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2. DEUSA COM AR DE MENINA

Aquela mulher olhando para mim, fixamente, era estava diferente da que saiu desta mesma casa, desta cidade, há um ano.

Na verdade, aquela mulher me encarando de volta no enorme espelho do meu quarto, de rosto lavado, uma camiseta de pijama, cabelos soltos bagunçados e um sorriso no rosto, estava diferente da menina insegura e de coração estilhaçado que tinha deixado o país, depois de uma quase guerra em casa, claro, para passar um ano, sozinha, em um país estrangeiro, para estudar.

Era muito mais do que a aparência, decidi, levantando os meus braços e segurando os meus cabelos cacheados e longos no alto, depois os soltando e sorrindo para a minha novamente. A diferença estava muito além do que eu, ou mesmo outras pessoas, pudessem notar em um primeiro momento. Era muito mais interna: era na minha autoestima, na minha personalidade, na minha forma de encarar a vida, na maneira que eu tinha decidido me pôr em primeiro lugar.

Um por si só não operava maravilhas no crescimento e na maturidade de uma pessoa, era apenas uma passagem formal de tempo, isso dependia muito da forma como essa pessoa conseguia lidar com as frustrações e aprender com os possíveis erros. Esse processo ainda estava em andamento, comigo, mas eu já gostava da maneira como ele estava iniciando...

A diferença, fundamental, decifrei, estreitando os olhos escuros e virando de um lado e de outro, foi que eu decidi me amar antes de tudo. Sim, foi isso. Como doar a sua vida e os seus sentimentos a alguém de uma forma tão absoluta, sem que você se valorize e se apaixone profundamente por si mesma? Hoje, pra mim, isso seria impossível.

Eu ainda era bastante nova, mas aprendi uma coisinha ou outra sobre mim que fariam toda a diferença quando eu tive que lidar com homens. Quando eu tivesse que lidar com ele, pensei.

Respirei fundo e levantei o queixo, apreciando a minha imagem e as mudanças em mim: as de fora e, principalmente, as que eu sabia que tinham ocorrido por dentro. Eu precisava sair do país para isso acontecesse? Não, mas veio a calhar que o curso e a necessidade de precisar me afastar acabaram por coincidir.

Sim, às vezes aquele processo de se amar e se valorizar era quase natural enquanto se passava da adolescência para a fase adulta, outras vezes, era problemático, sofrível, traumático, não raro havia um boom, uma explosão, um gatilho, algo que poderia fazer você repensar todas as suas prioridades.

Aquilo aconteceu comigo, mas a mudança foi mais do que apenas motivada por esse boom, foi mais motivada pela pergunta: quem eu sou e o que eu quero da vida? Quem eu era? Ou melhor, quem eu queria ser? Apenas a menina perfeita que aceitaria o que estava lhe sendo destinado, ou alguém que poderia fazer o que realmente amava, apenas eu poderia fazer? Muita gente não tinha opção, oportunidade, eu tinha, então, teria que aproveitar.

E então, no meio desse processo de redescobrimento, veio a questão crucial: o amor por um homem, sendo ainda tão jovem, não poderia ser o suficiente para me definir. Sentir-se apaixonada, amar alguém, dependendo das circunstâncias, era muito bom, sim, mas era preciso mais do que aquilo para que você se encontrasse na vida, para ser o seu norte.

E olha, eu me amava muito! Ri, observando aquela covinha na minha bochecha, aquela também sempre me fazia parecer mais jovem e mais "moleca" do que eu queria, às vezes.

Eu ainda estava imersa nesses pensamentos quando as batidas soaram na porta do meu quarto. Eu saí do banheiro e praticamente corri para abrir, porque eu sabia, ou melhor esperava não me enganar, sobre quem seria. Se ele ainda lembrasse do nosso ritual ao longo dos anos, sempre que ele voltava de uma viagem, por exemplo, eu sabia exatamente quem estaria ali.

Quando abri a porta, meu pai estava parado lá, uma das mãos no bolso da calça cinza, aquela expressão séria e aquele profundo vinco entre as sobrancelhas, algo que poderia enganar os desavisados sobre o seu estado de humor. Eu simplesmente sorri largamente, abri bem os braços e a carranca usual dele se desfez imediatamente em um sorriso que sempre tinha vindo muito fácil para mim, a vida inteira.

No segundo seguinte, meu pai estava me abraçando apertado, e eu fui praticamente arrancada do chão enquanto ria, feliz, e escondia o rosto em seu pescoço, sentindo seu cheiro bom, confortável, confiável. Fazíamos aquilo há anos, aquela espécie de ritual, sempre que ele estava de volta em casa: um abraço apertado e afetuoso na porta do meu quarto. A diferença era que, nesse caso, eu estava de volta em casa depois de uma viagem.

Como eu senti saudades dele, Meu Deus, de todos eles!

Às vezes, bem no início, no meu apartamento na movimentada e de certa forma fria Quinta Avenida, batia aquele medo, um arrependimento, e eu me perguntava o que estava fazendo ali, longe de casa, sem todos que eu estava acostumada a ter ao meu redor: sem meus pais, sem meus irmãos, sem ele. Mas então eu lembrava do meu processo de me "libertar", crescer, amadurecer, de buscar a minha autonomia, fazendo o que eu gostava, e concluía que estava tudo bem. Que eu iria ficar bem, sim. E eu fiquei.

— A minha menina acordou em casa, finalmente — ele murmurou, enquanto nos separávamos e olhávamos um para o outro longamente. As rugas charmosas em volta dos seus olhos me fizeram suspirar, emocionada. Eu não conheci o meu pai biológico, era muito pequena quando ele morreu, assim como a minha mãe, mas olhar para aquele homem e não pensar na figura de um pai na melhor e mais perfeita acepção da palavra, era impossível para mim, sempre havia sido.

— Nem parece que não nos abraçamos até perder o fôlego ontem — respondi, quase o arrastando para dentro do quarto para nos sentarmos na minha cama.

— Sim, mas como eu disse, você está acordando em casa, é diferente — ele retrucou, afastando um cacho disperso para trás da minha orelha enquanto me encarava — Ainda olho pra você aqui e praticamente não acredito que você esteve esse tempo todo fora, morando sozinha, Iza.

— Não apenas morando, Sr. Avellar de Barros. Estudando, estagiando, me qualificando em uma galeria de artes renomada, você quer dizer isso, não é? Em uma das mais prestigiadas escolas de Artes do mundo? Ou você não recebia as mensalidades da School of Visual Arts? — provoquei-o, fingindo alisar uma dobra na minha colcha branca, e depois sobservando-o. Ele franziu a testa e eu sorri novamente.

Aquele que eu tinha feito um tipo de curso "rápido" de um ano em uma conceituada e inovadora instituição americana que existia desce a década de 40. Esse tipo de experiência "valia ouro" em um currículo no Brasil, além de todo o conhecimento que adquiri. Eu tinha, portanto, um leque de opções e possibilidades acadêmicas e mesmo profissionais à minha frente, eu sabia disso, inclusive entrar em uma faculdade de Artes no Brasil e obter um diploma, por exemplo.

— Eu recebi, sim, cada uma delas, pode acreditar — meu pai informou, sério, depois sorriu novamente e envolveu o meu rosto entre as suas mãos, seus límpidos olhos azuis seriamente fixados nos meus. Aqueles olhos que eram considerados por muitas pessoas como frios, gelados e distantes, sempre me pareceram brilhantes de amor — E estou extremamente orgulhoso de você, filha. De tudo o que você conseguiu, que vai conseguir. Nunca duvide disso.

Eu fiz que sim, um aperto de emoção em minha garganta, apesar do sorriso.

Nesse momento, a minha mãe também apareceu na porta, ainda em um penhoar e sua longa camisola de seda preta e um belíssimo sorriso no rosto. Depois que chegamos do aeroporto, ninguém conseguiu dormir, exatamente, e ficamos conversando até mais tarde.

— Ora se já não estamos paparicando a cria novamente e eu não fui formalmente convidada para a ocasião — ela disse, daquela sua forma de falar quase "cantando", enquanto entrava e sentava-se ao meu lado. Trocamos beijinhos e um longo, longo abraço afetuoso. Como eu pensava, aqueles abraços de ontem não foram o suficiente, depois de tanto tempo afastada deles.

— Meu pai estava me contando como está orgulhoso de mim, mãe... e como achou excelente que eu tivesse esse meu "ano sabático", que estivesse um pouco livre, sozinha, inclusive, ele acha que eu poderia novamente retornar aos Estados Unidos se quisesse e...

A risada alta e incrédula dela abafou o restante do meu discurso.

Eu me mantive séria, até olhar para a cara fechada dele, mas não aguentei e nós duas sorrimos, nos abraçando pelos ombros. Então, veio aquele momento em que o riso acabou, mas ficamos os três olhando um para o outro, felizes, satisfeitos, em paz. Só seria mais perfeito se meus irmãos estivessem aqui, mas eles tinham saído de cada há um bom tempo, já, e nós nos acostumamos a sermos apenas nos três, nos últimos anos. Se eu senti uma saudade sufocante, imagina como não foi para eles?

De toda forma, teríamos um jantar em família e em dois dias e eu os veria, isso se eles não aparecessem antes. Marcos não tinha terminado ainda de implicar com o Erik, meu namorado, que havia passado mal no voo e foi embora antes que eles chegassem para me buscar no aeroporto. Eu tinha certeza de que ele não deixaria escapar a oportunidade de me provocar sobre aquilo nos séculos seguintes, pelo menos.

— Estamos orgulhosos sim de você, meu amor, completa e totalmente, mas estamos mais felizes ainda que você esteja de volta — mamãe anunciou, mansamente, depois daqueles segundos de silêncio. Depois, ela piscou para o meu pai — Não que seu pai tenha, algum dia em todo esse ano, deixado de resmungar sobre a sua ausência ou sobre onde ele estava com a cabeça quando permitiu que você fosse, mas tirando isso, esteve tudo muito bem por aqui.

Ele entrecerrou os olhos para ela, que sorriu ainda mais, mas não negou, notei, então voltou-se para mim, deu um beijo na minha testa e fechou o botão do terno.

— É claro que eu compreendi a sua necessidade de buscar independência, de ter a sua experiência de vida, Izabel, mas, por favor, não me diga que pretende fazer algo assim em breve, deixe primeiro que eu me recupere desse trauma. Senhoritas, preciso ir, já estou atrasado para uma reunião. Vejo vocês à noite.

— Não sei não, mas acho que o senhor está meio que pegando essa veia dramática da mamãe e do Marcos, hein? — impliquei, e ele sorriu novamente.

— Ele sempre teve essa veia dramática, querida, só não mostra muito ela por aí. Na ocasião certa, ela sempre aparece — mamãe disse, e então ele curvou-se e deu um beijo em seus lábios, que ela retribuiu afagando a sua nuca, antes que ele se fosse e nos deixasse a sós.

Eu havia mudado, sim, mas aparentemente aquela capacidade de suspirar na presença do amor, companheirismo e respeito dos meus pais, ainda estava ali, intacta, viva e desejável. Com uma vivência como aquela, como eu poderia desejar algo menos do que um amor real, vivo, amparado em respeito, fidelidade e carinho?

E enquanto o meu pai saía, fechando a porta atrás de si, eu fui tomada por um profundo sentimento de tristeza, e fiz novamente o que tinha feito pela viagem inteira, o que tinha feito assim que pisei em solo brasileiro, o que fiz muito — a quem eu queria enganar? — ao longo daquele ano inteiro fora, mesmo que eu ficasse tentando não fazer: eu pensei em Ricardo.

Eu pensei sobre o amor incondicional que eu imaginava ter por ele, sobre a paixão adolescente e depois adulta que eu passei a cultivar, sobre os sonhos bobos de um amor intenso assim... Parecido com o dos meus pais. Mas eu pensei, sobretudo, sobre as frustrações, sobre a decepção, sobre a mágoa. Hoje, eu encarava aquele episódio como um divisor de águas. 

Sim, eu saí sem falar com ele, sim, eu o odiei por um tempo, sim, eu ainda tinha um profundo ressentimento no que dizia respeito a Ricardo naquela noite, mas não, eu não mudei apenas por causa dele: eu mudei por mim, para nunca mais me sentir como eu senti naquela noite, com ele. Ou com qualquer outro homem, no futuro.

Mas, ainda assim, talvez, só talvez, eu pensei também acerca do que ele acharia sobre a nova Iza, as duas, na verdade, aquela que eu via no espelho, na aparência, mas, principalmente, sobre aquela que tinha mudado um pouquinho por dentro. Sorri comigo mesma, maliciosamente, imaginando se ele gostaria do que veria: por que ambas estavam sentindo-se poderosas, maravilhosas, deusas!

Até a noite do jantar em família, apenas, alguns dias depois, eu ainda não tinha saído muito de casa, mas pretendia remediar isso em breve.

O número de malas que eu havia trazido de volta talvez fosse um pouquinho maior do que eu tinha levado, e além de muita coisa para arrumar e mudar de lugar no meu quarto havia também muita coisa para ir ajustando à minha vida, aos meus hábitos. Eu estava voltando pra casa, sim, mas ao mesmo tempo, muita coisa tinha mudado na minha ausência.

Dominando todos os pensamentos naquela noite, quando eu desci, estava um: ele viria? Algo me dizia que não. Da última vez que nos vimos, eu nem mesmo me dignei a falar com Ricardo, quando ele apareceu para uma visita com Marcos e Teo. Fiquei no meu quarto até que ele fosse embora. Depois, ele passou claramente a me evitar, e eu a ele. E durante esse ano todo, não nos vimos e nem nos falamos.

Portanto, o pouco que eu achava que conhecia de Ricardo Hoffman me dizia que não, ele não viria aqui hoje jantar conosco.

Que não viesse, oportunidades de mostrar a ele que eu agiria de modo diferente, agora, não faltariam decidi. Eu deveria me concentrar no fato de que tinha um namorado, e que ele viria naquela noite conhecer oficialmente a minha família. Isso, por si só, já era uma mudança e tanto na minha vida.

Quando eu saí do Brasil, eu praticamente não havia namorado ninguém, principalmente porque nutria esperanças juvenis de que Ricardo me notasse e... sei lá, algo acontecesse. Esse algo nunca aconteceu, e a não ser por Gustavo, uma colega de escola do último ano que estava muito a fim, e que eu levei para a festa de 18 anos, a minha família realmente não estava acostumada a essas ocasiões.

Erik teria sua prova de fogo, esta noite, e eu sabia que ele estava nervoso, mesmo que não quisesse demonstrar. Meu pai e meus irmãos, por outro lado, deveriam fazer aquelas caras assustadoras para ele, isso eu já previa. E as perguntas? Que Deus me ajudasse naquele momento.

Para além disso, outras mudanças significativas rondavam a nossa família: novos relacionamentos pareciam estavam no ar, pelo que eu estava sabendo, e eu esperava sinceramente que deles surgissem amores duradouros: Teo, meu irmão, primo, amigo, merecia demais uma nova chance de amar, depois de anos casado com aquela mulher detestável, e eu já sabia que Diego esteve com uma bela e misteriosa mulher de cabelos vermelhos o final de semana em seu apartamento, segundo mamãe tinha arrancado de Marcos. Isso não era do feitio de Diego, não quando eu sabia, da última vez que nos falamos, que ele possuía um tipo de relacionamento com uma moça chamada Fabíola, que conforme mamãe fez questão de frisar, não tinha cabelos vermelhos.

Marcos, bom, eu esperava que ele também "caísse do cavalo" e pagasse pela longa fila de corações arrasados que ele deixava por aí, pensei, divertida, tomando um gole da minha taça de champanhe enquanto ajustava a alça de pedrinhas brilhantes do meu longo e justo vestido branco. Mesmo sendo uma reunião familiar, optei por me vestir à altura, com saltos altíssimos, um vestido de uma das duas cores que eu amava, branco e dourado, e deixei os meus longos cabelos cacheados soltos pelos ombros e costas.

Os elogios dos meus pais compensaram o tempo que eu investi no meu visual, e ainda havia recebido presentes maravilhosos — uma coleção de minúsculas esculturas, que eu amava, do meu pai, e uma pintura em óleo, linda, da minha mãe.

Faltava pouco tempo agora para que os convidados — Erik, meus irmãos, meu tio Rui e sua namorada — começassem a chegar, mas eu resolvi descer antes e ficar ali, na varanda, apreciando as luzes do nosso amado jardim, enquanto degustava lentamente uma taça de champanhe, perdida em pensamentos desordenados.

Ouvi o eco dos saltos da minha mãe, atrás de mim, assim como o aroma delicado e bem conhecido do seu perfume, quando ela parou ao meu lado. Também estava com uma taça de champanhe nas mãos e mais bonita do que sempre, com seu vestido preto longo e diáfano. Encostou a cabeça no meu ombro e trocamos um sorriso.

— Ansiosa demais? — ela perguntou.

— Muito, a senhora nem imagina. E o papai?

— Na biblioteca, mas irá receber os convidados assim que eles chegarem. Na verdade — ela abaixou a voz como se contasse um segredo, um sorriso em seus lábios — Acho que ele está lendo as últimas páginas do dossiê completo que mandou fazer sobre o seu namorado e a família, antes de ter que interrogá-lo, mais tarde.

— A senhora está brincando, não está?

— Claro que sim.

Olhamos uma para a outra e suspiramos juntas. Depois, desviamos nossos olhares. Havia uma chance enorme de que ele pudesse fazer algo assim.

— Quando lembro que o Erik terá que enfrentar o meu pai, o Marcos e o Diego, ao mesmo tempo, meu estômago se contrai, mãe — eu gemi, depois nós duas rimos — De todos, o meu medo maior é do Marcos. O meu pai não vai fingir que gosta dele, vai fazer aquela cara assustadora o tempo todo, eu já sei. Diego vai ficar impassível, analisando calado e tirando suas conclusões que também me assustam, mas o Marcos, mãe... ele vai debochar e desestruturar o coitado, além de amedrontá-lo, é lógico! Não é justo!

— Que bom que você lembra de como os nossos homens são.

— Mãe!

— Tá ok, fique tranquila. Eu já tive aquela conversa com seu pai sobre esse assunto, antes de descermos, aquela, você sabe, a que tem surtido um efeito ou outro ao longo dos anos. Os meninos, eu já ameacei o suficiente por telefone, e pessoalmente também — ela me olhou de lado, os olhos verdes brilhantes de divertimento — Não dá pra ficar tranquila, mas ele sairá vivo daqui hoje, isso é o máximo que eu posso prometer para você.

Balancei a cabeça sorrindo.

— Já é um bom começo.

— Muito bom.

— Vou ameaçar todos eles a ir embora pra outro lugar, bem mais longe dessa vez, se eles insistirem nessa proteção louca e não me deixarem viver a minha vida — resmunguei, tentando não rir.

— Eu sei que esse foi um dos motivos que fez você ir — mamãe murmurou, depois de um instante em que não dissemos nada, bebericando da sua taça. Ela não me encarava agora, olhava para longe, como se também estivesse perdida nas próprias lembranças.

— Sim, a senhora tem razão — concordei, lentamente, movendo os meus cabelos para um dos ombros. Percebi que ela assentiu, devagar, e depois não disse mais nada.

Ficamos em um silêncio cúmplice, até que ela virou-se totalmente na minha direção, balançando o líquido em sua taça, o olhar atento às minhas reações. Antes que ela fizesse a pergunta que eu sabia que estava por vir, já senti a minha garganta secar, apesar da bebida.

— Um dos, mas não o único motivo, filha, não é?

Nós éramos muito mais do que mãe e filha, éramos amigas, confidentes, companheiras, a minha mãe sabia muito, mas óbvio que não sabia tudo. Aquela noite, por exemplo, era algo que eu guardava apenas para mim mesma. Algumas coisas, nem as mães precisavam saber. No entanto, ela sabia mais do que eu algum dia pretendi mostrar, ela sempre fora assim.

— Não, não o único, mas todos os outros não são maiores do que a minha própria vontade de me encontrar na vida, a senhora sabe. Eu estava me sentindo sufocada por minhas inseguranças, de todos os tipos — confessei, mas eu tinha certeza de que ela já sabia. Mamãe acenou mais uma vez.

— E então, o Erik... me conta mais sobre ele — ela pediu, como se já não tivesse ouvido o suficiente nos últimos meses.

— A senhora sabe do geral: nós nos encontramos no museu em que eu estava estagiando, viramos amigos, inseparáveis, ele é um cara legal, atencioso, educado... Passamos a namorar depois de um tempinho. Ele é um rapaz legal.

— Hum... — foi só o que ela disse. Revirei os olhos e beberiquei a minha bebida devagar.

— Eu gosto dele, mãe.

— Pobre coitado, bem que eu desconfiei — ela suspirou audivelmente, encolhendo os ombros. Virei-me para ela intrigada com a afirmação.

— Como assim? Por que a senhora diz isso?

— Iza, meu bem, eu já vi você ter mais entusiasmo para dizer que gosta de um par de sapatos do que demostrou agora ao dizer que gosta do seu namorado. 

— Não é assim, eu realmente... gosto dele. Não posso dizer que estou perdida e loucamente apaixonada nem nada do tipo, mas é ele é bom... nós nos entendemos, e...

— Ei — ela tocou o meu ombro, depois o meu rosto, interrompendo o meu discurso — Eu não estou esperando uma justificativa sua. Foi só uma pergunta e um comentário, ok? Às vezes, nós nos envolvemos e nem sempre estamos "perdida e loucamente apaixonados", mas gostamos da pessoa, sim, há companheirismo, respeito, amizade. Nada de paixão louca, eu sei como é. Isso acontece, às vezes.

Suspirei profundamente, aliviada.

— Que bom que a senhora entende.

— O problema, minha filha, é quando estamos com alguém de quem apenas... gostamos mas, por outro lado, estamos "perdida e loucamente apaixonados" por outra pessoa.

Fiquei momentaneamente paralisada, engoli em seco e respirei fundo. Como eu disse, éramos amigas e confidentes, ela sabia da minha paixão antiga por Ricardo, sempre soube, talvez mesmo antes que eu percebesse. Ainda assim, ouvir aquilo me desequilibrava.

— Eu tive um ano inteiro para pensar sobre isso, mãe. Aquela menina boba apaixonada, bom, eu não sou mais essa pessoa — sussurrei, mesmo que soubesse que estávamos apenas as duas ali fora — As coisas não são e nem serão mais com eram antes, isso eu posso lhe garantir. 

Voltamos a nos encarar fixamente até que ela soltou um suspiro baixo e um sorriso triste.

— Se você diz... Mas não esqueça que, se precisar de mim, meu amor, eu estou aqui. Sempre estarei aqui pra você, não hesite em contar comigo, para estar com você de todas as formas que você precisar, minha filha.

Piscando para afastar as súbitas lágrimas de emoção, confirmei com um gesto de cabeça. Voltamos a nos abraçar, e quando nos separamos, ela enxugou o cantinho dos olhos, também.

— Eu o convidei, sabe? Liguei pra ele, afinal, seria estranho não convidá-lo, você não acha?

Eu não ia me dar ao trabalho, não com a minha mãe, de fingir não saber quem era ele, de não ter ideia de quem ela estava falando. Levantaria mais suspeitas se eu bancasse a boba com ela, o que dona Abigail sabia que eu não era. Ela me criou, ela me conhecia.

— Eu acho que ele não vem. Tenho certeza, aliás, que ele não virá — afirmei, convicta.

Ela balançou a cabeça, cruzou o braço no meu e voltamos para a sala, afinal, um carro acabava de entrar na garagem em frente à casa. Erik havia confirmado que estava chegando, então, devia ser ele. Eu precisava focar no presente, no que estava acontecendo agora. Quando chegasse a hora, eu esperava lidar com Ricardo da maneira que tinha imaginado. E, bom, eu imaginei muito. 


Vocês acham que Iza está aprontando alguma coisa? 

Ou ela apenas vai ignorar Ricardo? rsrs

Obrigada, meus amores, e não esqueçam de votar no capítulo. 

Bjs! E continuem mantendo-se seguras!🌹❤️❤️❤️❤️❤️❤️🌹

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