vai ficando cada vez mais urgente, cada vez mais íntimo, mais... intenso.
Suas mãos exploram todo o meu corpo e eu não fico para trás. Invado sua blusa e toco o seu peitoral arrancando gemidos e suspiros, toco sua barriga e arranho levemente, depois acabo parando nas suas costas, arranhando novamente e descendo até chegar no cós da sua calça.
Ele por sua vez, aperta a minha bunda, me atraindo mais para si e me fazendo sentir o volume dentro da sua calça jeans. Depois apalpa os meus seios por cima do sutiã e quase me arrependo por estar vestindo a peça nesse momento. Suas mãos são curiosas, cuidadosas e muito, muito quentes.
Em certo momento, ambos precisamos de ar e acabamos rompendo o delicioso contato. Léo cola sua testa na minha e respira com dificuldade.
-Acho... melhor...irmos...-Digo também ofegante.
-Sim... Não queremos ser presos por atentado ao pudor e se eu não te levar para casa, Josué vai me matar. -Responde enquanto dá vários beijos pela minha testa, bochecha e olhos.
Suspiro pela milésima vez em dez minutos e ele me dá um último selinho antes de se afastar e entrar no carro. Imediatamente sinto frio, mas não um frio pelo clima, é como aquele frio que sentimos quando estamos com medo ou ansiosos. Balanço a cabeça, devo estar ficando doida. Entro no carro, coloco o cinto de segurança e partimos para casa. Léo mantém a sua mão sobre a minha perna durante todo o caminho e eu tenho que me controlar para não demostrar que isso me afeta. Deus como me afeta.
Ao chegar em de casa, ele passa pelo primeiro portão e para o carro.
Tiro o cinto e estou prestes a sair quando ele segura o meu braço delicadamente.
-Não vai se despedir? -Pergunta com um brilho nos olhos.
-Oh... desculpa... -Beijo sua bochecha. De repente, me sinto tímida ao seu lado.
-Vamos Clara, se despeça direito! -Exige e eu levanto uma sobrancelha para o garoto. Ele aceita o desafio e segura o meu rosto com as duas mãos, olha profundamente nos meus olhos e diz: -Adeus Clara, durma bem...-E me dá outro beijo de tirar o fôlego, literalmente.
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