33 🔗 EGO PALÁDIO
O OUTRO EGO |
Três encarnações
de célebres malandros
De cérebros brilhantes
Reuniram-se no céu
O destino de um fiel,
se é o céu o que Deus quer
Consumado, é o que é,
assim foi escrito
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MINHO (?)
A minha vida é o fundo do mar, o topo de um penhasco.
Meus olhos pesados teimam em não se erguerem mais. Da dobra dos meus dedos, meus ossos, meu sangue, meu fôlego, é tudo descompassado, é uma bagunça, de dentro para fora. Tudo me dói tanto, mas não é físico, porqueê não sinto dor. A dor ainda é uma palavra muito pequena comparada a toda a minha existência. Tudo me dói, mas não é exatamente dor.
Às vezes, gostaria de me conhecer melhor, saber porquê tudo vai embora, e porque a vida é feita de rasgos, seja simbólicos ou literais. Sinto que... Estou andando por um túnel escuro..
Completamente sozinho.
E eu preciso ser. Existem algumas coisas que eu preciso fazer.
Manter-me são é minha única chance de sobrevivência, e eu preciso sobreviver. Eles precisam que eu viva para me violarem, para roubam minhas lembranças, me torturar, e me fazer um alguém perdido. É estranho racionalizar isso.
A minha cabeça como dói.
Mas eu não sinto dor?
Eu não deveria sentir, toda vez que repito isso, repito as palavras de meu pai, "Você não sente como eu sinto, você nunca sentirá dor." Procuro me convencer de que é verdade, mas não se passa de mentiras de amor, ou talvez isso não seja amor, só ignorância. O amor não dói. Aquelas palavras também não deveriam doer.
Os dias são cruéis e assustadores.
Sinto falta dos olhos dele, da prepotência, da risada, do cheiro, do seu saber. Eu sinto falta de amar sem preocupações, sem ter medo de morrer ou alguma coisa acontecer, sem ter medo de amar. Sinto falta dos dedos dela, às vezes, dos cílios que batiam nos meus, da risada, do cheiro, do seu saber. Sinto falta de ouvir seu coração, e sentir seu movimento, de ouvir o seu choro, de segurar sua mão, de vê-la, de abraçá-la, tê-la e falar "olha, o papai tá aqui!". De tirá-la do chão e rodear os braços sobre ela como se o mundo estivesse acabando. Como se o mundo estivesse nos meus braços. Como se Maria fosse meu mundo.
Estou suportando sozinho.
Lágrimas descem pelos meus olhos, pingam sob a mão roxa, dançam no sangue seco, caem no chão alvo, sem cor. O cômodo é azul, porque o branco me incomoda, por isso mesmo diante de tantos sentimentos conturbados, no meio de tudo eu sinto um pequeno alívio, alguém pensar nisso é pensar em 1% de um alívio pra' mim. As paredes tem buracos e rachaduras que se encaixam na moldura dos meus punhos, e há pedaços de concreto. Eu não os fiz então não sei quantas horas estou aqui e por quanto tempo permaneci em silêncio, só sentindo. Passaram-se muitos de outros egos até que o próprio eu conseguisse o controle, e agora não sei onde estou, com quem estou, se estou seguro ou em grande perigo, em que ano estamos, se estou com fome, se fui ao banheiro, se estou hidratado, se já não parti e não me dei conta.
Em meio a todos esses debates internos o qual me levaram a longos minutos encarando meu palmo, ouço a trinca do que poderia ser a porta do lugar que estava. Um longo ranger metálico se arrastou pelo piso, e erguendo meu olhar para frente sou tomado por uma súbita e forte vergonha, que somente essa pessoa é capaz de me provocar.
Ela se agacha em roupas casuais e de repente está a minha frente. Aquela postura rígida de passos firmes de uma digna agente com obrigatoriedade com a lei. Melissa foi convocada.
— Com quem eu falo? — Ela pergunta, sua voz sai grave, mesmo fora do serviço alguns traços dos anos de ofício são bastante marcantes em sua maneira de portar-se, eu quase consigo sorrir.
Não tenho vontade de conversar embora esteja feliz por vê-la, me sinto envergonhado por algum motivo, este que ainda não tive tempo de entender, então sigo com a testa baixa.
— Eu o conheço. — Ela diz. Seu suspiro pesa o ambiente quando a escuto mais uma vez. — Você nunca me olha nos olhos.
Por um momento me torno longe, em algum lugar da minha mocidade para voltar novamente, mesmo sem me mover consigo ir a um último momento com ela, quando tudo ainda era bom.
—...Minho. — Distante, eu a escuto se aproximar e abaixar-se, junto a com sua fala — Eu preciso que saiba que está em solo seguro em uma base segura, com pessoas de confiança. Os seus amigos estão tomando conta de tudo que podem. Você deve estar se perguntando o que aconteceu, porra, muita coisa aconteceu. Mas não vamos falar sobre isso, não agora, você ainda não está estável, está sob medicação, a pressão está baixa, mas continua muito machucado e não deixou ninguém se aproximar. Então, se estiver se sentindo um pouco melhor peço que me permita deixar um agente de saúde entrar aqui pra' cuidar de você. Você me concede permissão?
Novamente, tenho vontade de sorrir. Melissa me conhece profundamente e sabe com exatidão como se comunicar comigo, por termos crescido juntos, como ninguém mais sabe. Devagar, aceno positivo, e antes que ela se afaste, estendo o braço com muita dor ao fazê-lo. Ela compreende e vem ao meu encontro, me circula com os braços, e aperta forte, me sufoca entre lembranças e sentimentos, pensamentos e dores. E eu começo a soluçar novamente. Porque os dias são cruéis e assustadores.
Não demora muito para perceber que ela também é tomada por emoções, quando seu corpo pesa o meu e eu a ouço manifestar — Eu sinto muito, Minho, eu sinto muito, muito, muito, mesmo. Por favor, me perdoe por não ter ficado mais um pouco com você, me perdoe por ter ido embora quando precisou, me perdoe por não ter sido diferente de nossos pais. Me perdoe por ter te obedecido, eu deveria ter brigado mais, batido o pé, mas você me pediu distância e eu assim fiz. Eu sinto muito pela morte delas, Minho, eu sinto muito pelo que papai te fez naquele dia, eu sinto muito por fingir que estava tudo bem quando nenhum caralho estava bem! Por favor, Minho, eu peço que me perdoe por ter percebido tarde.
— Nunca será tarde demais. — Sussurro e finalmente a encaro, e muito infeliz me vou.
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NARRAÇÃO EM
TERCEIRA PESSOA
O céu lilás fazia-se presente há alguns dias desde que, sob falsa segurança, os ativistas de Internals se abrigavam em um grande imóvel localizado no interior da cidade de Gunsan, uma das vizinhas de Alma, na província de Jeolla do Norte, fora da perspectiva do sistema. O lugar era agora carregado de pessoas que moviam-se silenciosas sob os gritos de um homem com partes de lata. Era doloroso para todos, em principal para Asherah.
Han Jisung, afundado em seus próprios pensamentos, se sentava nas portas de saída de ar dos fundos, sozinho e distante, escondido dos olhares e da movimentação dos anarco-cibernéticos ocupados com o seu próximo destino. Sua cabeça se concentrava, mais uma vez, no céu, assistindo as naves cortarem a neve enquanto expirava fumaça.
Em poucos minutos, um pequeno estrondo pode ser ouvido próximo, de algo chocando-se com a escada de emergência metálica, e de lá surgia uma menina de pele preta, magra, esguia, e com olhos grandes feito o sol. O mecânico à observa percebê-lo ali também, retirando seu papel queimado dos lábios e amassando-o entre os dedos enquanto abana a fumaça. Sem dizer nada ela se aproxima da porta, e ele vê seus pés descalços e feridos, um suspiro forte ecoa de si, e se levanta calmo indo até o banheiro mais próximo.
Sem anúncios ou questionamentos, ele rasga um pedaço longo da cortina velha que forra as janelas do cubículo, e com o auxílio de um copo de vidro que se encontrava acima da pia ele retorna a saída. Sentando-se no chão, o Han estende suas mãos e aponta dizendo — Posso? — A menina o olha e hesitante acena. Logo seu pé é estendido e Jisung começa a limpá-lo, precisava lavar os machucados para cuida-los, enquanto sua mente continuava longe. — Quem te mandou aqui?
A curiosidade tem voz para ele, pois é ciente dos inúmeros profissionais de saúde no andar acima, mas ele talvez ainda não estivesse pronto para a resposta. Ela diz curta — Madalena.
Suas mãos quase pausam, mas dão seguimento antes de questioná-la mais uma vez — ... Como?
A menina continua em tom monótono e desconfiado — Maria Madalena me disse que se eu me machucasse no centro, eu deveria procurar um homem baixo de cabelo ruivo, tatuagem no pescoço e dedos escuros, e que se não achasse em lugar algum, olhasse em cantos afastados ou escondidos, ele estaria lá. Eu estive procurando todos esses dias. Você é esse homem?
—... Quem é você, para Hyunjin? — Talvez q questão doasse meramente ofensiva pelo seu tom, mas Jisung só tinha curiosidade.
Ela o observa, parece lê-lo com a vista, e então toma fôlego e anuncia com força — Carolina!
O moço à análise com dúvida, seguido de indagações — E por queê à obceceobedece?
E a cabeça da mesma tomba para o lado quando replica —... E ela estava errada?
Jisung então opta por permanecer em silêncio, dá por ombros, buscando não pensar ao momento, apenas ajudando-a com o ferimento. Ainda estava de emocional cansado pelo que havia acontecido com Hyunjin à pouco mais de dois dias, seu coração doía, e ele cogitava o pior, não sabia o que faria, sentia o controle escorrer por entre seus dedos feito areia do mar, ele temia, se irava, mas não sabia o que fazer. Exatamente por estes motivos que tragava afastado de todos, não precisava de consolo, ele sentia que precisava era enxergar sangue em seus punhos, e maquinava algo. Ele estava tão abalado que não conseguia subir para cima, no outro andar, pois Minho também estava lá, agonizando, ele não conseguia mover-se diante de uma situação tão delicada, temendo piorar as coisas, ele se afastava, e se afastava.
No entanto, o destino talvez não estivesse ao seu favor quando ouviu a voz de Tiago à procurá-lo e a menina tão intrometida responder pelo mesmo, gritando que o mecânico estava bem ali, recordando-o do porquê não gostava de crianças.
Quando o vêe, a ativista sinaliza que precisavam conversar. E após colocar as devidas ataduras nos pés da menina, ele se levanta para segui-la.
Pelo caminho, atrás da terceira líder de Internals, Jisung não podia conter-se em admirá-la, era inevitável, embora não estivessem no melhor dos humores para comentários. Tiago tinha braços fortes, aura pesado em contraste com seu rosto manchado e de pelos rasos, delicado mas quase fleumatico, eles tinham tanto a debater mas tão pouco tempo, o que o deixava ansioso e irritado.
Chegando até o local onde para o seu acelerar de batimentos cardíacos, seu noivo estava hospedado até então, sem muita paciência, ela o mandou para dentro. Brevemente, ele julgou o local como coerente, parecia um quarto confortável, suficientemente humano para que o cyborg não se sentisse menos que isso.
Então lento, ele abre a porta com a bota e enxerga Minho no chão, deitado contra o piso, apesar de se existir um colchão. Embora visualmente confortável, era inefável os traços da sua estabilidade a ver pelas paredes que também carregavam as marcas. Jisung não pode conter a lágrima solitária que foi rapidamente contida, ele estava ali como um profissional. Por isso o rosto emotivo foi levado pelas expressões neutras, virando-se para o lado, na caixa de primeiros socorros que haviam lhe entregado, ele vestiu as luvas respirando fundo para encará-lo.
O homem deitado o viu, e colocou-se de joelhos. Sem olhá-lo. Ele fez um movimento que tiraria sua camisa, mas alarmante o Han corre até o mesmo para auxiliá-lo por não saber da gravidade de seus ferimentos. —... Minho, sugiro que não faça esforço, você passou por um processo recente de remoção das balas que foram alojadas no seu corpo, e não se recuperou totalmente por conta das crises, seu corpo não está apto para ficar se esforçando. — Finda monótono, sua garganta seca em agonia. O outro não discute, somente ergue seu braço único dando abertura para que o "agente de saúde" fizesse seu serviço.
Minho fedia, estava à alguns dias talvez três neste estado, seu corpo exalava suor e sangue, mas não era nada comparado ao que o mecânico já havia visto na vida, por isso o processo é rápido e a roupa é posta em qualquer canto. Jisung sem aviso posiciona suas mãos abaixo das pernas e costas do mesmo e o carrega sem dificuldade para a cama que era muito melhor comparado ao chão para avaliá-lo com precisão e devida prudência. Não percebe no entanto os olhos surpresos do paciente porque assim como este, ele também não o encara. Sob o corpo deitado, a pele é tocada com naturalidade e certo carinho inconsciente e automático, tanto que o avaliador não percebe que o faz, mas um outro alguém consegue notar. Já havendo passado por diversos profissionais por conta das feridas de trabalho, em sua mente era bastante perceptível o tratamento com o qual era lhe entregue.
De visão baixa um pouco desconexa com o atual momento, o cyborg com necessidade de reparos e assistência psicológica observa cada ação. As mãos que se arrastam sob o peito se desviam de uma cicatrizes específicas, dançam entre as costelas, alisam pequenas elevações, arranhões, os pontos recentes, com toda precisão sobem até os ombros, e os dedos encostam onde devem encostar, era perceptível, que o conhecia. Mas não encarava o rosto, da mesma maneira que o homem de lata não encara o seu. Quando pousa em seu ombro que carrega apenas o início de seu braço e a falta deste, ele o segura e pausa.
Jisung pausa e não prossegue, ele encara a consequência genética com seriedade e silêncio, como se já não estivesse ali. E os olhos que o captam carregam tantas dúvidas.
Em mesmo transe, as mãos do agente voltam a circula-lo observando as pequenas irritações daquela pele, até que novamente paralisa. Ainda o assistindo, o Cyborg o vê erguer seu palmo até o próprio pescoço e de lá puxar uma corrente fina. Ele segura a ponta desta, cuja a figura de uma cruz se faz presente e a encosta nos lábios, a beija, fechando os olhos, e começa a mover sua boca devagar. E o outro não entende nada, absolutamente nada do que se passava ali.
Somente depois de certo tempo foi que tomou consciência de que talvez o profissional de saúde estivesse rezando por si, mas ele não entendia o porque de tal.
Por impulsividade a mão que era encostada em seu peito foi coberta, para retirá-la dali, mas assim que Minho a tocou, foi como se novamente, aquele momento não fosse incômodo, não era incomum, por isso ele a repousa ali também. Por coragem, ele lentamente ergue a vista por entre sua franja e solta uma exclamação baixa — É você, não é? — Ele disse rouco e paciente, viu o rapaz abrir os olhos com rapidez e confusão.
Jisung parece se despertar de uma grande dissociação e não compreendendo totalmente sua pergunta, questiona então —... O que?
Desviando a vista por mais uma vez, aquele que era metade lata metade homem movia sua boca como se guardasse certo amargor sob a língua, como se refletisse sob as reações do outro. E de maneira não muito séria murmura — Você é quem eu vi outro dia, eu acordei e você está lá casualmente. Deve ser compromisso de algum alter ego. Me deixe por dentro, quantos anos tem?
Negando com a testa o mecânico permanece em estado de confusão, cheio de interrogações em sua mente —... Do que está falando? Quem, quem é você?
O homem de rosto familiar e sutis comportamentos indiferentes arrasta sua voz como uma alma cansada e o responde com as pálpebras pesadas e boa eloquência — Lee Minho. Bom, pra' polícia eu sou Know, mas pra' quem mte conhece, eu sou o Capeta.
Pelas identificações o momento parece se clarear a mente de Jisung, que de imediato presume — Você é mais um deles?
Uma sobrancelha é arqueada, como se tudo não passasse de uma vela piada, aquele que o ouve mas não diretamente o vê, se coloca a falar novamente — Homem. Não tenho ideia do que está falando. Mas eu sinto que posso confiar em você, mas gostaria de saber por quêe. O que você é "meu", teoricamente?
Ainda sob incertezas hesita quando responde, mesmo com certo orgulho e soberba que contrata-se em sua voz soa — Noivo.
Os olhos do outro se abriram exageradamente, mas voltaram a neutralidade com rapidez. Questionando-se alto — Oh. Como superamos tão rápido?
Jisung se afasta, caminha sem muita direção sob o cômodo, como se buscasse paciência. Ele passa as mãos por entre o cabelo, puxando, embaraçando, frustrado e perdido, mais uma vez questiona — Eu vou ter que perguntar mais uma vez, mané.... quem é você?!
Mais uma vez dotado de uma postura cansada e muita calma, Lee Minho o responde alto —... Eu sou o núcleo. Eu não sou um Alter ego.
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alma
O oficial olhou para o abismo, e o abismo o olhou de volta.
As pupilas vermelhas o consumiam, o testavam, "Avança, avança pra' tu ver" elas diziam, elas sussuravam. O indivíduo loiro de cabelos até a altura do queixo, sujo, com fome, frio, era firme, sustentava a postura sem tremer, sem submissão, sem piscar, mal piscava, apenas o encarava. Algemado, confinado e limitado ao básico, seu queixo rangia de frio como um cão, sua boca era seca, mas não cederia fácil. E no final, a polícia não tinha nada para usar.
O indivíduo, homem e mulher tudo junto, ou talvez algo a mais que isso, não tinha filhos, marido, mulher, alguém, ninguém. Certidão de nascimento vinha vazia. Então nasceu onde? Nasceu de quem? Do que? Por quê? Caiu do céu? Pelos olhos era fácil saber, vinha de marte, do fogo, vestia-se do sol.
Ele não existia. Mas existia ali.
Um cidadão indigente, como sequer existia? A resposta era única, uma prostituta de metal.
O agente sentou-se a mesa, de frente para aquele que controlava a ansiedade e certo medo, organizando os dados inexistentes que tinha para argumento. Ele expressou — Te chamam de Madalena. Será que podemos conversar Madalena? Só precisamos que nos informe o que sabe, pra' quem trabalha, qual organização financia vocês... — Suas palavras foram cessadas assim que este que o ouvia ergue sua cabeça antes tombada para frente, e foi dali que o oficial se viu de frente com a face mais magoada e tão bela, dos olhos cristalinos que contrastavam entre o metal e as pupilas, era tão distinto dos coreanos, não se parecia com os alcances cirúrgicos do novo mundo, as tendências não se assemelhavam a isto. Repetiu sua questão — Pra' quem trabalha, Madalena?
Devolvendo suas dúvidas, a voz suave soa como uma brisa — Para quem acha que trabalho? Ou melhor... Por quem você acha que eu trabalho? — Arregalados os olhos brilhavam insanamente. Como uma louca.
O oficial negava com a testa controlando-se, do suor que riscava sua pele e o sangue que fluía rápido por suas veias, era território perigoso, ou era ao menos isso que sentia. Ele murmura brincando com a tela em mãos — Não quero jogos com você, se quer sair com segurança, sugiro que responda as devidas perguntas, e rápido, ou as coisas podem vir a se complicar. Então essa é uma oportunidade única, falar. Então prostituta, fale.
Feito Renato Russo que proferiu à toda altura como conseguiu o equilíbrio cortejando a própria insanidade, ciente de que tudo está perdido, e certeza que existem possibilidades. Sob razão e insanidade moral, aquele rosto permanecia inerse em anestesia, êxtase de sua mente pela tamanha ira que sentia, somente isto explicava a risada alta de Hwang Hyunjin antes de dizer-lhe com palavras — Vocês... — Sua gargalhada falha ecoa entre as paredes para iniciar uma citação angustiada e igualmente repleta de insanidade.
—... Me desgraçaram. Qual o motivo? Porque sou uma prostituta. Será que uma prostituta não tem olhos? Uma prostituta não tem mãos, órgãos, dimensões, sentidos, afetos... paixões? Não é alimentada com a mesma comida, ferida com as mesmas armas, e sujeita às mesmas doenças, curada pelos mesmos meios, aquecida e arrefecido pelo mesmo frio e o mesmo calor, tal qual como um cristão, um cidadão ou político, um rico? Se nos picarem, não sangramos igual? Se nos fazem cócegas, não rimos? Se nos envenenam não morremos? E se nos fizerem mal...não nos deveremos vingar?"— E enquanto murmurava movimentava os dedos presos por correntes por seu rosto, retirando os fios que encostavam a testa úmida.
O homem permanece descrente, a observa, aquela figura caricata, como quem vê um quadro obsoleto de significados, e questiona — Shakespeare? Essa é nova por aqui, ou talvez não, favelados gostam de palavras bonitas. Mas me diga, onde é que está a vergonha na cara? Ter tanta lábia mas sem educação alguma. Onde está a sua dignidade?
O desenlace vem dentro de um sorriso vermelho de dor junto com a arrazoa sincera —... Na avenida, deixei lá. — E se faz rindo mais uma vez para em seguida continuar —... Você pode fazer o que quiser comigo policial. Mas me matar vai ser mais fácil, só um conselho de um, favelado.
O agente se vira de costas com os pés cambaleantes como se não soubesse o que realmente fazer, mas suas palavras continuam rápidas e cruéis — Com rosto de anjo? Eu duvido muito que te queiram descartado ainda.
Maria Madalena mesmo presa à correntes e uma cadeira metálica, move-se para frente com os olhos grandes e predominância de vermelho, e balançando sua cabeça, mais uma vez, insanamente, dita com voz arrastada e vagarosa — Eu não estou aqui para brincar, oficial. Nem mesmo que eu apodreça no chão de cimento dessa cadeia e que meu corpo seja tratado com um pedaço de carne imundo nas suas mãos, eu abrirei a minha boca. Você não sabe da minha capacidade. Não sabe quanto dos seus homens eu já conheço e muito bem, eu sei de suas fraquezas, eles se fizeram vulneráveis a mim. Sei de suas vergonhas. Você pode nos colocar em categorias diferentes, mas eu não sou menos que você ou qualquer um de vocês. Chamam-me de onipotente.
O oficial da polícia apenas o assistia distante quando balançou as mãos ao alto em direção à porta sussurrando — Louco.
Hyunjin o vê sair, ouve o metálico bater-se a tranca, e espera-se alívio, espera-se que os ombros baixem, espera-se qualquer aspecto desvalidade, mas o que se faz presente carrega pavor. O ativista de histórico duvidoso vira sua cabeça para a parede de vidro de onde não se vê humanamente absolutamente nada, mas seus olhos são firmes e insanos, ele os oscila por contato visual à cada uma das autoridades de vigilância. Ele os ameaça e traz consigo o maior silêncio já previsto no setor pela possível absurda coincidência dos fatos, já que não era crivél. A suspeita passou pela operação de revista, e foi-se confirmado mais de uma vez sobre o mal funcionamento do seu objeto arduino acoplado em uma de suas ires, que já não era funcional.
Mas agora, mediante a testemunhas, Madalena, a dita ativista da facção Internals, os enxergava diretamente do abismo.
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O mecânico sentava-se sob a cama processando lentamente a informação que se passava — Então você... é... o cara? Tipo espera, você é o mané dos manés, e eu sou casado com um dos manés?
O outro, também sentado e afastado, de braços cruzados levanta as sobrancelhas ao dizer — Resumidamente.
Seus olhos são vagos, pausam em suas mãos, ainda engolindo todas aquelas palavras — Então. Poxa, significa que eu e você não temos nada?
— É, meio que isso. — Diz acenando observando suas reações para conseguir preparar-se propriamente para as respostas. Ele se faz pensativo, até acrescentar — Eu posso chamar, seu noivo, caso queira.
A face de Jisung de repente apresenta espanto, balbuciando algo, desacreditado, até que exalta —... Você controla eles?!
Minho pisca, seu rosto é sério e impassível, até que pisca novamente para então mostrar-lhe um rosto mais expressivo, dizendo com obviedade — É claro que controlo.
— Eu nunca os vi fazendo isso antes?
O outro então se vê investido a fala, indagando — Os viu? Você teve acesso a mais de um? Isso é interessante.
— Por que você... Tá assim?
— Assim como?
— Mexendo seu rosto, falando ou sei lá, meio, parece um personagem, meio robótico.
— O que?
— Seu rosto! Você tá mexendo ele, você sorriu estranho, levantou a sobrancelha, a testa, abriu os olhos-
— Eles não mascaram perto de você?!
— Mascarar? O que é isso?
— É... um jeito que eu encontrei pra' me adaptar aos meios, meu psicólogo dizia que todos eles faziam com ele. Não fazem com você?
— Se você diz do jeito que ce' fez agora, não! Mas o meu noivo da muita risada e sorri assim — Ele move sua boca para mostrar os dentes cerrados e prosscegue — Tem um que nunca mostrar nada, o rosto é simplesmente assustador, mas eu já me acostumei e outro que é só a voado, tem olho caíido, ele não mostra quase nenhuma emoção, mas dá pra ver o que ele tá sentindo.
O homem de lata se cala absorvendo seus próprios questionamentos, sua face então torna-se neutra, os olhos são retos, percebe-se então o outro presente soltar um suspiro aliviado, que o intriga. Dessa forma Lee Minho o contesta — Quem é você? Eu preciso que me conte.
O indivíduo de cabelos rubros e bagunçado levanta os braços, até o pescoço como se buscasse em sua mente uma forme de iniciar.
Ele toma tempo até que proclama— Tenho vinte e cinco anos, exerço função como mecânico auxiliar de reparação de veículos licenciados pelo governo e presto trabalho pra' eles já à alguns anos, sou bisexual, moro em Gyurong.
"Três alters seus me conhecem, eu acho né, enfim... Alguém ai me conheceu quando caiu do céu em cima da minha gostosa, que no caso, é meu carro. Eu entrei em pânico te botei no ombro e arrastei teu lombo até o carro todo fudido e trouxe pro' meu apartamento pra' te socorrer já que hospital é caro pra' caralho e eu poderia correr o risco de acharem que tentei de matar ou sei lá meu! Como fiz graduação de medicina mas nunca conclui, eu tenho uma vaga ideia de como um corpo funciona e fiz o que pude, felizmente serviu já que tu tá aí, vivão né."
"Enfim, o alguém, eu acho um deles, talvez o policial, acordou depois de uns tempos recuperando, começou a fazer um bilhão de pergunta idiota pra' no final demorar pra' caralho na entrega do conserto da minha gostosa e ficar me perseguindo igual stalkear do caralho e aparecendo do nada do meu barraco com algum machucado novo."
"Daí do nada veio um diferente, um outro você, tipo alter, igual você disse, e acredite se quiser meu caro, esse aí, todo lascado, pisado, cuspido e desgraçado, piradão conseguiu me pegar! E na metade disso enquanto eu descobria que gostava de um liquidificador de crossfit anarquista que é tu, ele lembrava que na verdade era a porra da cabeça da facção criminosa mais doida dessa favela, tá ligado? Daí quando ele me contou eu pirei a cachola, puta que pario eu morria ali de infarto súbito mas quando eu pensava que a gente mal tava namorando, ele me pede em casamento! CASAMENTO, MÉNO!"
"E você sabe do que mais? Você, sabe, do, que, mais!? EU ACEITEI! Juro pra' ti meu brother, louco igual eu não tem! Aceitei ser noivo de cop filho da da puta que era infiltrado na polícia mas também liderava comunidade ativista à mando de cyberpunk, sinistrão mano, e pior cara, pior que tudo bem! Eu aceitei tudo isso cara, sério, eu fui de cabeça nessa porra, porque assim sabe, o mané que é tu mas não tu, o outro lá, que o pouca bosta chama de Palet, esse mané, porra! É tipo, o homem da minha vida tá ligado? É tudo maravilhoso com ele, é como se a vida não fosse uma merda com muito pouco tempo e trabalho demais, como se nenhum arrependimento meu conseguisse roubar tudo o que ele me faz sentir."
"Eu sou doidinho das ideia por esse mano, porque ele me faz tão bem, sabe? Tipo um bem pra' porra! Ele foi, foi o cara que mais que fez sentir amado na minha vida inteira... Tipo ele me faz sentir amor correndo pela minha pele, ele faz essas paradas completamente insanas de narcotráfico e essas porra toda parecerem um NADA méno! Nada... porquê no final do dia, se for pra' passar por tudo isso, todas essas emoções do caralho, e acordar do lado dele, acho que vale a pena, saca? É por isso que a ideia de casar nem pareceu tão doida, porque era com ele. O pensamento de ter ele perto de mim é maior que qualquer outra coisa, mano. Eu amo ele, real, e... Po' mano desculpa, falei demais."
O outro permanecia ali, simplório em sua própria melancolia, com as mãos juntas ele apenas diz — Tudo bem, eu não entendi uma só palavra, mas parece que você está sério nisso. É um grande compromisso.
Aquele cujo os dedos são manchados se alegra e o responde — É! Eu tenho até anel mané. — mostrando a aliança dourada, baixando o olhar para a mesma, prosseguindo — Palet me deu no dia que pediu minha mão, depois da gente fazer briga de travesseiro de madrugada. Porra, tô com tanta saudade, bicho... Ele é minha latinha de coca cola.
Os dois se veem daquela forma, sentados a cama com as pernas para fora, em lados diferentes, sob duas perspectivas diferentes. Minho o observa de volta, sussurrando de repente — Você, me ajudaria a fugir daqui?
Jisung o acompanha com a vista, questionando ao franzir o cenho — Pra' que?
Sério, o outro prossegue — Preciso achar a minha filha.
Os lábios do mecânico tremem, e ele inicia — Mané, mas ela...
Com o palmo, Lee o corta, dizendo — Não! Ela não está morta.
A face do Han não poderia estar mais confusa, mas ele insiste em perguntar — Como sabe disso?
Os ombros de Minho sobem, como se lhe fosse algo guardado, para em seguida soltar — Foi Pedro que me disse.
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AVISO:
A citação parafraseada de Hyunjin é da obra de Shakespeare, mas foi retirada do filme "Ó Paí, Ó" pelo personagem do Lázaro Ramos, e é uma recomendação audiovisual minha pra' vocês ᥫ᭡
Quanto tempo né?
Apenas passando para agradecer pela leitura, comentários e por aqueles que não desistiram da obra e continuam em aguardo dos capítulos e adaptação do livro, vocês moram no meu coração<³・゚ʼ ゚ ˎˊ
Estou o que posso fazendo na medida do que me possível para atualizar aos poucos pois estou no meu último período de faculdade de psicologia e em processo de TCC, e pode ser bem apurado para tempos livres 😅, mas vocês estão sendo bem pacientes comigo e eu fico muitíssimo feliz por isto.
Espero que tenham gostado do capítulo, e eu volto em breve ❤️
Para ficar mais próximo da ficção e das atualizações indico minhas redes sociais:
TWITTER: @/Kanashi_cherry
TIKTOK: @/cerejatriste
INSTAGRAM: @/kanashicherry
e mais recentemente PODCAST:
INTERNALS talk, disponível no Spotify
É nestas redes que eu amplifico as informações extras sobre a fic, posto as fanarts e tenho debates mais aprofundados sobre algumas das temáticas tragas na obra. Ajuda bastante para aqueles que possuem dúvidas.
Por fim me despeço até o próximo capítulo, peço que continuem atentos e ansiosos, beijinhos.
— Cherry៚
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