31° verso
Fazia bastante tempo desde que changbin teve uma boa noite de sono.
Apesar dos contratempos, o cansaço no final o atingiu com força o suficiente para ele não pensar em seus problemas, apenas despencou no colchão e dormiu como um bebê. Não soube como ou quando foi limpo e arrumado, vestia a camisa de chan quando despertou, somente uma cueca cobrindo suas partes íntimas. Ele apertou os olhos pela claridade que invadia o quarto, o ar ainda tinha cheiro de hidratante de morango e o perfume másculo do australiano. Changbin se virou na direção onde jisung deveria estar dormindo, apenas encontrando o loiro ali com o rosto afundado no travesseiro e as costas largas e vermelhas em direção ao teto espelhado.
Changbin ainda estava zonzo de sono, ele deslizou sobre o colchão de lençóis bagunçados até estar com uma de suas coxas por cima do australiano, se aninhando nele como um coala. Seu coração martelava no peito, uma perfeita sinfonia que esmagava suavemente suas costelas, e tudo isso por apenas ver o rostinho de chan amassado contra a cama. Changbin se sentia um completo estúpido apaixonado, um adolescente que não sabia nada da vida e tinha sido jogado de cima de um penhasco e caído nos braços de Hades. E o moreno com certeza não queria sair daquele aperto quente, porque isso significava parar de amar chan e jisung, e ele estava disposto a queimar para sempre no fogo do submundo se aquilo significasse ficar com eles.
Ele estava ali, deitado num quarto de um motel qualquer junto com christopher. Não tinha ninguém além deles, e changbin podia viver pra sempre assim. Somente eles três num lugar onde ninguém pudesse ir interrompê-los. E era tão bom. Changbin queria mergulhar e ficar lá por toda a eternidade, mas é aí que a realidade se inicia novamente. Eles não podiam. Suas vidas de certa forma não dançavam a mesma música, jisung e chan eram ocupados e tinham uma vida pública, e o moreno tinha pulado fora daquele barco a muito tempo, mas de certa forma, estava cansado de viver na sombra dos outros por ser um medroso.
Seungmin e hyunjin estavam iniciando uma nova vida, e pareciam não ter medo de errar em nenhum momento. Admirava aquilo neles. Eles tinham uma confiança um no outro que deixava o baixinho com inveja, mesmo quando o bar estava em grandes problemas, seungmin sempre fora muito positivo e hyunjin fazia o que podia para trazer novas atrações e público novo. Em nenhum momento eles pensaram em desistir do trabalho que tinham, e changbin era totalmente o contrário daquilo, facilmente era coagido por suas emoções, principalmente as negativas. Estava trabalhando naquilo em suas terapias, mas era inegável que ele ainda se sentia um fracassado completo. Queria tentar algo novo, iniciar uma nova vida como eles, mas não sabia nem por onde começar.
Pela primeira vez, ele se arrependeu de ter largado a música.
Compor e cantar era algo que ele sempre almejou, quando ainda era um pirralho que fugia da casa do seu tio como forma de rebeldia, as manchetes e notícias de cantores e estrelas da música sempre chamavam sua atenção. Pensava que, se melhorasse certos aspectos da sua vida, poderia ser tão bom quanto as celebridades da televisão, mas era uma criança muito inocente na época. Ele tentou de tudo, mesmo com tanta gente jogando energia negativa em seu sonho de ser um cantor de sucesso, mesmo quando chorava escondido no quarto por não se sentir o suficiente, mesmo quando quis desistir de tudo e apenas ser mais um cidadão qualquer com uma vida entediante. Mas seu tio, um homem velho e barbudo, com menos de um e setenta de altura e uma compostura estóica, nunca deixou que o pequeno seo changbin desistisse dos seus sonhos. O apoiou em tudo e o ajudou no que podia, e quando finalmente o moreno conseguiu, ele faleceu por conta do câncer de pulmão que seu vício em cigarros acarretou.
Depois daquilo, changbin caiu totalmente de cabeça no trabalho. Tinha estreado e precisava mostrar a todos — e principalmente a si mesmo — que era o melhor. Muitas cobranças resultaram na perda de ânimo, changbin se viu como um ratinho sem saída com várias armadilhas na sua frente, e ele acabou pisando em cada uma como um completo tolo. Boatos, reclamações, críticas, julgamentos, cancelamentos, changbin tinha experimentado de tudo, um grande prato amargo e recheado de pimenta, daqueles que deixava seu paladar ardendo e sua boca dormente.
E então, ele explodiu. Cansou de bancar o bom moço e foi o SpearB que a mídia falava. Um arruaceiro sem educação. Um completo fracassado que fazia boas músicas, mas com seu comportamento de merda, ninguém o levava a sério. E aquele foi changbin por muito tempo.
Agora, de repente, ele queria aquela vida de volta. Queria se sentir completo do mesmo jeito que se sentia quando estava numa sala de produção, ou quando se sentava num café qualquer para compor músicas sobre o que via no dia a dia das pessoas, sobre suas vivências e experiências desagradáveis. Ele sentiu falta de tudo, e quis aquilo tudo de volta.
Mas ele não sabia por onde começar, e não sabia se era capaz de lidar com todos os julgamentos e cobranças.
Se assustou quando abruptamente a porta da suíte que estavam foi aberta, ele ergueu o queixo e visualizou a imagem de um jisung risonho entrando empurrando um carrinho com café da manhã e outros aperitivos. Ele cantarolava animado enquanto fechava a porta, e quando notou que o baixinho estava acordado, sorriu amplamente e tirou uma rosa do bolso do shorts que vestia, marchando saltitante até o menor que ainda estava perdido pelo sono.
— trouxe pra você. — disse ainda sorrindo, entregando a rosa artificial junto com um beijo delicado em sua testa, como um brinde. Changbin segurou a rosa pelo caule pequeno, olhando para o presente por alguns instantes antes de mirar suas orbes negras no mais novo. — esse preguiçoso ainda não acordou? Ei, seu chato, não é hora pra tá dormindo.
— cala a boca, eu não tô dormindo. — chan esfregou a bochecha no travesseiro, virando o rosto na posição contrária deles. Jisung bufou descontente, tocando as pequenas marcas de unha que estavam visíveis por toda coluna do maior, dedilhando com força para obrigar o bang a se virar por conta da sensibilidade que provavelmente estava o abrangendo. E deu certo. Irritado, o australiano encarou jisung fixamente.
— vai com calma aí, cachinhos dourados, não vai querer matar seu namorado na frente do seu outro namorado, né? — chan ficou sentado num suspiro, encarando o castanho com os olhos semicerrados. — né? — cutucou o australiano com os dedinhos, executando uma dancinha com os ombros que arrancou risadas do menor entre eles.
— para com isso, imbecil. — afastou as mãos do han do seu torso descoberto, jogando um dos vários lençóis em cima do garoto.
— nossa que mal humor. — torceu um bico com falsa chateação. Chan revirou os olhos, dando atenção para changbin que ainda apertava a rosa contra o peito.
— como se sente, amor? — indagou, acariciando o cabelo macio e bagunçado do menor.
— dolorido e cansado. — deitou no ombro livre do australiano, recebendo um afago agradável no cabelo.
— ainda temos algumas horinhas antes de ir embora, então vamos aproveitar pra comer. — jisung puxou o carrinho até a cama, ficando perto da beirada para pegar mesinha que estava na parte inferior do carrinho, colocando em cima da cama e em seguida distribuiu o que conseguiu pegar na cozinha com cuidado. — pedi o que vocês gostam de comer pela manhã.
— não tô vendo você no cardápio.
— muito engraçado. — deu um soco de leve no braço do australiano, fingindo estar irritado para esconder sua timidez. — não me toca, seu estúpido! — tentou se esquivar das mãos do bang, mas este o puxou com força para seu colo, esfregando o cabelo loiro e bagunçado contra a lateral do rosto do han, este encolheu as pernas e gargalhou alto. Changbin apenas os observava com deslumbre.
Ainda usando o ombro do bang como encosto, ele degustou do café da manhã, vez ou outra cochilando todo encolhido ao lado do mais velho. Jisung parecia radiante como o sol recém saído das nuvens, ele comeu e papeou ao mesmo tempo, daquele jeitinho que deixava a dupla mais velha impressionada e completamente boba.
— sabe o que eu ainda não entendi. — a indagação do menor foi o suficiente para os dois músicos se virarem para ele. — vocês resolveram os problemas da empresa antes de vir pra cá, né?
— não. — a tranquilidade com que chan respondeu fez changbin erguer o queixo para ele, encarando os olhos claros e os lábios espremidos que mastigava lentamente. — mas caso isso te tranquilize, metade das coisas já estão se resolvendo, a equipe de marketing está finalmente fazendo o trabalho deles direito, e a parte do vazamento de informações privadas dos artistas eu já resolvi com uns advogados, então, digamos estamos usando nosso poder como donos daquele lugar pra passar esse tempinho com você.
— ficar aqui realmente não vai atrapalhar vocês? — cruzou seu olhar entre os dois, nitidamente preocupado.
— claro que não, hyung. — jisung disse com as bochechas cheias. — e você é bem mais importante, tenha isso em mente.
Changbin nunca iria se acostumar com as falas inesperadas e imprevisíveis do castanho, nem mesmo com a facilidade que ficava envergonhado com suas ações.
— e você? — ele novamente ergueu o rosto para o australiano. — por que não atendeu o telefone ontem?
Changbin desviou rapidamente a atenção dos músicos, amassando o cobertor que estava sobre suas pernas tentando pensar em algo. Mentir talvez não fosse uma boa ideia no momento.
— o seungmin quem atendeu seu celular ontem, ele praticamente implorou pra gente vir pra Coréia porque você tinha desaparecido e ele tava com medo de que você pudesse ter feito algo consigo mesmo. — aquilo teve um peso enorme em seu peito, changbin fora obrigado a se encolher para tentar diminuir o sentimento de culpa que ressurgiu.
— tudo bem você não querer nos contar o que realmente aconteceu, a gente vai entender, amor. — o castanho acariciou seu cabelo com um sorriso compassivo.
— parece algo bobo agora…
— nada é bobo quando se trata de você, pequeno. — chan o aninhou melhor em seus braços, depositando curtos selares pela pele amendoada, arrancando de changbin um suspiro tímido. — estamos aqui por você, e seja lá quais motivos você teve pra fazer isso, não vamos te julgar e nem brigar com você por isso.
— eu não sabia o que fazer quando o seungmin disse que ia embora. — ele iniciou, ainda envergonhado e com uma dívida de culpa enorme nos ombros. Mesmo com o kim afirmando que estava tudo bem e que ele não estava bravo, aquilo trouxe uma comoção desnecessário, chris e jisung tinham saído de outro país só porque ele tinha sumido por algumas horas e tinha feito o ruivo ficar muito preocupado, mesmo sabendo dos problemas de ansiedade que o garoto detinha. — eu fui tão idiota, sabe? Simplesmente sai correndo porque não queria ser um escroto com o minnie. Ele devia ter ficado bravo comigo, porque assim…
— você sentiria menos culpa? — jisung completou meio duvidoso, mas ao receber um olhar estarrecido do menor, ele teve certeza do que tinha dito.
— bin, não é assim que funciona. — o australiano virou o menor em sua direção, o puxando para seu colo, repousou ambas mãos em seu rosto, apenas para garantir que teria a atenção dele. — é normal ficar assustado quando percebemos que a pessoa que a gente gosta vai ficar distante, mas tenho certeza que o seungmin não vai sumir. Pelo pouco que conheço ele, deu pra perceber o quanto ele se importa com você e quer te ver bem. Então, não pense nisso como um adeus, aposto que ele ainda vai dar um jeito de ir te ver pelo menos uma vez na semana. Não tem nada de errado em querer um tempo quando recebemos esse tipo de notícia sem nem mesmo estarmos preparados, tá tudo bem. — os olhos do menor de repente se encheram de lágrimas, as lindas pedras de turmalina sendo embasadas pelo acúmulo de água. O moreno fungou, abraçando chan pelo pescoço, esfregando diversas vezes sua testa no pescoço do maior, numa tentativa falha de fazer suas lágrimas sumirem.
O loiro gesticulou usando os lábios um "fiz bem?" para jisung que se mantinha na frente dele, o rapaz balançou o dedo polegar para cima, sorrindo para o maior.
Deixaram que o moreno se acalmasse por si só, ele choramingava baixinho contra a pele alva do australiano e às vezes murmurava que se sentia um idiota por fazer uma tempestade tão grande num copo d'água. Chan se manteve acariciando os fios negros e macios, e jisung afagou suas costas com a ponta dos dedos, desejando que ele parasse de chorar logo, odiava vê-lo daquele jeito.
— está se sentindo melhor? — indagou para o menor quando este afastou o rostinho vermelho e úmido do seu ombro, tentando limpar os resquícios de lágrima das bochechas. O menor assentiu, descendo do colo do bang e procurando pelo han, sendo rapidamente pego por ele e aninhado no meio de suas pernas, o castanho levava pequenas frutas cortadas em cubo até sua boca.
A imagem do moreno todo deitado sobre o rapper e com as bochechas grandes e cheias de comida era uma benção para christopher. O australiano não era de se vangloriar, mas tinha tanto orgulho de si mesmo por ter dois namorados tão lindos, e parecia um pecado apenas vê-los tão bem juntos, eles pareciam criar um próprio mundo feliz quando ficavam aconchegados um no outro. Chan sentia que seu coração podia parar ao ver o han fazer gracinhas para animar o baixinho, e quando ele finalmente caía aos encantos do garoto, e ria de um jeitinho adorável, o mundo ao redor parecia ter menos cores e só eles podiam brilhar em contraste ao cinza escuro que detinha o cenário ao redor.
— ele tá fazendo de novo, binnie. — sussurrou na orelha do menor, olhando para christopher com uma careta.
— é assustador, hannie. — comentou o menor, se contendo para não rir da cara de confusão do bang.
— será que a gente deve ligar para um médico?
— ou quem sabe um padre?
— o que vocês estão cochichando aí, hein? — ergueu uma sobrancelha curioso pelo assunto que eles discutiam em cochichos
— você fica encarando a gente com essa cara de idiota. — jisung disse sem cerimônias, pegando o maior desprevenido. Ele nem mesmo sabia que fazia esse tipo de cara quando os olhava.
— sério? — indagou genuinamente descrente.
— sim, e olha que tá acontecendo com tanta frequência que eu tô ficando preocupado.
— será que o trabalho tá comendo o restante do juízo dele? — changbin sussurrou um tanto alto para o castanho, que riu pela cara de irritado que o australiano fez.
— e quando ele teve juízo, bebê?
— você tem razão, ele nunca teve. — quando retornou sua visão para o maior, ele estava ficando vermelho de raiva. Estavam presenciando um daqueles dias que o loiro acordava com o pavio curto e a paciência quase nula. Changbin adorava esses dias, embora de que ver o bang bravo de verdade poderia ser perigoso, porém, talvez já fosse tarde demais para parar a tragédia que iria acontecer. — quer um calmante, hyung?
— venham aqui, vou ensinar uma lição a vocês.
Os garotos nem mesmo esperaram o australiano achar sua roupa íntima pela zona que estava o quarto, ambos ficaram de pé e tentaram a todo custo ficar longe do produtor, uma vez que ele parecia estar realmente enfurecido.
— fica longe, maluco! — jisung escondeu changbin em suas costas, pegando o travesseiro no chão para jogar contra o rosto do maior. Changbin gargalhou alto quando o mais velho cambaleou pela pancada e arregalou os olhos para eles, e em seguida correu na direção do han para pegá-lo.
Jisung foi facilmente capturado pelo loiro, este o pegou no colo e o jogou em cima da cama larga, focando na tarefa de deter o moreninho que corria em círculos pelo quarto.
— corre, changbin! Ele é louco!
O rapaz fez o que podia, desviou do loiro aproveitando que era menor que ele, passava facilmente por baixo dos seus braços quando ele avançasse para pegá-lo. Ficaram naquele joguinho de gato e rato por minutos, jisung da cama incentivava o seo a correr, dando gritos e rindo alto quando o australiano escorregava em alguma peça de roupa jogada pelo cômodo ou quando changbin conseguia despistá-lo de forma engraçada, sendo por debaixo de suas pernas ou pulando por cima da banheira e correndo na direção contrária que o australiano vinha.
— e aí, desiste, Cb97? — changbin indagou com um sorrisinho, de um lado da banheira. Chan estava na sua frente, caso ele fosse esperto e pulasse por cima, conseguiria prendê-lo contra a parede, mas ele estava ofegante e cansado, suor escorria pelas laterais do seu rosto e uma das veias da sua testa estava visível. Ele parecia esgotado. Changbin estava tão cansado quanto ele, mas ainda tinha forças para correr mais um pouco.
— desistir não está no meu vocabulário.
— uau, é agora que o protagonista vai soltar um poderzinho legal. — ambos mais velhos pararam e olharam pro han. — o que? Vocês nunca assistiram Naruto? — ele parecia tão genuíno e inocente que fora impossível para os dois mais velhos não rirem.
— eu tô exausto. — chan declarou, caindo na cama após entrar em um consenso mudo de trégua com o moreno.
— você tá ficando velho mesmo. — changbin provocou, caindo ao lado de jisung, se virando para fitar ligeiramente o australiano revirar os olhos.
— a gente tem quase a mesma idade.
— você continua sendo um ano mais velho que eu.
— não comecem a brigar. — jisung avisou, ficando no meio deles para apartar uma possível discussão que aquele assunto poderia trazer.
Após o han falar, os dois ficaram quietos, um silêncio agradável pairou ao redor deles, o quarto espaçoso se tornou finalmente quieto e calmo. Olhando pra cima, changbin podia visualizar pelo espelho no teto as costas do bang e jisung cochilando no meio deles, eles pareciam exaustos, não só pela agitação que tiveram agora, mas fisicamente cansados por conta da pressão mental que tinham sido expostos no último mês. Changbin sabia como era aquela sensação, estar tão cansado que não conseguia agir normalmente, todas as suas articulações ficavam rígidas e ele se via preso num monótono de "trabalho barra casa" excruciante.
— pra onde você vai, binnie? — jisung ergueu o rosto, vendo o rapaz ficar de pé indo em direção ao banheiro anexado ao quarto.
— vou tomar banho rapidinho. Fica aí com o chan, vocês dois precisam descansar. — voltou apenas para depositar um selar breve em sua testa, repetindo a mesma ação com o australiano que ressonava baixinho. — eu acordo vocês daqui a pouco.
— não some, por favor. — suplicou sonolento, se agarrando ao braço do bang para dormir.
— eu não vou, amor.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro